segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Século de gerência feminina


07/ 03/ 2007 - MULHERES

Século de gerência feminina

Ana Lúcia Galinkin
Professora e pesquisadora do programa de Pós-graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações, do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). Tem doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), mestrado em Antropologia Social pela UnB e graduação em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O processo de industrialização nas sociedades ocidentais deu origem a uma reconfiguração na divisão sexual do trabalho. A partir dele, criou-se a figura da mulher trabalhadora assalariada, que passou a desempenhar suas atividades profissionais no espaço público, particularmente nas fábricas. No decorrer do século 20, profissões como secretárias, professoras do ensino primário e secundário, enfermeiras, domésticas, funcionárias, entre outras tarefas que, nas representações coletivas aparecem como tipicamente femininas, foram, cada vez mais, ampliando as oportunidades de emprego para as mulheres.

Desde então, tem ocorrido um aumento significativo e constante da participação feminina no mercado de trabalho, em particular entre mulheres de classe média. Atualmente, elas correspondem a quase a metade da população economicamente ativa. Por conseqüência, o que se tem observado é uma progressiva feminilização do trabalho em diferentes setores, inclusive os considerados tipicamente masculinos. O nível de escolaridade também é crescente entre as mulheres, assim como sua participação em cargos de chefia intermediárias.

Mas sua presença ainda é minoritária em altos cargos gerenciais. As áreas mais favoráveis a elas continuam sendo a de serviços comunitários e sociais, educação e saúde, onde já têm maior representação e mais oportunidades de ocuparem cargos gerenciais. As micro e pequenas empresas, tanto no setor formal quanto informal, também têm se constituído em um espaço mais aberto para que as mulheres ocupem posições mais altas.

A participação feminina em postos de chefia tem levantado a questão se essas mulheres, que foram educadas para se colocarem em posições subalternas, adotando atitudes mais passivas e de conciliação, sendo treinadas para cuidar e se preocupar com o outro, desempenhariam bem esta função de mando tipicamente masculina, definida como racional, assertiva e impessoal. Estariam as gerentes exercendo essas funções como homens ou como mulheres? Teriam que mudar sua maneira de ser, considerada feminina, para se tornarem boas gerentes? Ou estão criando um estilo feminino de gerenciar?

Pesquisas voltadas para estilos gerenciais, que focalizam as relações de gênero, mostram que não há homogeneidade no desempenho das chefes, nem em sua maneira de entender qual a melhor forma de mandar. Em alguns casos, as mulheres adotam um estilo masculino, mais assertivo e competitivo, como forma de se fazerem respeitar e mostrar competência no desempenho de sua função gerencial. Este comportamento está, muitas vezes, vinculado às características da organização onde trabalham, que valoriza a racionalidade, a lógica e a competição.

Em outros casos, as gerentes adotam o estilo que consideram feminino, que é mais interativo e se caracteriza pela inclusão, por encorajar a participação das equipes, por dividir o poder e a informação e por desenvolver a auto-estima das pessoas. Esse estilo é estimulado por empresas em que ocorrem mudanças nas formas hierárquicas de organização, favorecendo o que tem sido interpretado como o estilo feminino de administração. Nele, as gerentes reconhecem como válida a transposição para o ambiente de trabalho de um aprendizado que tiveram no lar – seja na administração doméstica, no papel de negociadoras das relações familiares e de gestoras de uma multiplicidade de funções como mães, esposas e filhas.

Por mais contraditório que possa parecer, esse estilo de gerência já foi encontrado em empresas cujas atividades são consideradas tipicamente masculinas, como mineração. No serviço público, setor mais acessível às mulheres devido à seleção por concurso público, e que tem oferecido maiores oportunidades de ascensão funcional, o modo feminino de chefia também aparece com freqüência.

O estilo que as mulheres construíram corresponde às tecnologias gerenciais atuais que rejeitam a coerção e o autoritarismo, e valorizam a participação. Está em conformidade com as transformações organizacionais que exigem do gestor a capacidade de tecer redes de inclusão e gerar consenso. Uma forma de exercício de poder, cuja eficácia está baseada nas negociações, na coordenação, na persuasão, e não na dominação. Uma forma de gestão das organizações do século 21.

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