Cultivar em campos terraceados na China é menos arriscado com seguro.
Milhões de chineses fazem seguro climático
Agricultores a compram apólices contra quebras de safras resultantes de mudanças climáticas
Coco Liu e ClimateWire
Semanas antes do início da colheita no verão passado na China, os arrozais de Li Ping foram atingidos por condições meteorológicas extremas. Temperaturas de35°C literalmente assaram a aldeia de Longtan, no norte do país, durante mais de um mês, amarelando folhas e prejudicando a produção de grãos. Como resultado, a produção de arroz de Li sofreu uma quebra de 20% em comparação com anos normais.
Ainda assim, Li não teve dificuldades em levantar fundos para seu próximo plantio, como aconteceu depois de perdas de colheitas anteriores. Em vez disso, o lavrador, de 51 anos, esperou em casa até o dinheiro chegar.
“Faço seguro da minha produção de arroz desde 2009”, contou Li. “A compensação que recebi não cobriu as perdas totais, mas ela eliminou parte da pressão financeira que sofreria”.
Li Ping é um de centenas de milhões de agricultores chineses que agora utilizam o seguro como uma ferramenta para se proteger contra os riscos decorrentes das mudanças climáticas. A China é o segundo maior mercado mundial de seguro agrícola, atrás apenas dos Estados Unidos em termos de receitas de prêmios, e está lutando para estender o uso de seguros relacionados ao clima para outros setores.
As mudanças climáticas já deixaram muitas cicatrizes na sociedade chinesa. Dados da primeira estratégia nacional de adaptação às variações do clima, divulgados em 2013, mostram que eventos climáticos extremos mataram, em média, mais de 2.000 pessoas por ano desde a década de 90 e custam mais de 200 bilhões de yuans (US$ 32 bilhões) em danos econômicos diretos por ano à economia da China.
Embora o país já tenha injetado bilhões de dólares na prevenção desses danos, desastres naturais cada vez mais frequentes e intensos, provavelmente ligados às mudanças climáticas, estão forçando a nação a gastar mais.
De acordo com um estudo de 2013 do Climate Group, uma organização não governamental com sede em Londres, a China precisará de pelo menos US$ 24 bilhões por ano para ações de adaptação até 2020. Comparativamente, o orçamento nacional estimado com base em seus gastos atuais é de apenas US$ 13,5 bilhões.
Explorando forças do mercado
Para diminuir esse déficit, o governo chinês propôs expandir as finanças climáticas através das forças do mercado. Os serviços de seguro estão entre as soluções sugeridas.
Nos últimos anos, os formuladores de políticas do país já persuadiram centenas de milhões de agricultores chineses a comprar apólices de seguro agrícola. Em 2013, a iniciativa gerou uma capacidade de cobrir perdas no valor de 1,4 trilhões de yuans (US$ 225 bilhões). Os riscos climáticos são conhecidos como o maior perigo para perdas na agricultura.
“Embora o governo subsidie a aquisição de seguros, pelo menos 20% dos prêmios ainda vêm dos bolsos dos agricultores”, salientou Tuo Guozhu, um perito em seguros da Universidade Capital de Economia e Negócios, em Pequim.
“Em comparação com o auxílio dado pelo governo, portanto, o seguro climático pode reduzir o ônus financeiro nacional. E ele também pode ser usado de forma mais eficiente”, acrescentou.
Para gastar menos em compensações, as seguradoras estão empenhadas em proteger os agricultores de mudanças climáticas adversas ensinando-lhes como lidar com os padrões erráticos do clima. Elas também tentam mitigar os riscos climáticos pagando, por exemplo, por serviços artificiais de supressão de granizo.
Para as indústrias, que ainda precisam ganhar o apoio do governo enquanto já experimentam a ameaça do aquecimento global, a importância do seguro climático parece ser mais óbvia.
Em 2012, a Companhia Hidrelétrica Guangdong Meiyan Ltda., do sul da China, por exemplo, comprou uma apólice de seguro de precipitação que lhe permite exigir uma compensação de até 80 milhões de yuans (US$ 12,9 milhões) se um índice de precipitação anormalmente baixo impedir a produção (output) de suas cinco usinas hidrelétricas.
Embora uma solução desse tipo seja inédita na China, “chegamos relativamente rápido a um acordo com a Meiyan”, declarou Stuart Brown, diretor de soluções corporativas da Swiss Reinsurance Company Ltd., conhecida como Swiss Re, que formou uma parceria com uma empresa local para prestar o serviço.
“A equipe gerencial da Meiyan tem boa compreensão da solução”, observou Brown. “Eles fizeram seus próprios cálculos e descobriram que a empresa teria recebido um pagamento de seguro de mais de 17 milhões de yuans (US$ 2,7 milhões) se a apólice de seguro já estivesse em vigor em 2011”.
Escalada ascendente para um novo produto
O seguro que a geradora de energia hidrelétrica tinha obtido anteriormente podia protegê-la de danos causados por deslizamentos de terra e outros desastres naturais violentos, mas não podia ajudar em casos de perdas econômicas associadas a perigos lentamente crescentes, como um declínio de chuvas. Em 2011, as secas evaporaram quase 30% das receitas de produção de energia da empresa e esses tipos de perdas deverão aumentar acentuadamente no futuro à medida que as mudanças climáticas se tornarem mais extremas.
Outras companhias de energia também estão começando a considerar um seguro climático. No final de 2013, o desenvolvedor de um parque eólico da província de Hebei, no norte da China, assinou um contrato com a Swiss Re para se proteger contra a volatilidade do vento.
Atualmente, a empresa está trabalhando com seguradoras chinesas para desenvolver uma opção de seguro de temperatura para empresas de aquecimento distritais (urbanas), cujos lucros estão sendo impactados frequentemente por preços fixos de aquecimento e custos crescentes devido a invernos mais frios.
Embora a demanda de seguros climáticos seja forte na China, a reação negativa a esses serviços talvez seja ainda mais forte. De acordo com Brown, da Swiss Re, “muitos administradores seniores estão cientes de seus riscos meteorológicos; mas poucos fizeram uma análise quantitativa dessa exposição e de seu impacto na operação”.
Além disso, o planejamento orçamentário ao estilo chinês é outro desafio. Como explicou Brown, alguns administradores simplesmente não têm o orçamento para se proteger do clima, mesmo que estejam convencidos de que ele seria importante. “Isso é especialmente verdadeiro para algumas empresas estatais que separam estritamente a gestão de rendas e gastos. O prêmio de seguro, por exemplo, considerado como despesa, é difícil de ser aprovado mesmo que tenha a vantagem de resultar em um fluxo de caixa quando ele é mais necessário”, criticou.
Também existe a questão de quem envolver na adaptação às mudanças climáticas. Liu Xinli, professor associado do Departamento de Gestão de Riscos e Seguros da Universidade Peking, na capital chinesa, observou que a recuperação de desastres é tradicionalmente considerada uma tarefa do governo; portanto, o papel das seguradoras é amplamente ignorado — mas, aparentemente, não será mais.
Vários experimentos em andamento
Em uma coletiva de imprensa realizada em março em Pequim, Xiang Junbo, presidente da Comissão Reguladora de Seguros da China, disse a jornalistas que o governo pretende alavancar os serviços de seguros na luta contra catástrofes naturais. Para os formuladores de políticas chineses, a pressão está aumentando para que façam isso porque as indenizações pagas pelas seguradoras atualmente ajudam muitos países a cobrir de 30% a 40% de suas perdas decorrentes de desastres, enquanto essa contribuição na China é inferior a 1%.
Com isso em mente, a cidade de Shenzhen, no sul da China, recentemente lançou o primeiro plano piloto do país para seguros contra desastres, visando tufões, inundações costeiras e outras ameaças vindas do mar. O governo municipal de Shenzhen já comprou o serviço de seguro para cada um de seus cidadãos. Além disso, os habitantes da cidade também são incentivados a fazer um seguro de vida e de propriedade contra desastres naturais.
Também existem planos para reformular os termos do seguro, facilitando que empresas e cidadãos lidem com o aumento dos danos relacionados ao clima. Na província de Anhui, por exemplo, propensa ao estresse por calor, onde os rizicultores costumavam esperar meses até que as seguradoras completassem suas avaliações de danos, foi introduzido um chamado serviço de seguro de índice de temperatura em 2009. Ele permite que o processo de compensação comece imediatamente, assim que as temperaturas do ar ultrapassem um determinado limite.
Especialistas afirmam que essas inovações têm tido êxito na fase piloto, mas como ampliá-las é uma questão problemática. Embora os produtores de tangerinas da província de Jiangxi, na região central da China, aprovem de bom grado um serviço de seguro recém-desenvolvido, que vincula as taxas de compensação diretamente a baixas temperaturas, poucos deles têm condições de arcar com os prêmios das apólices. Autoridades locais forneceram apoio financeiro a alguns produtores, mas consideram um desafio subsidiar um número maior.
E os sortudos que têm acesso aos subsídios do governo também têm seus próprios problemas. O rizicultor Li Ping, por exemplo, se queixou de que, com sua atual apólice, ele só consegue recuperar metade do custo de sua produção de arroz quando desastres naturais ocorrem com maior frequência. Embora ter um seguro climático seja bom, observou Li, aumentar a taxa de compensação por meio de subsídios do governo poderia torná-lo ainda melhor.
Agricultores a compram apólices contra quebras de safras resultantes de mudanças climáticas
Coco Liu e ClimateWire
Semanas antes do início da colheita no verão passado na China, os arrozais de Li Ping foram atingidos por condições meteorológicas extremas. Temperaturas de35°C literalmente assaram a aldeia de Longtan, no norte do país, durante mais de um mês, amarelando folhas e prejudicando a produção de grãos. Como resultado, a produção de arroz de Li sofreu uma quebra de 20% em comparação com anos normais.
Ainda assim, Li não teve dificuldades em levantar fundos para seu próximo plantio, como aconteceu depois de perdas de colheitas anteriores. Em vez disso, o lavrador, de 51 anos, esperou em casa até o dinheiro chegar.
“Faço seguro da minha produção de arroz desde 2009”, contou Li. “A compensação que recebi não cobriu as perdas totais, mas ela eliminou parte da pressão financeira que sofreria”.
Li Ping é um de centenas de milhões de agricultores chineses que agora utilizam o seguro como uma ferramenta para se proteger contra os riscos decorrentes das mudanças climáticas. A China é o segundo maior mercado mundial de seguro agrícola, atrás apenas dos Estados Unidos em termos de receitas de prêmios, e está lutando para estender o uso de seguros relacionados ao clima para outros setores.
As mudanças climáticas já deixaram muitas cicatrizes na sociedade chinesa. Dados da primeira estratégia nacional de adaptação às variações do clima, divulgados em 2013, mostram que eventos climáticos extremos mataram, em média, mais de 2.000 pessoas por ano desde a década de 90 e custam mais de 200 bilhões de yuans (US$ 32 bilhões) em danos econômicos diretos por ano à economia da China.
Embora o país já tenha injetado bilhões de dólares na prevenção desses danos, desastres naturais cada vez mais frequentes e intensos, provavelmente ligados às mudanças climáticas, estão forçando a nação a gastar mais.
De acordo com um estudo de 2013 do Climate Group, uma organização não governamental com sede em Londres, a China precisará de pelo menos US$ 24 bilhões por ano para ações de adaptação até 2020. Comparativamente, o orçamento nacional estimado com base em seus gastos atuais é de apenas US$ 13,5 bilhões.
Explorando forças do mercado
Para diminuir esse déficit, o governo chinês propôs expandir as finanças climáticas através das forças do mercado. Os serviços de seguro estão entre as soluções sugeridas.
Nos últimos anos, os formuladores de políticas do país já persuadiram centenas de milhões de agricultores chineses a comprar apólices de seguro agrícola. Em 2013, a iniciativa gerou uma capacidade de cobrir perdas no valor de 1,4 trilhões de yuans (US$ 225 bilhões). Os riscos climáticos são conhecidos como o maior perigo para perdas na agricultura.
“Embora o governo subsidie a aquisição de seguros, pelo menos 20% dos prêmios ainda vêm dos bolsos dos agricultores”, salientou Tuo Guozhu, um perito em seguros da Universidade Capital de Economia e Negócios, em Pequim.
“Em comparação com o auxílio dado pelo governo, portanto, o seguro climático pode reduzir o ônus financeiro nacional. E ele também pode ser usado de forma mais eficiente”, acrescentou.
Para gastar menos em compensações, as seguradoras estão empenhadas em proteger os agricultores de mudanças climáticas adversas ensinando-lhes como lidar com os padrões erráticos do clima. Elas também tentam mitigar os riscos climáticos pagando, por exemplo, por serviços artificiais de supressão de granizo.
Para as indústrias, que ainda precisam ganhar o apoio do governo enquanto já experimentam a ameaça do aquecimento global, a importância do seguro climático parece ser mais óbvia.
Em 2012, a Companhia Hidrelétrica Guangdong Meiyan Ltda., do sul da China, por exemplo, comprou uma apólice de seguro de precipitação que lhe permite exigir uma compensação de até 80 milhões de yuans (US$ 12,9 milhões) se um índice de precipitação anormalmente baixo impedir a produção (output) de suas cinco usinas hidrelétricas.
Embora uma solução desse tipo seja inédita na China, “chegamos relativamente rápido a um acordo com a Meiyan”, declarou Stuart Brown, diretor de soluções corporativas da Swiss Reinsurance Company Ltd., conhecida como Swiss Re, que formou uma parceria com uma empresa local para prestar o serviço.
“A equipe gerencial da Meiyan tem boa compreensão da solução”, observou Brown. “Eles fizeram seus próprios cálculos e descobriram que a empresa teria recebido um pagamento de seguro de mais de 17 milhões de yuans (US$ 2,7 milhões) se a apólice de seguro já estivesse em vigor em 2011”.
Escalada ascendente para um novo produto
O seguro que a geradora de energia hidrelétrica tinha obtido anteriormente podia protegê-la de danos causados por deslizamentos de terra e outros desastres naturais violentos, mas não podia ajudar em casos de perdas econômicas associadas a perigos lentamente crescentes, como um declínio de chuvas. Em 2011, as secas evaporaram quase 30% das receitas de produção de energia da empresa e esses tipos de perdas deverão aumentar acentuadamente no futuro à medida que as mudanças climáticas se tornarem mais extremas.
Outras companhias de energia também estão começando a considerar um seguro climático. No final de 2013, o desenvolvedor de um parque eólico da província de Hebei, no norte da China, assinou um contrato com a Swiss Re para se proteger contra a volatilidade do vento.
Atualmente, a empresa está trabalhando com seguradoras chinesas para desenvolver uma opção de seguro de temperatura para empresas de aquecimento distritais (urbanas), cujos lucros estão sendo impactados frequentemente por preços fixos de aquecimento e custos crescentes devido a invernos mais frios.
Embora a demanda de seguros climáticos seja forte na China, a reação negativa a esses serviços talvez seja ainda mais forte. De acordo com Brown, da Swiss Re, “muitos administradores seniores estão cientes de seus riscos meteorológicos; mas poucos fizeram uma análise quantitativa dessa exposição e de seu impacto na operação”.
Além disso, o planejamento orçamentário ao estilo chinês é outro desafio. Como explicou Brown, alguns administradores simplesmente não têm o orçamento para se proteger do clima, mesmo que estejam convencidos de que ele seria importante. “Isso é especialmente verdadeiro para algumas empresas estatais que separam estritamente a gestão de rendas e gastos. O prêmio de seguro, por exemplo, considerado como despesa, é difícil de ser aprovado mesmo que tenha a vantagem de resultar em um fluxo de caixa quando ele é mais necessário”, criticou.
Também existe a questão de quem envolver na adaptação às mudanças climáticas. Liu Xinli, professor associado do Departamento de Gestão de Riscos e Seguros da Universidade Peking, na capital chinesa, observou que a recuperação de desastres é tradicionalmente considerada uma tarefa do governo; portanto, o papel das seguradoras é amplamente ignorado — mas, aparentemente, não será mais.
Vários experimentos em andamento
Em uma coletiva de imprensa realizada em março em Pequim, Xiang Junbo, presidente da Comissão Reguladora de Seguros da China, disse a jornalistas que o governo pretende alavancar os serviços de seguros na luta contra catástrofes naturais. Para os formuladores de políticas chineses, a pressão está aumentando para que façam isso porque as indenizações pagas pelas seguradoras atualmente ajudam muitos países a cobrir de 30% a 40% de suas perdas decorrentes de desastres, enquanto essa contribuição na China é inferior a 1%.
Com isso em mente, a cidade de Shenzhen, no sul da China, recentemente lançou o primeiro plano piloto do país para seguros contra desastres, visando tufões, inundações costeiras e outras ameaças vindas do mar. O governo municipal de Shenzhen já comprou o serviço de seguro para cada um de seus cidadãos. Além disso, os habitantes da cidade também são incentivados a fazer um seguro de vida e de propriedade contra desastres naturais.
Também existem planos para reformular os termos do seguro, facilitando que empresas e cidadãos lidem com o aumento dos danos relacionados ao clima. Na província de Anhui, por exemplo, propensa ao estresse por calor, onde os rizicultores costumavam esperar meses até que as seguradoras completassem suas avaliações de danos, foi introduzido um chamado serviço de seguro de índice de temperatura em 2009. Ele permite que o processo de compensação comece imediatamente, assim que as temperaturas do ar ultrapassem um determinado limite.
Especialistas afirmam que essas inovações têm tido êxito na fase piloto, mas como ampliá-las é uma questão problemática. Embora os produtores de tangerinas da província de Jiangxi, na região central da China, aprovem de bom grado um serviço de seguro recém-desenvolvido, que vincula as taxas de compensação diretamente a baixas temperaturas, poucos deles têm condições de arcar com os prêmios das apólices. Autoridades locais forneceram apoio financeiro a alguns produtores, mas consideram um desafio subsidiar um número maior.
E os sortudos que têm acesso aos subsídios do governo também têm seus próprios problemas. O rizicultor Li Ping, por exemplo, se queixou de que, com sua atual apólice, ele só consegue recuperar metade do custo de sua produção de arroz quando desastres naturais ocorrem com maior frequência. Embora ter um seguro climático seja bom, observou Li, aumentar a taxa de compensação por meio de subsídios do governo poderia torná-lo ainda melhor.
Scientific American Brasil
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