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Demanda por veículos pessoais e bens de consumo em economias que crescem rapidamente, como China, Índia e Brasil está aumentando o uso de transportes motorizados de todos os tipos.
Gases estufa do setor de transportes podem se tornar um dos mais importantes fatores da mudança climática, de acordo com um rascunho do quinto relatório de avaliação da ONU sobre a mitigação da mudança climática
Julia Pyper e ClimateWire
Na trajetória atual, emissões de gases de estufa de carros, trens, navios e aviões podem se tornar um dos principais indutores da mudança climática provocada humanos, de acordo com um rascunho do quinto relatório de avaliação da ONU sobre a mitigação da mudança climática.
Autores projetam com grande confiança que o crescimento continuado de emissões da atividade de transporte global poderia “superar futuras medidas de mitigação”, de acordo com uma versão preliminar do estudo do Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática (IPCC) obtido por ClimateWire.
Dada a falta de melhorias na eficiência de combustíveis e políticas abrangestes de mitigação, o relatório estima que as emissões do setor de transportes poderiam dobrar em 2050, a partir das 6,7 gigatoneladas de dióxido de carbono emitidas em 2010, o que representa 22% do total mundial.
A demanda por veículos pessoais e bens de consumo em economias que crescem rapidamente, como China, Índia e Brasil, está aumentando o uso de transportes motorizados de todos os tipos. O setor de transportes tem uma dependência quase total de combustíveis energeticamente densos de alto carbono, como gasolina e diesel, e isso torna a redução de emissões um desafio ainda maior.
“O setor de transportes poderia se tornar uma das maiores fontes de emissões... porque é possível mitigar os outros setores mais facilmente”, declarou um especialista que conhece o relatório.
O setor de eletricidade pode reduzir emissões com relativa facilidade se adotar fontes renováveis de energia como a solar e a eólica, enquanto carros e caminhões não conseguem fazer uso dessas fontes de energia que não produzem emissões sem tecnologias sofisticadas e custosas de armazenagem.
Mas o relatório adiciona que ainda existem oportunidades para mudar isso.
Cidades poderiam ser parte da solução
De acordo com o futuro relatório, melhorias técnicas e mudanças comportamentais combinadas com uma nova infraestrutura e investimentos em desenvolvimento urbano poderiam deixar a demanda energética do setor de transportes até 40% abaixo da linha de base em 2050, um potencial de redução maior que o exibido no quarto relatório de avaliação.
De acordo com especialistas em transportes, centros urbanos representam tanto a maior fonte potencial de emissões do setor de transporte quanto a maior oportunidade de mitigá-las.
“Nós estamos em um momento muito importante”, declarou Manish Bapna, vice-presidente executivo do Instituto de Recursos Mundiais, em uma recente conferência com jornalistas. “Será que as cidades serão parte da solução ou do problema?”.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a população urbana dobrará de 2,5 bilhões em 2009 para quase 5,2 bilhões em 2050. Apenas na China, espera-se que 300 milhões de pessoas se mudem para cidades nos próximos 15 anos.
A construção de cidades que reduzam a demanda por veículos e aumentem a acessibilidade poderia ser uma opção de baixo custo para reduzir emissões de gases estufa, e também uma solução para problemas locais urgentes, como a poluição do ar e más condições de saúde pública.
Abordar as emissões do setor de transportes de maneira mais compreensiva através do desenvolvimento urbano é um dos principais temas do Fórum Urbano Mundial das Nações Unidas, que acontece esta semana em Medelin, na Colômbia.
“Nós já estamos tendo problemas com a quantidade de carros nas ruas de nossas cidades; congestionamento, poluição do ar, problemas de segurança, impactos sobre a saúde de pessoas que dirigem o tempo todo...”, apontou Luc Nadal, diretor técnico de desenvolvimento urbano do Instituto de Transporte e Política de Desenvolvimento (ITDP). “Esse é um modelo de desenvolvimento absolutamente insustentável”.
Hábitos e projetos insustentáveis
O transporte motorizado compõe quase um quarto das emissões globais produzidas pela humanidade, e a maioria delas vêm de veículos pessoais. De acordo com Nadal, seria um “desastre absoluto” se o modelo de desenvolvimento do século 20, focado em carros, que caracterizou muitas cidades dos Estados Unidos e da Europa, continuasse no século 21.
“Temos que levar em conta a maneira como construímos prédios e ruas:essas formas urbanas ficarão conosco durante muito, muito tempo –décadas, e até séculos. Nós temos ruas em alguns locais que já existem há vários milênios”, destacou ele. “Uma vez que esses padrões são construídos, é muito difícil mudá-los”.
Ontem o ITDP revelou um novo guia de políticas durante o Fórum Urbano para avaliar desenvolvimentos em imóveisque integram transporte sustentável e uso de terras para conectar pessoas de maneira conveniente e segura a empregos, educação, compras e outras oportunidades.
O Padrão TOD (Desenvolvimento Orientado ao Trânsito, em inglês) se baseia em oito elementos: caminhabilidade; adequação a bicicletas; uma rede conectada de ruas e rotas; um sistema robusto de trânsito; um conjunto balanceado de atividades; construções densas e verticais;desenvolvimento compacto; e um afastamento de transportes pessoais motorizados.
De acordo com Nadal, esses princípios são compreendidos por planejadores urbanos e arquitetos, mas políticos ainda não estão cientes deles. Em partes cada vez mais urbanizadas da África, Ásia e da América Latina, cidades ainda estão sendo construídas para acomodar motoristas, mesmo quando eles só representam uma fração da população urbana.
O rascunho do relatório do IPCC estima que barreiras institucionais, legais, financeiras e culturais podem limitar a adoção de tecnologias de transporte debaixo carbono e mudanças na demanda de transportes. Uma análise compreensiva sobre até que ponto essas barreiras podem ser superadas não faz parte do relatório.
Uma versão final do estudo completo do IPCC deve ser divulgada no domingo.
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Scientific American Brasil
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