segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Rumos e desafios na construção da mudança pela gestão Obama

Elói Martins Senhoras
Meridiano 47 - 23/01/2009
A corrida à presidência dos Estados Unidos chega à reta final com um ganhador cujo perfil é diferente ao tradicional padrão histórico do país identificado em inglês pela sigla WASP como de origem Branca, Anglo-Saxã e Protestante.
Barack Hussein Obama II não é apenas o primeiro candidato negro a ter tido reais chances de ser eleito, mas seu nome retrata uma nova imagem internacionalizada do americano, cujo pai é queniano mulçumano e de mãe branca protestante do Kansas, que nasce no Havaí, tem passagem pela Indonésia e constrói sua rápida carreira política como parlamentar estatal em 1996 e senador do Estado de Illinois em 2005.
O novo fenômeno político Obama e o surgimento do apoio popular enquanto “Obamania” é visto pelos partidários democratas e um amplo espectro da opinião pública internacional como uma possibilidade de mudança do status quo estadunidense em suas relações nacionais e internacionais.
A aposta em Barack Obama como presidente também foi vista por diversos democratas com ar de dejavour. Desde as eleições primárias, quando concorreu em dura disputa com Hilary Clinton à vaga para candidato presidenciável pelo partido democrata, Obama teria sido comparado por alguns setores com a figura do ex presidente democrata John Fitzgerald Kennedy (JFK). A imagem positiva de um jovem líder que pode ser um empreendedor público para a sociedade se contrapõe de maneira dual à imagem negativa dos riscos de atentado derivados da forte rejeição de alguns setores dos Estados Unidos.
Um ponto importante da chegada de Obama à Casa Branca se refere ao custo total de sua campanha que claramente chama a atenção devido ao maior volume de recursos financeiros em quase três vezes em comparação à campanha do senador McCain oriundo da positiva estratégia de arrecadação via internet. Desde a criação do atual sistema de sistema de financiamento das eleições presidenciais criado após o escândalo de corrupção do caso Watergate, Obama tornou-se o primeiro candidato à rejeitar o financiamento público.
Outra discussão relevante na substitutição da administração Bush pela administração Obama é que falsas expectativas não devem existir a respeito de revoluções ou grandiosas inflexões na política estadunidense haja vista que as mudanças no sistema de administração política dos Estados Unidos são graduais e passam por negociações uma vez que o sistema político é bipolarizado - com os Partidos Republicano e Democrata - o que leva a uma conhecida “lei ou tendência de ouro do poder” que direciona os formuladores de políticas a uma via central ou moderada de diálogo entre as partes a fim de não haver processos claros de retaliação e trancamento de pautas.
O gradualismo das políticas públicas vai englobar temas polêmicos como saída das tropas do Iraque até 2010, reversão das políticas fiscais concedidos às classes mais ricas vis-à-vis cortes de impostos para os mais pobres e adoção de políticas econômicas contra problemas estruturais da crise econômica financeira e de déficit gêmeos da dívida publica e balanço comercial, o que possivelmente vai limitar nos dois primeiros anos da gestão altos investimentos em programas sociais estratégicos em saúde e educação e programas tecnológicos na área espacial e de energias renováveis que estavam presentes como promessas políticas.
As transformações na agenda da administração pública são certas de variação, de maneira que as temáticas unilaterais de poder duro do governo Bush abrirão espaço para novas temáticas políticas uma vez que o governo Obama vai contar com uma maioria de parlamentares democratas na Câmera e no Senado, o que se coloca em dúvida é o ritmo dos câmbios que está atrelado aos comprometimentos da administração anterior.
No cerne da política externa lato sensu, declarações da futura secretária de Estado, Hillary Clinton, durante uma sabatina no Comitê de Relações Exteriores do Senado americano indicam o rumo pretendido pela nova gestão, porém não deixam claro o seu conteúdo.
A gestão do presidente Barack Obama irá buscar uma nova estratégia externa para o país de modo a engajar um “poder inteligente” na arena internacional por meio do uso de políticas de poder brando de influência ideológica e cultural em combinação à políticas de poder duro, quando necessárias, exercidas por meio de força militar e ação econômica direta.
A direção de uma “política externa inteligente” que consagra o fortalecimento dos canais negociadores multilaterais de poder brando em razão do declínio do unilateralismo de políticas duras aponta para a retomada de um discurso de interdependência complexa no mundo, onde os Estados Unidos não estão a sós, mas antes têm que assumir um papel de liderança responsável por meio de diferentes meios de poder e sob diferentes áreas.
Embora haja um direcionamento para um conteúdo negociador e multilateralista na política externa americana na gestão Obama, tal como acontecera no governo Bill Clinton, não fica tão claro o conteúdo de construção de uma agenda de “poder inteligente”, embora haja indicações para continuidade na guerra ao terrorismo e abertura de canais de negociação junto à América Latina.
Se, em 1992, o início da gestão Clinton representava a chegada ao poder da corrente novo-democrata, que buscava abraçar a globalização e a economia de mercado em consonância com políticas internas, em 2009, a formulação do conteúdo da política externa torna-se mais problemática, pois Obama se situa em uma colcha de retalhos, representando diversos grupos de interesses democratas que se juntaram ao longo de sua campanha em um ambiente de questionamentos à globalização e de pedidos de regulação internacional.
Neste complexo contexto em que se insere a gestão Obama, é possível prospectar que, antes de assumir um papel estratégico na intitulada “política externa inteligente”, com diretrizes de abandono do unilateralismo de conteúdo neoconservador para o retorno ao multilateralismo, a senadora Hillary não vai ocupar um cargo de coadjuvante, mas antes terá centralidade na gestão Obama em função dos canais à passada gestão Clinton e ao seu importante papel que já teve na campanha presidencial democrata ao ter participado de comícios e das equipes de angariação de doações e de escolha e veto dos candidatos a vice-presidente.

Elói Martins Senhoras é Professor do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal de Roraima - UFRR (eloisenhoras@gmail.com).

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