sábado, 24 de setembro de 2011

O fim dos oceanos


Pescamos demais. Poluímos demais. Navegamos demais. E nem fazemos idéia do estrago que causamos nos mares
Por Claudia Carmello

Você nunca brincou de colocar uma concha no ouvido e ficar curtindo o barulho do mar, as ondas, a calmaria? Hoje seria bem mais realista colocar seu iPod no ouvido – e no volume máximo. Isso, sim, se aproxima do som que o oceano produz para boa parte das criaturas que vivem dentro dele. Um navio de carga emite, pelo estouro das bolhas que seus propulsores criam na água, ruídos de 150 a 195 decibéis. É mais do que uma britadeira (120 decibéis) ou um iPod no talo (114 decibéis). Imagine então o barulho produzido por 100 mil cargueiros que cruzam os mares durante o ano inteiro!

Qual o problema disso? É que os animais marinhos usam a audição para quase tudo – para encontrar o lugar de procriação, o parceiro sexual, a comida. E o mar virou uma linha cruzada dos diabos. Cientistas concluíram que a baleia-azul está ficando surda – escuta a distâncias até 90% menores do que antes. Já a orca está precisando gritar – produzir cantos mais longos para se fazer ouvir. Outras baleias aparecem mortas nas praias após testes militares com sonares caça-submarinos – seus 235 decibéis causam hemorragia nos ouvidos e nos olhos dos animais.

Os oceanos são 70% da superfície do planeta. Em volume, representam muito mais que isso. E sempre o vimos como uma vastidão infinita e onipotente. Mas não poderíamos estar mais enganados. Segundo a ONU, os mares estão em ruínas porque pescamos demais, produzimos lixo, gases do efeito estufa e esgoto demais e bagunçamos os ecossistemas. Pior: nem fazemos idéia do que está acontecendo lá embaixo em conseqüência disso. Ultimamente, aprendemos a pensar que o oceano está trasbordando de tanta água. Mas está acontecendo o contrário: ele está esvaziando, perdendo vida.

A PRÓXIMA FRONTEIRA
Conhecemos melhor o solo da Lua do que o fundo do mar, dizem os ecologistas. Nossa última fronteira são as águas profundas: entre 200 e 7 mil metros submarinos. Elas são 90% do volume dos oceanos e podem abrigar até 100 milhões de espécies – mais do que em todo o resto do planeta. A essa profundidade, não há luz para sustentar o fitoplâncton. Portanto, só animais e bactérias circulam. Até os 1 000 metros ainda há um lusco-fusco. Abaixo disso, a escuridão é total. Faz frio, de até 3oC.

SERES MUITO ESTRANHOS

As criaturas monstrengas das profundezas têm dentes ou olhos desproporcionais, protuberâncias que brilham no escuro, dimensões assustadoras – um tipo de água-viva chega a 40 metros de comprimento (algo como 13 andares)! Normalmente, esses seres vivem de restos caídos das águas de cima. Vivem muito tempo e deslocam-se e reproduzem-se com mais lentidão que os de superfície – por isso suas populações sofrem muito mais impacto com a sobrepesca.

Já comemos animais dessas profundezas. Por exemplo, o feioso olho-de-vidro, que nada a até 1 800 metros de profundidade, vive 150 anos e não procria antes dos 30 – por isso pescá-lo comercialmente
é tão pouco sustentável.

AS FAZENDAS MARINHAS
Uma solução encontrada para amenizar o declínio dos estoques de pesca é a aqüicultura, as fazendas marinhas. São hoje o setor da indústria alimentícia que mais cresce no mundo. Bem manejadas, as fazendas marinhas podem até aliviar a pressão sobre o oceano. Delas já saem 30% dos frutos do mar que comemos – salmão, truta, bacalhau, camarão.

No Brasil, os criadores de camarão desmatam e poluem imensas áreas de mangues preservados. Criadouros de salmão do Canadá sofreram uma explosão de parasitas que infestou o mar aberto e
as populações selvagens.

PARA SABER MAIS
The Unnatural History of the Sea Callum Roberts, Island Press, 2007.
The End of the Line, de Charles Clover, University of California Press, 2007.

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