domingo, 23 de janeiro de 2011

A utilização dos ditos populares e a observação do tempo e do clima


A atual realidade escolar no Brasil demonstra que o ensino de climatologia não tem sido desenvolvido no ensino fundamental II, ou, quando ocorre, é ministrado baseado na climatologia tradicional e separativa, cujos fatores elementos do clima são analisados individualmente, retratando-se a natureza de forma estática e totalmente destituída do real

Por Diego Corrêa Maia

ENSINO DE CLIMATOLOGIA ESCOLAR NA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL II

Por meio da observação dos elementos do clima, pretende-se demonstrar que o aprendizado dos "conteúdos climatológicos" pode ser auxiliado por meio dos ditos populares. O que se almeja aqui é demonstrar que, a partir da observação espontânea (diária) do tempo e do clima, com o auxílio dos ditos populares, os alunos do Ensino Fundamental II podem compreender as relações do tempo e do clima, assim como sua previsão. É necessário para essa atividade um período contínuo de observação para estabelecer a sequência habitual dos tipos de tempo de uma determinada estação do ano. O modo popular de prever o tempo foi iniciado quando o homem se fixou em cavernas; no entanto, esse hábito vem se perdendo em função da urbanização da sociedade. Para reforçar a importância dos provérbios populares para prever o tempo, realizar-se-á um pequeno histórico do nascimento da meteorologia popular, até a sua relevância destacada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Geografia.


Uma disciplina descritiva e de memorização

Durante muito tempo a Geografia foi considerada uma disciplina descritiva e de memorização, na qual o conhecimento geográfico foi repassado ao aluno de forma fragmentada e hierárquica, resultando no insucesso do processo de ensino e de aprendizagem. Essa postura tradicional que visualiza o professor como um mero transmissor de informações precisa ser rompida por meio de novas práticas pedagógicas, para não tornar o ensino de Geografia enfadonho e desinteressante.

A renovação do ensino de Geografia, segundo Kaercher, será alcançada na medida em que o professor tenha uma formação plena, que leve em conta a integração do conhecimento geográfico e pedagógico do ensino escolar.

Diante desse panorama do ensino de Geografia, os alunos ainda demonstram grande dificuldade de compreensão e assimilação de alguns temas geográficos; dentre eles, o tema clima é aquele pela qual a maioria dos alunos nutre menos simpatia.

No âmbito escolar, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) destacam a necessidade de inserção do tema clima, sugerindo o uso da percepção empírica sobre a sucessão dos tipos de tempo.

Por meio da utilização dos ditos populares e da observação sensível das nuvens, é possível contribuir para o fortalecimento da Climatologia Escolar no Ensino Fundamental. No entanto, é preciso se precaver para não fazer uso de "atos de fé" ou provérbios populares propagados por alguns professores de Geografia, os quais interpretam certos ditos populares que preveem o tempo de forma equivocada. Um exemplo corriqueiro exprime-se quando o professor de Geografia, ao ser questionado sobre a razão pela qual a tonalidade do céu é azul, diz que o fenômeno é gerado pela reflexão das águas dos oceanos. Sem dúvida esse é um legítimo ato de fé com potencial de reprodução nas futuras gerações. Vale ressaltar, a própria radiação solar e sua interação com o sistema Terra-atmosfera é um conteúdo praticamente ignorado nos bancos escolares, na maioria das escolas brasileiras.

Para contribuir para a melhoria do ensino da Climatologia no Ensino Fundamental II, pretende-se reunir e sistematizar novas possibilidades de prática de ensino voltadas para a formação de professores e alunos, utilizando para isso a observação sensível das nuvens auxiliada pela previsão do tempo evocada pelos anexins populares.

A produção do material "experimental" chamado O Tempo e o Clima. Esse material foi destinado para atender os alunos dos Ensinos Médio e Superior, acerca de conhecimentos básicos de dinâmica atmosférica. O objetivo principal do material didático foi a modificação da atitude do professor em relação ao ensino de Climatologia, tornando-o mais efetivo e relevante para o aluno. O material era constituído de um kit (um livro-texto mais um livro-guia, para o professor). Desde então, já se passaram quase duas décadas e nenhum outro material relacionado à Climatologia foi elaborado; e sequer este mesmo, de iniciativa da FUNBEC, veio a ser aperfeiçoado ou atualizado - o que seria imprescindível, em se tratando de um material didático datado da década de 80.

Em 1990 foi realizado o I Simpósio Brasileiro de Climatologia Geográfica na Universidade Estadual Paulista, Campus de Rio Claro. Desde então, trabalhos no âmbito climatológico vêm ganhando importância no cenário brasileiro. Nesse simpósio foram publicados 74 trabalhos científicos, sendo que apenas um esteve diretamente interessado pela questão do clima e seu ensino (Fialho; Azevedo, 2004).

Uma tal ausência de trabalhos voltados para o ensino de Climatologia ainda se repetiria nos encontros ocorridos em Presidente Prudente/SP (1996, com quatro trabalhos publicados), em Salvador/BA (1998, quatro), no Rio de Janeiro/RJ (2000, sete), em Curitiba/PR (2002, oito), em Aracaju/SE (2004, dez). Durante os doze anos delimitados pelos seis Simpósios de Climatologia Geográfica, foram publicados, ao todo, 744 trabalhos das diversas áreas da Climatologia; todavia, apenas 34 deles concernentes ao ensino (4,5% do total) - o que sinaliza uma preocupação restrita com este tema, a bem dizer tão profícuo e, no entanto, carente de trabalhos que reflitam sobre possibilidades didáticas. Outro problema do ensino de Climatologia diz respeito aos livros didáticos, cujos conteúdos aparecem como um somatório de informações variadas a serem memorizadas, retratando o clima como estado médio da atmosfera. Enfatizando essa ideia sobre as abordagens climáticas contidas nos livros didáticos, segundo Pontushka (1997, p. 217, parêntese nosso) são "raros os livros (didáticos) de 1° grau (atual fundamental II) que trabalham com massas de ar". Esses pressupostos reforçam a necessidade de enfocarmos o clima por meio da dinâmica atmosférica.

Para ser mais bem compreendida, a Geografia, segundo Kaercher, pode utilizar diferentes linguagens. Por exemplo, a partir do "uso da Literatura, da Pintura, da Música, dos relatos não acadêmicos, de imagens cotidianas, de fala dos populares etc." (Kaercher, 2004 p. 249, grifo nosso). O autor comenta sobre a importância de os professores de Geografia dominarem a "Geografia mais acadêmica, formal"; no entanto, sustenta que esta não é a melhor e mais completa. O autor complementa afirmando que o processo de ensino-aprendizagem na Geografia necessitaria de outros instrumentos que auxiliassem as formas de ver o mundo.


METODOLOGIA DA ATIVIDADE PARA O 7° ANO (6° SÉRIE) DO ENSINO FUNDAMENTAL II
Inicialmente, propõe-se que essa atividade seja aplicada ao 7° ano do Ensino Fundamental II, porém cabe ao professor escolher o momento certo para encaixá-la ou aplicá-la em séries posteriores, inclusive no Ensino Médio. A atividade a ser submetida aos alunos do Ensino Fundamental II compreenderá dois estágios básicos, sendo o primeiro a apresentação aos alunos dos principais tipos de nuvens, por meio de fotografias, slides, imagens e da observação desses hidrometeoros; em seguida, serão utilizados os ditos populares como ferramenta na previsão do tempo e do clima (no caso em questão, trabalhar-se-á com dois ditos). Vale lembrar que os alunos devem ter assimilado as noções de tempo e clima, para que a atividade seja proveitosa e as etapas possam ser alteradas em sua ordem, tornando a atividade flexível conforme a decisão do professor.

A duração dessa atividade pode se estender por dois meses, conforme a carga horária das aulas de Geografia. Deve-se sempre ter como linha norteadora a integração dos elementos (pressão atmosférica, temperatura, vento e umidade) e suas interações com as atividades rotineiras dos alunos.


CONHECENDO OS HIDROMETEOROS: AS NUVENS
O conhecimento das fases da água e suas mudanças de estado é necessário para realizar essa atividade. Esse conteúdo pode ser trabalhado pelo professor de Ciências, enquanto o professor de Geografia apresenta os principais tipos de nuvens no que se refere às altitudes em que elas se encontram e sua configuração, desenvolvendo, assim, um projeto multidisciplinar. É preciso assimilar a noção de dez nuvens, conforme demonstra a figura 1 e as tabelas 1 e 2.


Figura 1 Os principais tipos de nuvens (Fonte: GRIMM, 2010, modificado pelos autores)


Figura 2 Nuvem de baixa altitude (nível do solo), chamada cientificamente stratus e conhecida popularmente como nevoeiro (FONTE: MASTER - IAG, 2010)

Ademais, a classificação das nuvens pode ser feita segundo altura e forma, conforme se pode observar na figura 1.

As nuvens são classificadas, segundo Mendonça e Danni-Oliveira, conforme a altura de sua base em relação ao solo, sendo divididas em três categorias: nuvens altas, nuvens médias e nuvens baixas, conforme tabelas 1 e 2.


Tabela 1 Família de nuvens conforme a altitude e formato
(Fonte: Mmendonça e Ddanni-Ooliveira, 2007, p. 69 apud Vvide, 1991)

As nuvens baixas nas regiões tropicais não ultrapassam 2 quilômetros de altura em relação ao solo (figura 1 e tabelas 1 e 2). A família de nuvens "mais" comuns são aquelas de desenvolvimento vertical granulosas, com aparência semelhante a uma "bigorna", denominada cientificamente de Cumulonimbos (Cb) (figura 1 e tabelas 1 e 2). Esse tipo de nuvem provoca chuvas fortes, trovoadas e granizo, e convém destacar que esse tipo de nuvem é o "terror" dos aeronavegantes, atingindo grandes altitudes, chegando 6 a 10 quilômetros de extensão vertical. Da mesma família das nuvens baixas, os Cumulus são conhecidas como nuvens de "bom tempo" e se apresentam dispersas pela atmosfera (figuras 1 e tabelas 1 e 2). Também da família das nuvens baixas, têm-se as nuvens estratificadas, denominadas de Stratus (St) e o Nimbostratus (Ns), responsáveis pelos chuviscos e até neve nas regiões temperadas e glaciais (figura 1 e tabelas 1 e 2). Os Stratocumulus (Sc) são as nuvens que finalizam a família das nuvens baixas, aparentando um aspecto granuloso-estratificado que ocasionalmente é responsável pela "chuva rala" (figura 1 e tabelas 1 e 2). Presentes na baixa troposfera, geralmente formadas junto ao solo ou perto dele, têm-se as nuvens estratiformes, conhecidas como névoas e nevoeiros (figura 2). O primeiro é menos intenso e, em comparação com o segundo, possibilita mais a visão. Os nevoeiros acarretam muitos problemas aos gerenciadores de transportes rodoviários, marítimos e terrestres em virtude do perigo de acidentes.

As nuvens de média altitude estão situadas acima de 2 quilômetros e abaixo dos 7 quilômetros de altitude (figura 1 e tabelas 1 e 2). Nesse patamar da troposfera, têm-se os Altostratus (As) e Altocumulus (AC), no qual se destacam pelo formato estratificado e granuloso-estratificado, respectivamente (figura 1 e tabelas 1 e 2). Essa família de nuvens responde pelas chuvas fracas e pelas coroas lunares.

As nuvens cuja base está a mais de 7 mil metros da superfície terrestre e se enquadram na troposfera superior, conhecidas como nuvens altas (figura 1 e tabelas 1 e 2), são consideradas verdadeiros "postes de sinalização" das condições do tempo, principalmente os Cirros (Ci), com aspectos fibrosos e ondulados. Os Cirrocumulus (Cc) são nuvens altas com aparência fibrosa e granulosa. Finalizando a família das nuvens altas, temos os Cirrostratus (Cs), apresentando feições fibrosas e estratificadas, responsáveis pelos halos solares e lunares (figura 1 e tabelas 1 e 2).

O surgimento dos ditos populares

Desde o início da civilização as observações das condições atmosféricas foram utilizadas para a sobrevivência da espécie humana. Por meio da direção do vento, o caçador primitivo era conduzido a seguir seu destino, conforme relata Wolfe (1963, p. 7-8): "Se tomasse a direção exata, poderia caçar o tigre-de-sagre ou o mamute; se errasse, arriscava-se a passar um dia de fome na sua caverna".

Considerado o pai da Meteorologia, Aristóteles (nascido em 384 A.C.) foi um dos pensadores mais brilhantes de sua época, cujo pensamento alicerçou o cristianismo. Escreveu um livro que nomeou justamente de Meteorologia, cujo significado é "coisas acima da Terra". Sem o auxílio de pluviômetro, termômetro e barômetro, Aristóteles postulou explicações sobre a gênese dos fenômenos climáticos que hoje sabemos estarem equivocadas, tais como a suposição de que a origem dos ventos do Mediterrâneo estaria associada aos tremores de terra. No entanto, foi o primeiro a afirmar que a Lua e o Sol, quando estão envolvidos com um anel, indicam mudança de tempo.


Teofrasto
Filósofo grego, considerado por muitos como o único botânico da Antiguidade, nasceu por volta de 372 a.C. na ilha de Lesbos, e morreu cerca de 288 a.C. O seu verdadeiro nome seria Tirtamos, mas Aristóteles o apelidou Teofrasto, nome que significa "o que tem eloquência divina", pelo qual ficou conhecido.


A obra de Aristóteles não fez sucesso entre os agricultores, pescadores e os habitantes da Grécia, já que eles necessitavam saber sobre as condições do tempo para as próximas horas ou para o dia seguinte. A partir dessa necessidade, um jovem estudioso do tempo chamado Teofrasto, discípulo de Aristóteles, com o auxílio dos ensinamentos sobre o tempo herdados dos babilônios, escreveu um livro intitulado Livro dos Sinais. Esse livro, segundo Wolfe (1963, p. 17-18), "mencionava oito maneiras diferentes para prever a chuva, 24 para tempo limpo, 45 para ventos, cinquenta para tempestades e sete que ajudaram a prever o tempo com um ano de antecedência".

O livro de Teofrasto, por sua vez, fez sucesso entre os gregos. Assim como Aristóteles, Teofrasto também cometeu erros e acertos sobre a previsão do tempo, por meio dos seus provérbios e adágios. Um provérbio curioso de Teofrasto sobre a previsão de uma tempestade discorre sobre o comportamento do burro na previsão do tempo:"Quando um burro abana as orelhas é sinal de tempestade". Porém, Teofrasto estava correto em sua previsão sobre as condições atmosféricas quando descrevia: "Depois de um nevoeiro há poucas possibilidades de chover" (Wolfe, 1963).


Semiárido brasileiro
A região semiárida brasileira é uma das maiores, mais populosas e mais úmidas do mundo. Estende-se por 868 mil quilômetros, abrangendo o norte dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, os sertões da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e uma parte do sudeste do Maranhão. Vivem nessa região mais de 18 milhões de pessoas, sendo 8 milhões na área rural. A precipitação pluviométrica é de 750 milímetros anuais, em média. Em condições normais, chove mais de mil milímetros. Na pior das secas, chove pelo menos 200 milímetros, o suficiente para dar água de qualidade a uma família de cinco pessoas por um ano


Profetas das chuvas

No Semiárido brasileiro, mais especificamente no Estado do Ceará, existem muitos sertanejos que interpretam as manifestações da natureza para prever as condições do tempo e clima. Por meio da percepção empírica acumulada ao longo de muitas gerações, os "profetas das chuvas" - em função da vulnerabilidade do clima - criaram mecanismos para evitar o malogro de suas culturas, e assim manter as esperanças do sucesso da lavoura, perante as condições inóspitas do semiárido brasileiro. Cabe enfatizar que a utilização dos ditos populares não é intrínseca ao sertão cearense, e são utilizadas em todo território brasileiro, inclusive em outros países, cada qual com sua peculiaridade, e utilizados principalmente para prever o tempo para o dia seguinte e para as "estações" também.

Segundo Folhes e Donald, o sertanejo, por conviver em um ambiente extremamente hostil, desenvolveu uma acuidade detalhada para a observação dos fenômenos presenciados na natureza, em especial para a previsão do tempo e do clima, utilizando como referência o comportamento dos animais, o comportamento da vegetação e a posição dos astros, constelações e nuvens.

Com relação aos animais, eles observam o canto, atitude e conduta, como se pode exemplificar utilizando o comportamento das formigas, pois quando estas constroem suas casas em lugares altos e secos é indício de chuva à vista. Com relação à vegetação, esta pode ser uma rica fonte de informações para percepção da umidade relativa do ar, observada pelos agricultores do semiárido que desejam plantar sua roça, por meio da presença maciça de cocos da Macaúba e do aparecimento do milho-cobra (Dracontium asperum) e feijão - bravo (Dioclea grandiflora). No último grupo de sinais da natureza, os astros, constelação e nuvens são observados pelos sertanejos, com destaque para os ditos que associam o clima da próxima estação pela observação da Lua. Conforme os sertanejos, a estação vai ser chuvosa quando a primeira lua cheia de janeiro "sair vermelha, por detrás de uma barra de nuvens", mas "se surgir prateada é sinal de seca" (Folhes; Donald, 2007, p. 27).

Pelo breve histórico dos adágios populares relacionados à previsão do tempo e clima, e até mesmo considerando circunstâncias de maior "evolução civilizatória", vê-se que os conhecimentos a ela correlatos são fruto de observação empírica e repassada de geração para geração. Muitas das vezes são comprovados cientificamente, mas também podem ser apenas crendices que vão sendo propagadas de gerações em gerações. O objetivo deste artigo é demonstrar a possibilidade de utilização dos ditos populares como subsídio a observação das nuvens para o desenvolvimento de noções sobre o tempo e o clima para os alunos do 3° Ciclo do Ensino Fundamental II.

Escolha do tema
Há uma clara necessidade de que se amplie o número de trabalhos voltados para o Ensino de Climatologia Escolar no Brasil.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais discorrem sobre a necessidade de familiarização do aluno com as noções básicas sobre clima, sendo possível discutir os mecanismos climáticos, por exemplo, das massas de ar, as variações diárias de tipos de tempos atmosféricos. Ensinar como ocorrem e explorar a sua percepção empírica sobre a sucessão dos tipos de climas do lugar onde vive. Com base nesses conhecimentos, discutir que muitos ditos populares sobre o tempo atmosférico são desprovidos de verdade. Outros, no entanto, revelam um tipo de observação empírica acumulada culturalmente que permite previsões em pequena escala.

É possível trabalhar o tempo e o clima pela observação atenta dessa sucessão, mostrando que ela poderá garantir uma relativa previsibilidade. Assim, também garantir o reconhecimento da sucessão habitual das estações do ano como uma necessidade para a sociedade se organizar, tanto no plano da produção econômica como na vida prática do seu cotidiano. É importante que o professor explique e discuta com os alunos a ocorrência de certos fenômenos naturais dos climas de consequências catastróficas, como furacões, tempestades, tornados, que provocam grandes inundações, fortes nevascas, paralisando cidades. Nessas explicações, o aluno poderá ser levado à compreensão de que não se deve atribuir nenhuma culpa à natureza, mas à decorrência histórica de uma forma de escolha que a sociedade fez quando se estabeleceu nessas localidades (PCN, 1997, p.61-62).

Um fator que tem chamado a atenção é que, nos últimos anos, o conteúdo de Climatologia no Ensino Fundamental II tem sido trabalhado por professores de Ciências. José B. Conti (1990, p. 39) fala da importância de se recuperar o campo perdido pelo geógrafo; e que esse profissional deveria realizar um trabalho "ativo e interessante", visando à compreensão das "consequências espaciais" exercidas entre os fenômenos atmosféricos e a superfície terrestre.

Em um levantamento da produção em Climatologia nas Teses e Dissertações defendidas nos Programas de Pós-Graduação da USP e Unesp, entre 1971 e 2000, Zavattini constatou que, das 108 obras, apenas uma está ligada ao Ensino de Climatologia. Esse trabalho foi realizado no ano de 1997, intitula-se Uma proposta metodológica para o ensino de climatologia no primeiro grau e foi defendido por Berenice Bley Ribeiro Bonfim, sob a orientação do professor José Bueno Conti, na Universidade de São Paulo.

No início da década de 80, por meio de projeto da FUNBEC, Fundação Brasileira para o Desenvolvimento de Ensino de Ciências, com a cooperação dos professores do IBECC, Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura, da Universidade de São Paulo, e com recursos da Unesco e da Fundação Ford, foi elaborado o Projeto Brasileiro para o Ensino de Geografia, no qual foram formulados materiais didáticos de apoio a diversas áreas da Geografia.

A Climatologia foi contemplada com

Após a abordagem teórica sobre as nuvens, especificando os principais tipos de nuvens (dez no total), com suas respectivas altitudes e formatos, deve-se proceder à atividade prática com os alunos. A atividade prática é dividida em duas fases:

1ª fase - ir a campo com os alunos durante um mês, fotografando as nuvens presentes na atmosfera próxima à escola; requerer-se dos alunos, sob a forma de grupos, fotografias, imagens ou ilustrações das dez nuvens presentes no Atlas ou o máximo de nuvens que conseguirem captar durante a atividade, assim como o preenchimento da tabela 3 (não esquecendo os nevoeiros que não estão citados na tabela); esta atividade pode ser feita por meio de uma máquina digital do professor/escola ou por celulares que disponham do dispositivo fotográfico;

2ª fase - apresentar e discutir as nuvens fotografadas, partindo então para um debate e confronto das divergências que surgirem. Em seguida ao exercício prático-teórico é necessário proceder à introdução dos ditos, primeiramente com o breve histórico, descrito anteriormente, utilizando os conhecimentos provenientes do imaginário popular como ferramenta para auxiliar a previsão do tempo e clima.


A PREVISÃO DO TEMPO COM O AUXÍLIO DOS DITOS POPULARES

Para tornar a tarefa instigante para os alunos, pode-se solicitar que realizem uma pesquisa juntos aos familiares e amigos, os questionando sobre o conhecimento de algum ditado popular relativo à previsão do tempo e do clima, e sua utilidade para as pessoas. Pode-se sugerir que exponham em sala de aula, reunindo todos os ditos populares em um quadro (lousa, cartaz ou flipchart). Acompanhando os ditos populares trazidos pelos alunos é possível inserir alguns ditos conhecidos pelo professor, como os relatados por Sartori (2000, p. 234-235) e seu respectivo país de origem. Dentre eles destacam-se:
- "Asas abertas no galinheiro, sinal de aguaceiro." (Índia);
- "Andorinhas a mil braças, céu azul sem jaça; andorinha rente ao chão, muita chuva com trovão." (China; Japão; Coreia; Rússia; Turquia; França e Suíça);
- "Formiga carregando ovos barranco acima, é chuva que se aproxima." (Índia e Japão);
- "Mosquitos voando em bando é sinal de chuva." (China)
- "Sapo cantando ao anoitecer, bom tempo vai fazer." (Espanha)
- "Cabras tossindo e espirrando, o tempo está mudando." (Espanha e Brasil)
- "Gato se lambendo é sinal de chuva." (Reino Unido, Holanda e Bélgica)
- "Céu avermelhado de manhã, chuva de tarde; tarde avermelhada, tempo bom." (China)
- "Quando o Sol está em casa, a chuva não tarda." (Índios Zuni, do Novo México, EUA)
- "Um círculo grande em volta da Lua é sinal de chuva iminente; um círculo pequeno é sinal de que a chuva ainda demora." (Índia)

Partindo dos provérbios populares relatados pelos alunos e por Sartori, é possível fazer entender o sentido de cada um e fazer uma comparação com o dia a dia dos alunos, chamando a atenção para a observação da natureza, ou seja, do comportamento dos animais e plantas, tomando como referência principal a reflexão e descrição das nuvens, percebendo assim a provável mudança de tempo.

Essas discussões em sala de aula são o "pontapé inicial" para trabalhar com os seguintes ditos populares:
1 "Névoa na baixa, sol que racha, névoa na serra, chuva que berra."
2 "Céu pedrento é sinal de chuva e vento."

Estes dois ditos populares nortearão a atividade que buscará responder à seguinte questão: Será que vai chover hoje?

NUVENS VERSUS DITOS POPULARES
Em primeiro lugar, é preciso iniciar a observação e a descrição das nuvens, principalmente para os dez tipos descriminados, utilizando a paisagem como categoria para o ensino-aprendizagem da previsão atmosférica.

Kaercher discorre sobre a importância de utilizar a observação e a descrição dos fenômenos, mediante a categoria paisagem nas aulas de Geografia para [...] desenvolver e treinar mais a capacidade de observação e descrição, habilidades que foram erroneamente confundidas como sinônimo de "Geografia Tradicional", e, portanto, consideradas menores, e saber pensar os fenômenos para além do visível, do sensório e do imediato. Tarefas nada fáceis. Como fazer? Praticando com os alunos e estudando! É trabalho, não é dom!" (Kaercher, 2004, p. 233).

Conforme os anexins, "Névoa na baixa, sol que racha, névoa na serra, chuva que berra" e "Céu pedrento é sinal de chuva e vento", forem sendo explicados, os procedimentos didáticos podem ser alterados, mas convém destacar é a funcionalidade desses conhecimentos populares dentro da sala de aula atuando como uma ferramenta na assimilação dos conhecimentos climáticos.


1° DITO Névoa na baixa, sol que racha, névoa na serra, chuva que berra.
Iniciando a atividade com o dito popular "Névoa na baixa, sol que racha, névoa na serra chuva que berra", será necessário fazer uso de duas fotografias para facilitar a atividade, demonstrando a representação dos fenômenos localizados na "baixa" e na "serra", dando ênfase aos fatores relevo e altitude, elementos importantes na origem da insolação (sol que racha) e chuva (chuva que berra), de acordo com figura 3.


A fotografia localizada à esquerda (figura 3), demonstra a presença de uma névoa, em um cruzamento viário, pela manhã. Observando a fotografia, percebe-se que a névoa não prejudica a visão de elementos próximos, como a placa de sinalização; no entanto, quando se instiga a enxergar os detalhes ao fundo da fotografia, a névoa impede essa ação.

Quanto ao sentido "Névoa na baixa, sol que racha", explica-se pela formação da névoa, devido à perda de radiação terrestre para a atmosfera durante a noite, e devido à ausência de nebulosidade e vento que precede a névoa ou nevoeiro. Geralmente esse fenômeno ocorre no inverno e em locais planos e com baixa altitude.

Com a perda de radiação terrestre, o ar junto ao solo se resfria e condensa, em razão da diminuição do ponto de orvalho; ou seja, quanto menor a temperatura do ar, menor a capacidade de armazenar a água no estado gasoso. A névoa tem uma duração temporal pequena, desaparecendo rapidamente logo que o Sol aparece. O dia que é precedido por névoa ou nevoeiro é agraciado por uma insolação plena, devido ao "céu de brigadeiro". Os gregos antigos já utilizam essa observação para prever o tempo.

Quanto ao dito "Névoa na serra, chuva que berra", ao observar a fotografia à direita, nota-se que a névoa está em uma localidade montanhosa e de elevadas altitudes, indicando a possibilidade de chuvas intensas provenientes das nuvens Nimbostratus e Cumulonimbos (figura 1 e tabelas 1 e 2). Caso a chuva for moderada, ou apenas um chuvisco, essa precipitação está ligada à nuvem Stratus (figura 1 e tabelas 1 e 2).

2° DITO Céu pedrento é sinal de chuva e vento
O cruzamento do conhecimento popular e do conhecimento científico pode ser verificado quando o ditado popular que prevê a mudança de tempo para o dia seguinte diz o seguinte: "Céu pedrento é sinal de chuva e vento". Esse provérbio popular relata a mudança do tempo indicada pelas nuvens Cirros, Cirroscumulos e Altocumulos (figura 4), no qual a presença destas antecipa a chegada de uma frente fria, gerando a movimentação do ar decorrente dos diferentes campos barométricos. O "céu pedrento" é uma alusão a "pedras", ou seja, nuvens de alta e média altitude. Esses três tipos de nuvens indicam a entrada de uma frente fria. Após a sinalização da chegada de uma frente fria, ocorrem chuvas fortes, geradas pela nuvem Cumulonimbos, nuvem esta que caracteriza precipitações intensas e de grande extensão vertical (figuras 1 e 2, e tabela 2).

Os dois ditos populares "Névoa na baixa, sol que racha" e "Ceú pedrento é sinal de chuva e vento" podem auxiliar na previsão do tempo, pois, tomando os devidos cuidados, é lícito afirmar que é muito provável que irá chover nas próximas horas ou no dia seguinte.


Para entender o conhecimento popular

A intenção deste artigo é contribuir para o entendimento e divulgação do conhecimento popular como fonte de informação importante para a Geografia Escolar. A interpretação da natureza, no caso específico, e a leitura do comportamento atmosférico por meio das nuvens com o auxílio dos anexins populares, podem ser utilizadas como ponto de partida para a compreensão do tempo e do clima, já que cientistas renomados sinalizam positivamente (como no Seminário de Tropicologia) para a aceitação dos ditos populares como fontes relevantes para a compreensão dos fenômenos atmosféricos.

A leitura da paisagem de forma direta (observação das nuvens), mediante a utilização das crenças populares possibilita a aquisição de habilidades para a leitura e interpretação dos diferentes tipos de tempo que podem interferir diretamente na vida das pessoas, seja na opção de vestimenta apropriada ou deixar o guarda-chuva de prontidão para evitar um aborrecimento futuro.

A própria Bíblia já relatava a importância de se observar a atmosfera para prever tempestades, quando fariseus e os saduceus pediram a Jesus para indicar algum sinal no céu daquele dia e Jesus disse "Quando é chegada a tarde, dizeis: haverá bom tempo, porque o céu está rubro, e, pela manhã: hoje haverá tempestade, porque o céu está de um vermelho sombrio. Hipócritas, sabeis discernir a face do céu, e não conheceis os sinais dos tempos?" (Mateus , Capítulo 16, versículos 1 a 3).

Dessa forma, espera-se por meio da proposição desta prática envolvendo a Climatologia Escolar, fortalecer as atividades de campo, valorando a percepção da natureza e demonstrando ao aluno a importância dos fenômenos atmosféricos e sua relação com a natureza.


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