quinta-feira, 11 de abril de 2019

A corrosão da Caatinga


Extração de madeira e uso da terra para roças e pastagens reduzem biodiversidade e transformam a paisagem do sertão



Retirada de lenha no interior de Pernambuco
Ricardo Azoury / olhar imagem

Durante três dias de sol forte, na segunda semana de março de 2018, uma equipe da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) cavou crateras na terra seca de roças abandonadas no Parque Nacional do Catimbau, na região central de Pernambuco, para examinar o interior de ninhos de saúva. Os pesquisadores viram que, em áreas de solo raso como as que escavavam, as formigas guardavam matéria orgânica a até 3 metros (m) de profundidade, dificultando o acesso das plantas a nutrientes e retardando a regeneração da vegetação original. Em outras expedições, já tinham observado que a densidade das colônias de saúva aumentava de duas por hectare (ha) nas áreas de vegetação nativa para 15 por ha (1 ha corresponde a 10 mil metros quadrados) nos trechos usados para cultivo agrícola ou pastagem. As saúvas sobrepõem-se a outras espécies de formigas à medida que a vegetação nativa é retirada.

A proliferação dos ninhos de saúva evidencia o empobrecimento da Caatinga causado pela retirada lenta e contínua de árvores e de animais das matas. Por consistir na extração de pequenas porções de recursos naturais, esse processo escapa das imagens de satélite, mas, em silêncio, transforma a paisagem do sertão nordestino e aumenta o risco de desertificação. Outro sinal visível da metamorfose é a proliferação de plantas invasoras como a algaroba (Prosopis juliflora), árvore nativa dos Andes usada para extração de madeira e alimentação do gado. As invasoras crescem com rapidez em ambientes mais abertos e tornam-se dominantes em roças ou pastos abandonados.

Situado no município de Buíque, com 622 quilômetros quadrados (km2), o parque do Catimbau abriga cerca de 1.500 pessoas, que já viviam ali no momento de sua criação, em 2002. Os moradores usam as áreas de mata para plantar milho e feijão, criar cabras, retirar madeira para fazer cerca ou cozinhar e caçar para se alimentar. Ali, concluíram os pesquisadores da UFPE, as intervenções dos pequenos produtores rurais causaram a perda de pelo menos um terço da biodiversidade, principalmente de plantas.

“Não é um quadro isolado”, diz o ecólogo Marcelo Tabarelli, da UFPE, coordenador do grupo de pesquisa. “A trajetória da degradação, com a transformação da floresta em uma vegetação dominada por arbustos e depois por herbáceas, ocorre em toda a Caatinga. Quanto maior a pressão humana sobre a vegetação nativa e quanto menos água, mais pobres serão o ambiente e as pessoas que vivem dele.”

A ação humana sobre a vegetação nativa do interior do Nordeste é antiga. No século XVI, o sertão produzia carne e alimentos para os moradores do litoral, que priorizavam a produção de cana-de-açúcar. Como resultado de cinco séculos de exploração econômica, quase metade (45%) da área original da Caatinga – 826 mil km2, o equivalente a 11% do território nacional – já foi desmatada, como resultado principalmente da ação dos grandes produtores rurais.

Na introdução ao livro Caatinga – The largest tropical dry forest region in South America, publicado em 2017, Tabarelli, os biólogos Inara Leal, também da UFPE, e José Maria Cardoso, da Universidade de Miami, nos Estados Unidos, observaram que os moradores de comunidades rurais da Caatinga dependem da vegetação nativa para sobreviver, o que causa uma lenta e contínua alteração do ambiente. Segundo eles, somando a ação dos moradores do sertão com os grandes projetos de infraestrutura e a agricultura comercial, pelo menos 63% da Caatinga já deve ter sofrido os efeitos da ação humana.


Mantidas em cercados, as cabras alimentam-se de plantas da Caatinga, dificultando a regeneração da vegetação
INARA LEAL/UFPE

Das 89 famílias que vivem no parque do Catimbau, 85% dependem da extração da madeira para cozinhar, de acordo com um levantamento de 2012 da bióloga da UFPE Laís Rodrigues. O consumo médio de lenha foi de 606 quilogramas (kg) por ano por pessoa, o que equivale a 10 ha por ano, somente para abastecer os fogões a lenha. “Dentro do parque”, observa o biólogo Felipe Melo, professor da UFPE, “como o governo impõe restrições ao uso da terra, as famílias são mais pobres e mais dependentes dos recursos naturais que as de fora, mas também não conseguem sair de lá porque não têm para onde ir”.

Fora das áreas de proteção ambiental, há também a extração de lenha para abastecer as empresas de produção de gesso, olarias, padarias e pizzarias. O consumo doméstico e comercial implica uma perda estimada em 30 milhões de metros cúbicos por ano de mata nativa, segundo o Ministério do Meio Ambiente.

A situação é similar na Mata Atlântica no Nordeste. Um estudo de 2015 na Global Ecology and Conservation, com base em 270 famílias de sete comunidades de Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba, registrou um consumo médio de 686 kg de lenha por ano por pessoa, o que implicaria a retirada de 2 mil ha de mata por ano nos 270 municípios da região com esse tipo de vegetação. “Quanto menor a renda das famílias, maior a dependência e a retirada de lenha”, diz Melo. Florestas de clima semiárido ou desértico da África e da Índia que abrigam comunidades humanas registram o mesmo fenômeno.

Menos espécies nativas
No Catimbau, espécies típicas como aroeira (Myracrodruon urundeuva) e angico-branco (Anadenanthera colubrina) são as mais extraídas para construção de cercas ou casas, de acordo com um estudo de fevereiro deste ano na Environmental Research Letters. Em Parnamirim, município pernambucano a 350 km a oeste do Catimbau, cujos 20 mil moradores vivem da extração de madeira e de plantas, os pesquisadores verificaram que as espécies de árvores típicas tendem a ser substituídas por outras, que crescem com rapidez e suportam as alterações provocadas pelas roças e pastos itinerantes, como marmeleiro-do-mato (Croton sonderianus) e jurema-preta (Mimosa tenuiflora). As cabras, por sua vez, comem os galhos de árvores com folhas mais macias, deixando de lado arbustos menores e plantas herbáceas com folhas mais duras, que se tornam as predominantes em áreas de pastagens.

Além da proliferação de saúvas, a ação humana altera as interações de outros grupos de formigas e insetos com as plantas. “Vimos que se perdem dois tipos de serviço que as formigas prestam às plantas: a proteção contra insetos herbívoros e a dispersão de sementes”, diz Inara. No primeiro caso, segundo ela, por sofrerem mais estresse em áreas mais abertas, as plantas acumulam menos néctar em seus nectários extraflorais, que atraem formigas. Por sua vez, as formigas se alimentam de insetos herbívoros, que, sem elas, atacariam as plantas. Com menos néctar e menos formigas, as plantas tornam-se mais vulneráveis aos insetos herbívoros. No segundo caso, as ações humanas causam uma redução das populações e da atividade de espécies de formigas consideradas boas dispersoras de sementes, como a tocandira (Dinoponera quadriceps). “Em consequência”, diz Inara, “as sementes são dispersas em menor quantidade e por menores distâncias.”

Vista geral do Parque Nacional do Catimbau (PE), com áreas de roças e pastos abandonados com solo exposto, em primeiro plano
KATIA RITO/UNAM

Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a bióloga Gislene Ganade pode ter encontrado uma solução para um antigo problema da recomposição da Caatinga: as árvores plantadas em campo dificilmente sobrevivem ao clima seco, apesar de adaptadas a ambientes inóspitos. Em seus experimentos, árvores de 16 espécies foram inicialmente cultivadas em tubos plásticos até as raízes atingirem 1 m de comprimento. Depois, foram plantadas em uma cova regada com 4 litros de água, na Floresta Nacional de Assu, no Rio Grande do Norte, em junho de 2016.

“Com água para abastecer as raízes, as árvores mantiveram-se verdes por dois meses, mesmo na seca, e depois de oito meses, quando choveu, produziram folhas novas e frutos”, Gislene observou. Segundo ela, um ano após o plantio, 75% das árvores tinham sobrevivido. Com base nesse método, as equipes da UFRN e da UFPE pretendem recompor a vegetação do Catimbau. O plano é criar uma área experimental de 5 ha com árvores que possam servir para a produção de mel ou de alimento para os moradores do parque e para os animais de criação.

A integração entre a criação de cabras, a agricultura e o plantio de espécies de árvores usadas como lenha é outra estratégia cogitada para evitar a degradação ambiental e favorecer a renda dos proprietários rurais. “Como não haveria recursos próprios para implementar os sistemas integrados do tipo lavoura-pecuária, a participação dos órgãos governamentais é essencial, por meio de linhas de crédito e do apoio a pesquisas”, diz o engenheiro-agrônomo Luiz Antonio Martinelli, professor da Universidade de São Paulo.

Políticas públicas já em vigor têm ajudado a preservar a Caatinga, observa Tabarelli, que desde 2012 percorre com frequência o Catimbau. “Os programas de transferência de renda, principalmente a aposentadoria rural, desaceleraram a exploração da Caatinga e deixaram as famílias menos dependentes dos recursos naturais”, observa. “Em vez de caçar, os sertanejos podem comprar frango e, em vez de tirar lenha da mata, podem comprar gás para cozinhar.”

Artigos Científicos
SFAIR, J. C. et al. Chronic human disturbance affects plant trait distribution in a seasonally dry tropical forest. Environmental Research Letters. v. 13, 025005, fev. 2018.
RIBEIRO, E. M. S. et al. Chronic anthropogenic disturbance drives the biological impoverishment of the Brazilian Caatinga vegetation. Journal of Applied Ecology. v. 52, p. 611–620, mar. 2015.
SIQUEIRA, F. F. S. et al. Leaf-cutting ant populations profit from human disturbances in tropical dry forest in Brazil. Journal of Tropical Ecology. v. 33, n. 5, p. 337-44, set. 2017.
SPECHT, M. J. et al. Burning biodiversity: Fuelwood harvesting causes forest degradation in human-dominated tropical landscapes. Global Ecology and Conservation. v. 3, p. 200-9, jan. 2015.

Livro
SILVA, J. M. C. da, LEAL, I. R. e TABARELLI, M. (eds.) Caatinga – The largest tropical dry forest region in South America. Cham: Springer, 2017.
Revista FAPESP

quarta-feira, 10 de abril de 2019

Expectativa de vida no mundo aumentou 5,5 anos desde 2000


Enquanto a maioria dos habitantes de países ricos morrem de velhos, uma em cada três mortes em países mais pobres é de menores de 5 anos

AF Agência France-Presse




(foto: Bruno Peres/CB/D.A Press) 

A expectativa de vida no mundo aumentou 5,5 anos entre 2000 e 2016, revelou a Organização Mundial da Saúde (OMS) nesta quinta-feira, alertando que a desigualdade na renda e no acesso aos cuidados se traduzem em uma vida mais curta para muitos.


A agência de saúde da ONU constatou, além disso, diferenças de expectativa de vida entre gêneros.


Em média, uma criança nascida em 2016 pode esperar viver 72 anos, em vez dos 66,5 de 2000, segundo o informe anual de Estatísticas de saúde mundial.

Nas Américas, a expectativa de vida passou de 73,6, em 2000, a 76,8, em 2016, apesar de que nos Estados Unidos sofreu uma redução (de 79 anos a 78,5), atribuída em parte à obesidade.

Os primeiros 16 anos do século registraram uma queda dramática nas mortes de crianças menores de cinco anos, especialmente na África subsaariana, onde houve progressos na luta contra a malária, o sarampo e outras doenças contagiosas, explicou a OMS.

As estatísticas melhoraram também graças aos avanços contra o HIV/aids, que causou estragos na maior parte da África nos anos 1990. 

Mas apesar dos progressos nos países mais pobres, a OMS destacou as diferenças significativas entre países em desenvolvimento e os já desenvolvidos.

Os habitantes de países de rendas baixas vivem em média 18 anos a menos que os de rendas altas, mostram as estatísticas.

Em Lesoto, por exemplo, as pessoas vivem em média 52 anos, longe dos 84 do Japão - o país mais longevo do mundo - e dos 83 da Espanha e da Suíça.

Enquanto a maioria dos habitantes de países ricos morrem de velhos, uma em cada três mortes em países mais pobres é de menores de 5 anos.


'Diferenças impactantes'
Pela primeira vez, a OMS separou suas estatísticas por gênero, mostrando claramente que as mulheres têm melhores perspectivas de viver uma vida longa do que os homens.

É mais provável nascer homem que mulher, e em 2019 se espera que nasçam 73 milhões de meninos e 68 milhões de meninas, segundo a OMS.

Mas, devido a uma maior fragilidade biológica e a comportamentos de maior risco, espera-se, entre os nascidos em 2016, que os meninos vivam 69,8 anos e as meninas, 74,2.

Uma das razões pelas quais as mulheres parecem viver mais é que tendem a usar melhor os recursos de saúde.

Assim, por exemplo, nos países com epidemias de HIV, as mulheres tendem mais a se submeter a exames e a acessar terapias antirretrovirais.

Ainda assim, nos países com escassos serviços de saúde, uma de cada 41 mulheres morrem por causas maternas, em comparação com uma entre 3.300 em países de altos rendimentos.

Há "diferenças impactantes", disse à imprensa a responsável de dados e análises da OMS, Samira Asma.

Em conjunto, as estatísticas demonstram que a expectativa de vida aumentou na maioria dos países, com saltos significativos em lugares como a Eritreia, onde se espera que as pessoas vivam 22 anos a mais que os 43 de 2000.

Na Síria, após oito anos de guerra, a expectativa de vida caiu uma década, dos 73 anos de 2000 para 63,8 em 2016.

domingo, 7 de abril de 2019

Floresta submarina


Recifes da foz do Amazonas podem ser maiores, mais profundos e complexos do que o previsto

Esponjas-do-mar e algas a 90 metros de profundidade, na área norte dos recifes da Amazônia

Greenpeace

Levantamentos submarinos indicaram que os recifes na plataforma continental em frente à foz do rio Amazonas podem ser muito maiores, mais profundos e ricos em espécies de organismos aquáticos do que o previsto por meio das primeiras medições, realizadas em 2012 e em 2014 por sonar e dragas que varrem o fundo do leito marinho. Os recifes estão a 110 quilômetros (km) da costa e se estendem do Amapá até o Maranhão. Ali a água barrenta do Amazonas encontra a do Atlântico e a maré sobe de 6 a 8 metros (m) por dia. Como o próprio Amazonas – o maior rio do mundo, com margens de 50 km de largura, que despeja no mar cerca de 200 toneladas de água e 14 toneladas de sedimentos por segundo –, os recifes estão se revelando monumentais.

A área dos recifes pode ser seis vezes maior que os inicialmente estimados 9,5 mil quilômetros quadrados (km2), podendo chegar a até 56 mil km2, de acordo com as expedições realizadas em janeiro e fevereiro de 2017 e abril e maio de 2018 com o navio Esperanza, da organização não governamental Greenpeace, com pesquisadores das universidades da Paraíba, do Pará, do Rio de Janeiro e de São Paulo. Se confirmada, a área poderá ser maior que a do estado do Espírito Santo (46 mil km2).

Em setembro de 2017, com o Alucia, do Instituto Oceanográfico Woods Hole, dos Estados Unidos, um grupo de pesquisadores da Rede Abrolhos (abrolhos.org) percorreu a região e verificou que a profundidade dos recifes pode chegar a 350 m, quase três vezes mais que a inicialmente estimada. “Confirmamos que a paisagem é bastante fragmentada e descontínua, como outros recifes de bordas de plataforma continental”, diz o biólogo Rodrigo Moura, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador da viagem com o Alucia e da Rede Abrolhos.





As duas equipes reconhecem que se trata de uma área rica e complexa. “A diversidade de ambientes equivale à de florestas, com uma grande quantidade de espécies em uma área ampla”, observou o biólogo Ronaldo Francini Filho, professor da Universidade Federal da Paraíba e principal autor do artigo publicado em abril de 2018 na revista científica Frontiers in Marine Science com os resultados das viagens com o Esperanza. Segundo ele, “cada área está em diferentes estágios de desenvolvimento”, ora mais jovens, ora mais maduras, formando ou ocupando clareiras.

As formações se diferenciam na direção norte-sul. Segundo Moura, os recifes do litoral do Amapá são mais antigos (cerca de 14 mil anos), pararam de crescer e são constituídos principalmente por moluscos e outros invertebrados, mas não por corais. Os do Maranhão são mais jovens, ainda estão em crescimento e são formados por corais e algas calcárias. O biólogo Gilberto Amado, pesquisador do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, com outros especialistas da Rede Abrolhos, participou da viagem com o Alucia e verificou que a estrutura e a composição dos bancos de algas calcárias chamados rodolitos se torna mais complexa no sentido norte-sul, como descrito em um artigo de julho de 2018 na Journal of South American Earth Sciences.

“A maioria dos recifes de corais é de águas quentes, rasas e limpas, com muita luz e poucos nutrientes”, diz o oceanógrafo Nils Asp, professor da Universidade Federal do Pará, que participou de uma das viagens com o Esperanza. “Ali, na foz do Amazonas, é o contrário. Os sedimentos carregados pelo rio deixam a água turva, mas trazem muitos nutrientes, compensando a escassez de luz.” Outra peculiaridade é a variação de acidez, da salinidade e da turbidez da água, como resultado do encontro do rio com o oceano.

Entrevista: Gilberto Amado





No fundo da plataforma em frente à foz do maior rio do mundo estendem-se recifes e rodolitos com centenas de quilômetros de extensão. Sobre essa superfície, grandes esponjas amarelas, vermelhas, negras e brancas dominam a paisagem. “Por causa do volume de nutrientes, é um ambiente ideal para esponjas, que são organismos filtradores”, comenta Moura. Por enquanto, os pesquisadores identificaram cerca de 70 espécies de peixes, incluindo algumas raras no litoral brasileiro, como o pargo, de até 1 m de comprimento, e o mero, que pode chegar a 3 m. Até agora, as expedições registraram também cerca de 80 espécies de esponjas e 40 de corais, muitas delas semelhantes às encontradas nos recifes dos arquipélagos de Fernando de Noronha e de Abrolhos.


O volume de nutrientes da foz do Amazonas é um ambiente ideal para as esponjas coloridas, que dominam a paisagem

Uma equipe da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), coordenada pela engenheira de pesca Sigrid Neumann Leitão, identificou comunidades complexas de organismos que flutuam na água, o chamado zooplâncton. Os pesquisadores contabilizaram 197 espécies de zooplâncton, predominando os crustáceos milimétricos parecidos com insetos, os copépodes, com 92 espécies. Como detalhado em um artigo de março de 2018 na Frontier in Microbiology pelo grupo de Pernambuco, a densidade variou de 2,6 milhões de indivíduos por metro cúbico (m3) nas áreas mais próximas da foz a 107 indivíduos por m3 nas mais distantes, em razão do volume de sedimentos.

Nos recifes vivem duas espécies de peixes azulados conhecidos como donzela (Chromis spp.) e comuns no mar do Caribe, a cerca de 2 mil km de distância. Essa e outras indicações reforçam a hipótese de que os recifes poderiam funcionar como um corredor – e não como uma barreira, como também se cogitava – entre o mar do norte da América do Sul e o litoral ao sul do Maranhão. “Desde a década de 1970 se pensava que peixes e outros organismos poderiam passar de pouco em pouco pelo fundo da foz e poderia haver intercâmbio genético entre organismos do Caribe e do litoral ao sul da foz do Amazonas”, diz o biólogo Sergio Floeter, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenador da Rede Nacional de Pesquisa em Biodiversidade Marinha (Sisbiota-Mar). “Agora temos mais evidências dessa conexão.”

Escarpas no fundo da foz
No assoalho marinho, há escarpas, semelhantes a falésias, com quilômetros de extensão e até 70 m de altura. “Acreditava-se que nessa parte da plataforma continental a areia e a lama, acumuladas ao longo de 10 milhões de anos, já teriam coberto todo o fundo”, diz Asp. Segundo ele, os degraus poderiam ser consequência da erosão causada pela água do mar há 18 mil anos, quando o nível do oceano estava cerca de 120 m abaixo do atual. As escarpas, portanto, marcariam o limite do nível do Atlântico no último período glacial, quando grandes áreas do planeta estavam cobertas por gelo, ou expressariam mudanças no curso do rio Amazonas, cuja água poderia ter escavado as rochas. Ou ainda, como uma terceira hipótese, os degraus resultariam do peso dos sedimentos. Nesse caso, teria ocorrido uma espécie de efeito gangorra: o rebaixamento de trechos da foz do Amazonas teria levantado outras áreas, como o leste da ilha de Marajó.

“Os recifes do Amazonas são um ambiente único, que ainda está sendo descoberto. Ninguém imaginava que pudesse ser tão grande”, diz a bióloga Helena Spiritus, do Greenpeace. Essa área, enorme e rica, está sendo estudada somente agora porque, até a metade da década de 1970, os cientistas tinham como certo que o volume de areia e lama despejada pelo rio no mar impediria a penetração de luz e a formação de qualquer tipo de ambiente. Aos poucos, as evidências diluíram o pressuposto.

Há informações escassas sobre a foz do Amazonas desde os anos 1950. Na década de 1960, o oceanógrafo John Milliman, de Woods Hole, e o geólogo Henyo Barreto, da Petrobras, identificaram uma estrutura rochosa rica em carbonatos na região. Em 1977, dois biólogos do Museu de História Natural dos Estados Unidos, Bruce Collette e Klaus Rützler, apresentaram uma lista de 45 espécies de peixes e 35 de esponjas típicas de recifes, coletados ao largo da boca do rio.

Em julho de 1998, Moura, Francini e o biólogo Ivan Sazima, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), seguiram além do parcel de Manuel Luís, no Maranhão, até então o banco de corais mais ao norte do Brasil, entraram em águas ainda mais setentrionais da costa brasileira e encontraram seis espécies de corais que não haviam sido relatadas nessa parte do litoral. “Os pescadores falavam que ao norte do parcel havia muito recife”, lembra Francini. A pesca de pargo e da lagosta na região também indicava que o fundo deveria ser sólido; não apenas lama, mas as dificuldades logísticas e financeiras dificultaram a organização de expedições. Até que em 2012 uma equipe coordenada por Moura, da UFRJ, percorreu a área a bordo do navio Atlantis, do Woods Hole.

A inquietação convive com o deslumbramento das descobertas porque a foz do Amazonas tem sido visada para a exploração de petróleo e gás natural. Em 2013, em uma licitação internacional, o governo federal ofereceu 125 áreas, das quais 39 foram adquiridas por empresas nacionais e multinacionais. No final de maio, ao voltar da segunda expedição à foz do Amazonas, Francini enviou um ofício à Procuradoria Geral da União, com fotos submarinas dos recifes, requisitando o bloqueio do pedido de licenciamento ambiental feito por uma empresa petrolífera interessada em explorar uma área da região.

Artigos científicos
MOURA, R. L. et al. An extensive reef system at the Amazon River mouth. Science Advances. v. 22, n. 2, e1501252, abr. 2016.
FRANCINI-FILHO, R. B. et al. Perspectives on the Great Amazon Reef: Extension, Biodiversity, and Threats. Frontiers in Marine Science. v. 5, p. 1-5, abr. 2018.
COLLETTE, B. B., and RUETZLER, K. Reef fishes over sponge bottoms off the mouth of the Amazon River. Proceedings of the 3rd International Coral Reef Symposium. v. 3, p. 305-310, mai. 1977.
NEUMANN-LEITÃO, S. et al. Zooplankton From a Reef System Under the Influence of the Amazon River Plume. Frontiers in Microbiology. v. 9, p. 1-15, mar. 2018.
MOURA, R. L. de et al. Unexpected richness of reef corals near the southern Amazon River mouth. Coral Reefs. v. 18, n. 2, p. 170, jul. 1999.
VALE, N. F. et al. Structure and composition of rhodoliths from the Amazon River mouth, Brazil. Journal of South American Earth Sciences. v. 84, p. 149-159, jul. 2018.
CORDEIRO, R.T.S. et al. Mesophotic coral ecosystems occur offshore and north of the Amazon River. Bulletin of Marine Science. v. 91, n. 4, p. 491-510, out. 2015.
MILLIMAN, J. D. et al. Quaternary sedimentation on the Amazon continental margin: A model. Geological Society of America Bulletin. v. 86, p. 610-614, 1975.
Revista FAPESP

Alternativas na mesa


Adoção de tecnologias baseadas na agricultura 4.0 é o caminho para reduzir o consumo de pesticidas nas lavouras nacionais
Com auxílio de um pulverizador costal, produtor rural lança agrotóxicos em plantação de hortaliças

Lucas Lacaz Ruiz / 

Um dos setores mais robustos da economia, o agronegócio é responsável por cerca de 25% do Produto Interno Bruto (PIB), responde por 20% dos postos de trabalho e se destaca na pauta de exportações do país, com soja, açúcar, celulose e carne bovina e de frango, ocupando os primeiros lugares da lista. A alta produtividade do setor depende, em boa medida, do uso intensivo de agrotóxicos, principalmente nas grandes plantações de soja, cana-de-açúcar e milho, que juntas respondem por 75% dos defensivos consumidos no Brasil (ver infográfico). Não por acaso, essas monoculturas ocupam extensas regiões de cultivo. As lavouras de soja e milho, por exemplo, correspondem a quase 70% do total da área semeada no país em 2018, estimada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) em 61,7 milhões de hectares, equivalente a 7% do território nacional.

O emprego de elevados volumes de agroquímicos nessas plantações gera impactos diretos no ambiente, com a contaminação do solo e de fontes de água superficiais e subterrâneas, como rios, lagos e lençóis freáticos. A redução desses danos, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem, passa pela adoção de novas tecnologias pelos grandes produtores agrícolas.

“Soluções baseadas na chamada agricultura 4.0, como sensores, máquinas inteligentes que ‘conversam entre si’, internet das coisas e robotização, podem auxiliar no uso mais adequado de diversos insumos, entre eles agroquímicos”, diz o engenheiro eletricista Fernando Martins, conselheiro da empresa Máquinas Agrícolas Jacto, uma das líderes mundiais em fabricação de pulverizadores (ver reportagem).

O emprego dessas tecnologias de ponta nos próximos anos, diz Martins, permitirá que os produtores rurais apliquem os insumos (pesticidas, adubo, sementes, água, entre outros) em taxas variáveis – e não de maneira uniforme como ocorre atualmente. Dosar a quantidade ideal de defensivos aplicados nas lavouras é um dos grandes desafios do setor. “O agricultor vai colocar mais defensivos em um talhão [pedaço da plantação] e menos em outro, de acordo com a necessidade, gerando economia e elevando a eficiência da pulverização”, explica. “Hoje, já há uma força contrária ao emprego excessivo de agroquímicos porque eles são caros.”

Além da Jacto, com sede em Pompeia (SP), outra empresa paulista que investe na agricultura digital é a Solinftec, de Araçatuba. Sua linha de máquinas e equipamentos agrícolas conectados está presente em cerca de 65% da lavoura canavieira de São Paulo. A pulverização de grandes extensões de áreas destinadas à produção de commodities, como soja, cana-de-açúcar, algodão, milho e eucalipto, para fabricação de celulose, é feita por aviões ou tratores, enquanto plantações menores, focadas no cultivo de alimentos que vão para a mesa dos brasileiros, são muitas vezes pulverizadas pelos próprios agricultores, que utilizam aparelhos chamados costais (por serem presos às costas do aplicador).

“A pulverização aérea é um problema ambiental e de saúde pública. Os agrotóxicos lançados pelo avião avançam sobre mananciais, outras plantações, áreas de preservação ambiental e regiões habitadas. Quando se faz a aplicação aérea, a dispersão pelo ar é muito maior, impactando o ambiente e colocando em risco a saúde de quem mora na vizinhança, dos trabalhadores e de pessoas que consomem os alimentos”, ressalta Adelaide Cassia Nardocci, professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP).

Em parceria com o Centro de Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, a FSP-USP criou o portal Sistema de Busca de Informações sobre Agrotóxicos. Batizado de Ariadne, ele apresenta dados sobre o uso e as aplicações de agrotóxicos em São Paulo, com destaque para o comportamento da substância no ambiente e sua toxicidade para a saúde humana. “O Ariadne tem a função de auxiliar as pessoas não familiarizadas com o tema a encontrar informações sobre agrotóxicos”, diz Nardocci.

Funcionário da Solinftec opera computador durante a colheita de cana-de-açúcar
Solinftec

A necessidade de desenvolver soluções e sistemas inteligentes para conter a deriva – o volume de agroquímicos que não atinge a cultura-alvo – e que tornem mais eficiente a aplicação de defensivos e o controle de pragas levou à criação da Rede de Pesquisa Redagro montada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) com 10 universidades e o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag). Durante quatro anos, os pesquisadores trabalharam no projeto “Desenvolvimento da aplicação aérea de agrotóxicos como estratégia de controle de pragas agrícolas de interesse nacional”, encerrado no início do ano.

“A utilização de tecnologias, ferramentas da agricultura 4.0 e sistemas inteligentes de auxílio à tomada de decisão para o controle de pragas na agricultura tropical tem proporcionado caminhos para a segurança alimentar e energética”, pontua o engenheiro de controle e automação Paulo Cruvinel, pesquisador da Embrapa Instrumentação, de São Carlos, e coordenador da Redagro. De acordo com ele, o resultado desse esforço foi a criação de novos métodos, a adaptação de tecnologias e o desenvolvimento de estratégias para pulverizações mais eficientes.

Um dos estudos mostrou que a adoção de atomizadores rotativos – um tipo de bico pulverizador – em culturas de soja pode reduzir em torno de 80%, em média, a deriva nas aplicações aéreas na comparação com os bicos hidráulicos ajustáveis, os mais usados em aviões. Outra pesquisa, voltada à aplicação de defensivos por tratores-pulverizadores, estabeleceu níveis adequados de automação para adequar os bicos de pulverização e a pressão na barra pulverizadora conforme a trajetória do trator, em linha reta ou em curva.

Se a adoção de inovações tecnológicas é um meio de racionalizar o uso de agrotóxicos nas terras dedicadas à produção de commodities, nas lavouras de alimentos que abastecem as feiras do país, cultivadas principalmente por pequenos produtores, um caminho é estimular o cultivo orgânico, isento de defensivos agrícolas. Além de minimizar o risco de contaminação, a redução de agroquímicos pode diminuir a intoxicação entre pequenos produtores rurais. Responsáveis por 70% dos alimentos consumidos no país, eles somam 4,4 milhões de trabalhadores.

Estímulo à agroecologia
Em discussão na Câmara dos Deputados desde 2016, o Projeto de Lei nº 6.670/16, que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRA), prevê medidas para fortalecer a produção de orgânicos, a agricultura agroecológica e o controle biológico, técnica que utiliza insetos, fungos, vírus e bactérias no combate às pragas agrícolas. “O PNaRA é o contraponto ao PL nº 6.299/02”, afirma o biólogo Fernando Carneiro, membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Ceará. “Ele tramita lentamente na Câmara. Só recentemente foi instalada uma comissão especial para analisá-lo.”

Outro ponto do PNaRA determina a eliminação de isenções tributárias e estímulos financeiros à importação, produção e comercialização de agrotóxicos. Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) estimou que a renúncia fiscal com agrotóxicos entre 2010 e 2017 alcançou R$ 9 bilhões. Como esses produtos são considerados insumos agrícolas, as despesas dos produtores rurais relativas a eles são passíveis de dedução.

Avião pulveriza pesticidas em plantio de cana-de-açúcar no interior de São Paulo
Caetano Barreira / Olhar Imagem

A agroecologia, explica Carneiro, defende um manejo sustentável das lavouras, incorporando na produção questões sociais, políticas, culturais, ambientais e éticas. “Esse tipo de prática leva em conta as condições de trabalho dos agricultores, a compatibilidade das culturas em relação ao ecossistema e o nível de industrialização de todo o processo”, diz o pesquisador. Ao mesmo tempo, evita o emprego de defensivos agrícolas e fertilizantes químicos, e estimula o plantio de orgânicos.

Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo, ligada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a área destinada ao cultivo de orgânicos deve bater recorde este ano, ultrapassando os 750 mil hectares de 2016. Essa prática é impulsionada em boa medida pela agricultura familiar. Apesar do crescimento, os orgânicos representam apenas 1,2% da área plantada do país, o que coloca o Brasil como o 13º maior produtor do mundo.

“Entendemos que formas alternativas de produção são importantes. Tanto a produção convencional quanto a orgânica, desde que bem conduzidas, produzem alimentos seguros para o consumo. Não somos contra a agroecologia ou a produção orgânica, mas precisamos ser realistas. Os orgânicos são mais caros e a produtividade é mais baixa”, destaca o engenheiro-agrônomo Mario Von Zuben, diretor-executivo da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef). “A diferença entre os dois modelos é de escala. Para produzir a mesma quantidade de orgânicos é preciso um aumento significativo da área cultivada – e essa não é uma alternativa por causa do impacto ambiental e da degradação das florestas.” Para Fernando Carneiro, da Abrasco, é um mito que a agroecologia é cara e sem escala. Publicações recentes da Agência das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) recomendam que se estimule o sistema, por favorecer a economia solidária, priorizar mercados locais e apoiar o desenvolvimento regional.

Além disso, uma das formas de reduzir as intoxicações nas pequenas propriedades é investir na capacitação da mão de obra, de forma que os agrotóxicos sejam aplicados com cuidado. “Por falta de informação, muitos produtores rurais aplicam a substância em doses acima do recomendado e de maneira inadequada para as pragas que pretendem controlar. Daí a importância de receberem treinamento adequado”, afirma o engenheiro-agrônomo Hamilton Humberto Ramos, pesquisador do Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico (CEA-IAC), em Campinas, e coordenador do programa Aplique Bem, que oferece aos agricultores treinamento para uso de agroquímicos. Além do risco à saúde, a aplicação incorreta de agrotóxicos gera perdas na lavoura e compromete a sustentabilidade da agricultura.
Revista FAPESP

Entre florestas e savanas

Variabilidade nas chuvas pode ser determinante na permanência das florestas
Regime de chuvas determina a resiliência da Amazônia

Léo Ramos Chaves

Artigo publicado nesta segunda-feira (25/2) na revista Nature Geoscience por pesquisadores brasileiros e colaboradores da Alemanha indica que florestas tropicais em áreas com maior variação no regime de chuvas podem ter sobrevida maior do que aquelas que têm um padrão previsível de chuvas. Os resultados apontam direções de investigação sobre as variáveis que determinam a sobrevivência das florestas (ou resiliência, termo cada vez mais utilizado em ecologia). “Percebemos que a variedade interanual é mais importante do que a chuva média”, afirma a matemática Marina Hirota, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Existe uma faixa tropical de latitudes onde pode haver tanto florestas exuberantes, como a Amazônia, quanto fisionomias mais esparsas e de menor estatura, como as savanas. Nas áreas chuvosas predomina a floresta, nas mais secas a savana é típica. Onde a média de chuva é intermediária, podem coexistir os dois tipos de vegetação. Hirota e colegas se concentraram no Brasil, na parte que abrange do Amazonas ao Brasil Central e abriga floresta amazônica e Cerrado, por haver mais dados e ser possível analisar regiões com pouca interferência humana, ressaltando os processos naturais.

Os resultados mostraram que, além da quantidade de chuva característica de cada lugar, também é importante a variabilidade que está escondida pelo valor médio. O estudo surgiu de conversas entre Hirota e o biólogo Rafael Oliveira, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que a levaram a produzir um mapa unindo, ao longo de vários eixos, variáveis como a média de chuvas de cada local, a sazonalidade e os efeitos esporádicos como El Niño – esse conjunto é chamado de regime de chuvas. Esse mapa, que não foi publicado por si só, serviu como ferramenta para a alemã Catrin Ciemer quando passou um período no laboratório de Hirota na UFSC, como parte de seu doutorado em física na Universidade Humboldt de Berlim, na Alemanha. Ao analisar as variáveis do mapa, Ciemer selecionou como fator principal a variabilidade interanual – causada por eventos do tipo El Niño, por exemplo – em vez da média de chuva.


Fisionomia aberta do Cerrado não é necessariamente o futuro da florestaRafael Oliveira / Unicamp

Em alguns lugares é fácil prever a quantidade e a distribuição das chuvas – e as espécies que vivem ali estão adaptadas a essas condições. Em outros, as precipitações são imprevisíveis e as florestas passam por longos períodos chuvosos ou de seca, sem um ritmo regular. Um lugar com 1.600 milímetros de chuva por ano pode ter essa pluviosidade distribuída de maneira uniforme ou esporádica quando se compara anos sucessivos. Para os pesquisadores, é essa irregularidade que conta.

“Existe um mecanismo compensatório que chamamos de efeito de treino”, diz Hirota. Esse efeito faz com que, nas áreas de maior variabilidade, tanto a floresta como a savana consigam existir em uma faixa mais ampla de média de chuva. Oliveira explica que por trás dessa capacidade estão características funcionais das árvores que lhes permitem resistir a secas prolongadas, por exemplo. Entram nessa equação a densidade da madeira, a estatura das árvores, as propriedades hidráulicas que lhes permitem resistir à seca, entre outras. “Ainda não entendemos todas as propriedades do sistema”, ressalta ele. A importância detectada agora para a resistência à variabilidade é uma pista importante para, daqui em diante, esmiuçar aspectos ecofisiológicos da vegetação.

Oliveira também explica que, para testar as hipóteses levantadas no artigo da Nature Geoscience, o ideal é que existam séries temporais muito longas registrando o que acontece com a floresta conforme as variações climáticas, algo bastante demorado de fazer. No longo prazo, ele propõe que o regime de chuvas selecione espécies capazes de subsistir naquelas condições.


Na área hachurada, analisada no estudo, floresta e savana podem coexistir; zona com maior variabilidade interanual é mais resiliente
Ciemer et al./Nature Geoscience

Todas essas ideias amadureceram ao longo de um projeto financiado pela FAPESP que terminou no início de 2018, e agora continuarão a se desenvolver com apoio do Instituto Serrapilheira. “É preciso tempo para que uma inspiração inicial dê origem a um modelo que possa gerar conhecimento”, diz Hirota, que coordena o projeto atual em parceria com Oliveira e outros colegas. A partir dos achados publicados agora, eles pretendem entender como o clima, a presença humana, o tipo de vegetação, a água e o fogo atuam para determinar a resiliência da floresta.

Por enquanto, Oliveira não parece ser preocupar com a possível transformação da Amazônia em savana. Não só é um conhecedor e apreciador do Cerrado, mas também vem observando, nos resultados de sua pesquisa, que as florestas são mais resilientes do que se esperava. “Com as mudanças que ocorrem no clima pode haver uma dinâmica de substituição de espécies mais adaptadas”, pondera. A floresta pode se tornar mais resistente ou com uma feição mais aberta diferente de savana, como aconteceu no experimento que simulou uma seca na Amazônia (ver Pesquisa FAPESP nº 238).

Projetos
1. Towards an understanding of tipping points within tropical South American biomes (nº 13/50169-1); Modalidade Parceria para Inovação Tecnológica (Pite); Convênio Microsoft Research; Pesquisador responsávelRicardo da Silva Torres (Unicamp); Investimento R$ 446.798,40 (FAPESP).
2. Interações entre solo-vegetação-atmosfera em uma paisagem tropical em transformação (nº 11/52072-0); Modalidade Parceria para Inovação Tecnológica (Pite); Convênio Microsoft Research; Pesquisador responsávelRafael Silva Oliveira (Unicamp); Investimento R$ 1.249.709,83 (FAPESP).
3. Fenômenos dinâmicos em redes complexas: fundamentos e aplicações (nº 15/50122-0); Modalidade Projeto Temático; Convênio DFG; Pesquisadores responsáveis Elbert Einstein Nehrer Macau (Inpe) e Jurgen Kurths (Universidade Humboldt); Investimento R$ 3.757.320,00 (FAPESP).

Artigo científico
Revista FAPESP

Manguezal armazena mais carbono que floresta



Floresta de mangue retém duas vezes mais carbono que a mata, na AmazôniaLéo Ramos Chaves

O litoral das regiões Norte e Nordeste do país abriga uma das mais extensas florestas de mangue do mundo. Área de reprodução de grande variedade de animais marinhos, os manguezais protegem a costa das ondas e da subida do nível do mar. Já se sabia que são importantes sorvedouros de gás carbônico, associado às mudanças climáticas. Agora, se conhece melhor a capacidade de esse tipo de vegetação armazenar o gás de efeito estufa. Um estudo realizado por pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos verificou que, na Amazônia, cada hectare de manguezal contém uma quantidade de carbono duas vezes maior que a mesma área de floresta (Biology Letters, 5 de setembro). No Nordeste, 1 hectare de mangue armazena ao menos oito vezes mais carbono do que 1 hectare de vegetação da Caatinga. A equipe coordenada por John Boone Kauffman, da Universidade Estadual do Oregon, Angelo Bernardino, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), e Tiago Ferreira, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), chegou a esses valores depois de passar quatro anos realizando medições em áreas de manguezais preservados e em regiões nas quais esse tipo de floresta havia sido removido. Em um estudo anterior, a mesma equipe havia quantificado o gás carbônico que esses ecossistemas liberam para o ar quando devastados – em geral, para dar lugar a pastagens ou fazendas de camarão. No Nordeste, a conversão de 1 hectare de manguezal em fazenda de camarão emite cerca de 10 vezes mais gás carbônico do que a queima de 1 hectare de floresta continental. Esse volume de carbono é equivalente ao acumulado no solo do mangue durante mais de 180 anos (Ecology and Evolution, maio).
Revista Fapesp

sábado, 6 de abril de 2019

Alguns humanos detectam, inconscientemente, o campo magnético da Terra


Em experimento, voluntários expostos a campo similar ao gerado pelo nosso planeta sofreram alterações perceptíveis nas ondas cerebrais do tipo alfa.
Ingrid Luisa

(real444/Getty Images)


Ainda bem que ninguém é de ferro, porque nós estamos rodeados por um campo magnético.


Alguns animais (e, surpreendentemente, algumas bactérias) são capazes de detectar esse campo e usá-lo para determinar sua posição na Terra.

Essa capacidade se chama magnetorecepção, e é o GPS biológico que guia aves, peixes, tartarugas e outros animais migratórios em suas viagens.


Além de servir de Waze da vida selvagem, o campo tem outras aplicações: ratos-toupeira o utilizam para posicionar seus ninhos; os cães se ajeitam com base nele na hora de fazer xixi ou cocô (e você achando que cortar papel higiênico no picote é TOC).

A novidade está em um estudo conduzido pelas Universidades de Princeton e de Tóquio: os pesquisadores afirmam alguns seres humanos também conseguem se orientar de acordo com o campo magnético – ainda que inconscientemente. Até então, pensava-se que nossa espécie não tinha essa habilidade.

O tema voltou à tona quando o geofísico Joseph Kirschvink e o neurocientista Shin Shimojo perceberam que a magnetorecepção, nos animais, não é útil só para migrar, construir tocas, fazer cocô e outras atividades de cunho prático.


A presença do campo magnético da Terra gera mudanças perceptíveis na atividade cerebral de pássaros, tartarugas etc., que não estão necessariamente associadas ao uso que eles dão para o “sexto sentido”.


Assim, os cientistas especularam que talvez o campo também afete de alguma maneira o cérebro humano – e a gente só não dê bola para o dito cujo porque não precisamos da magnetorecepção para sobreviver.

A câmara escura

Para analisar essa possibilidade, os cientistas criaram um experimento com uma gaiola em forma de cubo, cujas paredes eram especialmente projetadas para proteger a instalação contra interferências externas.

No interior dessa câmara isolada, enquanto os participantes tinham suas ondas cerebrais monitoradas por eletroencefalograma (EEG), os pesquisadores reproduziram o campo magnético da Terra.

O experimento envolveu 34 voluntários adultos, homens e mulheres com idades entre 18 e 68 anos. Os dados do EEG foram coletados de 64 eletrodos. Durante os testes, que foram realizados na escuridão total, o cientistas mudavam a direção do campo magnético para verificar se o cérebro dos voluntários reagia de alguma forma.

Resultados

Nenhum dos 34 participantes disse sentir qualquer alteração durante o teste. Ou seja: o ser humano é incapaz de detectar conscientemente o campo magnético terrestre à sua volta. Os eletroencefalogramas de quatro deles, porém, mostraram mudanças inconscientes.

Certas mudanças no campo magnético desencadearam uma queda nas ondas cerebrais alfa desses quatro. As ondas cerebrais alfa são um padrão de ativação de neurônios que ocorre entre 8 e 12 vezes por segundo e é comum quando você deita de olhos fechados, mas se mantém acordado.


A queda nas ondas alfa observada durante esses experimentos sugere que o cérebro interpreta os campos magnéticos como um estímulo – só não sabemos ainda para que serve esse estímulo, se é que ele tem alguma serventia.


“Eu estou convencido de que algo no cérebro está respondendo ao campo magnético de uma forma peculiar”, afirmou à revista Science a neurocientista Mary MacLean, que não participou do estudo. “Eu só não faço ideia do que esse mecanismo realmente representa.”


Outros especialistas, mais céticos, não consideram o achado relevante. “Se eu enfiasse minha cabeça em um forno de micro-ondas e ligasse, eu também veria o efeito nas minhas ondas cerebrais”, afirmou, também no artigo da Science, o biofísico Thorsten Ritz. “Isso não significa que eu tenha um sexto sentido de microondas.”


Polêmicas à parte, os autores do artigo concluem o artigo esperançosos: “Dada a presença conhecida de sistemas de navegação geomagnética altamente evoluídos em espécies do reino animal, não é surpreendente que tenhamos mantido pelo menos alguns desses componentes neurais funcionais, especialmente dado o estilo de vida de caçador-coletor nômade de nossos ancestrais não tão distantes. A extensão total desta herança ainda precisa ser descoberta”.
Revista Mundo Estranho

quarta-feira, 3 de abril de 2019

Certos conflitos estão associados a mudança climática e migração, sugere estudo


Pesquisadores concluíram que as mudanças climáticas foram um fator decisivo na busca de asilo entre 2011-2015

Departamento para o Desenvolvimento Internacional / Derek Markwell

Este acampamento, criado pelo ACNUR, tem capacidade para 15.000 refugiados. No momento em que a foto foi tirada, ela estava acomodando cerca de 2.000 pessoas - mas mais pessoas estão chegando da Costa do Marfim todos os dias, fugindo da luta feroz e agitação política lá.

Nas últimas décadas, as condições climáticas têm sido responsáveis por gerar agitação política, guerras civis e, posteriormente, ondas de migração, mas a evidência para estabelecer esta conexão de forma científica ainda é limitada. Um estudo que envolveu acadêmicos da Universidade de East Anglia (UEA) procurou detectar as conexões entre mudança climática, conflito e migração.

Um exemplo importante é o conflito em curso na Síria, que começou em 2011. Muitos países europeus da costa do Mediterrâneo experimentaram a chegada de milhares de refugiados, que fugiram do conflito na África.

Pesquisadores do Instituto Internacional para Análise de Sistemas Aplicados (IIASA) na Áustria, incluindo Raya Muttarak, também da Escola de Desenvolvimento Internacional da UEA, procuraram descobrir se existe um nexo causal entre a mudança climática e a migração, e qual a sua natureza. Eles descobriram que, em circunstâncias específicas, as condições climáticas levam ao aumento da migração, mas indiretamente, causando conflitos.

Os resultados, publicados na revista Global Environmental Change, sugerem que a mudança climática desempenhou um papel significativo na migração e busca de asilo no período 2011-2015, com secas mais severas ligadas ao agravamento do conflito.

Muttarak, professor sênior de geografia e desenvolvimento internacional da UEA, disse: "A questão de como as condições climáticas podem contribuir para a agitação política e a guerra civil chamou a atenção tanto da comunidade científica quanto da mídia. Contribuímos para o debate sobre a migração induzida pelo clima, fornecendo novas evidências científicas.”

"O efeito do clima na ocorrência de conflitos é particularmente relevante para os países da Ásia Ocidental no período 2010-2012, quando muitos estavam passando por transformações políticas durante as chamadas revoltas da Primavera Árabe. Isso sugere que o impacto do clima na busca de conflitos e asilo fluxos é limitado a períodos de tempo e contextos específicos”. As revoltas políticas da Primavera Árabe ocorreram em países como a Tunísia, a Líbia e o Iêmen, e na Síria, onde o conflito levou a uma guerra civil.

Na Síria, particularmente, secas e escassez de água causadas pela mudança climática resultaram em repetidas quebras nas colheitas, com as famílias rurais eventualmente se mudando para áreas urbanas. Isso, por sua vez, levou à superlotação, desemprego e agitação política, e depois à guerra civil. Padrões semelhantes também foram encontrados na África subsaariana no mesmo período de tempo.

Jesus Crespo Cuaresma, do IIASA e da Universidade de Economia e Negócios de Viena, disse: "As alterações climáticas não causarão conflitos e subsequentes fluxos de busca de asilo em todos os lugares. Mas num contexto de má governança e um nível médio de instituições democráticas, condições climáticas severas podem levar a conflitos por recursos escassos ".

Os pesquisadores, que também incluem Guy Abel (IIASA e Universidade de Xangai) e Michael Brottrager (Universidade Johannes Kepler Linz), dizem que as preocupações relacionadas aos conflitos induzidos pelas mudanças climáticas que levam à migração devem ser consideradas no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (SDGs).

Atualmente, a ligação entre as mudanças climáticas e a migração não é explícita, e elas não são tratadas como inter-relacionadas. Mais pesquisas são necessárias para entender melhor os fluxos migratórios.

Os requerentes de asilo têm maior probabilidade de serem influenciados por conflitos do que os migrantes habituais. Por isso, os investigadores utilizaram dados de pedidos de asilo de 157 países entre 2006 e 2015 para estudar os padrões. Esses dados foram obtidos do alto comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUR).

Como uma medida das condições climáticas nos países originais dos requerentes de asilo, a equipe usou o Índice Padronizado de Evapotranspiração-Precipitação (SPEI), que mede as secas comparadas às condições normais, identificando o início e fim das secas e sua intensidade com base precipitação, evaporação, transpiração e condições climáticas, como temperatura. Para avaliar o conflito, a equipe usou dados sobre mortes relacionadas a guerras do Programa de Dados de Conflito de Uppsala (UCDP).

Esses conjuntos de dados foram introduzidos na estrutura de modelagem dos pesquisadores, juntamente com vários conjuntos de dados socioeconômicos e geográficos. Estes incluíam a distância entre o país de origem e o destino, os tamanhos das populações, as redes de migrantes, o estatuto político dos países e os grupos étnicos e religiosos.

UNIVERSIDADE DE EAST ANGLIA
Revista Scientific American

O oceano está ficando sem fôlego, alertam os cientistas

Declínio dos níveis de oxigênio pressiona espécies sensíveis - uma tendência que continuará com a mudança climática

Matt Wilson / Clark Jay, NOAA NMFS AFSC Wikimedia
Zooplâncton 


As atividades executadas por animais - incluindo aí o animal humano - tais como fugir de predadores, digerir os alimentos etc. exigem oxigênio. Mas vários novos estudos revelam que está cada vez mais difícil para a vida marinha obter esse ingrediente essencial.

Na última década, os níveis de oxigênio nos oceanos despencaram - uma tendência alarmante ligada à mudança climática, diz Andreas Oschlies, oceanógrafo do Centro Helmholtz de Pesquisas Oceanicas Kiel, na Alemanha, cuja equipe monitora os níveis de oxigênio nos oceanos em todo o mundo. "Ficamos surpresos com a intensidade das mudanças que vimos, a rapidez com que o oxigênio está baixando no oceano e o quão grandes são os efeitos nos ecossistemas marinhos", diz ele.

Não é surpresa para os cientistas que oceanos aquecidos experimentem perda de oxigênio, mas a escala do declínio exige atenção urgente, diz Oschlies. Os níveis de oxigênio em algumas regiões tropicais caíram impressionantes 40% nos últimos 50 anos, revelam alguns estudos recentes. Os níveis caíram mais sutilmente em outros lugares, e a perda média global é de 2%.

Oschlies e outros pesquisadores do campo descobriram que os animais marinhos, grandes e pequenos, respondem até mesmo a pequenas alterações no oxigênio, buscando refúgio em zonas de oxigênio mais altas ou ajustando seu comportamento. Esses ajustes podem expor animais a novos predadores ou forçá-los a regiões com escassez de alimentos. A mudança climática já coloca sérios problemas para a vida marinha, como a acidificação dos oceanos, mas a desoxigenação é a questão mais urgente que os animais marinhos enfrentam atualmente, diz Oschlies. Afinal, diz ele, "todos precisam respirar."

UM PROBLEMA DA CADEIA ALIMENTAR

Um oceano aquecido perde oxigênio por duas razões: primeiro, quanto mais quente um líquido se torna, menos gás ele pode conter. É por isso que as bebidas carbonatadas ficam sem gás mais rapidamente quando deixadas ao Sol, diz Oschlies. Em segundo lugar, quando o gelo polar do mar derrete, ele forma uma camada de água leve na superfície do mar sobre águas mais frias e salgadas. Este processo cria uma espécie de tampa que pode impedir que as correntes misturem as águas superficiais com aquelas situadas em camadas mais profundas. E como todo o oxigênio entra neste habitat a partir da superfície - seja diretamente da atmosfera ou do fitoplâncton que vive na superfície, produzindo-o durante a fotossíntese -, menos mistura significa menos oxigênio nas áreas profundas.

Os efeitos de oscilações sutis no oxigênio em locais onde o zooplâncton - animais na base da cadeia alimentar - se reúne em coluna de água foram documentados em um relatório de dezembro de 2018 da Science Advances. "Eles são muito sensíveis", diz Karen Wishner, líder do estudo, oceanógrafa da Universidade de Rhode Island, mais até do que ela esperava. Algumas espécies nadam para águas mais frias e profundas com mais oxigênio. "Mas em algum momento não funciona para eles irem mais fundo", diz ela, porque pode ser mais difícil encontrar comida ou se reproduzir em águas de baixa temperatura. Muitos predadores - incluindo peixes, lulas e baleias - ou comem zooplâncton ou comem peixes que comem zooplâncton, então as formas como o zooplâncton lidam terão ramificações na cadeia alimentar, observa ela.

Além das interrupções na rede alimentar, os animais enfrentam vários outros desafios fisiológicos à medida que seus corpos se ajustam para reduzir os níveis de oxigênio. Camarões chineses lançam suas caudas de forma menos vigorosa para economizar energia em ambientes de oxigênio mais baixos, tornando-se menos ágeis como resultado, informou um estudo sobre Fisiologia e Comportamento Marinho e de Água Doce no mês passado. Além disso, alguns peixes machos produzem menos e menos espermatozóides móveis à medida que os níveis de oxigênio diminuem - e a tendência parece não se recuperar nas gerações futuras quando os níveis de oxigênio melhoram, disseram pesquisadores na Nature Communications.

As funções sensoriais básicas, como ver e ouvir, também podem sofrer em um oceano com falta de oxigênio, diz Lillian McCormick, estudante de doutorado na Universidade da Califórnia, em San Diego. Seus resultados preliminares sugerem que mesmo pequenas quedas no oxigênio prejudicam a visão em alguns zooplânctons. (Isso também acontece em humanos, com evidências de pessoas viajando em altas altitudes experimentando visão noturna e cores reduzidas.) Muitas espécies de zooplâncton confiam em pistas visuais para migrar pela coluna d`água a cada manhã para evitar predadores, então a perda de visão pode impedir sua capacidade de captar essas dicas de luz, diz ela.

Algumas criaturas, como as medusas, são mais tolerantes a baixos níveis de oxigênio do que outras. Mas, todos os animais irão sentir o impacto da desoxigenação porque todos eles desenvolveram sua capacidade de oxigênio por uma razão, diz Brad Seibel, um oceanógrafo da Universidade do Sul da Flórida que trabalhou com Wishner no recente estudo sobre zooplâncton. "Qualquer queda no oxigênio vai prejudicar a capacidade de sobrevivência e o desempenho", diz ele.

HABITATS ENCOLHENDO

À medida que as regiões ricas em oxigênio se tornam mais escassas, os atuais habitats de peixes também irão encolher e forçar espécies economicamente importantes - como o atum, que gera globalmente estimados US$ 42 bilhões por ano - a novas faixas. No nordeste do Atlântico tropical, os pesquisadores descobriram que o hábitat para o atum e a pesca do peixe-agulha diminuíram 15% entre 1960 e 2010 devido à perda de oxigênio.

As pescarias costeiras também podem enfrentar a pressão adicional das lavouras de algas que consomem o escoamento da agricultura e consomem oxigênio copioso à medida que decaem - como tem sido o caso no Golfo do México, perto da foz do rio Mississippi. Essas “zonas mortas” forçam alguns peixes a buscar áreas de oxigênio mais altas nas bordas de suas faixas típicas. Isso pode ajudar os pescadores a encontrá-los porque os peixes se reúnem nessas áreas condensadas, mas também fornece uma falsa sensação de abundância e não será sustentável a longo prazo, observa Seibel.

Para resolver o problema geral de desoxigenação, Oschlies ajudou a organizar uma conferência internacional sobre o assunto em Kiel em setembro passado. Os participantes elaboraram uma declaração improvisada chamada Declaração de Kiel sobre a desoxigenação oceânica para conscientizar os governos internacionais, as Nações Unidas e o público, bem como exigir ações imediatas. Eles querem que governos e grupos internacionais façam avanços mais sérios para diminuir a mudança climática e reduzir a poluição do escoamento da costa que agrava o declínio de oxigênio. Os pesquisadores modelaram a nova declaração após a Declaração de Mônaco, que a Oschlies acredita ter ajudado a aumentar a conscientização internacional sobre a acidificação dos oceanos em 2008.

"É realmente um alerta para o público e para as várias agências governamentais e internacionais sobre a importância desta questão", diz Wishner, um dos mais de 300 cientistas de mais de 30 países que assinaram a declaração. Seibel, também signatário, não mede palavras sobre o assunto: "Eu acho que é potencialmente muito terrível."

Laura Poppick
Revista Scientific American

Rebobinando o clima: cientistas transformam dióxido de carbono em carvão


Nova técnica pode converter eficientemente CO2 do gás em partículas sólidas de carbono

Reprodução

Pesquisadores usaram metais líquidos para transformar dióxido de carbono novamente carvão sólido, uma conquista que poderia transformar nossa abordagem de captura e armazenamento de carbono. A equipe de pesquisa liderada pela RMIT University, em Melbourne, Austrália, desenvolveu uma nova técnica que pode converter eficientemente o CO2 de um gás em partículas sólidas de carbono.



Publicado na revista Nature Communications, a pesquisa oferece um caminho alternativo para a remoção segura e permanente do gás de efeito estufa de nossa atmosfera. As tecnologias atuais de captura e armazenamento de carbono concentram-se na compactação do CO2 em uma forma líquida, transportando-o para um local adequado e injetando-o no subsolo. Mas, a implementação tem sido dificultada por desafios de engenharia, questões relacionadas à viabilidade econômica e preocupações ambientais sobre possíveis vazamentos dos locais de armazenamento.



O pesquisador da RMIT, Dr. Torben Daeneke, disse que a conversão de CO2 em um sólido pode ser uma abordagem mais sustentável. "Enquanto não podemos literalmente voltar no tempo, transformar o dióxido de carbono novamente em carvão e enterrá-lo de volta no solo é como rebobinar o relógio das emissões", disse Daeneke, um membro do Conselho de Pesquisa Australiano da DECRA. Até o momento, o CO2 só foi convertido em sólido a temperaturas extremamente altas, tornando-o industrialmente inviável.

"Usando metais líquidos como catalisadores, mostramos que é possível transformar o gás novamente em carbono à temperatura ambiente, em um processo que é eficiente e escalável. Embora mais pesquisas precisam ser feitas, é um primeiro passo crucial para a entrega de armazenamento sólido de carbono." afirma Daeneke.

Como a conversão ocorre

A autora, Dorna Esrafilzadeh, desenvolveu a técnica eletroquímica para capturar e converter CO2 atmosférico em carbono sólido armazenável. Para converter CO2, os pesquisadores projetaram um catalisador de metal líquido com propriedades de superfície específicas que o tornaram extremamente eficiente na condução de eletricidade enquanto ativa quimicamente a superfície. O dióxido de carbono é dissolvido em um béquer preenchido com um líquido eletrolítico e uma pequena quantidade do metal líquido, que é então carregado com uma corrente elétrica.

O CO2 se converte lentamente em flocos sólidos de carbono, que são naturalmente separados da superfície do metal líquido, permitindo a produção contínua de sólido carbonáceo. Esrafilzadeh disse que o carbono produzido também pode ser usado como eletrodo.

"Um benefício colateral do processo é que o carbono pode manter a carga elétrica, tornando-se um supercapacitor, por isso potencialmente poderia ser usado como um componente em veículos futuros. O processo também produz combustível sintético como subproduto, que também pode ter aplicações industriais."

Instituto Real de Tecnologia de Melbourne
Revista Scientific American

terça-feira, 2 de abril de 2019

20 imagens de trabalho infantil que o deixarão sem palavras


Publicado no Site Conti Outra 


Há mais de uma década, a Organização Internacional do Trabalho ( OIT ) estabeleceu o dia 12 de junho como dia Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, contudo, ainda existem milhões de crianças em todo o mundo que estão empregados ilegalmente. Em tais condições, eles não têm direito à educação e às alegrias próprias da infância.

O trabalho infantil é mental, física e emocionalmente desgastante, e em casos extremos pode ser classificado como escravidão.

Abaixo, 20 fotografias de trabalho infantil capturadas pelo mundo. O que eles fazem para sobreviver o deixará, certamente, sem palavras …


Shaheen, 10, trabalha em uma fábrica de alumínio. Foto tirada em Dhaka, Bangladesh, em 16 de novembro de 2009.


Masud, 6, reúne peças do veículo em Bangladesh, em 29 de Fevereiro de 2012.


Naginah Sadiq, 5, trabalha em uma fábrica de tijolos de barro, em Islamabad, Paquistão. Foto de 12 de Junho de 2012.


Foto tirada em Lad Rymbai, na Índia, no dia 16 de abril de 2011. Os pais não permitem que as crianças vão à escola.


Takenin, aldeia Chheuteal, província de Kandal, Camboja, em 2 de Maio de 2011. Esta menina seca tijolos para uma fábrica de tijolos

Takenin Cartum, Sudão, em 17 de setembro de 2011. Como muitas pessoas na região de Darfur, este rapaz ganha dinheiro formando blocos de lama.


Foto tiradda em Nova Delhi, na Índia, em 12 de junho de 2012. Este menino está limpando as peças da bicicleta, possivelmente para vender.


Foto feita em Dhaka, em 19 de abril de 2012. Outro rapaz trabalha em uma fábrica de alumínio.Acredita-se que mais de 6 milhões de crianças com idade inferior a 14 trabalham em Bangladesh.


Jacques Monkotan, 4, trabalha em um sítio de escavação em Dassa-Zoume, Benin, no dia 25 de Fevereiro, 2007.


Burma, em 6 de dezembro de 2011. Esta menina transporta cimento necessário para um novo hotel.


Czoton, 7, é trabalha em uma fábrica de balão em Dhaka, Bangladesh, em 23 de Novembro, 2009.


Hazrat, 7, trabalha em uma fábrica de tijolos inJalalabad, Afeganistão.


Rustam, 10, trabalha em uma fábrica de alumínio em Daca, Bangladesh. 25 outras crianças trabalham com ele durante 12 horas por dia.


Esta criança é um imigrante ilegal que recolhe plástico em um depósito de lixo em Mae Sot, Tailândia.


Esta criança organiza tijolos nos arredores de Herat, Afeganistão.


Outra criança trabalha em um depósito de lixo em Islamabad, Paquistão.


Issa, 10, trabalha em uma fábrica de armas para o Exército Livre da Síria em Aleppo.


Diversas crianças enchem os cigarros com o tabaco cultivado localmente no distrito Haragach em Rangpur, Bangladesh.


Esta criança está em busca de plástico reciclável em Siem Reap, Camboja.


Paulo Henrique Felix da Silveira, 9, de Saramandaia, favela no Recife, Brasil. 

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