Escrito por Pedro Caldeira Rodrigues
01-Set-2009
Apesar dos projectos que contornam a Rússia, este país vai permanecer um fornecedor decisivo de gás natural para o mercado europeu. E a profunda interdependência entre todos os actores envolvidos neste campo poderá forçar ao reforço da cooperação bilateral, apesar das rivalidades que subsistem.
O Sudeste da Europa está a tornar-se num "corredor" para a passagem do gás e uma região decisiva para a segurança energética da Europa. A necessidade em assegurar quantidades suficientes de gás para as crescentes necessidades europeias, ou a redução da dependência energética da Rússia, implicou uma série de projectos destinados a abastecer a Europa com gás natural de "países alternativos". Foi neste contexto que se desenvolveram os projectos de gasodutos TGI e Nabucco, que pretendem trazer gás do Azerbaijão, Turquemenistão, Irão, Cazaquistão, Egipto, e mesmo do Iraque, para a Europa. O South Stream (Corrente do Sul), um projecto regional da Rússia, foi considerada uma decisão estratégica para manter a sua posição dominante no mercado europeu. Diversificar o fornecimento de gás natural, e melhorar as relações com a Rússia são dois objectivos pretendidos pela União Europeia (UE), e que podem afinal revelar-se compatíveis.
A UE é um dos maiores consumidores e importadores de combustíveis fósseis do mundo. Necessita de um fornecimento ininterrupto e diversificado de energia, e calcula-se que as necessidades do mercado europeu em gás natural vão aumentar 2,3 por cento por ano, atingindo os 630 mil milhões de metros cúbicos em 2030. E a crise entre a Rússia e a Ucrânia em torno da disputa dos preços do gás natural, que implicou a interrupção do fornecimento de gás natural da Rússia para a Ucrânia e a Europa central, agravou o problema.
A Rússia fornece cerca de 25 por cento do gás consumido na Europa, e a necessidade de assegurar novos fornecimentos de gás fez do Sudeste da Europa uma região decisiva para a segurança energética europeia.
Actualmente, existem três projectos de gasodutos nesta região, e dois deles destinam-se a canalizar gás que não é proveniente da Rússia, e proveniente do Cáucaso, Ásia Central e Médio Oriente. O terceiro projecto envolve o transporte de gás russo por um novo gasoduto que atravessará o Mar Negro.
O TGI
O Interconector Turquia-Grécia-Itália (TGI) foi o primeiro projecto de gasoduto no Sudeste da Europa destinado a transportar gás natural que não é proveniente da Rússia. Envolve a companhia grega DEPA, a turca BOTAS e a italiana Edison. O projecto tem duas fases: a primeira destina-se a ligar as redes de gás natural da Turquia e Grécia, e a segunda fase prevê um gasoduto subterrâneo nas águas do estreito de Otranto com 212 km de extensão e um custo de 500 milhões de euros, para a ligação das redes grega e italiana, e que deverá estar concluído em 2012. Prevê-se que esta rede possua uma capacidade de 12 mil milhões de metros cúbicos em 2012. A possível extensão desta rede para a região dos Balcãs Ocidentais também está em discussão.
O Nabucco
O gasoduto Nabucco, com 3280 km de extensão também está destinado a evitar o transporte de gás russo, e prevê-se que na fase final garanta 30 mil milhões de metros cúbicos por ano. Inicia-se em Erzurum, Leste da Turquia, e foi projectado para atravessar a Bulgária, Roménia e Hungria, até ao complexo de gás natural de Baumgarten, na Áustria. Em Fevereiro de 2008, a RWE alemã tornou-se no sexto parceiro do projecto.
De início, a matéria-prima vital será transportada pelo gasoduto Nabucco desde o Azerbaijão, fonte original, transitando pelo território da instável Geórgia até à Turquia, e de onde seguirá para o "coração" da Europa.
O gasoduto do Cáucaso do Sul, que fornece a Turquia com gás natural do Azerbaijão, será ligado a Erzurum. Também se previa a conexão Tabriz-Erzurum, o gasoduto que canaliza gás iraniano para o mercado turco. No entanto, as más relações entre Teerão e o Ocidente estão a comprometer esta possibilidade. Também se prevê que este novo projecto possa exportar gás natural do Turquemenistão, Cazaquistão, Iraque e Egipto para o mercado europeu.
Este projecto, anunciado em 2004, também obteve um forte apoio dos Estados Unidos, que o encaram como um passo para a emancipação económica e política das ex-repúblicas soviéticas do Cáucaso e Ásia Central. O Nabucco enfrenta contudo diversas dificuldades, pelo facto de o gás azeri ser insuficiente para tornar o projecto rentável. Para amais, o Turquemenistão apenas está autorizado a fornecer quantidades limitadas de gás natural para Nabucco, e através de território iraniano.
Em paralelo, a Rússia intensificou os esforços para assegurar a maior quota possível de gás turcomeno, através da melhoria das infra-estruturas e de preços mais competitivos. O mesmo fez Moscovo com o Azerbaijão, numa óbvia antecipação ao acordo em torno do Nabucco, e numa tentativa de tentar controlar as potenciais fontes de energia destinadas à Europa. Assim, em finais de Junho passado, a gigante Gazprom assinou um acordo com Baku para a importação inicial de 500 milhões de metros cúbicos de gás natural azeri a partir de 2010, e que depois será reexportado para a Europa. O responsável da Gazprom, Alexei Miller, também anunciou que a companhia terá prioridade em adquirir gás natural do enorme campo azeri de Shakh Deniz, no Mar Cáspio, em fase de expansão. Será talvez por este motivo que nos círculos russo se comenta que Nabucco é um projecto que arrisca a ter as condutas… vazias.
O South Stream
O terceiro projecto destinado a atravessar o Sudeste europeu designa-se South Stream e é de origem russa. E exclusão da Rússia do projecto Nabucco, por pressões dos Estados Unidos e UE, justificou o projecto do gasoduto South Stream, e em Junho de 2007 a Gazprom e a companhia de energia italiana ENI assinam o primeiro protocolo. Com uma capacidade total de 30 mil milhões de metros cúbicos por ano, as condutas partem do terminal de Beregovaya, na costa russa do Mar Negro, e atravessam o fundo do mar durante 900 km até atingirem as costas búlgaras, perto de Varna. Depois, divide-se em duas secções: para Norte atravessará a Sérvia e Hungria até à Áustria; para Sul, a Grécia, o Mar Jónio, até alcançar a Itália. Um projecto que também conhece limitações, devido à necessidade em aumentar a produção da matéria-prima e descobrir novas jazidas. E a recusa da Rússia em assinar o Tratado da Carta de Energia de 1991, constitui outro potencial problema nas relações com a UE.
Apesar dos projectos que contornam a Rússia, este país vai permanecer um fornecedor decisivo de gás natural para o mercado europeu. E a profunda interdependência entre todos os actores envolvidos neste campo poderá forçar ao reforço da cooperação bilateral, apesar das rivalidades que subsistem
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