segunda-feira, 17 de novembro de 2008

'Guerra da água' agrava tensão na Palestina*



'Guerra da água' agrava tensão na Palestina*
José Sacchetta
Relatório de avaliação dos recursos hídricos das Nações Unidas, divulgado durante o 3° Fórum Mundial da Água, em Quioto, faz prognóstico alarmante de disputas entre países do Oriente Médio por acesso a mananciais.

Quioto, Japão - Se as previsões do 3° Fórum Mundial da Água se confirmarem, muita água vai rolar antes que o Oriente Médio tenha paz. Um relatório divulgado em Quioto pelo Programa das Nações Unidas para Avaliação dos Recursos Hídricos apresentou prognóstico alarmante de disputas entre países da região por acesso a mananciais. Os litígios envolvem Iraque, Turquia, Israel, Iêmen, Síria, Jordânia e Líbano. O caso potencialmente mais explosivo é o conflito entre israelenses e palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, duas áreas carentes de água, ambas ocupadas por Israel.

"Com a guerra ao Iraque, a tendência é olhar apenas para o petróleo. Precisamos enfatizar o problema da água no Oriente Médio e, em relação a ele, o papel desestabilizador de Israel. Com a desculpa de se defender, o país controla, ilegalmente, todos os recursos hídricos dos palestinos, inclusive poços artesianos", diz o japonês Yoshihiro Yakushioe, integrante do Fórum Popular da Água, que aglutina movimentos pela democratização do uso da água em países pobres.

O grupo lidera o pedido de organizações de defesa dos direitos humanos para que o governo do Japão "cobre" de Israel US$ 630 milhões doados por Tóquio aos palestinos, e usados para construir cisternas e encanamento nos Territórios Ocupados, destruídos pelo Exército israelense.

Yoshihiro lembra que a Guerra dos Seis Dias, em 1967, teve como pano de fundo a necessidade de Israel ampliar seu acesso ao rio Jordão e ao lago Tiberíades. "Na época, veio a calhar para os israelenses a ocupação da Cisjordânia, das colinas de Golã e o controle das suas fontes de água, que se mantém até hoje".

Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), nos últimos 50 anos aconteceram 507 situações internacionais de litígio ou conflito envolvendo a água. Em 37 ocasiões, houve atos de violência; em 21 casos, verificaram-se agressões militares, 18 delas promovidas por Israel contra seus vizinhos.

Aparentemente sem resolução à vista, o conflito árabe-israelense é, no entanto, uma exceção, entre as disputas que envolvem o acesso a recursos hídricos. O relatório "Água, Segurança e Paz" mostra que nas últimas décadas inimigos de longa data conseguiram se entender - ou pelo menos estão tentando - e negociaram acordos para suas desavenças por água.

Um modelo de entendimento apontado pelas Nações Unidas é a cooperação entre os dez países que integram a bacia do rio Nilo, envolvendo projetos de irrigação e desenvolvimento agrícola. A ajuda mútua, nesse caso, pode aliviar conflitos históricos da África negra com o Islã, ou a longa disputa por água entre Egito e Sudão, que remonta à Antigüidade.

Cerca de um terço das 261 grandes bacias fluviais do mundo são partilhadas hoje por mais de um país; 19 delas estão em cinco ou mais países. A resolução de problemas dessas bacias é quase sempre complicada e pode levar anos, já que requer consenso entre os envolvidos. O curso de um único rio pode atravessar vários territórios e cruzar continentes, como é o caso do Danúbio, que passa por 18 Estados europeus.

Para Gordon Young, diretor do Programa da ONU para Avaliação dos Recursos Hídricos, independente da atual guerra movida pelos Estados Unidos contra o Iraque, "o potencial de conflitos com origem no problema da água, especialmente em rios partilhados, continuará grande nos próximos anos; a única possibilidade de segurança e paz é os países formularem políticas em que reconheçam sua interdependência do setor hídrico".
José Sacchetta é jornalista.

* Matéria publicada na agência de notícias Carta Maior, em 22 de março de 2003.

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