segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A “metamorfose ambulante” da identidade



Marlucio Luna

Quando alguém busca definir o que é identidade, percebe-se que historicamente surgiram três diferentes concepções: o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o pós-moderno. Elas representam uma evolução e demonstram como o destaque dado ao estudo da identidade variou ao longo da trajetória do conhecimento humano. Quando cresceu a importância da individualidade e das expressões do "eu", a discussão avançou com mais rapidez. A simples comparação entre as concepções mostra como o debate se aprofundou.

O sujeito do Iluminismo se baseava na idéia de um ser humano centrado, unificado e dotado de razão consciência e ação. Seu "centro" surgia no nascimento da pessoa e se desenvolvia ao longo da existência, porém permanecia essencialmente o mesmo ao longo da vida. Esse "centro essencial" era a identidade do indivíduo.

Já a concepção de sujeito sociológico reflete a crescente complexidade do mundo moderno. A grande mudança ocorre na visão acerca do "centro essencial" do indivíduo. Ele deixa de ser autônomo e auto-suficiente, se estruturando a partir das relações estabelecidas com outras pessoas responsáveis por mediações de valores, símbolos e sentidos - ou seja, a cultura. Assim, a identidade é o espaço entre o "interior" e o "exterior", entre o mundo pessoal e o mundo público do ser humano.

A última concepção, a de sujeito pós-moderno, aponta a fragmentação do indivíduo. Ele não tem apenas uma, mas várias identidades. Esta fragmentação por vezes o coloca em situações contraditórias. Por exemplo, aquele funcionário que contesta o autoritarismo do patrão pode ser flagrado reproduzindo o comportamento do chefe na relação com a família. Assim, o sujeito pós-moderno não possui uma identidade fixa, essencial ou permanente. Ela assume diferentes formas em diferentes momentos - tal qual na música "Metamorfose Ambulante", de Raul Seixas.

Se a construção – e reafirmação – da identidade é uma tarefa complexa para qualquer pessoa, para o jovem assume importância crítica. Aberto a experimentações, sensações e conceitos, o adolescente se vê diante de um vasto “cardápio de novidades”. Influências culturais diversas, mudanças sociais repentinas, transitoriedade de conceitos... A realidade se fragmenta. O caleidoscópio em que se transforma a vida torna a construção da(s) identidade(s) algo ainda árduo para quem começa a se prepara para a entrada no chamado mundo da vida adulta.

Tantas transformações acompanham o ritmo do mundo globalizado. A distância entre os países diminuiu, a indústria cultural produz em escala planetária e as culturas locais são submetidas a um intenso bombardeio de elementos externos. O indivíduo está sujeito a alterações radicais - fruto do dinamismo da realidade. Modismos, padrões de conduta e comportamentos se sucedem com rapidez jamais vista. A identidade em tempos de globalização é maleável, flexível, fluida. A grande questão não é mais se há ou não a capacidade de mudança. O desafio é garantir que a pessoa possa dar continuidade a sua história individual, compreendendo como se desenvolve o processo de (re)construção constante da identidade.


Marlucio Luna é editor do projeto Século XXI

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