sábado, 24 de janeiro de 2009

Meio Ambiente - Josué de Castro

Para dominar realmente o problema do meio ambiente, seria preciso, além de uma ampla consulta geral indispensável, a autoridade de um "Governo Mundial", ou, se a expressão o incomoda, de uma instância planetária e soberana a ser definida".
Nunca o mundo necessitou tanto de um pensamento renovador, de uma nova filosofia de ação como nesta época em que o processo histórico se acelera de maneira estonteante e tudo se faz não através da evolução progressiva mas através de bruscas explosões arrasadoras. É esta a característica fundamental da nossa época: a sua brutal carga explosiva e o desencadear sucessivo de múltiplas explosões em todos os setores das atividades humanas. Vivemos a era das explosões: a explosão atômica, a explosão industrial, a explosão demográfica, a explosão psicológica dos povos oprimidos, a explosão da juventude em completa oposição à geração pré-atômica. Sempre a explosão aguda e violenta, agindo como um processo de destruição criadora, modelando a nova civilização tecnológica na qual somos todos inevitavelmente arrastados por bem ou por mal e para o bem ou para o mal, pois se trata de uma revolução universal e de certa forma desprovida de qualquer ética e de qualquer ideologia. A tecnologia passou a ser em nossos dias a teologia do Ocidente.
A tecnologia não é boa nem má. É a sua utilização que lhe dá sentido ético. Se nos países do Terceiro Mundo a tecnologia age contra os povos subdesenvolvidos é porque foi utilizada unicamente para produzir o máximo de vantagens e lucros para os grupos da economia dominante.

O Terceiro Mundo está sob a ameaça permanente de ver introduzidos tipos de desenvolvimento tecnológicos que, desdenhando a dimensão ecológica, podem provocar uma desagregação total de sua estrutura. Se levarmos em conta a relativa fragilidade de alguns ecossistemas equatoriais e tropicais, onde se agrupa a maior parte dos países do Terceiro Mundo, este perigo adquire maior gravidade ainda.

Os países subdesenvolvidos que lutam pela sobrevivência devem se preocupar com os problemas do meio e do desenvolvimento em escala mundial, para se defenderem das agressões que seu próprio meio sofre há séculos por parte das metrópoles colonialistas, destruidoras da condição humana nas áreas subdesenvolvidas.

Poucas regiões do mundo se prestam tão bem para um ensaio de natureza ecológica como a do Nordeste açucareiro, com sua típica paisagem natural...teve o Nordeste a vida do seu solo, de suas águas, de suas plantas e do seu próprio clima, tudo mudado pela ação desequilibrante e intempestiva do colonizador, quase cego às consequências de seus atos, pela paixão desvairada que dele se apoderou, de plantar sempre mais cana e de produzir sempre mais açucar.

Eis porque os países subdesenvolvidos estão preocupados com os problemas ambientais e da poluição. Eles estão preocupados porque o subdesenvolvimento que sofrem é a secreção de um tipo de desenvolvimento, concebido sem respeito pela Natureza e no qual o Homem não passa de um instrumento da produção.

A poluição é uma doença universal que interessa a toda humanidade, mas existem tipos de poluição diferentes no mundo inteiro. Os países ricos conhecem a poluição direta, física, material, a do ambiente natural. Os países subdesenvolvidos são presas da fome, da miséria, das doenças de massa, do analfabetismo. O Homem do Terceiro Mundo conhece essa forma de poluição chamada "subdesenvolvimento". E devo dizer que esta é a forma mais grave, mais terrível de todas.

O meio não é apenas o conjunto de elementos materiais que, interferindo continuamente uns nos outros, configuram os mosaicos das paisagens geográficas. O meio é algo mais do que isso. As formas das estruturas econômicas e das estruturas mentais dos grupos humanos que habitam os diferentes espaços geográficos também são partes integrantes dele.

Desse ponto de vista o meio abrange aspectos biológicos, filosóficos, econômicos e culturais, todos combinados na mesma trama de uma dinâmica ecológica em transformação permantente.
Eis porque é preciso, ao mesmo tempo, rejeitar a idéia de uma interrupção do crescimento enquanto houver necessidades a satisfazer e, ao mesmo tempo rejeitar um tipo de desenvolvimento sem objetivo (exceto o do lucro) e modos de produção que poluem e degradam a vida e o meio ambiente.
A estratégia que considerava a realidade social do Terceiro Mundo separada do mundo como totalidade foi fatal para a melhoria das condições do meio. Toda a biosfera é um só ecossistema composto de múltiplos subsistemas.

Insisto na necessidade de esclarecer bem esta natureza do subdesenvolvimento. Não se trata de uma simples ausência ou insuficiência de desenvolvimento. Não: é um produto - um produto negativo - do próprio desenvolvimento. O desenvolvimento traz consigo, de um lado, suas riquezas, suas novas fabricações e, de outro, seus dejetos. O Terceiro Mundo está no lado dos dejetos.

Como a poluição é um problema universal, seria bom discutí-lo em âmbito internacional. Na verdade, as poluições dificilmente podem ser combatidas por regulamentações nacionais. Se um país tiver a coragem de aplicar sozinho toda a regulamentação necessária, sua produção logo cessaria de escoar-se a preços competitivos e ele logo iria a falência. É preciso obter uma regulamentação em escala mundial. Então, os delegados à Conferência de Estocolmo atacaram o problema… mas, veja bem, não o resolveram. E, sobre questões essenciais - a guerra e os armamentos, entre outras - as discussões andaram em círculos, como era de ser prever. Todos nós sabemos que o melhor que se pode obter de um quadro assim é uma boa recomendação… que cada país, depois, tem a liberdade de adotar ou não.

Para dominar realmente o problema do meio ambiente, seria preciso, além de uma ampla consulta geral indispensável, a autoridade de um "governo mundial", ou , se a expressão o incomoda, de uma instância planetária soberana a ser definida. Apesar de tudo, na falta desta, é preciso tomar medidas indispensáveis. .

Acalento essa esperança. Hoje a poluição constitue essa razão suficiente para que finalmente o mundial obtenha as suas primeiras vitórias sobre o nacional.

Nós não podemos passivamente esperar o futuro, pois, assim, seremos esmagados por ele. O homem de hoje tem que criar o seu futuro. Já não podemos ficar como espectadores. Não podemos ser mais os homens de pensamento e de ciência, simples teóricos da acepção grega da palavra.

Nem capitalismo nem comunismo, mas uma outra coisa. Um dia é possível que a sociedade em conjunto se constitua como organismo único. Mas, para isso, é preciso que seja condensada em torno de um pensamento comum.

É imprescindível retransformar a economia de guerra em que vivemos numa economia de paz, e utilizar a enorme poupança que resultar do desarmamento parcial na obtenção de um tipo de desenvolvimento pacífico mais igualitário e não poluidor.

www.josuedecastro.com.br

Um comentário:

Laura disse...

Post interessante, gostei dos trocadilhos no final, obrigada pelo elogio ao meu blog o seu também é excelente cheio de informações relevante...então vc me pediu pra visitar o blog feijodaliteraria..mas o endereço não existe, é uma pena pq fiquei bastante interessada. Abraços!

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