domingo, 17 de janeiro de 2010

PROCURAM-SE PLANETAS

Adriana Válio

Aqueles que observarem o céu noturno cuidadosamente, noite após noite, notarão uns poucos astros errantes no firmamento, isto é, pontos brilhantes que se movem com relação às estrelas fixas. Os gregos já haviam notado isso desde a antiguidade e os batizaram de "planetas", que significa errante em grego. Até o século XVI, anterior à invenção do telescópio, cinco eram os planetas conhecidos, os quais levam os nomes dos deuses grego-romanos: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno.

Foi somente em 13 de março de 1781 que o planeta Urano foi descoberto por William Herschel, utilizando um telescópio que ele mesmo construiu no quintal de sua casa na Inglaterra. Já o planeta Netuno foi predito antes de ser observado de fato em 1846 por Johann G. Galle e Heinrich L. d´Arrest. A previsão baseou-se nos cálculos matemáticos das perturbações observadas nas órbitas dos planetas Urano, Saturno e Júpiter. Plutão foi observado por acaso em 1930 por Clyde Tombaugh, e recebeu a denominação de planeta devido a um erro na estimativa de sua massa, bem maior do que a real. Por quase um século, assim ficou o sistema solar formado por nove planetas.



DEFINIÇÃO DE PLANETA
Até o final do século XX, o sistema solar era constituído por nove planetas. Entretanto, a descoberta de objetos localizados no cinturão de Kuiper, além da órbita de Netuno, como Sedna e Eris, puseram em cheque a denominação de planeta de Plutão. Esses objetos, com massas da ordem ou até maiores do que a massa de Plutão trouxeram à baila a discussão sobre a necessidade de uma definição precisa do que é um planeta. Além disso, foram descobertos planetas extra-solares, ou seja, planetas que orbitam outras estrelas. Isso exigiu uma reformulação da classificação de planeta, a fim de definir parâmetros claros.

Em 2006, na reunião da Assembléia Geral da União Astronômica Internacional (UAI) em Praga, ocorreu uma discussão entre astrônomos do mundo inteiro. Vários tipos de classificação foram propostos, visando uma definição precisa do que é um planeta. A União Astronômica Internacional decidiu por fim classificar os planetas e outros objetos celestes do sistema solar em três categorias: planeta, planeta-anão e pequenos corpos. Hoje Plutão é considerado um planeta-anão, assim como Sedna e Eris. Dessa forma, o sistema solar passa a ter oito planetas clássicos.

Um planeta, conforme definido em 24 de agosto de 2006 pela União Astronômica Internacional, é um corpo celeste que satisfaça as seguintes três condições:

1. Gira em uma órbita em torno de uma estrela;

2. Tem massa suficiente para que sua própria gravidade supere as forças de corpo rígido de modo que assuma uma forma com equilíbrio hidrostático (isto é, aproximadamente esférica);

3. Tenha limpado a vizinhança de sua órbita (de forma que praticamente não haja população local), ou seja, é o objeto dominante na vizinhança de sua órbita.

O último item baseia-se em conceitos de dinâmica orbital. É justamente o último item da definição de planeta que desqualificou Plutão, pois a órbita de Plutão cruza a de Netuno, que é claramente o objeto dominante nessa vizinhança.

PLANETAS EXTRA-SOLARES
Em primeiro lugar, é necessário distinguir um planeta de uma estrela, e a definição de planeta é principalmente baseada na massa do objeto. De acordo com o Grupo de Trabalho em Planetas Extra-Solares (WGESP, na sigla em inglês) da UAI, os planetas são objetos cujas massas estão abaixo do limite da fusão nuclear do deutério e, portanto, não possuem fonte de energia própria. Essa definição restringe a massa do objeto para algo menor do que aproximadamente 13 MJ, onde MJ equivale à massa do planeta Júpiter. Esses objetos tanto podem orbitar estrelas ou restos estelares, no caso pulsares, e são considerados planetas independentemente da maneira como foram formados.

Já os objetos capazes de realizar a fusão termonuclear do deutério, mas não a do hidrogênio, são denominados de anãs marrons. Estima-se que a massa desses objetos seja algo entre 0,013 e 0,075 da massa do Sol. Finalmente, as estrelas são objetos com massa superior a 0,075 massa solar e, portanto, capazes de fazer a fusão termonuclear do hidrogênio. Convém salientar que os limites de massa descritos acima são valores aproximados.

A descoberta dos primeiros planetas em torno de outras estrelas se deu há quinze anos, em 1992. Porém esses orbitavam não uma estrela normal, mas um pulsar, os restos de uma estrela que explodiu em uma supernova (1). Logo depois, em 1995, astrônomos suíços descobriram o primeiro planeta em torno de uma estrela como o Sol, 51 Pegasus (2). Desde então o número de planetas descobertos tem crescido rapidamente. Hoje existem mais de 350 planetas extra-solares descobertos (http://exoplanet.eu), sendo necessário atualizar esse número semanalmente, para não dizer diariamente.

A estrela 51 Peg, distante 14,7 parsec (1 parsec = 3,086 x 1016 metros, trata-se de uma medida de distância astronômica a partir da técnica de triangulação) da Terra, é muito semelhante ao Sol, e tem aproximadamente a mesma idade. O planeta descoberto ao seu redor possui uma massa de 0,468 MJ em uma órbita com raio de 0,052 U.A. (Unidade Astronômica, U.A., é a distância entre a Terra e o Sol), percorrendo uma volta em torno da estrela em apenas 4,2293 dias. Inicialmente, a grande proximidade da estrela hospedeira de um planeta quase do tamanho de Júpiter gerou muita surpresa. Porém a descoberta foi rapidamente confirmada por um grupo de astrônomos americanos usando o Observatório Lick nos Estados Unidos, e a subsequente descoberta de dois outros planetas em torno de 70 Vir (3) e 47 UMa (4).

MÉTODOS DE DETECÇÃO DE PLANETAS
São vários os métodos de detecção de planetas, os quais basicamente podem ser divididos em três tipos. O primeiro tipo está associado aos efeitos dinâmicos na estrela causados pela interação gravitacional com o planeta em órbita. Esses efeitos podem ser observados através de: i) deslocamento Doppler, ou velocidade radial, das linhas espectrais de átomos na atmosfera estelar; ii) variação do tempo de chegada de um sinal periódico muito preciso, como o de pulsares; ou iii) de medidas astrométricas do movimento da estrela no céu.

O segundo método diz respeito ao efeito do planeta funcionar como uma lente gravitacional amplificando ligeiramente a luz da estrela hospedeira. Perturbações na forma de cáusticas da luz são interpretadas como sendo devido à presença de um planeta.

Finalmente, o terceiro método refere-se a efeitos fotométricos, seja na variação do brilho da estrela causada por trânsitos do planeta em órbita, seja por detecção direta da luz do próprio planeta. Atualmente, ainda não é possível detectar a luz visível refletida por um planeta de outro sistema planetário em torno de uma estrela como o Sol, devido ao fato do planeta ser um bilhão de vezes menos brilhante do que a estrela. No entanto, isso se torna factível em comprimentos de onda mais longos, como na faixa do infravermelho, ou então observando-se estrelas de baixa massa, menos brilhantes, ou estrelas jovens cujo brilho ainda não alcançou o seu máximo.

MÉTODO DE VELOCIDADE RADIAL
Até hoje a grande maioria dos planetas foi detectada pelos efeitos dinâmicos sobre a estrela, os quais podem ser observados como pequenas variações na velocidade radial das linhas espectrais provenientes de átomos na atmosfera da estrela. No entanto, por enquanto, esse método de detecção está limitado à detecção de planetas gigantes como Júpiter muito próximos à sua estrela. Planetas telúricos, isto é, rochosos como a Terra, somente foram detectados por medidas muito precisas do tempo de chegada da radiação de um pulsar ou poderão ser detectados num futuro próximo por observações de seus trânsitos realizadas do espaço.

Não é somente o planeta orbitando uma estrela que sofre a atração gravitacional desta, mas também a estrela sente a força gravitacional causada pelo planeta. Essa força gravitacional, segundo a Lei da Gravitação Universal de Newton, é proporcional ao produto das massas e inversamente proporcional à distância ao quadrado do planeta à estrela. Quanto maior a massa do planeta, ou menor a distância entre os dois corpos, maior será a força de atração gravitacional e o efeito produzido no movimento da estrela. O resultado é que ambos, estrela e planeta, descrevem então órbitas em torno do centro-de-gravidade comum do sistema com um mesmo período. Esse movimento da estrela causa pequenas perturbações periódicas em três grandezas que podem ser observadas: tempo de chegada de um sinal periódico de referência, posição e deslocamento Doppler de linhas espectrais (ou velocidade radial).

Não apenas um único planeta orbitando ao redor de uma estrela, mas sistemas planetários com até quatro planetas já foram descobertos. Atualmente, já somam 34 os sistemas planetários descobertos pelo método de velocidade radial. O primeiro sistema planetário a ser descoberto foi Andromedae, cuja estrela havia apresentado anteriormente uma periodicidade de 4,6 dias na sua velocidade radial consistente com a presença de um gigante gasoso a apenas 0,059 U.A. da estrela. Observações subsequentes pelo time do Observatório Lick confirmaram essa periodicidade e revelaram periodicidades adicionais de 241 e 1.275 dias. Essas variações periódicas se mostraram consistentes com o movimento orbital kepleriano de mais dois planetas gigantes, com duas e quatro vezes a massa de Júpiter, respectivamente.


MICROLENTE GRAVITACIONAL

Um evento de microlente gravitacional, em nossa galáxia, ocorre quando um objeto massivo, compacto e escuro (a lente) passa muito próximo da linha de visão de uma estrela mais brilhante ao fundo (a fonte). Os raios de luz da estrela-fonte são então curvados pelo campo gravitacional da estrela-lente no meio do caminho. Esse efeito, proposto primeiramente por Albert Einstein, foca a luz da fonte distante causando, portanto, a amplificação aparente da sua luz.

Geralmente, a estrela-fonte situa-se no bojo da galáxia enquanto que a estrela-lente pode tanto fazer parte da população do bojo ou estar localizada no disco da galáxia. Uma vantagem desse método é não ser necessário detectar a luz da lente, geralmente fraca, que tanto pode ser uma estrela ou um planeta ao seu redor. O método de microlente é principalmente sensível a planetas com órbitas entre 1 e 5 U.A. e massas desde da ordem da de Júpiter até massas terrestres, mesmo que a vários kpc de distância. Em princípio, esse método é capaz de detectar planetas tão pequenos quanto 0,1 massa da Terra no caso de estrelas-fontes da sequência principal no bojo galáctico.

Devido ao movimento relativo entre fonte, lente e observador, o fator de amplificação varia com o tempo, aumentando gradativamente e depois diminuindo num período que pode durar horas ou dias. Caso a estrela-lente possua um planeta ao seu redor, este atuará como uma lente também causando um pico secundário de amplificação com menor intensidade e duração.



Embora esse método seja eficaz para detecção de planetas pequenos, é necessário um alinhamento extremamente preciso entre as estrelas fonte e lente e o observador. A probabilidade de que isso ocorra causando uma amplificação substancial é bastante diminuta, da ordem de 10-6 para as estrelas no bojo galáctico ou nas Nuvens de Magalhães. Até o presente, oito planetas já foram descobertos por esse método.

Uma desvantagem do método de microlente gravitacional é o fato de não poder ser reproduzível, isto é, uma vez que um evento ocorra é bastante improvável que ele ocorra novamente para o mesmo sistema em uma escala de tempo humana. Além disso, não é possível escolher uma estrela-lente específica para determinar se existe ou não algum planeta ao seu redor. Entretanto, esse método possui várias vantagens como sua alta sensibilidade mesmo para planetas de massa terrestre, detecção de planetas distantes (a kpc de distância), e finalmente não é necessário observar a luz da estrela-lente ou seu planeta, pois o que se mede é apenas o seu efeito gravitacional.

FOTOS DE PLANETAS

Obviamente a maneira mais direta de inferir a existência de um planeta é através da detecção direta de sua luz. No entanto, o fato de um planeta não emitir luz própria na faixa do visível, mas apenas refletir a luz de sua estrela hospedeira torna o seu brilho um bilhão de vezes mais fraco do que o da estrela. Além disso, a sua proximidade à estrela dificulta substancialmente a detecção da sua emissão.

Como mencionado anteriormente, atualmente ainda não é possível obter uma fotografia na faixa do visível para planetas em torno de estrelas como o Sol, pois o brilho da estrela é da ordem de um bilhão de vezes mais intenso do que o do planeta. Para superar esse problema, as observações têm se concentrado em estrelas bastante jovens e as observações têm sido realizadas no infravermelho. Os objetos sub-estelares em torno dessas estrelas, com a mesma idade, por serem jovens encontram-se ainda em fase de contração. Consequentemente, são muito mais quentes e brilhantes e, portanto, mais facilmente detectados. Até o presente, imagens de 11 planetas já foram obtidas.

Em 27 de abril de 2004, fotografou-se o primeiro planeta em órbita da anã marrom 2M 1207 com massa de 25 MJ e idade aproximadamente de 8 milhões de anos. A imagem mostrada na figura 3(A) foi obtida com o Very Large Telescope (VLT) operando na faixa do infravermelho. A distância de 59 kpc até o sistema implica que o planeta está a uma distância projetada de 55 U.A. da sua estrela.

A figura 3(B) mostra uma estrela jovem (T Tauri) GQ Lupi com sua companheira, 250 vezes mais fraca e distante 100 U.A., o segundo planeta fotografado, em 25 de junho de 2004. Essa é uma estrela jovem de 0,7 Msol com menos que 2 milhões de anos em uma região de formação estelar a 140 kpc da Terra. Comparando com imagens dessa mesma estrela obtidas entre 2 e 5 anos antes, foi possível confirmar que o objeto companheiro possui o mesmo movimento próprio que a estrela.

ECLIPSES ESTELARES (OU TRÂNSITOS)

Uma outra maneira de se inferir a presença de um planeta é através de pequenas variações periódicas na luz da estrela causada pela passagem do planeta entre a estrela e observador, ou seja, eclipses. A diminuição no brilho da estrela para planetas gigantes como Júpiter é da ordem de 1%, e no caso de planetas telúricos de apenas 0,01%. No último caso, impossível de ser detectado a partir do solo com a tecnologia atual. É claro que esse efeito somente pode ser observado para os sistemas planetários vistos de perfil, isto é, cuja órbita seja quase perpendicular ao plano do céu.

Os primeiros trânsitos de planetas do sistema solar em frente ao Sol foram observados já no século XVII. Obviamente isso ocorre somente para Mercúrio e Vênus, os planetas com órbitas internas à da Terra. Foram necessários mais três séculos para se detectar trânsitos de planetas extra-solares em torno de suas estrelas hospedeiras. Nesse caso, quando o planeta passa na frente da sua estrela ocorre uma pequena diminuição no brilho da estrela. A diminuição da intensidade da luz da estrela é proporcional à razão entre as áreas do planeta e da estrela e se repete periodicamente de acordo com o período orbital.

O primeiro trânsito de planeta extra-solar foi anunciado em 1999 para a estrela HD 209458. O planeta é um gigante gasoso com 70% da massa de Júpiter, porém com um raio 30% maior do que o de Júpiter, muito próximo da sua estrela a apenas 0,045 U.A., e completa uma revolução orbital em torno da estrela a cada 3,5 dias. O trânsito acarreta uma diminuição de 1,8% na intensidade da estrela e possui duração aproximada de 2,5 horas. Esse é, sem dúvida, o planeta mais famoso, o qual é citado em 325 artigos publicados até o presente. Uma grande vantagem do método de trânsito é que fornece o raio do planeta. Caso observações de velocidade radial estejam disponíveis com uma indicação do limite inferior da massa, essa será, de fato, a massa real do planeta pois o ângulo orbital é seguramente próximo de 90º.

Um problema do método de trânsito é a confirmação de que o objeto companheiro é de fato um planeta, o que somente é comprovado após a determinação da sua massa (por velocidade radial). Vários fatores podem causar diminuição periódica no brilho da estrela como, por exemplo, atividade magnética da estrela, mas, principalmente, eclipses entre membros de sistemas estelares duplos ou triplos. Trânsitos por estrelas anãs na frente de uma bem maior (e.g. estrelas gigantes) também podem imitar um trânsito planetário. Nesse caso, é necessário um estudo espectroscópico de baixa resolução da estrela principal para determinar o seu raio.


ATMOSFERAS PLANETÁRIAS

A observação das eclipses primária e secundária (quando o planeta passa atrás da estrela) permite o estudo de suas atmosferas. Durante o trânsito primário nos momentos de ingresso e egresso, conforme a luz da estrela passa através da atmosfera do planeta é possível detectar alguns de seus constituintes como, por exemplo, sódio, hidrogênio, oxigênio e carbono ionizado.

Com o telescópio espacial Hubble operando em 589 nanômetros (nm) (linhas de ressonância do sódio), Charbonneau e colaboradores (5) conseguiram medir um pequeno aumento na profundidade do trânsito de HD 209458 b. Mesmo assim, a detecção foi apenas um terço do valor esperado a partir dos modelos de atmosfera sem nuvens e abundância solar para o sódio. Essa observação, combinada ao limite superior de detecção de CO (monóxido de carbono), implica na presença de nuvens na alta atmosfera do planeta.

As observações espectrais do trânsito secundário de outro planeta, HD 189733 b, evidenciaram que o fluxo do planeta é 0,49% do fluxo da estrela. A comparação do espectro observado com o espectro calculado por modelos atmosféricos de planetas tipo Júpiter, mas quentes, revelou uma discrepância. Os modelos preveem uma queda no fluxo relativo do planeta devido à absorção por água. No entanto essa queda não foi detectada. Esse é um fato intrigante, pois todos os modelos de atmosfera de planetas consideram a presença de água. Uma explicação seria o fato da água estar presente, porém em regiões mais baixas na atmosfera do planeta, encobertas por nuvens de silicato sem água.

O telescópio Alma, um arranjo de antenas de rádio na faixa do submilimétrico, está previsto para entrar em operação em 2012 no deserto do Atacama no Chile. Esse instrumento será capaz de imagear os exoplanetas além de fornecer preciosas informações sobre a composição da atmosfera destes, buscando detectar oxigênio, principal indicador da existência de vida.

OBSERVAÇÃO POR SATÉLITES NO ESPAÇO

Um satélite atualmente em órbita da Terra é o satélite francês CoRoT (Convection, Rotation and planetary Transits, http://corot.oamp.fr) - sendo um dos seus objetivos a detecção de trânsitos de planetas extra-solares. Esse satélite, lançado em 27 de dezembro de 2006, possui uma significativa participação brasileira. A partir do monitoramento contínuo durante 150 dias por vez de um total de 60 mil estrelas, na duração total da missão (prevista para dois anos e meio), espera-se detectar dezenas de trânsitos de planetas gigantes gasosos como Júpiter, e pela primeira vez, descobrir a partir de seus trânsitos também planetas telúricos com até duas ou três vezes a massa da Terra. Atualmente, o satélite CoRoT já descobriu oito planetas extra-solares, sendo o menor deles do tipo super-Terra, isto é, com uma massa aproximada de seis massas terrestres.

O satélite Kepler, da Agência Espacial Americana (Nasa), cujo objetivo é a busca de trânsitos planetários, é capaz de obter imagens de planetas na banda do visível e infravermelho além de estudos espectroscópicos. O satélite norte-americano Kepler foi lançado em 6 de março de 2009 e, brevemente, teremos notícia da detecção de planetas como a Terra.

Várias missões espaciais com o propósito de descobrir e estudar planetas extra-solares estão planejadas para a próxima década. Entre essas podemos citar Darwin, da Agência Espacial Europeia (ESA), com a finalidade de imageamento na faixa do infravermelho e espectroscopia de planetas terrestres, Gaia, também da ESA, cujo objetivo é a detecção de planetas por astrometria e observação de trânsitos planetários.

ZONA DE HABITABILIDADE

É consenso entre os biólogos que a exis-tência de vida baseada em carbono, tal qual a conhecemos aqui na Terra, é imprescindível da disponibilidade de água líquida para a ocorrência de reações químicas durante bilhões de anos. Portanto, a condição principal para que um planeta seja capaz de abrigar vida, ou habitabilidade, é a existência de água líquida em sua superfície que, embora necessária para a vida, não é uma condição suficiente.

A zona de habitabilidade de uma estrela é definida como a região onde a água na forma líquida pode existir na superfície de um planeta. Essa região é controlada pela distância de separação entre a estrela e o planeta, mas também é afetada pela rotação do planeta e a convecção da sua atmosfera. O extremo interior da zona de habitabilidade é limitado pela perda de água e por um possível efeito estufa fora do controle, enquanto que o bordo externo é determinado pela condensação de CO2 (dióxido de carbono) e glaciações. Considerando esses efeitos, a zona de habitabilidade para uma estrela como o Sol está situada entre 0,7 e 1,5 U.A.

Convém notar que essas distâncias variam com a idade da estrela, conforme a estrela evolui, a sua luminosidade aumenta (o Sol jovem era 30% menos brilhante do que o atual e seu fluxo irá aumentar de um fator 3 nos próximos 4 bilhões de anos), portanto futuramente a borda interna da zona de habitabilidade irá migrar para regiões mais externas do sistema solar. Pelo mesmo motivo, isto é, uma maior luminosidade da estrela, os limites da zona de habitabilidade também variam para estrelas de diferentes massas.

Um resultado que teve grande repercussão na mídia em 2007 foi a descoberta do planeta em torno da estrela Gliese 581, um estrela com um terço da massa do Sol e, portanto, uma luminosidade cinquenta vezes menor que a solar. Já se sabia da existência de um planeta como Saturno, com 16 massas terrestres, em torno dessa estrela. Udry e colaboradores (6) descobriram mais duas super-Terras, isto é, planetas com cinco e oito vezes a massa da Terra em órbita dessa estrela, formando um sistema planetário triplo. Essa descoberta foi feita utilizando-se o espectrógrafo Harps (High Accuracy Radial Velocity for Planetary Search) no telescópio de 3,6 m do ESO no Chile.

A grande novidade foi a localização desses novos planetas. Devido ao fato da estrela ter um brilho bem menor do que o Sol, consequentemente a sua zona de habitabilidade também é bem menor. O planeta de cinco massas terrestres reside na borda interna da zona de habitabilidade a 0,07 U.A. da estrela, enquanto que o outro planeta, de oito massas terrestres, dista 0,25 U.A. e encontra-se no extremo mais externo da zona de habitabilidade da estrela. Considerando a luminosidade da estrela, Udry e colaboradores (6) computaram a temperatura de equilíbrio do planeta Gl 581 c como estando entre -3º e +40ºC. Certamente a temperatura na superfície desse planeta sofrerá grande influência da sua atmosfera. Supondo um raio para o planeta de 1,5 raio terrestre, baseado em modelos, e uma temperatura média da ordem de +20º C Gl 581 c é o planeta extra-solar descoberto até hoje que mais se assemelha à Terra.

Adriana Válio é professora adjunta do Centro de Radioastronomia e Astrofísica, da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Revista Ciência e Cultura - SPBC

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