Países desenvolvidos exportam emissões de carbono
"NEW YORK TIMES"
Durante sua vida útil, o iPhone 5S emite o equivalente a 70 kg de dióxido de carbono. A boa notícia: isso é 4 kg a menos do que o iPhone 5.
Seja como for, cerca de três quartos desse dióxido de carbono são considerados de responsabilidade não dos Estados Unidos, mas de lugares como China, Taiwan, Coreia do Sul e Mongólia Interior (região autônoma da China), onde o telefone e seus componentes são fabricados.
A globalização –a qual, no processo de "exportar" produção e emprego dos países ricos para os pobres, "exportou" também o dióxido de carbono emitido para a fabricação dos produtos- adiciona um novo aspecto à alocação das responsabilidades pela emissão de carbono na atmosfera: será que essas emissões devem ser de responsabilidade dos países fabricantes ou dos países para os quais os produtos se destinam?
Dois anos atrás, algumas das localidades mais ambientalmente corretas dos EUA solicitaram à seção americana do Instituto Ambiental de Estocolmo que calculasse suas emissões de carbono. Em vez de contabilizar o carbono que produziam, elas queriam um inventário das emissões geradas na fabricação, no transporte, na utilização e na eliminação do que é consumido nesses lugares.
O resultado surpreendeu. San Francisco, por exemplo, gerou em 2008 apenas 8 milhões de toneladas de CO2 ou equivalente. O consumo da cidade, por outro lado, acrescentou quase 22 milhões de toneladas de carbono à atmosfera. Usando medições baseadas no consumo, as emissões do Oregon saltaram em 2005 de 53 milhões para 78 milhões de toneladas. "As pessoas que nos contrataram se viam como muito 'verdes' e inovadoras", disse Frank Ackerman, que na época chefiava o Grupo de Economia Climática da entidade nos EUA. "Eles achavam que, por terem boas iniciativas em andamento, teriam um resultado menor, apesar de muitos dos produtos industriais por eles consumidos serem fabricados no exterior."
O foco no consumo faz sentido. Compreender o seu impacto sobre a mudança climática é um primeiro passo necessário para que as pessoas e as cidades, grandes ou pequenas, tomem medidas concretas para reduzir as emissões de carbono. Este novo tipo de cálculo, no entanto, pode ter um efeito imprevisto sobre a política internacional de mudança climática, deslocando a responsabilidade em escala global.
Enquanto a concentração de CO2 disparou no primeiro semestre de 2013 para o seu maior nível desde que os mastodontes vagavam pela Terra, há 3 milhões de anos, as Nações Unidas, contrariando todas as probabilidades, esperam que 2014 finalmente traga os avanços necessários para que as grandes nações cuspidoras de carbono cheguem a um acordo sobre um plano climático até 2015.
"Desafio os senhores a trazer promessas ousadas para a cúpula", disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, ao convidar líderes mundiais para uma reunião em setembro próximo, em Nova York.
Um estudo publicado há dois anos na revista "PNAS", da Academia Nacional de Ciências dos EUA, observou que, entre 1990 e 2008, a globalização exportou o equivalente a 1,2 bilhão de toneladas de emissões de carbono por ano do mundo desenvolvido para nações em desenvolvimento.
Cálculos com critérios estritamente geográficos dão a impressão de que os países industriais avançados conseguiram estabilizar suas emissões de carbono.
Mas eles apenas transferiram o aumento para fora das suas fronteiras. As emissões de carbono criadas pelo consumo dos americanos são cerca de 8% superiores às emissões produzidas nos EUA, de acordo com os cientistas do Projeto Global do Carbono. Por outro lado, cerca de um quinto das emissões da China são de produtos consumidos fora de suas fronteiras.
A União Europeia, satisfeita com seus resultados ambientais nos cálculos habituais, com base no lugar onde o carbono é emitido, parece menos virtuosa sob uma lente baseada no consumo. Em 2011, os europeus emitiram apenas 3,6 bilhões de toneladas de CO2, mas 4,8 bilhões de toneladas foram jogados na atmosfera para a produção das coisas que os europeus consumiram.
Aqui está o dilema. A abordagem habitual, a qual está sendo considerada para contabilizar o custo do carbono "comercializado", consistiria em taxar as emissões registradas nas fronteiras. Não surpreende que países exportadores, como a China, não gostem dessa abordagem.
Um estudo recente corroborou a imposição de um imposto de carbono sobre as importações. Mas "a China tem tudo a perder", disse Glen Peters, do Centro para o Clima Internacional e a Pesquisa Ambiental, em Oslo. "Se a China trouxesse isso para as negociações, estaria permitindo que os EUA e Europa regulamentassem as exportações chinesas."
Outra pesquisa concluiu que a imposição de uma penalidade na fronteira incentivaria a China e outros países em desenvolvimento a tributarem suas próprias emissões de carbono –ficando com o dinheiro– em vez de deixar que outros as tributem. Mas, se o mundo quiser evitar uma mudança climática catastrófica, alguém –em algum lugar– deve arcar com o custo de consumir menos carbono. E ninguém está se voluntariando.
"NEW YORK TIMES"
Durante sua vida útil, o iPhone 5S emite o equivalente a 70 kg de dióxido de carbono. A boa notícia: isso é 4 kg a menos do que o iPhone 5.
Seja como for, cerca de três quartos desse dióxido de carbono são considerados de responsabilidade não dos Estados Unidos, mas de lugares como China, Taiwan, Coreia do Sul e Mongólia Interior (região autônoma da China), onde o telefone e seus componentes são fabricados.
A globalização –a qual, no processo de "exportar" produção e emprego dos países ricos para os pobres, "exportou" também o dióxido de carbono emitido para a fabricação dos produtos- adiciona um novo aspecto à alocação das responsabilidades pela emissão de carbono na atmosfera: será que essas emissões devem ser de responsabilidade dos países fabricantes ou dos países para os quais os produtos se destinam?
Dois anos atrás, algumas das localidades mais ambientalmente corretas dos EUA solicitaram à seção americana do Instituto Ambiental de Estocolmo que calculasse suas emissões de carbono. Em vez de contabilizar o carbono que produziam, elas queriam um inventário das emissões geradas na fabricação, no transporte, na utilização e na eliminação do que é consumido nesses lugares.
O resultado surpreendeu. San Francisco, por exemplo, gerou em 2008 apenas 8 milhões de toneladas de CO2 ou equivalente. O consumo da cidade, por outro lado, acrescentou quase 22 milhões de toneladas de carbono à atmosfera. Usando medições baseadas no consumo, as emissões do Oregon saltaram em 2005 de 53 milhões para 78 milhões de toneladas. "As pessoas que nos contrataram se viam como muito 'verdes' e inovadoras", disse Frank Ackerman, que na época chefiava o Grupo de Economia Climática da entidade nos EUA. "Eles achavam que, por terem boas iniciativas em andamento, teriam um resultado menor, apesar de muitos dos produtos industriais por eles consumidos serem fabricados no exterior."
O foco no consumo faz sentido. Compreender o seu impacto sobre a mudança climática é um primeiro passo necessário para que as pessoas e as cidades, grandes ou pequenas, tomem medidas concretas para reduzir as emissões de carbono. Este novo tipo de cálculo, no entanto, pode ter um efeito imprevisto sobre a política internacional de mudança climática, deslocando a responsabilidade em escala global.
Enquanto a concentração de CO2 disparou no primeiro semestre de 2013 para o seu maior nível desde que os mastodontes vagavam pela Terra, há 3 milhões de anos, as Nações Unidas, contrariando todas as probabilidades, esperam que 2014 finalmente traga os avanços necessários para que as grandes nações cuspidoras de carbono cheguem a um acordo sobre um plano climático até 2015.
"Desafio os senhores a trazer promessas ousadas para a cúpula", disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, ao convidar líderes mundiais para uma reunião em setembro próximo, em Nova York.
Um estudo publicado há dois anos na revista "PNAS", da Academia Nacional de Ciências dos EUA, observou que, entre 1990 e 2008, a globalização exportou o equivalente a 1,2 bilhão de toneladas de emissões de carbono por ano do mundo desenvolvido para nações em desenvolvimento.
Cálculos com critérios estritamente geográficos dão a impressão de que os países industriais avançados conseguiram estabilizar suas emissões de carbono.
Mas eles apenas transferiram o aumento para fora das suas fronteiras. As emissões de carbono criadas pelo consumo dos americanos são cerca de 8% superiores às emissões produzidas nos EUA, de acordo com os cientistas do Projeto Global do Carbono. Por outro lado, cerca de um quinto das emissões da China são de produtos consumidos fora de suas fronteiras.
A União Europeia, satisfeita com seus resultados ambientais nos cálculos habituais, com base no lugar onde o carbono é emitido, parece menos virtuosa sob uma lente baseada no consumo. Em 2011, os europeus emitiram apenas 3,6 bilhões de toneladas de CO2, mas 4,8 bilhões de toneladas foram jogados na atmosfera para a produção das coisas que os europeus consumiram.
Aqui está o dilema. A abordagem habitual, a qual está sendo considerada para contabilizar o custo do carbono "comercializado", consistiria em taxar as emissões registradas nas fronteiras. Não surpreende que países exportadores, como a China, não gostem dessa abordagem.
Um estudo recente corroborou a imposição de um imposto de carbono sobre as importações. Mas "a China tem tudo a perder", disse Glen Peters, do Centro para o Clima Internacional e a Pesquisa Ambiental, em Oslo. "Se a China trouxesse isso para as negociações, estaria permitindo que os EUA e Europa regulamentassem as exportações chinesas."
Outra pesquisa concluiu que a imposição de uma penalidade na fronteira incentivaria a China e outros países em desenvolvimento a tributarem suas próprias emissões de carbono –ficando com o dinheiro– em vez de deixar que outros as tributem. Mas, se o mundo quiser evitar uma mudança climática catastrófica, alguém –em algum lugar– deve arcar com o custo de consumir menos carbono. E ninguém está se voluntariando.
Folha de S.Paulo
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