quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Petróleo: a manutenção da importância geoeconômica



por Virgílio Arraes


Em 1999, John McCain, em sua primeira disputa no Partido Republicano para ser o candidato a Presidente, havia sido favorável à interrupção de novas prospecções petrolíferas ao longo da costa norte-americana ao menos até 2012. Em 2008, contudo, ele alterou o seu posicionamento, sendo favorável à imediata retomada da exploração, sob a justificativa de que ela auxiliaria a estabilizar, no curto prazo, o abastecimento energético. Desta forma, a cotação poderia situar-se em patamar inferior à atual, com resultado positivo sobre a economia nacional.
No entanto, caso houvesse o fim da suspensão a partir, por exemplo, de 2009, a produção materializar-se-ia apenas em 2014 - estima-se que as reservas marítimas estejam próximas de 20 bilhões de barris. Atualmente, os Estados Unidos consomem quase 21 milhões de barris diários, o que representa ¼ do total, embora os estoques do país correspondam a meros 3% do mundo inteiro.
A despeito da instabilidade política e econômica, ocasionada pela disputa para obtenção regular de petróleo e gás, os republicanos não parecem dispostos a investir maciçamente no desenvolvimento de novas matrizes energéticas. Conquanto no início de seu segundo mandato Bush tenha enfatizado a importância da energia renovável, na prática, a Casa Branca concedeu poucas verbas para pesquisas.
De imediato, apenas medidas protecionistas, a fim de resguardar o biocombustível, no caso extraído majoritariamente do milho. Sabe-se que este tipo de etanol está impossibilitado de concorrer com o da cana-de-açúcar em termos de aproveitamento energético. No entanto, ao ser produzido maciçamente no centro-oeste do país, região conhecida por seu conservadorismo político, os republicanos sentem-se à vontade para resguardá-lo.
John McCain pertence politicamente à ala que se opõe a destinar parte dos impostos do setor petrolífero para pesquisar fontes energéticas renováveis e menos poluentes. Assim, a fixação na energia de origem fóssil perdurará bastante.
A questão deste tipo de combustível tornou-se mais complexa recentemente porque há uma presença significativa de empresas estatais. Até o início dos anos 70, as grandes companhias ocidentais controlavam cerca de 80% das jazidas de petróleo e de gás, enquanto hoje mal passam de 10%. Contribuíram para o presente quadro o posicionamento da Rússia e da Venezuela. Assim, 15 das 25 maiores empresas do ramo são, ao menos parcialmente, estatais.
A mudança da composição administrativa já implica considerações de ordem geoeconômica em um grau observado apenas quando do Primeiro Choque do Petróleo em 1973: o quarto fornecedor dos Estados Unidos é a Venezuela, o que deixa o Departamento de Defesa, por meio do Comando do Sul, alarmado com as iniciativas políticas do Presidente Hugo Chávez. Desde 2005, uma subsidiária da PDVSA, a Citgo, comercializa o óleo de aquecimento a preços menores em algumas localidades carentes norte-americanas.
Além do mais, a África, considerada por Washington como uma alternativa relevante ao Oriente Médio, recebe cada vez mais a atenção da China, desassossegada na busca de matérias-primas com o objetivo de manter o ritmo de seu crescimento. Na encarniçada disputa por recursos energéticos, endereçam-se lamentavelmente direitos humanos e referências democráticas para um plano secundário.
No inicio do ano passado, o governo chinês vetou uma resolução do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas sobre a União de Mianmar, país detentor de gigantescas reservas de gás natural e com o qual Pequim estreita-se comercialmente. Na Ásia Central, o Casaquistão, farto em petróleo, é o exemplo de um país transformado em um regime, onde a presidência é, de fato, vitalícia, sob o férreo comando de Nursultan Nazarbayev. No relacionamento diplomático russo-ucraniano, o fornecimento de gás é um elemento-chave, sendo a maneira de Moscou influenciar os rumos políticos de Kiev.
Ainda assim, destaque-se que não se pode menosprezar a força das companhias privadas no setor energético, ainda mais após os recentes e robustos aumentos do petróleo, originados simultaneamente do rumo desastrado da II Guerra do Golfo e do crescimento econômico indo-chinês.
Deste modo, a presença das corporações petrolíferas se confirma no cenário, em muitas ocasiões, por meio da transferência de conhecimento ou do estabelecimento de parcerias. Vários países estatizantes não dispõem por si mesmos de condições - tecnológicas ou econômicas - suficientes para uma exploração adequada de seus recursos naturais, por onde se diminua o desperdício e se minimizem os danos ambientais, como é o caso do próprio Cazaquistão.

Virgílio Arraes é professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (arraes@unb.br).
http://meridiano47.info/2008/07/02/petroleo-a-manutencao-da-importancia-geoeconomica-por-virgilio-arraes/#more-349

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