quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O Eterno Problema dos Transportes




Juarez B. Regis

Antes da década de sessenta o sistema de transporte de carga do Estado do Pará era baseado na modalidade hidroviária, em virtude das características de seus rios que ofereciam excelentes condições de navegabilidade para barcos até um determinado limite de calado, interligando a maioria de suas cidades e localidades. A partir dessa década, emergiu o transporte rodoviário e uma pequena parcela do ferroviário entre Carajás e o Porto de Itaquí, no Maranhão.

O marco inicial desse impulso pelo sistema rodoviário ocorreu com a construção da rodovia Belém-Brasília, e continuou, na década seguinte, com a construção da estrada Transamazônica e de Santarém-Cuiabá, com recursos do PIN e PROTERRA. O financiamento todo foi oriundo do Governo Federal, restando ao governo paraense atuar na complementaridade de outros trechos, como foi o caso da implantação da PA-150, PA-156, PA-254, e mais recentemente a Alça Viária, ligando as cidades de Ananindeua e Barcarena, e conseqüentemente, ao Porto de Vila do Conde, da Albrás/Alunorte.

Desde essa época, atravessando as décadas de oitenta e noventa, até os dias de hoje, com a exceção da Alça Viária não houve um aumento significativo na abertura de novas vias de escoamento de produção, mas houve sim, o comprometimento de muitas estradas implantadas anteriormente, por falta de um eficiente programa de restauração e conservação. Como se pode constatar, essa estratégia do governo federal para tentar integrar a Amazônia ao todo nacional, deu impulso a certo crescimento econômico, na região, que com o passar do tempo, foi deixado de lado, voltando a Amazônia a sofrer as conseqüências negativas, pelo total abandono a que foi submetida nos últimos 12 anos. Uma dessas conseqüências, é a má qualidade de vida de seus habitantes, principalmente, os ruralistas que vivem sem nenhum apoio, por partes dos Órgãos Federais e Estaduais, que foram criados para prestar assistência técnica e administrativa a essas famílias de pequenos criadores e agricultores. Terras tituladas foram entregues a camponeses, como também, foram ensaiados certos acompanhamentos técnicos desses proprietários, mas tudo isso durou pouco. Os pequenos produtores, se viram desorientados, produzindo aleatoriamente, e o que produziam, ou produzem até hoje, é em grande parte desperdiçado, pela total carência de uma infra-estrutura de transporte adequada, a começar pela falta de estradas vicinais e mesmo de estradas troncos com asfalto adequado. Isso sem dúvida, tem repercussão desastrosa, nas periferias das cidades, onde uma população de origem campesina tenta sobreviver às duras penas, num ambiente estranho a seus tradicionais costumes, passando a conviver com a violência de outros cidadãos que, também, foram empobrecidos pela estrutura injusta impregnada no país.


Acompanhando a implantação dos grandes projetos econômicos, na Amazônia, os programas especiais de financiamentos, os incentivos fiscais e outros, tiveram tudo a ver com a atual situação com a qual os habitantes dessa região se encontram, atualmente. Sem dúvida, foi um modelo concentrador de terra e renda, nas mãos do grande empresário e político, regional, nacional e estrangeiro. Essa aliança, entre o grande empresariado e a máquina estatal, através do apoio proporcionado pelo Programa Nacional de Transportes, ao abrir os grandes eixos rodoviários, redefine novas práticas de atividades produtivas no território paraense. É, portanto, imprimido ênfase aos processos modernos de produção, em grande escala, e da máxima eficiência econômica, onde a grande empresa rural, capitalista, nacional ou estrangeira (serrarias, fazendas e agro-indústrias), recebiam financiamentos até para o preparo da terra, que incluía a derrubada de extensas áreas de florestas para a formação de latifúndios. Essa maneira pela qual os anteriores planejadores do desenvolvimento, acharam de melhor iniciar o processo de ocupação da Amazônia, incentivando a agropecuária extensiva, e produtos para a exportação, sem uma certa convivência harmônica com a floresta, e o que pior: sem traçar uma linha de ação para a atividade familiar, na agropecuária de pequeno porte e no extrativismo vegetal, que hoje voltam a ser propalados, acabou por alijar do sistema produtivo o pequeno produtor nativo que passou a vender terras ou ser, simplesmente, expulso de sua lavoura. Soma-se a essa estratégia de desenvolvimento - aliás bem intencionada, mas ao mesmo tempo incompleta, pois trazia no bojo dos grandes projetos, a implantação de distritos agropecuários familiares, - a chegada de camponeses de outras regiões do país, atraídos pelas promessas de um novo eldorado, que chegando sem conhecer a nova realidade do solo da região, que é totalmente dependente da floresta, tornaram-se, também, atores nessa desastrosa ocupação, de terras às vezes até produtivas, com danos irreversíveis à natureza.


Apesar de todos esses erros cometidos, que sem dúvida elevou os custos de produção não para o empresário - que está se saindo bem na comercialização de seus produtos, - mas para o tesouro nacional, não se pode deixar de reconhecer que em alguns setores econômicos houve progressos, e que atualmente estão dando ensejo a novas atividades geradoras de renda e emprego. O exemplo disso, é rebanho paraense de bovino e bufalino, salvo engano, o terceiro maior do país, o que já dá uma idéia da representatividade dessas espécies por toda a Amazônia.

Ao nosso ver, nesses novos tempos de grandes preocupações com as ameaças de desastres naturais, cabe ao governo federal, justamente com os governos estudais da Amazônia, repensar essa estratégia de desenvolvimento, ou melhor, revisar esse propalado desenvolvimento sustentável, antes de partir para um grande esforço de, ao mesmo tempo, produzir preservando e preservar produzindo. Na Amazônia, essas duas maneiras cabem, perfeitamente, desde que se leve em consideração à atenção para os mínimos detalhes, respeitando as especificidades de cada sub-região, e para isso, é preciso que o governo federal apresente uma política regional com diretrizes bem formuladas, que oriente o planejamento do desenvolvimento sustentável, incentivando somente atividades que produzam sem devastar ou causar danos aos ecossistemas naturais. Desse modo, há que ser selecionadas as futuras indústrias e as atividades agropecuárias ao longo da rodovia BR-163, que pode fazer da cidade de Santarém o tão sonhado corredor de exportação do país. Para atender os pequenos produtores, há que ser repensado novos padrões de módulos produtivos, maiores e/ou menores dos atuais 100 hectares, para não ficar nesse inoperante padrão, ainda criado no regime militar. Quanto à grande empresa rural capitalista, há que ser definido uma dimensão máxima que não seja prejudicial à produtividade, mas que, também, não abocanhe áreas quase do tamanho de certos países do mundo, o que pode comprometer a nossa soberania, para acolher futuros brasileiros ávidos de terras.


Como se pode observar, é possível se ter uma Amazônia produtiva, nos três setores da economia, incluindo-se aí, ramos como o turismo (eco-turismo, turismo cultural, religioso e da pesca esportiva); a indústria, voltada para a construção de (artefatos de ferro-aço, eletrônica e a manufatura); a biotecnologia abrangendo (pesquisas e extração de essências da flora e da fauna); a atividade madeireira com métodos mais modernos de exploração e de desdobramentos, com aproveitamentos dos resíduos para a extração de sub-produtos, verdadeiros sucedâneos do petróleo, como álcoois, enzimas e substâncias para a indústria cosmética e farmacêutica; a agropecuária mais selecionada e direcionada para a criação do gado menor em áreas degradadas; agricultura com plantações cercadas de ilhas de florestas, bem como a atividade mineral processada somente por empresas obedientes à conservação de ecossistemas. Esse é o verdadeiro modelo sustentável, com mudança da base produtiva.


Agora em que pese toda essa perspectiva que se abre para a região, é bom lembrar que foi a partir da procura de um porto para o escoamento da produção, não só da Amazônia, como dos excedentes agrícolas e industriais de outras regiões do país, que se construiu o porto de Santarém, na década de setenta. Lembremo-nos, também, que com a implementação do Programa de Desenvolvimento Integrado do Noroeste do Brasil (Governo Brasileiro/Banco Mundial), houve um grande esforço no sentido de solucionar o problema do escoamento da produção agropecuária de Mato-Grosso, Rondônia e do Acre. Das soluções portuárias preconizadas (Itacoatiara, Santarém, Belém) a que oferecia maior vantagem comparativa era a de Santarém, por ser a mais direta, eliminando um transbordo intermediário, e por contar, a longo prazo, com a possibilidade de conviver com o transporte ferroviário, além de estar mais próximo da PA-254, na margem esquerda do rio Amazonas, ligando várias cidades com o Amapá e as Guianas e mesmo aos portos do Sul e Sudeste brasileiro.


Hoje, com a retomada dos problemas no Sul do país - mais precisamente nos portos de Santos e Paranaguá, que enfrentam, continuamente, longas filas de caminhões e navios à espera de vez para descarregar e embarcar as produções, especialmente, de grãos de soja e outros produtos, além das constantes ondas de greves dos operários daqueles portos que estão, sempre, importunando a todos, causando prejuízos de milhões de dólares ao tesouro nacional, - seria oportuno que se retomasse a discussão de uma política mais abrangente para a Amazônia, que priorizasse de uma vez por toda o asfaltamento da BR-163, e outros investimentos portuários, envolvendo o porto de Santarém, a construção de um segundo porto na cidade de Óbidos, e conseqüentemente o asfaltamento da PA-254, completando-se assim, os reais objetivos para que foi projetada a rodovia Santarém-Cuiabá, dentro do programa de integração amazônica.

Termino essas rápidas considerações, deixando um pensamento: “tudo o que se fizer por essa Amazônia, tem que, primeiro, visar reduzir os custos de produção, para suas unidades federadas e para o Brasil, pois essa é a melhor maneira dessa região contribuir com o país”.
http://www.istoeamazonia.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=644&Itemid=220

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