quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Petróleo e Alimentos


Uma das questões mais importantes, de tantas que assombram os economistas, é entender o fantástico aumento dos preços do petróleo, dos metais e dos alimentos, que produz uma inflação planetária. O petróleo é o mais ubíquo dos fatores de produção e seus preços (e dos derivados) são custos em todo o sistema produtivo, particularmente na produção agrícola. Por isso, a elevação dos preços do petróleo e dos alimentos, que a rigor é uma mudança de preços relativos, tem um poder desestabilizador capaz de alterar o equilíbrio econômico e social da sociedade.


Uma tentativa de organizar o pensamento em torno dessas questões é apresentada no gráfico, no qual se busca esclarecer a estreita ligação entre os preços do petróleo e dos alimentos. A oferta de energia é a soma da energia não renovável (petróleo, gás natural, carvão mineral e urânio) com a renovável (hidráulica, etanol, biocombustível, lenha, carvão vegetal e eólica). A demanda de energia é gerada pelo crescimento da renda per capita, pelo crescimento da população e por sua concentração urbana. Elas determinam o preço da energia (PE). Este, por sua vez, cria as condições para o desenvolvimento da energia não renovável, estimulando a pesquisa de novas energias que aumentem a oferta e promovendo a economia de energia que reduz a demanda.

O preço da energia influencia diretamente os custos agrícolas, por meio do preço do combustível para mover o equipamento agrícola, o transporte e o uso de fertilizantes. O preço agrícola (PA) é determinado: 1. Pela demanda agrícola, determinada pelos mesmos fatores que controlam a demanda de energia. 2. Pela oferta agrícola, surgida da produtividade da terra (fertilizantes, pesquisa genética e tecnológica), pela produtividade da mão-de-obra (educação, saúde e capital) e pela disponibilidade de água e de terra.

Há ainda duas ligações importantes: 1. A demanda de energia exerce, certamente, alguma influência sobre as mudanças climáticas, o que condiciona a disponibilidade de água. Por exemplo: uma parte importante das dificuldades da oferta de alimentos atual deve-se a problemas climáticos na Austrália, Nova Zelândia, EUA, Canadá, Ucrânia e Eurolândia, o que ajudou a reduzir os estoques. 2. No resto do mundo, a demanda de energia renovável desvia a oferta agrícola para biocombustíveis. A exceção é o Brasil.

O conhecimento dessas múltiplas e complicadas ligações talvez seja útil para colocar o problema da inflação planetária em uma perspectiva mais adequada. O importante, entretanto, é reconhecer que ela é, basicamente, resultado de um desequilíbrio físico entre a oferta e a procura, particularmente no caso do petróleo, que não teve investimento nos últimos anos e foi consumida toda a capacidade ociosa do setor.

O produto cujos preços cresceram por uma mudança estrutural no seu uso é o milho, em razão da desesperada busca de autonomia energética pelos EUA. Eles produzem pouco menos que 40% da produção mundial (300 milhões de toneladas na safra 2007/08, enquanto o Brasil produz 57 milhões) e usam quase 30% para produzir etanol. Restam para o mercado de milho apenas 219 milhões de toneladas. A oferta mundial de milho, nos últimos cinco anos, tem crescido à taxa de 2,8% ao ano, enquanto a demanda aumenta cerca de 3,8%.

Sem o uso do milho para etanol, a oferta mundial para o mercado cresceria pouco mais de 4% ao ano. Nos EUA, a produção de “milho-livre” disponível para o mercado tem decrescido 1% ao ano desde a safra 2002/2003, com graves conseqüências sobre os preços dos seus derivados. Lá, entre julho de 2006 e julho de 2008, o preço do milho subiu 200%. O mesmo, mas em menor escala, tem ocorrido na Europa, com a produção do biodiesel de colza, trigo e beterraba. Certamente, não é isso que ocorre no Brasil, como os europeus têm afirmado. (carta capital - Delfim Neto)
08-08-2008

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