segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

A fúria de um terremoto


23/ 07/ 2007 - SISMOLOGIA

A fúria de um terremoto

Alberto Veloso
Alberto Veloso foi o criador do Observatório Sismológico da UnB e é professor aposentado do Instituto de Geociências. Foi funcionário da ONU, em Viena, Áustria.

Falar sobre a ocorrência de terremotos no Japão não é grande novidade, mas associar um deles ao vazamento de material radioativo de uma usina nuclear já é algo diferente. Em 16 de julho, às 10h13, um abalo de magnitude 6.6 (segundo o Serviço Geológico Americano) com epicentro no mar, fez tremer uma vasta porção da costa oeste de Honshu, incluindo a área onde se encontra a maior central nuclear de energia elétrica do mundo. Logo em seguida, uma coluna de fumaça negra se elevou a partir de um ponto da usina, devido à queima de um transformador elétrico.

Cerca de 24 horas depois do tremor, as autoridades anunciaram um vazamento de água radioativa para o mar, mas afirmaram não ter ocorrido nenhum tipo de dano nos reatores. No decorrer do terremoto, medidas de segurança foram acionadas: a usina foi desligada automaticamente, trens-bala da região foram paralisados, os aeroportos fechados e os fornecimentos de energia elétrica e de gás para as residências cortados.

Não se tratou de um terremoto de magnitude colossal, mas sua profundidade rasa – 10km – e a proximidade da costa – 20 km - foram os fatores que aumentaram seu poder de destruição. Colapso de centenas de casas, danos em milhares de outras, escorregamento de encostas, grandes fissuras no terreno, autopistas cortadas e deslocadas e pessoas que não conseguiam se manter em pé durante o chacoalhar do terreno foram exemplos da gravidade desse terremoto. A intensidade sísmica - que avalia a severidade do terremoto – atingiu VI, valor altíssimo para a escala japonesa cujo limite é VII. Nove pessoas morreram, cerca de mil ficaram feridas e dez mil foram evacuadas.

Os principais terremotos são originados pelo deslocamento das placas tectônicas e as regiões mais perigosas são aquelas situadas nos limites ou encontro das placas. O arquipélago japonês se localiza justamente onde colidem três dessas placas tectônicas e essa é a razão para sua intensa e perigosa atividade sísmica. Ontem, hoje e amanhã, não há como o Japão escapar da ação dos terremotos, mas cada vez mais, o país tem aprendido a minimizar seus efeitos trágicos. O atual pequeno número de mortos e feridos é uma prova disso. O caso do vazamento precisa ser melhor estudado para saber se houve algum problema com a construção civil da usina, afinal o país tem aproximadamente 90 delas.

O Japão tem cerca de 380 mil quilômetros quadrados, mas, por ser um país montanhoso, somente 1/3 de sua área é ocupada. A densidade demográfica é muito alta e a concentração nas grandes cidades é um fator de vulnerabilidade diante dos terremotos. Em 17 de janeiro de 1995, um tremor de magnitude 6.9, com epicentro muito próximo da cidade de Kobe, produziu um desastre impressionante: 5.502 mortos e prejuízos de aproximadamente US$ 60 bilhões. A economia do país sentiu um baque e os engenheiros e arquitetos se assustaram com falhas em projetos e construções da cidade. Certamente colheram muitas lições.

Em 1º de setembro de 1923, um terremoto de magnitude acima de 8 destruiu um pedaço de Tóquio e o fogo consumiu uma outra grande parte da cidade. Morreram 140 mil pessoas. Essa região experimenta grandes terremotos a cada 70 anos. Isso significa que um outro pode acontecer a qualquer momento. Mas, nessas dezenas de anos, aprendeu-se muita coisa e por isso se tem confiança de que os belos e modernos arranha-céus da cidade continuarão de pé após um grande sismo. (Minha descrição não tem nenhum tom alarmista – já morei no Japão, senti seus terremotos, mas adoro o país e sempre que posso estou por lá).

Que lição o Brasil poderia tirar desse desastre sísmico? É ínfima nossa sismicidade perante o Japão. Estamos situados no interior de uma placa tectônica e distantes de seus limites ativos. Mas nem tudo é perfeito e há pontos a considerar. Abaixo do Acre, um pedaço de placa tectônica mergulha para as profundezas da Terra. Por isso, há muitos terremotos fortes na região, mas como são profundos, quase ninguém os sente ou reclama. Curiosamente, nosso maior terremoto teve magnitude similar ao do Japão, mas aconteceu em uma área deserta do Mato Grosso, há 50 anos, sem causar danos maiores. Se ele se repetir agora, o resultado será muito diferente. O Brasil está projetando novas barragens hidrelétricas e almejando a construção de outras usinas nucleares. É tradição considerar o risco sísmico nas grandes obras de engenharia brasileira e isso não pode ser abandonado jamais. Mesmo em áreas de pouca sismicidade, os terremotos não podem ser negligenciados. Nossa história sísmica não é bem conhecida e surpresas não podem ser descartadas.
http://www.secom.unb.br/artigos/at0707-07.htm

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