quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Extrair carbono da atmosfera não reduzirá aquecimento global


Modelos mostram que sem redução de emissões, nem mesmo geoengenharia extrema protegerá os oceanos

Tiago Fioreze/Wikimedia Commons

Maria Temming 

À medida que muitas nações do mundo têm falhado reiteradamente em efetuar cortes significativos em sua produção de gases de efeito estufa, cientistas e outras pessoas começaram a se perguntar se a mudança climática poderia ser brecada não por cortes de emissões, mas por uma tecnologia que removesse esses gases da atmosfera.

Essa abordagem é chamada geoengenharia.

Infelizmente, uma recente simulação de seus efeitos sobre os oceanos verificou que nem métodos extremos seriam capazes de reabilitar completamente os ambientes marinhos. 

O trabalho foi publicado em Nature Climate Change em 3 de agosto (A Scientific Americanintegra o Nature Publishing Group).

Os experimentos focaram a chamada remoção do excesso de dióxido de carbono (CO2) diretamente da atmosfera.

Teoricamente, isso poderia ajudar os oceanos porque eles se tornam perigosamente ácidos quando absorvem demais CO2 atmosférico.

Uma ideia de remoção implica plantar árvores, que consomem grandes quantidades de dióxido de carbono, e depois queimá-las em instalações onde os gases podem ser capturados e armazenados no subsolo. 

Mas até agora ninguém ainda testou esse ou outros esquemas similares de remoção de carbono em larga escala. 

A segunda melhor opção para testes dessa envergadura é uma simulação em grande escala. 

No novo estudo, pesquisadores liderados por Sabine Mathesius, cientista ambiental no Instituto Potsdam de Pesquisa sobre Impacto Climático, na Alemanha, usou um modelo computadorizado para investigar a eficácia da CDR na reabilitação de águas marinhas danificadas por emissões de CO2.

Dois testes 

A equipe de Mathesius aplicou suas simulações em dois experimentos.

No primeiro, os cientistas queriam verificar se a remoção de carbono poderia reduzir a concentração de CO2 atmosférico aos níveis considerados “normais”, ou típicos, antes da Revolução Industrial nos século 18 e 19, restaurando assim o ambiente marinho a seu estado anterior.

Para isso, os pesquisadores basearam sua simulação em emissões de dióxido de carbono do mundo real de 1800 a 2005, e depois projetaram esses valores para o ano 2250.

Em seguida, simularam o que aconteceria se a tecnologia pudesse remover 18 bilhões de toneladas de CO2 por ano, cerca de 50% das atuais taxas de emissões, de 2250 até 2700.

Eles constataram que isso de fato diminuiria os níveis de CO2 atmosférico, mas não restauraria o conteúdo pré-industrial de oxigênio dissolvido nos oceanos, nem suas temperaturas.

Mesmo após 450 anos de geoengenharia, o oceano modelado continuaria sendo quase tão ácido como se não tivesse sofrido nenhuma intervenção tecnológica ou científica.

Mas o que aconteceria se alguém inventasse uma esplêndida e aprimorada nova técnica para a remover carbono do ar?

A equipe de Mathesius estava curiosa.

Para descobrir, os pesquisadores elevaram a taxa de remoção máxima para 90 bilhões de toneladas de CO2 por ano.

Esse desempenho é “francamente ridículo”, resumiu o geofísico Donald Penman da Universidade de Yale, que não esteve envolvido na pesquisa.

No entanto, mesmo nesse nível, em 2700 o oceano ainda estava mais quente, mais ácido e menos oxigenado que o ambiente marinho pré-industrial.

Em sua segunda simulação, a equipe modelou um mundo em que, contra todas as probabilidades, a atual sociedade humana reduziu substancialmente sua produção de gases de efeito estufa.

Os cientistas queriam determinar o que era melhor: cortes de emissões ou a remoção póstuma de CO2.

E conseguiram.

Quando se tratou de preservar o ambiente marinho, a remoção não foi páreo para uma redução de emissões.

Mesmo na simulação em que o método CDR extraía 90 bilhões de toneladas de CO2 da atmosfera por ano, o oceano profundo mostrou-se muito mais ácido do que no modelo com emissões reduzidas.

“Está claro que em vez de tentar limpar uma enorme bagunça, seria bem mais sensato simplesmente não criar a desordem em primeiro lugar”, observa Penman.

De acordo com Mathesius, a tecnologia CDR é ineficaz para combater a acidificação oceânica devido ao modo como a água marinha circula.

Existem regiões em que a água superficial submerge até o oceano profundo e permanece ali durante séculos ou até milênios, completamente isolada de qualquer contato com a atmosfera.

Portanto, mesmo se a CDR conseguisse reduzir significativamente a concentração de CO2 atmosférico, o oceano profundo continuaria altamente acídico.

O trabalho de Mathesius não é o único a indicar que a remoção de carbono é insuficiente.

Um estudo publicado em 3 de agosto em Nature Communications mostra que limitar o aquecimento global a no máximo 2ºC, exige a remoção 1,8 bilhão de toneladas de carbono da atmosfera por ano de agora até 2100, uma tarefa descomunal que excede qualquer capacidade da tecnologia atual.

Os estudos não significam que a remoção de dióxido de carbono seja completamente inútil, salienta Mathesius.

“Só estamos dizendo que a CDR não seria suficientemente potente para combater um cenário de atividades normais e habituais”, explica ela, e acrescenta: “Mas ainda existe a possibilidade de você recorrer à CDR como uma medida suplementar”.

A remoção, embora não possa desfazer todos os danos resultantes do excesso de emissões, ainda pode revelar-se útil se for combinada com cortes reais de carbono.

Scientific American Brasil

Guerra no espaço pode estar mais perto que nunca


Embora neguem, China, Rússia e Estados Unidos estão desenvolvendo e testando novas e controvertidas tecnologias para travar guerras espaciais

Lee Billings

U.S. NAVY
Testes de mísseis antissatélites como este realizado pela Marinha dos Estados Unidos em fevereiro de 2008, fazem parte de uma preocupante marcha rumo a conflitos militares no espaço exterior.

O ponto crítico militar mais volátil e preocupante do mundo não está, indiscutivelmente, no Estreito de Taiwan, na Península da Coreia, no Irã, em Israel, na Caxemira ou na Ucrânia.

De fato, ele não pode ser localizado em qualquer mapa da Terra, embora seja muito fácil de encontrar.

Para vê-lo, basta olhar para cima, para um céu claro, para a “terra de ninguém” que é a órbita terrestre, onde está se desenrolando um conflito que é uma corrida armamentista em tudo, menos no nome.

Talvez a vastidão do espaço exterior seja o último lugar em que se esperaria ver militares competindo por território disputado, exceto pelo fato de que o espaço exterior já não está mais tão vazio.

Cerca de 1.300 satélites ativos circundam o globo em um congestionado traçado de órbitas, fornecendo meios de comunicação, navegação por GPS, previsão meteorológica e vigilância planetária.

Para forças armadas que dependem de alguns desses satélites em guerras modernas, o espaço tornou-se a quintessência do “terreno elevado”, com os EUA como o rei indiscutível “no topo da colina”.

Agora, à medida que China e Rússia procuram agressivamente desafiar a superioridade americana no espaço com ambiciosos programas espaciais militares próprios, a luta pelo poder corre o risco de precipitar um conflito que poderia prejudicar seriamente, se não paralisar, toda a infraestrutura espacial do planeta.

E embora possa começar no espaço, uma confrontação desse tipo poderia deflagrar facilmente uma guerra total na Terra.

As tensões que vinham fervilhando há muito tempo agora estão se aproximando de um ponto de ebulição devido a vários acontecimentos, inclusive recentes e contínuos testes russos e chineses de possíveis armas antissatélites, assim como o fracasso, em julho, das conversações sob os auspícios das Nações Unidas para aliviar as tensões.

Em depoimento perante o Congresso no início do ano, James Clapper, diretor de Inteligência Nacional, ecoou as preocupações de muitas altas autoridades do governo sobre a crescente ameaça a satélites americanos, ao afirmar que tanto a China como a Rússia estão “desenvolvendo capacidades para negar acesso em um conflito”, como os que podem eclodir por causa das atividades militares de Pequim, no Mar da China meridional, ou de Moscou, na Ucrânia.

A China, em particular, ressaltou Clapper, demonstrou “a necessidade de interferir com, danificar e destruir” satélites americanos, referindo-se a uma série de testes de mísseis antissatélites, que começaram em 2007.

Há muitas maneiras de desativar ou destruir satélites além de explodi-los provocativamente com mísseis.

Uma nave espacial poderia simplesmente se aproximar de um satélite e lançar (borrifar) tinta em seus dispositivos ópticos, ou quebrar manualmente suas antenas de comunicação, ou ainda desestabilizar sua órbita.

Lasers podem ser usados para desativar temporariamente ou danificar de forma permanente os componentes de um satélite, particularmente seus delicados sensores, e ondas de rádio ou micro-ondas podem bloquear ou sequestrar transmissões para ou de controladores em terra.

Em resposta a essas possíveis ameaças, a administração Obama programou um orçamento de pelo menos US$ 5 bilhões a serem gastos nos próximos cinco anos para melhorar as capacidades defensivas e ofensivas do programa espacial militar do país.

Os EUA também estão tentando resolver o problema por meio da diplomacia, embora com sucesso irrisório; no final de julho, na ONU, discussões há muito esperadas sobre um código de conduta para nações que exploram o espaço, redigido tentativamente pela União Europeia, empacaram devido à oposição da Rússia, China e de vários outros países, inclusive Brasil, Índia, África do Sul e Irã.

O fracasso colocou soluções diplomáticas para a crescente ameaça em um limbo, conduzindo, provavelmente, a muitos anos mais de debates no âmbito da Assembleia Geral da ONU.

“O xis da questão é que os Estados Unidos não querem conflitos no espaço exterior”, resumiu Frank Rose, secretário-assistente de Estado para controle de armamentos, verificação e cumprimento das leis, que liderou os esforços diplomáticos americanos para impedir uma corrida armamentista espacial.

Os Estados Unidos, declarou Rose, estão dispostos a trabalhar com a Rússia e a China para manter o espaço seguro. “Mas quero deixar muito claro: nós defenderemos nossos bens espaciais se formos atacados”.



Teste

A perspectiva de guerra no espaço não é nova.

Temendo armas nucleares soviéticas lançadas da órbita terrestre, os EUA começaram a testar armamentos antissatélites no final da década de 50.

Os americanos chegaram até a testar bombas nucleares no espaço antes que armas orbitais de destruição em massa foram proibidas através do Tratado do Espaço Exterior da ONU, em 1967.

Após a proibição, a vigilância baseada no espaço tornou-se um componente crucial da Guerra Fria, com satélites servindo como uma parte importante de elaborados sistemas de alerta antecipado de prontidão para detectar o posicionamento ou lançamento de armas nucleares baseadas em terra.

Durante a maior parte da Guerra Fria, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) desenvolveu e testou “minas espaciais”, naves espaciais autodetonantes que podiam procurar e destruir satélites espiões dos EUA ao bombardeá-los com estilhaços.

Na década de 80, a militarização espacial culminou com a multibilionária Iniciativa de Defesa Estratégica do governo de Ronald Reagan, apelidada “Guerra nas Estrelas”, para desenvolver medidas retaliatórias orbitais contra mísseis balísticos intercontinentais soviéticos.

E, em 1985, a Força Aérea dos Estados Unidos fez uma clara demonstração de suas formidáveis capacidades, quando um caça F-15 lançou um míssil que destruiu um satélite falho americano na baixa órbita da Terra.

Durante tudo isso, não ocorreu uma corrida armamentista desenfreada e total, nem foram deflagrados conflitos diretos.

De acordo com Michael Krepon, perito em controle de armas e cofundador do think tank Centro Stimson, na capital Washington, isso se deveu ao fato de que tanto os EUA com a URSS perceberam o quanto seus satélites eram vulneráveis, especialmente os que encontravam em órbitas geossincrônicas (ou geoestacionárias), de aproximadamente 35 mil quilômetros ou mais.

Esses satélites efetivamente pairam acima de um ponto no planeta, tornando-os alvos muito fáceis.

Mas como qualquer ação hostil contra esses satélites poderia escalar facilmente para uma troca nuclear aberta na Terra, as duas superpotências recuaram.

“Nenhum de nós assinou um tratado sobre isso”, observa Krepon. “Simplesmente chegamos independentemente à conclusão de que nossa segurança estaria mais ameaçada se fossemos atrás desses satélites, porque se um de nós fizesse isso, então o outro também faria”.

Hoje, a situação é muito mais complicada.

Órbitas terrestres baixas e altas tornaram-se incubadoras de atividade científica e comercial, repletas de centenas e centenas de satélites de cerca de 60 nações diferentes.

Apesar de seus propósitos majoritariamente pacíficos, todos os satélites, sem exceção, estão em risco, em parte porque nem todos os membros do crescente clube de potências militares espaciais estão dispostos a agir de acordo com as mesmas regras, e nem precisam fazer isso, porque até agora elas ainda não foram escritas.



Lixo espacial

Satélites se deslocam pelo espaço a velocidades muito altas; portanto, o jeito mais rápido e sujo de “matar” um deles é simplesmente lançar alguma coisa ao espaço para obstruir seu caminho.

Até o impacto de um objeto tão pequeno e rudimentar quanto uma bolinha de gude pode desativar ou destruir inteiramente um satélite de um bilhão de dólares.

E se uma nação empregar um método “cinético” desses para destruir o satélite de um adversário, ela pode facilmente criar detritos ainda mais perigosos, potencialmente originando uma reação em cadeia que transformará a órbita terrestre em palco de uma absurda corrida de demolição.

Em 2007, os riscos de detritos aumentaram drasticamente quando a China lançou um míssil que destruiu um de seus próprios satélites meteorológicos na baixa órbita terrestre.

Aquele teste gerou um “enxame” de estilhaços de longa vida que constitui quase um sexto de todos os detritos rastreáveis por radar em órbita.

Os EUA responderam na mesma moeda em 2008, ao redirecionarem um míssil antibalístico lançado de um navio para abater um satélite militar avariado pouco antes de ele cair na atmosfera.

Essa medida também produziu lixo perigoso, embora em quantidades menores, e os detritos tiveram vida mais curta porque foram gerados a uma altitude muito mais baixa.

Mais recentemente, a China lançou o que muitos especialistas dizem ser testes adicionais de armas cinéticas antissatélites baseadas em terra.

Nenhum desses novos lançamentos destruiu satélites, mas Krepon e outros peritos afirmam que isso é porque os chineses agora só estão testando para errar o alvo, em vez de atingi-lo, com a mesma capacidade hostil como resultado final.

O último desses episódios aconteceu em 23 de julho do ano passado.

As autoridades chinesas insistem que a única finalidade dos ensaios é defesa antimíssil pacífica e experimentação científica.

Mas um teste, realizado em maio de 2013, lançou um projétil desses a uma altitude de 30 mil km acima da Terra, aproximando-se do “santuário” de satélites geossincrônicos estratégicos.

Aquilo foi um chamado de alerta, admite Brian Weeden, analista de segurança e ex-oficial da Força Aérea que estudou e ajudou a divulgar o teste chinês.

“Os Estados Unidos aceitaram há décadas o fato de que seus satélites de baixa órbita poderiam ser abatidos facilmente”, diz ele. “Mas quase atingir [a órbita geossincrôncica] fez as pessoas entenderem que, nossa!, alguém realmente poderia tentar ir atrás das coisas que temos lá em cima”.

Não foi coincidência que pouco depois de maio de 2013, os EUA liberaram a divulgação de detalhes de seu programa ultrassecreto Consciência Situacional do Espaço Geossincrônico (GSSAP), um planejado conjunto de quatro satélites capaz de monitorar as altas órbitas da Terra e até se encontrar com outros satélites para inspecioná-los de perto.

Os dois primeiros GSSAPs foram lançados à órbita em julho de 2014.

“Este costumava ser um [chamado] ‘programa preto’, algo que oficialmente nem existia”, explica Weeden. “Ele basicamente foi oficializado (liberado para divulgação) para enviar uma mensagem dizendo: ‘Ei, se você estiver fazendo algo suspeito dentro e ao redor do cinturão geossincrônico, nós veremos’”.

Um intruso na órbita geossincrônica não precisa ser um míssil com uma ogiva (ponta) cheia de explosivos para ser um risco de segurança, mesmo aproximar-se ou se encostar em satélites estratégicos de um adversário é considerado uma ameaça.

Esta é uma das razões por que potenciais adversários dos Estados Unidos podem estar alarmados com as capacidades de rendezvous (encontros) dos satélites GSSAP e dos aviões espaciais robóticos altamente manobráveis X-37B da Força Aérea americana.

A Rússia também está desenvolvendo sua própria capacidade de abordar, inspecionar e potencialmente sabotar ou destruir satélites em órbita.

Nos últimos dois anos, o país incluiu três misteriosas cargas em lançamentos de outra forma rotineiros de satélites comerciais, sendo que o último ocorreu em março deste ano.

Observações de radar feitas pela Força Aérea americana e por entusiastas amadores revelaram que depois que cada um desses satélites foi posicionado, um pequeno objeto adicional voava para bem longe do foguete arremessado, só para depois dar meia volta e voltar.

Os objetos, apelidados Kosmos-2491, K-2499 e K-2504, podem ser apenas parte de um programa inofensivo para o desenvolvimento de técnicas para fazer a manutenção e reabastecer satélites velhos, argumenta Weeden, embora também possam ser destinados a propósitos mais sinistros.



Tratados oferecem poucas garantias

Autoridades chinesas sustentam que suas atividades militares no espaço são simplesmente experimentos científicos pacíficos, enquanto as autoridades russas em geral têm se mantido em silêncio na maior parte do tempo.

As duas nações poderiam ser vistas como simplesmente respondendo ao que elas entendem como o desenvolvimento clandestino, pelos EUA, de potenciais armas espaciais.

De fato, os sistemas americanos de defesa de mísseis balísticos, seus aviões espaciais X-37B e até suas naves espaciais GSSAP, embora todos ostensivamente destinados a manter a paz, poderiam ser facilmente convertidos em armas de guerra espacial.

Durante anos, a Rússia e a China vêm pressionando para a ratificação de um tratado legalmente vinculativo das Nações Unidas para banir armas espaciais; um tratado que autoridades americanas e especialistas externos têm rejeitado repetidamente como uma inviabilidade cínica.

“O esboço do tratado sino-russo visa proibir justamente as coisas que eles mesmos estão procurando desenvolver tão ativamente”, reclama Krepon. “Ele serve perfeitamente aos seus interesses. Eles querem liberdade de ação, e estão encobrindo isso com essa proposta para proibir armas espaciais”.

Mesmo se o tratado estivesse sendo proposto de boa fé “ele estaria morto ao chegar” ao Congresso e não teria a menor chance de ser ratificado, salienta Krepon.

Afinal, os EUA também querem liberdade de ação no espaço, e no espaço nenhum outro país tem mais capacidade e, portanto, mais a perder.

De acordo com Rose, existem três problemas fundamentais com o tratado.

“Um, ele não é efetivamente verificável, o que os russos e chineses admitem”, argumenta. “Você não consegue detectar trapaça. Dois, ele é totalmente silencioso (omisso) sobre a questão das armas terrestres antissatélites, como as que a China testou em 2007 e novamente em julho de 2014. E, terceiro, ele não define o que é uma arma no espaço exterior”.

Como alternativa, os EUA apoiam uma iniciativa liderada pela Europa para estabelecer “normas” para uma conduta adequada através da criação de um Código Internacional de Conduta para o Espaço Exterior, voluntário.

Este seria um primeiro passo, a ser seguido por um acordo vinculativo.

Um esboço dessa proposta, que Rússia e China impediram de ser adotada nas discussões de julho na ONU, exige maior transparência e “construção de confiança” entre nações com capacidade espacial como um meio de promover a “exploração e o uso pacífico do espaço exterior”.

Espera-se que isso possa impedir a geração de mais detritos e o contínuo desenvolvimento de armas espaciais.

No entanto, como o tratado russo-chinês, esse código também não define exatamente o que constitui uma “arma espacial”.

Essa imprecisão representa problemas para altas autoridades da defesa, como o general John Hyten, chefe do Comando Espacial da Força Aérea dos EUA.

“Nosso sistema de vigilância baseado no espaço, que olha para os céus e monitora tudo na órbita geossincrônica, é um sistema de armas?”, pergunta ele. “Creio que todos no mundo olhariam para isso e diriam não. Mas ele é manobrável, viaja a mais de 27.350 km por hora, e tem um sensor a bordo. Não é uma arma, certo? Mas a linguagem [de um tratado] proibiria a nossa capacidade de realizar uma vigilância baseada no espaço? Eu espero que não!”



Guerra no espaço é inevitável?

Enquanto isso, mudanças na política dos EUA estão dando à China e à Rússia mais razões para novas suspeitas.

O Congresso tem pressionado a comunidade de segurança nacional dos EUA a voltar suas atenções para o papel das capacidades ofensivas, em vez das defensivas, chegando até a impor que a maior parte do financiamento do ano fiscal de 2015 para o Programa Segurança e Defesa Espacial, do Pentágono, seja destinada ao “desenvolvimento de estratégias e capacidades ofensivas de controle e defesa ativa do espaço”.

“Controle espacial ofensivo” é uma clara referência a armas.

“Defesa ativa” é uma expressão muito mais nebulosa e se refere a medidas indefinidas de retaliação ofensiva que poderiam ser tomadas contra um atacante, ampliando ainda mais os caminhos através dos quais o espaço pode se tornar um ambiente equipado com armas.

Se uma ameaça iminente for percebida, um satélite ou seus operadores poderiam desfechar um ataque por meios de lasers ofuscantes, micro-ondas de interferência, bombardeio cinético, ou diversos outros métodos possíveis.

“Espero nunca travar uma guerra no espaço”, diz Hyten. “Isso é ruim para o mundo. A cinética [armamentos antissatélites] é horrível para o mundo”, devido aos riscos existenciais que os detritos representam para todos os satélites.

“Mas se a guerra se estender ao espaço”, argumenta ele, “precisamos ter capacidades ofensivas e defensivas com que responder, e o Congresso nos pediu que explorássemos que capacidades seriam estas. E, para mim, o único fator limitante é ‘nada de detritos’. Não importa o que faça, não crie detritos”.

Uma tecnologia para bloquear ou interferir em transmissões, por exemplo, parece sustentar o Counter Communications System (CCS), o sistema de interferência ofensiva em comunicações da Força Aérea, a única capacidade ofensiva americana reconhecida contra satélites no espaço.

“Basicamente o CCS é uma grande antena sobre um trailer, e ninguém sabe como ele realmente funciona, o que de fato faz”, informa Weeden, salientando que, como a maior parte das atividades (trabalhos) espaciais, os detalhes do sistema são ultrassecretos.

“Tudo o que sabemos essencialmente é que eles poderiam usá-lo de para interferir ou bloquear de alguma forma satélites de um adversário ou talvez até enganar ou hackear os instrumentos”.

Para Krepon, os debates sobre as definições de armas espaciais e a agressiva exibição de poder militar entre Rússia China e Estados Unidos estão atrapalhando e eclipsando a questão mais premente dos detritos espaciais.

“Todo mundo está falando sobre objetos intencionais, feitos pelo homem, destinados a travar guerras no espaço, e é como se estivéssemos de volta na Guerra Fria”, compara.

“Enquanto isso, já há cerca de 20 mil armas lá em cima em forma de detritos. Eles não têm nenhum propósito, e não são guiados. Eles não estão procurando detectar satélites inimigos. Eles só estão zanzando por lá, fazendo o que fazem”.

O ambiente espacial, salienta, precisa ser protegido como um bem comum global, como os oceanos e a atmosfera da Terra.

Lixo espacial é muito fácil de ser produzido e muito difícil de ser eliminado; por essa razão, os esforços internacionais deveriam se concentrar na prevenção de sua criação.

Além da ameaça de destruição deliberada, o risco de colisões acidentais e impactos de detritos continuará aumentando à medida que mais nações lançam e operam mais satélites sem uma rigorosa responsabilização e supervisão internacional.

E, à medida que a chance de acidentes aumenta, o mesmo acontece com a possibilidade de eles serem mal interpretados como ações deliberadas e hostis na tensa intriga melodramática dessa intensa competição militar no espaço.

“Estamos no processo de sujar e estragar o espaço, e a maioria das pessoas não se dá conta disso porque não podemos vê-lo como vemos o abate de peixes marinhos, florações enormes de algas, ou os efeitos da chuva ácida”, adverte ele.

“Para evitar poluir e destruir a órbita terrestre, precisamos de um senso de urgência que atualmente ninguém tem. Talvez possamos senti-lo quando não conseguirmos usar nossa televisão por satélite ou nossas telecomunicações, ou acessar noticiários sobre o clima global e previsões de furacões. Quando formos catapultados de volta às condições da década de 50, talvez possamos adquiri-lo. Mas então será tarde demais”.

Sabrina Imbler contribuiu para a reportagem. 

Scientific American Brasil

Algas poderiam substituir petróleo em produtos sintéticos


Bactérias geneticamente modificadas produzem material plástico que é fabricado a partir de combustíveis fósseis


Ed Bierman/Flickr

Niina Heikkinen e ClimateWire

De camisas de poliéster, jarras de leite de plástico e tubos de PVC à produção de etanol industrial de alta qualidade, a matéria-prima química etileno pode ser encontrada por toda parte ao redor do globo.

Mas a onipresença de etileno como um bloco de construção em plásticos e produtos químicos mascara seu custo ambiental embutido. Esse hidrocarboneto de baixo custo é feito de petróleo e gás natural, e o modo como é produzido emite mais dióxido de carbono (CO2) que qualquer outro processo químico. À medida que as preocupações sobre os níveis de CO2 na atmosfera têm aumentado, alguns cientistas andaram realizando experimentos alternativos para tornar a produção de etileno mais “verde”, ou ecologicamente correta.

No Laboratório Nacional de Energia Renovável do Departamento de Energia (NREL, em inglês), pesquisadores estão tendo um sucesso inesperado com a ajuda de cianobactérias, ou algas verde-azuladas. Jianping Yu, do Grupo de Fotobiologia do NREL, lidera uma equipe que está trabalhando com esses organismos.

Em seu laboratório, eles conseguiram produzir etileno diretamente a partir de algas geneticamente modificadas. Para isso, os cientistas introduziram em cianobactérias um gene que codifica uma enzima produtora de etileno, alterando efetivamente seu metabolismo. Isso permite que os organismos convertam em etileno parte do CO2 utilizado normalmente para produzir açúcares e amidos durante a fotossíntese.

Como o etileno é um gás, ele pode ser facilmente capturado. Produzir etileno também não requer muitos insumos. Os requisitos básicos para cianobactérias são água, alguns minerais, luz e uma fonte de carbono. Em um ambiente comercial, o CO2 poderia vir de uma fonte pontual, como uma usina de energia, explicou Yu.

Se esse método alternativo de produção se tornar suficientemente eficiente, ele poderia potencialmente substituir o cracking (fraturamento) a vapor, o método energeticamente intensivo utilizado atualmente para dissociar petroquímicos em etileno e outros compostos.

Como algas absorvem três vezes mais CO2 para produzir uma única tonelada de etileno, o processo age como um “sumidouro de carbono”. Isso seria uma melhoria significativa em relação ao cracking a vapor, que gera entre uma e meia e três toneladas de dióxido de carbono por tonelada de etileno de acordo com a própria análise dos pesquisadores.

O gás de etileno capturado pode então ser transformado para utilização em uma ampla gama de combustíveis e produtos. “Acho melhor transformar o CO2 em algo útil”, observou Yu, comparando a abordagem a outros métodos de captura de carbono.

“Você não precisa bombear CO2 no solo e [os produtos] durarão muitos anos”.

Modificando genes para absorver carbono

Yu e seus colegas não foram os primeiros a ter a ideia de usar cianobactérias para produzir etileno. O processo foi tentado originalmente por pesquisadores no Japão há mais de uma década; mas, à época, os cientistas não foram capazes de produzir etileno de forma confiável.

Quando Yu leu aquele estudo anos mais tarde, ele pensou que, ao alterar geneticamente uma cepa diferente com a qual tinha trabalhado intensamente (Synechocystis sp. PCC6803), talvez fosse capaz de tornar a produção de etileno mais consistente.

Os pesquisadores conseguem produzir etileno a partir de algas ao alterarem uma parte do metabolismo do organismo chamada ciclo dos ácidos tricarboxílicos (TCA), envolvida na biossíntese e produção de energia. Em algas verde-azuladas geneticamente inalteradas, esse ciclo só pode absorver uma fração relativamente pequena, de 13%, dos 2% a 3% do CO2 fixado.

Mas no laboratório de Yu, as algas são capazes de enviar três vezes mais carbono ao ciclo TCA e emitem 10% do CO2 como etileno, a uma taxa de 35 miligramas por litro por hora. Isso pode não parecer muito, mas representa um aumento de mil vezes na produtividade desde que o cientista começou a trabalhar com as cianobactérias em 2010.

Até o final deste ano, Yu pretende aumentar esse rendimento para 50 miligramas. “Isso não está, nem de longe, perto do limite superior”, salientou, explicando que a meta final será converter 90% do carbono fixado em etileno.

“Não vejo por que ele [o limite] não pode ir além; ainda não ‘bati em um muro de tijolos’. Não sei o que impediria isso de acontecer, mas é claro que seria possível”.

Surpreendentemente, embora as cianobactérias estejam produzindo mais etileno, os organismos ainda estão crescendo à mesma razão das algas não produtoras de etileno.

Os resultados demonstram que o metabolismo das cianobactérias é muito mais flexível do que se acreditava, de acordo com Yu.

“É como uma pessoa que está perdendo sangue o tempo todo, mas parece saudável”, comparou.

Yu e seus colegas não têm certeza de como isso está acontecendo, mas a mutação que permitiu a produção de etileno também estimulou a fotossíntese.

“Esse sistema nos oferece um novo insight de fotossíntese e nos dá a esperança de que podemos aprender com isso e aumentar a atividade fotossintética”, resumiu.

Esse entendimento do metabolismo de cianobactérias é tão importante quanto a criação de organismos capazes de produzir etileno consistentemente, avaliou Robert Burnap, professor de microbiologia e genética molecular na Universidade Estadual de Oklahoma.

Ele não esteve envolvido no estudo, mas forneceu uma referência para a inscrição de Yu no prêmio 2015 da R&D 100 Awards, uma espécie de “Oscar da invenção” que identifica e premia os principais produtos tecnológicos do ano.

Yu agora é um dos finalistas na categoria Dispositivos/Material Mecânico.

“É surpreendente o quanto o metabolismo é adaptável. Ele está produzindo algo que não evoluiu para fazer. Houve muita controvérsia inclusive sobre se era ou não possível ter uma produção consistente de etileno. Ele [o metabolismo] mostra que é flexível”, resumiu.

A pesquisa poderia ajudar outros cientistas a entender melhor os caminhos metabólicos em outras plantas e até em humanos.

O ciclo TCA também está ativo nas mitocôndrias de nossas células, comentou Burnap.

“O que torna esse estudo realmente especial é a profundidade de análise que eles empreenderam”, observou ele, descrevendo a pesquisa toda como uma “peça de trabalho seminal”.

Criando centros de produção... em tanques?

Ainda é extremamente prematuro afirmar quando, ou mesmo se, essas algas produzirão etileno em escala comercial. Yu estima que o desenvolvimento até essa fase possa levar mais de 10 anos.

“Será preciso muito trabalho para aumentar (melhorar) a eficiência de carbono para 50% ou mais”, admitiu.

Philip Pienkos, gerente principal do Grupo Bioprocess R&D, no Centro Nacional de Bioenergia do NREL, informou que o projeto está começando a se concentrar mais no lado do desenvolvimento, mesmo enquanto Yu continua trabalhando para alcançar volumes mais elevados de etileno.

“Como você recupera etileno? O que faz com a biomassa? Esse projeto está preparado para responder a essas perguntas importantes”, comentou Pienkos.

Em algum momento do próximo ano, os pesquisadores planejam levar seu trabalho para o ar livre a fim de verificar como as algas se comportam em um ambiente que se assemelha mais às condições em que seriam cultivadas comercialmente.

“Precisamos obter um processo de etileno realmente escalável para termos uma noção melhor de como isso funcionaria”, salientou Pienkos.

Yu vislumbra as cianobactérias crescendo em tanques, ou talvez em painéis verticais parecidos com folhas de jornais.

Em qualquer um desses casos, as culturas sólidas ou líquidas teriam de estar encerradas (encapsuladas) para capturar o etileno, enfatizou.

Também existem algumas preocupações de segurança associadas à produção de grandes quantidades de gás.

O hidrocarboneto e o oxigênio que também são produzidos pelas algas são inflamáveis, e certas precauções de segurança teriam de ser adotadas para coletar o etileno de forma segura.

Mesmo se as cianobactérias criarem grandes volumes de etileno, seu sucesso dependerá de se o produto pode tornar-se competitivo em termos de custo.

Isso não será fácil, porque o etileno petroquímico é barato e está amplamente disponível.

De acordo com a análise econômica dos pesquisadores, o etileno derivado de produtos petroquímicos custa entre US$ 600 e US$ 1.300 a tonelada, enquanto o gás proveniente de algas é estimado em cerca de US$ 3.240 por tonelada.

Provar a viabilidade econômica do sistema mais adiante também ajudará a manter o financiamento de pesquisa do Departamento de Energia (DOE), sublinhou Peinkos.

“Algas não são o foco principal do DOE; elas passaram décadas sustentando o trabalho em derivados de celulose. Algas são um portfolio muito menor, e a maior parte do trabalho está na conversão direta para combustíveis líquidos”, declarou.

“O etileno se destaca um pouco porque não é um combustível, mas pode ser uma matéria-prima de combustível”.

Os ganhadores do R&D 100 Awards deste ano serão anunciados em novembro.

Reimpresso de Climatewire com permissão de Environment & Energy Publishing, LLC. www.eenews.net



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