segunda-feira, 30 de junho de 2014

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Economia americana já sente efeitos de mudanças climáticas
Prejuízos causados pelo clima nos Estados Unidos podem atingir US$35 bilhões

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A elevação dos níveis dos mares, maiores danos de ondas de tempestades e ondas mais frequentes de calor extremo terão “impactos específicos, mensuráveis, sobre os atuais bens de nossa nação e sua atual atividade econômica”.


Catástrofes induzidas por mudanças climáticas, inclusive o aumento do nível do mar, ondas de calor extremo e quebras de safras custarão ao país bilhões de dólares por ano nas próximas décadas.

Essa é a previsão de um relatório divulgado em 24 de junho, que foi patrocinado pelo investidor bilionário e ativista ambiental Tom Steyer, pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg (I) e pelo ex-secretário do Tesouro, Henry Paulson.

“Risky Business: The Economic Risks of Climate Change to the United States” (“Negócio Arriscado: Os riscos econômicos das alterações climáticas para os Estados Unidos”), uma análise que se estendeu por mais de um ano, projeta perdas por setores e regiões do país. Seu objetivo é fornecer o que chama a primeira “avaliação abrangente já feita dos riscos econômicos que nossa nação enfrenta em decorrência das mudanças climáticas”.

De acordo com o documento, haverá perda de produtividade devido ao calor extremo. Mais usinas de energia terão de ser construídas para fornecer energia elétrica para aparelhos de ar condicionado. E, enquanto isso, a elevação do nível do mar ameaça a infra-estrutura, particularmente ao longo da costa leste e da região do Golfo.

“Se permanecermos em nossa atual rota climática, algumas residências e propriedades comerciais com hipotecas de 30 anos, em lugares como a Virgínia, Carolina do Norte, Nova Jersey, Alabama, Flórida, Louisiana e outros estados poderiam literalmente estar embaixo da água antes que as dívidas estejam quitadas”, adverte o relatório.

Existe uma chance em 20 “de que até o final desse século mais de US$ 701 bilhões em propriedades costeiras existentes estarão abaixo do nível médio do mar; além de mais de US$ 730 bilhões em propriedades em risco durante a maré alta maré”, prevê a análise.

O documento, de 56 páginas (pdf, em inglês), que tem como alvo o público empresarial, foi divulgado formalmente na manhã de 24 de junho em Nova York e publicado on-line em riskybusiness.org. O site de ClimateWire obteve uma cópia antecipada do relatório.

Além de Steyer, Paulson e Bloomberg participaram do evento em Nova York vários membros do comitê consultivo de “Risky Business”, entre eles: Henry Cisneros, ex-secretário de Habitação e Desenvolvimento Urbano, Robert Rubin, ex-secretário do Tesouro e Donna Shalala, ex-secretária de Saúde e Serviços Humanos — todos do governo Bill Clinton; além de Alfred Sommer, da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health e Gregory Page, ex-CEO e atual presidente do conselho da Cargill Inc.

Impactos de curto e longo prazos

A economia americana já está começando a sentir os efeitos das mudanças climáticas, afirma o relatório e “esses impactos provavelmente aumentarão substancialmente nos próximos 5 a 25 anos, afetando o desempenho futuro dos negócios e as decisões de investimento de hoje”.

A elevação dos mares, o aumento de danos decorrentes de ondas gigantes de tempestades e ondas mais frequentes de calor extremo terão “impactos específicos, mensuráveis, nos atuais bens de nossa nação e sua atual atividade econômica”, alerta o documento.

A análise se concentra em três importantes áreas em que há riscos resultantes de “mudanças climáticas induzidas pelo homem”: propriedades costeiras e infraestrutura, agricultura e energia.

É provável que ocorram mais tempestades extremas, como a supertempestade Sandy, de 2012, prevê a avaliação.

“Nos próximos 15 anos, os níveis mais elevados dos mares, combinados com ondas de tempestades, provavelmente aumentarão o custo médio anual de tempestades ao longo da costa leste e do golfo do México em entre US$ 2 bilhões e US$ 3,5 bilhões”, estima diz o relatório. Somando-se isso às potenciais mudanças na atividade de furacões, “o provável aumento em perdas médias anuais subirá para algo em torno de US$ 7,3 bilhões, elevando o custo anual total de furacões e outras tempestades costeiras para US$ 35 bilhões”.

O aumento da temperatura ao longo dos próximos cinco a 25 anos também deverá resultar em uma demanda maior de energia, uma quantidade igual à gerada por aproximadamente 200 usinas médias movidas a carvão ou a gás natural. Isso custará aos contribuintes residenciais e comerciais até US$ 12 bilhões por ano, de acordo com a análise.

Em longo prazo, haverá muito mais dias com temperaturas desconfortáveis e perigosas, prossegue o documento. Esse calor extremo, especialmente no sudoeste, sudeste e centro-oeste superior, ameaça “a produtividade do trabalhador, a saúde humana, e os sistemas de energia”.

“Em meados desse século, o americano médio provavelmente verá de 27 a 50 dias com mais de 35ºC por ano — de duas a mais de três vezes o número médio de dias com 35ºC que experimentamos durante os últimos 30 anos”, prevê o relatório, e prossegue: “até o fim do século, esse número provavelmente chegará, em média, a entre 45 e 96 dias com 35ºC por ano”.

Temperaturas mais altas trarão sérios desafios para a agroindústria, especialmente em certas regiões.

Sem adaptação, alguns municípios do centro-oeste e do sul poderiam ver sua produtividade cair mais de 10% nos próximos cinco a 25 anos se eles continuarem a semear milho, trigo, soja e algodão, diz o relatório. Há uma chance em 20 de que as perdas de rendimento dessas culturas cheguem a mais de 20%. A análise não coloca um valor em dólares nesses prejuízos potenciais, porque seria impossível projetar preços futuros, explicou Matt Lewis, diretor de comunicações do relatório “Risky Business”.

O documento baseou suas conclusões em dados de relatórios da Avaliação Nacional do Clima (NCA, na sigla em inglês) e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), além de em material revisado por pares sobre impactos climáticos extremos em culturas, produtividade do trabalhador e desempenho do sistema de energia. Ele também utilizou modelos proprietários sobre o impacto de ondas de tempestade costeiras da Risk Management Solutions (RMS), que modela catástrofes para o setor de seguros e instituições financeiras.

“Evitando explicitamente” prescrições de políticas

A análise Risky Business foi ansiosamente aguardada por alguns grupos ambientalistas, empresas e ativistas democratas devido à poderosa equipe por trás do documento. Além disso, Steyer tem estado politicamente ativo, usando sua fortuna pessoal para apoiar candidatos que, em sua opinião, apóiam suas metas climáticas, e para atingir outros com pontos de vista contrários.

Mas o documento não defende quaisquer ações para enfrentar as mudanças climáticas. Lewis enfatizou que Steyer é apenas uma de 10 pessoas envolvidas, depois de contar os sete membros do Comitê de Risco.

“Não estamos construindo uma lista de empresas que estão participando do conselho para forçar a adoção de políticas. Esse não é o objetivo de “Risky Business”, argumentou Lewis. “Estamos evitando explicitamente uma discussão sobre política em todo o projeto”.

Membros do Comitê de Risco do grupo não concordam sobre a melhor política para lidar com o aquecimento, acrescentou.

“Sobre o que eles estão plenamente de acordo é que as mudanças climáticas representam muitos riscos para muitos setores da economia americana, e que não deveríamos, em sã consciência, deixar de discuti-los”, salientou Lewis.

O principal objetivo da análise é ajudar empresas a entender esses riscos, acrescentou. Isso poderia ajudá-las a tomar decisões informadas.

“Você poderia mudar a forma como fluxos de capital funcionam para o setor imobiliário, se elas (as seguradoras) começarem a entender que há propriedades nas quais estão investindo agora, mas que, daqui a 20 anos, poderiam ser inaseguráveis”, sugeriu Lewis. Poderia haver investimentos diferentes na agricultura “para lidar com os padrões de crescimento mutantes que esperamos”, exemplificou.

Empresas poderiam estar envolvidas na moldagem de ações governamentais, mas elas terão que decidir por conta própria se isso é no seu melhor interesse, salientou, acrescentando: “A comunidade empresarial americana tem um papel fundamental a desempenhar, tanto em se preparar para mudanças climáticas, como para informar a resposta política”, disse Lewis

Alguns prevêem pressões para regulamentos

Críticos do projeto Risky Business, no entanto, admitiram estar preocupados com a possibilidade de ele ser usado para defender medidas corretivas caras.

O relatório provavelmente “soará alarmes”, argumentou Chris Neefus, porta-voz da Americans for Prosperity, um grupo de defesa conservador ligado aos barões da energia Charles e David Koch.

“Em geral constatamos que na esteira de algo desse tipo as pessoas procuram meios de aumentar os impostos”, seja diretamente, através de um imposto sobre o carbono, ou através de mudanças de normas que aumentam os preços da energia, observou.

Tom Pyle, presidente da American Energy Alliance, uma organização sem fins lucrativos focada em defesa do livre mercado e parcialmente financiada por empresas de energia, criticou que restrições de emissões de carbono seriam caras e não muito eficientes.

Reduzir a poluição de gases de efeito estufa a zero até 2100 resultaria em uma queda de temperatura de 0,17ºC, observou ele, e acrescentou que estava citando informações de relatórios preparados para análise do IPCC.

“Desperdiçar a enorme quantidade de recursos para fazer qualquer coisa além do que o mercado já está fazendo não faz muito sentido para mim”, resumiu Pyle.

Lewis observou que uma das principais conclusões do relatório “Risky Business” é que os aumentos de temperatura variarão por regiões. Segundo ele, a queda da temperatura média global citada por Pyle, ou o fato de que foi evitado que ela aumentasse, não é muito útil.

“Embora seja fácil apontar médias de temperatura; para lugares como o Alasca ou como o sudeste, que verão mudanças extremas, isso não ajuda”, criticou Lewis.

Médias mascaram a variabilidade e não exprimem o verdadeiro impacto, salientou. E existe o mesmo problema com as médias de aumento do nível do mar e das inundações, disse ele.

“Em média, os Estados Unidos não submergirão”, ironizou Lewis, “mas não contem isso para o povo de Miami”.

Um estrategista democrata manifestou esperança de que fatos do relatório serão usados como defesa política, em anúncios de TV e outros tipos de publicidade voltada para o público eleitor antes da eleição.

“O estudo pode ser potencialmente uma peça do quebra-cabeça para reverter a estrutura básica dessa questão”, observou Mark Longabaugh, um sócio da empresa de consultoria de mídia democrata Devine Mulvey Longabaugh. “Ele (o relatório) ajuda o público a aceitar a ideia de que a mudança climática afetará drasticamente nossa economia”.

Interesses petrolíferos e carvoeiros promoveram a ideia de que reduzir as emissões de carbono é caro, mas o dano em longo prazo do aquecimento “é muito maior”, salientou.

“Uma vez que isso seja revertido, acredito que as pessoas que se opõem a uma legislação climática séria estarão em apuros”, concluiu Longabaugh.

Questionado sobre se Steyer planeja qualquer ativismo climático usando o relatório, Lewis repassou as perguntas à NextGen Climate, o braço de defesa político de Steyer. Uma porta-voz da organização não respondeu imediatamente às indagações.
Scientific American Brasil

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