A bomba-relógio de metano voltar
Steve Connor
Jornalista do The Independent
Cientistas no Ártico descobriram a mais nova ameaça ao aquecimento global: o derretimento da camada permafrost1 que libera milhões de toneladas de um gás 20 vezes mais danoso que o dióxido de carbono. A primeira evidência que este potente gás está sendo lançado na atmosfera das profundezas do Ártico já foi relatada por cientistas. O jornal “The Independent” vem divulgando detalhes preliminares de descobertas que sugerem um depósito sub-oceânico massivo de metano que borbulha na superfície do Mar Ártico e vem aquecendo e derretendo o gelo desta região. Cientistas vêm dando importância a esses depósitos, pois se acredita que a liberação do gás metano, no passado, possa ter sido o responsável pelo aumento da temperatura global, e pelas dramáticas mudanças no clima e inclusive pela extinção em massa das espécies.
Cientistas a bordo do navio de pesquisa que percorreu toda a costa do Norte da Rússia, descobriram uma concentração intensa de metano – às vezes até 100 vezes maior que o usual – em diversas áreas que cobrem milhares de quilômetros quadrados na plataforma continental da Sibéria. Recentemente, pesquisadores avistaram áreas de mar espumando com gases que borbulham formando “chaminés de metano” saindo do solo oceânico.
Eles acreditam que a subcamada marítima de permafrost, a qual vinha agindo como uma “tampa” prevenindo que o gás não escapasse, derreteu e permitiu que os depósitos formados antes da Era do Gelo liberassem o gás para a superfície. Eles avisaram que o rápido aumento na temperatura que essa região vem apresentando está ligado diretamente a este fato.
O metano é um agente 20 vezes mais poderoso que o dióxido de carbono quando se trata do Efeito Estufa. E muitos cientistas temem que sua liberação precipitada possa acelerar o aquecimento global e significar um enorme retrocesso na tentativa de impedir o aumento na temperatura mundial, o que significaria um derretimento ainda maior da camada permafrost e índices ainda mais elevados de gás metano na atmosfera.
Calcula-se que o total de metano depositado embaixo do solo Ártico é maior que o total de carbono armazenado nas reservas mundiais de carvão, portanto existe o interesse em estabilizar esses depósitos de metano já que a região vem apresentando um aquecimento acelerado quando comparada a outras regiões do Planeta. Orjan Gustafsson, da Universidade de Estocolmo, um dos líderes da expedição Rússa, descreveu a escala de emissões de metano que os pesquisadores do navio Jacob Smirnitskyi vêm coletando.
“Foi agitada e confusa a conclusão do programa de coleta ontem (20 de Setembro) e hoje” afirmou o Dr. Gustafsson. “Uma área extensa com a liberação intensa de gás metano foi encontrada. Nas outras áreas encontramos altos índices de metano dissolvido na água. Ontem, no entanto, pela primeira vez documentamos um campo onde a liberação era tão intensa que não havia tempo para o metano se dissolver na água. Ele está se elevando e emergindo à tona em forma de bolhas de metano. Estas “chaminés de metano” foram documentadas por instrumentos eco-sonoros e sísmicos”.
Em certas locações, a concentração de metano atingiu níveis de profundidade 100 vezes maior que os usuais. Estas anomalias foram encontradas no Mar do Leste da Sibéria e no Mar Laptev, cobrindo milhares de quilômetros quadrados, indicando que milhões de toneladas de metano estão sendo despejadas diariamente. “Este desastre pode ter a mesma magnitude que o impacto estimado que já causamos aos oceanos”, afirma o Dr. Gustafsson.
“Ninguém sabe quantas, ao certo, ainda podem existir na extensa Placa Continental do Leste da Sibéria”. A perspectiva convencional sempre foi a de que a “tampa” permafrost dos sedimentos sub-oceânicos da placa siberiana deveria sustentar e preservar os maciços reservatórios de metano adequadamente. No entanto, evidências claras de que metano está sendo liberado nessa inaccessível região do Planeta sugerem que a “tampa” permafrost foi perfurada e daí o vazamento de metano. “Atualmente, o permafrost possui pequenos buracos. Encontramos níveis elevados de metano sobre a superfície da água e também um pouco abaixo da superfície. É óbvio que a fonte está no solo oceânico”.
As descobertas preliminares do Estudo Internacional da Placa Siberiana, realizado ao longo deste ano de 2008, que será publicado pela União Americana de Geofísica (American Geophysical Union), está sendo conduzida por Igor Semiletov da afastada Seção Leste da Academia Russa de Ciências. Desde 1994, Semiletov conduziu 10 expedições ao Mar Laptiev, mas durante a década de 90 não descobriu índices elevados de metano. No entanto, desde 2003 ele vem relatando um crescente número de “Hot Spots” (áreas quentes), que só agora foram confirmados por aparelhos mais sensíveis a bordo do navio Jacob Smirnitskyi.
O Dr. Semiletov já sugeriu diversas razões para explicar porque o metano está sendo liberado no Ártico, inclusive o porquê também do crescente volume de águas aquecidas sendo despejadas dos rios siberianos devido ao derretimento do permafrost no continente.
A região ártica, como um todo, já experimentou um aumento de 4ºC em média nas últimas décadas, assim como um declínio dramático do gelo que cobre o mar durante o verão. Muitos cientistas temem que a perda deste gelo possa acelerar ainda mais as tendências de aquecimento global porque o mar absorve mais calor do sol quando aberto que quando refletido numa superfície coberta de gelo.
Por sua vez, cientistas britânicos, a bordo do navio de pesquisas britânico, James Clark Ross, descobriram centenas de fontes de metano borbulhando no solo Ártico; eles contaram cerca de 250 fontes borbulhando numa área de 50 km2 em águas com menos de 400 metros de profundidade, ao Oeste da costa de Svalbard. Também foram descobertas outras fontes a uma profundidade de cerca de 1.200 metros numa segunda área próxima.
Análises de sedimentos e de água do mar confirmaram o aumento de gás metano, diz o Professor Graham Westbrook da Universidade de Birmingham, o principal investigador deste estudo. “A descoberta desse sistema tem sua importância, pois a presença do metano – causador do Efeito Estufa- indica que o mesmo vem sendo liberado nessa região climaticamente sensível desde a Era do Gelo”. A análise dos sedimentos retirados do solo dessa região mostra que o gás procede de hidrantes de metano – cristais semelhantes ao gelo cujas moléculas permanecem capturadas em “jaulas” feitas de moléculas de H2O, que se tornam instáveis quando a pressão da água diminui ou as temperaturas aumentam.
Segundo o professor Westbrook, a área analisada ao Oeste da costa de Svalbard é bastante distinta da área estudada no Norte da Rússia, pois as águas são mais profundas e não há uma camada de permafrost selando o metano debaixo do solo oceânico. É provável que as emissões de metano da costa de Svalbrad datem de aproximadamente 15.000 anos – desde a última Era de Gelo –, mas não se sabe ainda se as recentes mudanças climáticas no Ártico aceleraram o processo a um ponto onde elas próprias possam gerar novas mudanças. “Estávamos bastante curiosos ao encontrar essas fontes porque seria a primeira evidência de um sistema de gás ativo nesta parte do Planeta”, aponta o professor Westbrook. “Agora que sabemos que estão lá, precisamos considerar os seus efeitos.”
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1 O permafrost é o tipo de solo encontrado na região do Ártico. É constituído por terra, gelo e rochas permanentemente congelados. Esta camada é recoberta por uma camada de gelo e neve que, se no inverno chega a atingir 300 metros de profundidade em alguns locais, ao se derreter no verão, reduz-se para de 0,5 a 2 metros, tornando a superfície do solo pantanosa, uma vez que as águas não são absorvidas pelo solo congelado.
Revista ECO 21
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