domingo, 23 de novembro de 2008

O fast food e a mundialização do gosto - parte 4



O Significado e a Importância da Formatação nas Redes de Fast Food

O rigor da formatação que garante a padronização; e a padronização, por sua vez, é a garantia da qualidade dos produtos e serviços, principalmente dentro do setor fast food. Segundo o discurso empresarial, dentro do sistema de franquia existem algumas estratégias de peso, que se encontram embutidas dentro da formatação do negócio como um todo. Entre essas estratégias destaca-se a da “formatação do negócio” é nela que se concentra a capacidade de desenvolverem novos produtos e serviços de modo contínuo, aperfeiçoando os procedimentos. Ela é a própria garantia, para que a empresa se torne competitiva, pois o sucesso dessa estratégia prevê o sucesso da própria empresa, sendo ela que instrumentaliza todas as demais. Para isso os consultores frisam a necessidade de uma base sólida para o lançamento do “pacote” ou programa de sistema de franquia. As opiniões dos pesquisadores desse assunto apontam vários caminhos para a realização de um programa eficaz e, com base em várias leituras, nos foi possível selecionar e nomear alguns dos componentes que mais aparecem nos textos trabalhados especializados em franquias. a) A unidade-piloto: É a base do programa. Esta unidade deve estar testada, refinada e operando no mercado, oferecendo condições de transferir o know-how e a experiência acumulada. b) A gestão do sistema de franquia como método de expansão: Prevê um corpo administrativo competente que conheça as peculiaridades do setor de atuação e os aspectos legais do sistema. c) Suporte capitalizador: A necessidade da existência de capital suficiente para lançar e sustentar o programa em todas as suas etapas. d) Treinamento para os franqueados: Através de manuais de operação de fácil compreensão, treinamento e cursos de reciclagens profissionais aos franqueados. e) Monitoriamento contínuo: Assistência periódica aos franqueados, assistindo-os no que for necessário, além de supervisionar os padrões de qualidade estabelecidos. f) Pesquisa de mercado: Contínua e eficaz, capaz de avaliar a competição real a ser enfrentada, bem como a demanda latente prevista para o setor. g) Sistema de seleção: Capaz de identificar, entre os interessados, os que realmente estão qualificados para assumir o comando de uma nova unidade. A partir da rigidez no controle desses pontos, os empreendedores acreditam que uma operação de franquia possa ter maiores chances de ser bem sucedida, e, para isso, a formatação de todo o sistema deve ser muito bem elaborada e testada. Nesse sentido é que a generalizada aplicação da gerência científica propicia a revolução técnica, não só na indústria como no comércio. As transformações geradas pelo gerenciamento são fundamentais para a estruturação, funcionamento e controle das redes de franquias. BRAVERMAN, ao analisar os principais efeitos da gerência científica, nos diz: “O conceito de controle adotado pela gerência moderna exige que cada atividade na produção tenha suas diversas atividades paralelas no centro gerencial: cada uma delas deve ser prevista, pré-calculada, experimentada, comunicada, atribuída, ordenada, conferida, inspecionada, registrada através de toda a sua duração e após conclusão. O resultado é que o processo de produção é reproduzido em papel antes e depois que adquire forma concreta. Desse modo, como o trabalho humano exige que o seu processo ocorra no cérebro e na atividade física do trabalhador, do mesmo modo agora a imagem do processo, tirada da produção para um lugar separado e grupo distinto, controla o próprio processo” (BRAVERMAN,1987, p. 113). As empresas americanas, de um modo geral, têm maior facilidade em formatar seus serviços, operar lojas em menor tempo, o que pode ser justificado pela própria experiência do país no que concerne ao sistema de franquia. Esse sistema pode propiciar ao detentor da “marca” uma velocidade espaço-tempo inconcebível para o comércio tradicional. Atualmente a busca pela velocidade torna-se prioritária, norteando todo o mundo dos negócios, o que acaba por dar a tal sistema tão elevado índice de crescimento e aceitabilidade pelas empresas. Para que a “marca” não envelheça e permaneça forte no mercado tornam-se necessário a pesquisa permanente, a introdução sistemática de novos produtos e a flexibilização da produção. Essa capacidade de gerar o novo é processo inerente ao capitalismo e a escolha do sujeito, desse modo, vai se esvaziando: o que existe é uma criação industrial da necessidade. A gerência científica, planejada e articulada, penetra no sistema de franquia, e a manipulação do gosto passa a ser a expressão dessa dinâmica. Tal gerenciamento reduz o caráter autônomo da demanda, e é nesse sentido que a busca do controle do mercado pelas empresas faz com que, não só os consumidores sejam induzidos como também o próprio território se torne dominado. A partir do sistema de franquia, a produção planejada passa a estar presente como nunca nas formas urbanas, através da padronização e formatação das redes. Desenvolvem-se condições materiais capazes de permitir que a racionalidade da mercadoria, através do produto-marca, se estabeleça e o valor de troca sobressaia. As redes de fast food, através de um sistema operacional rígido altamente disciplinado, vêm assegurando o padrão de qualidade em todos os pontos de venda. Os equipamentos são sob medida, para agilizar o serviço de fast food. O cardápio é limitado, as técnicas de produção são refinadas, divididas em procedimentos detalhados, com o objetivo de poupar tempo. A máquina substitui o principal obstáculo ao serviço “idêntico” do fast food - o elemento humano. Afinal, acabaram descobrindo como atender à principal característica do fast food: a velocidade. Esse ritmo combina muito bem com a sociedade atual e com as necessidades que lhe são impostas pelo modo de produção. A cozinha deixa de ser considerada uma arte pessoal e se especializa, tornando-se industrial e comercial perdendo a criatividade e a identidade. Com todo esse formato moderno, o fast food torna-se um lugar impessoal, um lugar sem memória. Um não-lugar? Segundo AUGÉ, a supermodernidade é produtora de não-lugares: “Se um lugar pode se definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não pode se definir nem como identitário, nem como relacional, nem como histórico definirá um não-lugar” (1994, p.73). Essa teoria abre novas perspectivas de discussão e parece-nos bastante oportuna para o que estamos pensando no momento sobre o fast food: um espaço que é símbolo da supermodernidade.
Artigo publicado no Vol. V / 1997 da Revista Cadernos de Debate, uma publicação do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação da UNICAMP, páginas 21-45.
alvarenganj@yahoo.com.br

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