Marcus Nakagawa*
Em fevereiro de 2003, a maior empresa de alimentos da época, mundialmente famosa, deu início a uma grande campanha de marketing que se chamava Junta Brasil. Nessa campanha, ela reuniu dois famosos apresentadores de televisão, rivais de audiência na ocasião, Gugu Liberato e Fausto Silva, para chamar os consumidores para um concurso no qual as pessoas tinham que juntar oito rótulos de embalagens de qualquer produto da marca e concorrer a uma casa por dia até o fim do ano.
AEsse concurso também era veiculado durante a principal novela na época, que tinha até um casal de idosos que sofria bullying (na época, não era este o nome, era agressão mesmo) de sua neta, casal este que juntava embalagens para concorrer a uma casa e sair da residência desta neta agressora. As casas eram sorteadas durante os programas de auditório de domingo.
No fim, o concurso recebeu um total de 51 milhões de cartas, significando o envio de 408 milhões de comprovantes de compra de produtos, e 248 casas foram entregues aos consumidores. Além de render a manutenção da posição de 1º, ou 2º lugar, no ranking de valor de marca em 96% das categorias nas quais a empresa atuava, sendo que ela continuou líder em 52% delas.
VISÕES
As campanhas de marketing e comunicação, se bem pensadas e planejadas, podem mobilizar muitas pessoas para comprar produtos, serviços e fazer com que as empresas lucrem com este investimento. No entanto, e se usarmos essas ferramentas para as questões sociais, ambientais e buscarmos mudanças de comportamento sustentável? Isso também é possível?
Segundo o “papa” do marketing, Philips Kotler, isso é possível, sim, por meio do marketing social, que é o “uso de princípios e técnicas de marketing para influenciar um público-alvo a voluntariamente aceitar, rejeitar, modificar ou abandonar um comportamento em benefício de indivíduos, grupos, ou da sociedade como um todo”.
Uma ação realizada há algum tempo numa novela, também da principal emissora do País, fez com que aumentasse a doação de medula óssea em 4.400% de novembro de 2000 a janeiro de 2001, fazendo a média de cadastrados pular de 20 para 900 por mês. Uma personagem da novela apareceu com leucemia e somente a doação de medula poderia salvá-la. E numa cena comovente que parou o País, essa belíssima atriz raspou as suas lindas madeixas “ao vivo”, para realizar o tratamento da doença. Alguns capítulos depois, encontrou finalmente um doador e viveu “feliz para sempre”.
Contudo, como podemos viver “feliz para sempre”, sabendo que amanhã poderá faltar água para o nosso banho matinal, ou para escovar nossos dentes? Ou ainda para dar descarga no banheiro? Sabendo que as reservas aquíferas que abastecem muitas cidades não foram gerenciadas de forma planejada, ou que a conta de água aumentará significativamente?
Sim, caso não chova o necessário, passaremos por mais uma crise relacionada a algumas necessidades básicas que temos na nossa sociedade moderna, assim como foi a crise energética alguns anos atrás. Podemos fazer algumas “danças da chuva”, ou qualquer outra mandinga popular. Ou teremos que fazer uma grande economia e mudar o nosso comportamento (alguns já estão tendo que fazer isso forçadamente no interior paulista e em algumas regiões metropolitanas de São Paulo).
Temos que diminuir os banhos, dar menos descargas, escovar os dentes de torneira fechada, lavar louça de uma só vez e, de preferência, com um balde, entre outras ações que estamos escutando, ou sempre escutamos e às quais nunca prestamos atenção.
E é aí que está o problema: como comunicar, mobilizar e fazer com que essa população mude o comportamento? Na dor, ou no amor? Na dor, será efetivamente com a falta de água, ou com o aumento exacerbado da conta de consumo. No amor, poderá ser com campanhas de marketing social, incentivando e ensinando a população a diminuir o seu consumo, ou ter o seu consumo conscientemente.
"Sim, caso não chova o necessário, passaremos por mais uma crise relacionada a algumas necessidades básicas que temos na nossa sociedade moderna, assim como foi a crise energética alguns anos atrás."
IDEIAS
Estou clamando, aqui, por uma campanha criativa, incentivadora, legal, enfim, que as pessoas realmente participem, que os consumidores de água realmente tenham consciência, sejam eles da classe AAA, sejam eles da classe C e D.
Algumas campanhas que viraram “memes” nas redes sociais, como o balde gelado na cabeça, a menina menor de idade que ia casar forçadamente, ou o faça xixi no banho, da SOS Mata Atlântica, podem ser muito bem explorados. No caso da campanha de fazer xixi no banho, esta não teve nenhum investimento em mídia, porém gerou um retorno espontâneo de mais de US$ 20 milhões em mídia, contando aparições do tema em grandes programas de auditório, reportagens de jornais, internet, mídias sociais, isso tudo no Brasil e internacionalmente. A campanha era exatamente sobre a economia de água, incentivando as pessoas a fazer xixi no banho, para economizar pelo menos uma descarga por dia.
PENSAMENTO POSITIVO
Esperamos que o Poder Público, os marqueteiros e os publicitários de plantão possam se lembrar dessa poderosa ferramenta, que ativará outras mídias e ações. E que, principalmente, não seja mais uma crise ambiental e de consumo, mas que os aprendizados deste momento prossigam durante muito tempo em nosso país e que continuemos sempre economizando água. Como aprendemos e zemos com a energia, depois dos apagões de anos atrás.
*MARCUS NAKAGAWA é sócio-diretor da iSetor; professor da ESPM; idealizador e presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira dos Pro ssionais de Sustentabilidade (Abraps); e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida.
Revista GeografiaEm fevereiro de 2003, a maior empresa de alimentos da época, mundialmente famosa, deu início a uma grande campanha de marketing que se chamava Junta Brasil. Nessa campanha, ela reuniu dois famosos apresentadores de televisão, rivais de audiência na ocasião, Gugu Liberato e Fausto Silva, para chamar os consumidores para um concurso no qual as pessoas tinham que juntar oito rótulos de embalagens de qualquer produto da marca e concorrer a uma casa por dia até o fim do ano.
AEsse concurso também era veiculado durante a principal novela na época, que tinha até um casal de idosos que sofria bullying (na época, não era este o nome, era agressão mesmo) de sua neta, casal este que juntava embalagens para concorrer a uma casa e sair da residência desta neta agressora. As casas eram sorteadas durante os programas de auditório de domingo.
No fim, o concurso recebeu um total de 51 milhões de cartas, significando o envio de 408 milhões de comprovantes de compra de produtos, e 248 casas foram entregues aos consumidores. Além de render a manutenção da posição de 1º, ou 2º lugar, no ranking de valor de marca em 96% das categorias nas quais a empresa atuava, sendo que ela continuou líder em 52% delas.
VISÕES
As campanhas de marketing e comunicação, se bem pensadas e planejadas, podem mobilizar muitas pessoas para comprar produtos, serviços e fazer com que as empresas lucrem com este investimento. No entanto, e se usarmos essas ferramentas para as questões sociais, ambientais e buscarmos mudanças de comportamento sustentável? Isso também é possível?
Segundo o “papa” do marketing, Philips Kotler, isso é possível, sim, por meio do marketing social, que é o “uso de princípios e técnicas de marketing para influenciar um público-alvo a voluntariamente aceitar, rejeitar, modificar ou abandonar um comportamento em benefício de indivíduos, grupos, ou da sociedade como um todo”.
Uma ação realizada há algum tempo numa novela, também da principal emissora do País, fez com que aumentasse a doação de medula óssea em 4.400% de novembro de 2000 a janeiro de 2001, fazendo a média de cadastrados pular de 20 para 900 por mês. Uma personagem da novela apareceu com leucemia e somente a doação de medula poderia salvá-la. E numa cena comovente que parou o País, essa belíssima atriz raspou as suas lindas madeixas “ao vivo”, para realizar o tratamento da doença. Alguns capítulos depois, encontrou finalmente um doador e viveu “feliz para sempre”.
Contudo, como podemos viver “feliz para sempre”, sabendo que amanhã poderá faltar água para o nosso banho matinal, ou para escovar nossos dentes? Ou ainda para dar descarga no banheiro? Sabendo que as reservas aquíferas que abastecem muitas cidades não foram gerenciadas de forma planejada, ou que a conta de água aumentará significativamente?
Sim, caso não chova o necessário, passaremos por mais uma crise relacionada a algumas necessidades básicas que temos na nossa sociedade moderna, assim como foi a crise energética alguns anos atrás. Podemos fazer algumas “danças da chuva”, ou qualquer outra mandinga popular. Ou teremos que fazer uma grande economia e mudar o nosso comportamento (alguns já estão tendo que fazer isso forçadamente no interior paulista e em algumas regiões metropolitanas de São Paulo).
Temos que diminuir os banhos, dar menos descargas, escovar os dentes de torneira fechada, lavar louça de uma só vez e, de preferência, com um balde, entre outras ações que estamos escutando, ou sempre escutamos e às quais nunca prestamos atenção.
E é aí que está o problema: como comunicar, mobilizar e fazer com que essa população mude o comportamento? Na dor, ou no amor? Na dor, será efetivamente com a falta de água, ou com o aumento exacerbado da conta de consumo. No amor, poderá ser com campanhas de marketing social, incentivando e ensinando a população a diminuir o seu consumo, ou ter o seu consumo conscientemente.
"Sim, caso não chova o necessário, passaremos por mais uma crise relacionada a algumas necessidades básicas que temos na nossa sociedade moderna, assim como foi a crise energética alguns anos atrás."
IDEIAS
Estou clamando, aqui, por uma campanha criativa, incentivadora, legal, enfim, que as pessoas realmente participem, que os consumidores de água realmente tenham consciência, sejam eles da classe AAA, sejam eles da classe C e D.
Algumas campanhas que viraram “memes” nas redes sociais, como o balde gelado na cabeça, a menina menor de idade que ia casar forçadamente, ou o faça xixi no banho, da SOS Mata Atlântica, podem ser muito bem explorados. No caso da campanha de fazer xixi no banho, esta não teve nenhum investimento em mídia, porém gerou um retorno espontâneo de mais de US$ 20 milhões em mídia, contando aparições do tema em grandes programas de auditório, reportagens de jornais, internet, mídias sociais, isso tudo no Brasil e internacionalmente. A campanha era exatamente sobre a economia de água, incentivando as pessoas a fazer xixi no banho, para economizar pelo menos uma descarga por dia.
PENSAMENTO POSITIVO
Esperamos que o Poder Público, os marqueteiros e os publicitários de plantão possam se lembrar dessa poderosa ferramenta, que ativará outras mídias e ações. E que, principalmente, não seja mais uma crise ambiental e de consumo, mas que os aprendizados deste momento prossigam durante muito tempo em nosso país e que continuemos sempre economizando água. Como aprendemos e zemos com a energia, depois dos apagões de anos atrás.
*MARCUS NAKAGAWA é sócio-diretor da iSetor; professor da ESPM; idealizador e presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira dos Pro ssionais de Sustentabilidade (Abraps); e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida.
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