domingo, 25 de setembro de 2022

Entenda o conflito entre Armênia e Azerbaijão pelo território de Nagorno-Karabakh

Por Luiz Fernando Pinto dos Reis


Entender o conflito entre Armênia e Azerbaijão sobre o controle da região de Nagorno-Karabakh é, acima de tudo, entender como a geopolítica funciona na prática e quais as suas consequências para a população. O conflito, que teve seu auge no início dos anos 90 com o fim da União Soviética, voltou a sofrer uma escalada no ano de 2020. Armênios e Azeris, com apoio turco e russo, disputam uma histórica região montanhosa.

Os motivos dessa guerra, porém, vão além de questões territoriais, já que o Cáucaso é peça-chave na questão energética. Mas onde exatamente esse conflito acontece? Quem são os povos envolvidos? Por que Rússia e Turquia estão interessadas nesse conflito? Todas essas respostas você encontra no texto a seguir!
Onde acontece o conflito?

Armênia e Azerbaijão fazem parte do que já foi conhecida como Transcaucásia, região que liga a Rússia ao norte do Oriente Médio e que hoje é denominada Cáucaso do Sul. A localidade é historicamente conhecida por ser um território multiétnico, abrigando ao longo do tempo, inclusive, os impérios Persa, Otomano e Russo. Não por acaso, o local é popularmente conhecido como a esquina do mundo.

E quando pensamos no conflito entre eles, destaca-se a região de Nagorno-Karabakh, situada entre Armênia e Azerbaijão, e que vem sendo alvo de disputas que remontam, pelo menos, ao tempo em que ambos territórios faziam parte do Império Russo. O nome que essa região leva, por exemplo, é reflexo do seu aspecto multiétnico. A palavra de origem túrquica Karabakh tem como significado “jardim negro”, enquanto que a palavra Nagorno, que tem origem russa, significa “alto”, ou “montanhoso”. Nagorno-Karabakh, portanto, pode ser compreendida como uma região montanhosa dentro do território de Karabakh.

Dentro desse conflito, destacam-se duas etnias: os armênios e os azeris. Enquanto os armênios são, em sua maioria, historicamente uma população cristã, os azeris – população de etnia túrquica – são majoritariamente islâmicos. Entretanto, não se pode atribuir ao conflito causas puramente religiosas ou étnicas. Como veremos logo mais, ele foi fruto de um conjunto de acontecimentos ao longo da história.
Fonte: GeoCurrents.
Origens do conflito durante o período soviético

Por se tratar de uma região multiétnica, a definição de fronteiras por muito tempo foi – e ainda é – assunto delicado. Desde o início do século XX, quando territórios que hoje conhecemos como Armênia, Geórgia e Azerbaijão ainda pertenciam ao Império Russo, demarcações territoriais eram um problema. Porém, por estarem sujeitos às ordens do império a situação era controlada. Foi só com a Revolução Russa de 1917 que, dissolvido o império que controlava a região, os povos da Transcaucásia tiveram a oportunidade de se tornarem independentes, o que aconteceu no ano seguinte.

Porém, essa independência adquirida se traduziu em mais um impasse. Sem um governo superior que fizesse o papel exercido pelo Império Russo – o de controlar as negociações -, ambos Armênia e Azerbaijão reivindicaram o território de Karabakh. Embora não tenha sido um período extenso (1918 a 1922), foi durante essa época que as populações azeris e armênia passaram a ocupar aquela região de maneira específica. Enquanto os azeris localizavam-se, em sua maioria, no território plano daquela área, os armênios majoritariamente ocupavam a região montanhosa: o “Alto Carabaque” (Nagorno-Karabakh).

Entretanto, já em 1922 mais uma vez um Governo centralizaria o poder naquela região do Cáucaso. Com o surgimento da União Soviética, Armênia e Azerbaijão se tornaram então repúblicas soviéticas e, nesse contexto, as disputas na região seriam controladas novamente. Inclusive, foi sob a administração soviética naquela localidade que foram demarcados os territórios ocupados por ambos países atualmente.

A região e Karabakh foi então alocada dentro das fronteiras azerbaijanas por Stalin, quando este fazia parte do chamado Comissariado do Povo para as Nacionalidades, instituição que lidava com povos de nacionalidades não-russas. Porém, a maioria étnica daquela região ainda era armênia. Posteriormente, a região de Nagorno-Karabakh foi denominada uma oblast – isto é, uma região autônoma, mas ainda sujeita às ordens de Moscou -, porém, ainda dentro da República Soviética do Azerbaijão.

Região de Nagorno-Karabakh em destaque. Fonte: Deutsche Welle.
Cessar-fogo após 4 anos de guerra

Com o fim da União Soviética no ano de 1991, as Repúblicas Soviéticas da Armênia e do Azerbaijão tornaram-se independentes. A população armênia que ocupava a região montanhosa, por sua vez, viu naquela ocasião a oportunidade de conseguir a sua independência. A ação foi apoiada por Yerevan (capital da Armênia) e rejeitada pelo Governo azerbaijano. Um plebiscito foi convocado e, com abstenção dos azeris, a maioria votou a favor pela criação da República de Nagorno-Karabakh, que, mais tarde, passou a se chamar República de Artsakh.

Os conflitos por Nagorno-Karabakh reacenderam e, entre 1991 e 1994, estima-se que mais de 30 mil armênios e azeris tenham morrido. A guerra iniciada só foi freada quando, em maio de 1994, foi assinado um cessar-fogo pelos Governos envolvidos nos combates.

Contudo, mesmo após terem assinado um cessar-fogo, conflitos de menor magnitude continuaram a ocorrer na região, o que com o passar do tempo gerou propostas para resolução do conflito. Uma das mais notáveis foi aquela desenvolvida pelo Grupo de Minsk, criado pela OSCE (Organização pela Segurança e Cooperação Europeia), onde, dentro de alguns tópicos, é feita a seguinte proposta:retorno dos territórios em torno de Nagorno-Karabakh ao controle do Azerbaijão;
um status provisório para Nagorno-Karabakh fornecendo garantias de segurança e autogoverno;
um corredor ligando a Armênia a Nagorno-Karabakh;
o direito de todas as pessoas deslocadas internamente e refugiados de retornar aos seus antigos locais de residência; e
garantias de segurança internacional que incluiriam uma operação de manutenção da paz.

Contudo, ambos países não aceitaram os termos propostos por acreditarem que estariam sofrendo desvantagens. De um lado, o Governo de Baku (capital do Azerbaijão) defende as leis que determinam a sua soberania na região de Nagorno-Karabakh. De outro, Yerevan e Artsakh acreditam que o território pertence historicamente ao povo armênio. É um fato que escaramuças – isto é, pequenos conflitos – eventualmente ocorrem na região, desrespeitando, desta forma, o documento assinado.
Aliados turcos e russos

É verdade que o Cáucaso é uma região rica em petróleo, o que além de enriquecer alguns países – como é o caso do Azerbaijão – desperta o interesse de Estados vizinhos. Por isso, a região constantemente serve como palco para projeções de poder, sobretudo por parte de Governos mais próximos da região. No caso do conflito entre Armênia e Azerbaijão não é diferente, já que Rússia e Turquia apoiam lados diferentes. (quer saber quem apoia quem, e por que? chega mais pra ler)

Ao falar de turcos e azeris, é importante ter em mente que isso significa a existência de alguns fatores que geram identificação entre esses povos. Além de seus idiomas serem parecidos, ambos são países muçulmanos – embora o Azerbaijão seja um país tradicionalmente Xiita, enquanto que a Turquia é majoritariamente Sunita. Historicamente, portanto, o Azerbaijão tem como seu principal apoiador a Turquia. O país, que diversas vezes fecha suas fronteiras com a Armênia como forma de demonstrar apoio ao Azerbaijão, possui, inclusive, um passado conflituoso com a Armênia.


Já do lado Armênio, a Rússia é o principal aliado. A religião pode ser entendida como um dos fatores que unem esses dois Estados, uma vez que o país do Cáucaso é historicamente cristão em uma região de maioria islâmica. A Federação Russa, portanto, utiliza-se de questões como esta para projetar seu poder na região vizinha e manter uma relação próxima com a Armênia.
A energia que move alianças

Essa influência exercida pelo país de Vladimir Putin busca, sobretudo, manter sua soberania em um aspecto financeiramente importante para o país: a exportação de gás natural.

A Rússia é, há muito tempo, um dos principais exportadores de gás natural da Europa. De acordo com dados do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e gás), em 2018 o país foi o segundo maior exportador de gás natural, atrás apenas dos Estados Unidos. O Azerbaijão, por sua vez, é peça-chave no mercado energético. Além de ser um dos maiores produtores de petróleo e gás natural da região, existe uma importante rede de oleodutos que atravessam o território azerbaijano em direção à Turquia, país que há um tempo vem aumentando o seu protagonismo no cenário energético.

Oleodutos que atravessam a região do cáucaso do sul, saindo de Baku, capital do Azerbaijão. Fonte: Wikimedia.

O apoio russo e turco, portanto, possui objetivos próprios que vão além da disputa por Nagorno-Karabakh. Utilizando de fatores como etnia e religião, Turquia e Rússia envolvem-se em questões como essa mirando maior influência e projeção de poder naquela região que é de interesse mútuo, o que se traduz em medidas práticas tomadas pelos Governos.

O atual presidente turco Recep Tayyip Erdoğan se apoia no chamado neo-otomanismo. Essa política externa, que faz alusão ao histórico império, tem como principal objetivo gerar maior protagonismo e aumentar a influência da potência na região. Uma das formas de colocar essa política externa em prática é, portanto, o apoio militar fornecido ao Azerbaijão.

Já a Rússia, que tem o mesmo objetivo de projetar seu poder no Cáucaso, embora possua boa relação com o Azerbaijão, interfere no conflito ao lado da Armênia. O país faz parte da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO), aliança militar que reúne alguma das ex-repúblicas soviéticas. Além de ser considerado um dos principais negociadores entre os países, a Rússia mantém uma base militar na Armênia como forma de exercer influência no território.
Acontecimentos recentes

É verdade que desde 1994 existe um cessar-fogo assinado entre Armênia e Azerbaijão, contudo, constantemente o documento é desrespeitado e conflitos ocorrem nas fronteiras. Este ano, porém, as ofensivas foram mais violentas e até mesmo fora da região de Nagorno-Karabakh, o que é incomum de acordo com o histórico do conflito.

Até o momento, estima-se que aproximadamente 5 mil pessoas foram vítimas dos confrontos que tiveram início nesse ano de 2020, porém, existe certa dificuldade na apuração exata desses números, já que existe uma batalha de narrativas que permeia esse conflito. Da mesma forma que o Azerbaijão tende a não reconhecer o número de mortos declarado pelo Governo Armênio, este não concorda com os números apresentados pelo Governo azeri.
Foto divulgada pelo Ministério de Defesa do Azerbaijão que mostra soldados Azerbaijanos em Nagorno-Karabakh.

Um exemplo desta batalha de narrativas é contada por Filipe Figueiredo, do Podcast Xadrez Verbal. Filipe conta que, de acordo com o Governo de Artsakh – ex-república de Nagorno-Karabakh – no dia 27 de setembro de 2020 hostilidades tiveram início às 8 da manhã após um ataque azeri na região. Contudo, o governo azerbaijano contradiz afirmando que, duas horas antes, ataques haviam sido efetuados por integrantes de Artsakh.

O território disputado por Armênia e Azerbaijão pode ser considerado pequeno se comparado com outros confrontos, porém, não se trata apenas de Nagorno-Karabakh. Diariamente o cenário se transforma, já que pontos estratégicos são conquistados e perdidos por ambos os lados. E a participação de potências como Rússia, Turquia e até mesmo Israel gera preocupação nessa nova escalada dos conflitos, podendo ocasionar em combates cada vez mais violentos.
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Uma pessoa morre de fome no mundo a cada quatro segundos, denunciam ONGs


Em comunicado destacam que "345 milhões de pessoas sofrem de fome aguda, um número que mais que dobrou desde 2019"
Por AFP




Uma pessoa morre de fome no mundo a cada quatro segundos atualmente, denunciaram nesta terça-feira (20) mais de 200 ONGs, que pedem aos governantes de todo o planeta reunidos em Nova York que atuem "para deter a crise mundial da fome".

"As organizações procedentes de 75 países assinaram uma carta aberta para expressar indignação com a explosão do número de pessoas que sofrem fome, e para fazer recomendações", afirmam as 238 ONGs em um comunicado, no qual destacam que "345 milhões de pessoas sofrem de fome aguda, um número que mais que dobrou desde 2019".

A carta aberta foi publicada no dia do início da reunião da Assembleia Geral da ONU em Nova York, onde muitos líderes políticos, mas também representantes da sociedade civil, permanecerão por uma semana para aquele que é considerada o encontro diplomático mais importante do mundo.

"É inadmissível que, com toda a tecnologia agrícola disponível atualmente, ainda estejamos falando de fome no século XXI", declarou Mohanna Ahmed Ali Eljabaly, da ONG Yemen Family Care Association, uma das signatárias da carta.
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ONU quer impor taxas sobre os lucros das companhias produtoras de combustíveis fósseis


Há algumas semanas, Guterres denunciou a "avareza" das grandes empresas petroleiras e de gás que obtém lucros "escandalosos" "às custa dos mais pobres"
Por AFP




O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, instou nesta terça-feira (20) os países ricos a impor taxas sobre combustíveis fósseis para financiar programas de ajuda aos países vítimas do impacto da mudança climática e às populações afetadas pela inflação.


"Insto todas as economias desenvolvidas a impor taxas sobre os lucros extraordinários das companhias produtoras de combustíveis fósseis e destiná-las de duas formas: aos países que sofrem perdas e danos causados pela crise climática e às populações em dificuldade pelos preços dos alimentos e da energia", disse o chefe da ONU na abertura da Assembleia Geral em Nova York.

Há algumas semanas, Guterres denunciou a "avareza" das grandes empresas petroleiras e de gás que obtém lucros "escandalosos" "às custa dos mais pobres", devido à crise energética provocada pela guerra na Ucrânia e instou os governos a impor novas taxas sobre elas.

Na ocasião, não mencionou a possibilidade de redistribuir uma parte destes impostos em programas de alívio à mudança climática, causada principalmente pelo carvão, petróleo e gás.

O foco em "perdas e danos" causados pela multiplicação de eventos climáticos extremos tornou-se um ponto crucial nas negociações sobre o clima e pode virar outro tema-chave da COP27, que acontecerá no Egito em novembro, juntamente com a redução de emissões, previsto no acordo de Paris, adaptação aos impactos e financiamento.
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Morre adolescente indiana da casta dalit que foi estuprada e queimada viva

Dalit já foi chamada de "intocável" e é considerada casta hindu mais baixa
Por AFP



Uma adolescente indiana de 16 anos que teria sido estuprada e queimada viva por seus agressores morreu no hospital, informou, nesta terça-feira (20), a polícia indiana.

A jovem, membro da comunidade dalit, que já foi chamada de "intocável" e é considerada como a casta hindu mais baixa, morreu na segunda-feira (19) em um hospital de Lucknow, em Uttar Pradesh (norte), depois de ter sido agredida no início de setembro.

Os dois homens acusados de estuprá-la e queimá-la foram detidos "duas horas depois da denúncia do incidente" e a polícia prometeu à família da vítima um acompanhamento adequado do caso, disse à AFP o chefe da polícia local, Dinesh Kumar Prabhu.


Agentes cercaram a casa da família da jovem "para evitar incidentes indesejáveis". A polícia é frequentemente acusada de não levar a sério as denúncias feitas pela comunidade dalit.

Em circunstâncias semelhantes, familiares de classe baixa foram ameaçadas ou atacadas para impedir que testemunhassem.

As mulheres dalit são vítimas de delitos sexuais, de forma desproporcional, em um país onde a taxa de crimes contra mulheres é alta.

A morte desta jovem ocorre menos de uma semana depois que os corpos de duas irmãs dalit, de 15 e 17 anos, foram encontrados pendurados em um árvore.

Aparentemente, elas foram estupradas e estranguladas por seis homens que foram detidos.

Ambos os casos ocorreram em Uttar Pradesh, um estado pobre de quase 230 milhões de habitantes, onde estes crimes estampam as capas de jornais com frequência.
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sábado, 24 de setembro de 2022

Presidente da Colômbia denuncia na ONU o fracasso do combate às drogas

Gustavo Petro direcionou seu discurso aos países consumidores e pediu para que acabassem com a "irracional guerra contra as drogas"
Por AFP




O presidente colombiano Gustavo Petro denunciou, em seu primeiro discurso perante a ONU, o fracasso da guerra antidrogas e seu rastro sangrento na América.

O consumo mortal tem aumentado, de drogas leves até as pesadas, ocorreu um genocídio em meu continente e em meu país, milhões de pessoas foram condenadas à prisão, destacou o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, principal país produtor mundial de cocaína.

Em um discurso direcionado aos países consumidores, Petro pediu para "acabar com a irracional guerra contra as drogas".

O presidente enfatizou que a estratégia que vem sendo usada há quatro décadas para acabar com o negócio lucrativo deixa apenas centenas de milhares de mortos na América do Norte e presídios superlotados no restante do continente.


Se não corrigirmos o rumo e esta (guerra) se prolongar outros 40 anos, os Estado Unidos verão 2.800.000 jovens morrerem de overdose" e "mais um milhão de latino-americanos serão mortos, disse o líder.


Desde sua posse no dia 7 de agosto, Petro insiste em focar na prevenção do consumo no lugar da perseguição aos cultivadores de folha de coca, a base da cocaína.
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sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Uruguai freia narcotráfico de cannabis, mas mercado ilegal ainda predomina


A descriminalização da maconha no Uruguai ajudou a tirar os narcotraficantes do mercado
Por AFP




A descriminalização da maconha no Uruguai ajudou a tirar os narcotraficantes do mercado, mas uma oferta estatal insuficiente e de baixa potência nas farmácias leva a maioria dos consumidores a recorrer ao mercado clandestino.

Em 2013, o Uruguai fez história ao se tornar o primeiro país do mundo a legalizar e regulamentar a produção e o consumo de cannabis, uma medida que começou a ser aplicada há pouco mais de cinco anos.


Impulsionada pelo ex-presidente José Mujica, a medida foi apresentada como uma alternativa à fracassada "guerra contra as drogas" e significou mais de US$ 20 milhões para a economia uruguaia, que antes ficavam nas mãos dos narcotraficantes.

Também permitiu o surgimento de uma incipiente indústria exportadora de maconha, que cresce ano a ano.

Segundo dados do portal Uruguay XXI, em 2020 dobraram as exportações em relação ao ano anterior, chegando a 7,3 milhões de dólares. Em 2021, a receita foi de 8,1 milhões de dólares e no primeiro semestre de 2022, de 4,4 milhões de dólares.


No momento, as exportações se concentram em flores para uso medicinal e têm como principais destinos Estados Unidos, Suíça, Alemanha, Portugal, Israel, Argentina e Brasil.

Apesar de ter sido pioneiro nessa indústria, o Uruguai ainda exporta menos do que outros concorrentes na América Latina, como Chile, que em 2020 faturou 59 milhões de dólares, Peru (US$ 40 milhões) e Colômbia (US$ 37 milhões), segundo um informe da Câmara de Comércio de Quito.

A legislação implementou três mecanismos para adquirir maconha: o autocultivo, os clubes canábicos e a compra em farmácias, todos sob regulamentação estatal e restritos a quem mora no país, embora o Parlamento esteja considerando abrir o mercado aos turistas.


"A regulamentação da cannabis foi mais eficaz do que a repressão no que se refere ao impacto no narcotráfico", explica Mercedes Ponce de León, diretora do Cannabis Business Hub e da ExpoCannabis Uruguay.

Variedade mais forte

O governo planeja agora vender no fim do ano uma cannabis mais forte nas farmácias para atrair um número maior de consumidores recreativos ao mercado formal.


"Há alguns usuários que demandam um maior percentual de THC ou mais variedade e isso conspira contra a eficácia do sistema porque determina que alguns usuários que poderiam comprar em farmácias busquem outras opções do mercado regulado ou no mercado clandestino", assegura Daniel Radío, secretário-geral da Junta Nacional de Drogas.

Apenas 27% das pessoas que compram cannabis o fazem de forma legal, segundo um estudo publicado pelo IRCCA (Instituto de Regulação e Controle de Cannabis), que compila os dados anuais de 2021.


Este percentual corresponde às pessoas registradas em alguma das três opções do mercado regulado.

O percentual chega a 39% se for levado em conta que alguns compradores compartilham o produto com amigos e conhecidos.

Poucas farmácias

Joaquín, nome fictício de um consumidor de cannabis que compra no mercado clandestino, explica que "muitas vezes é muito difícil conseguir maconha sem marcar hora para retirar na farmácia". "O mercado clandestino é simplesmente ter um contato, falar com ele e no dia, ou no dia seguinte, marcar e comprar".

Além disso, as farmácias habilitadas são poucas em relação à população total e persistem as dificuldades de acesso ao sistema financeiro devido às legislações internacionais.

O problema dos dados também afeta os consumidores. Para se ter acesso às três vias de compra legal, é preciso se registrar, uma medida que alguns preferem evitar, embora esta informação seja usada exclusivamente para o estudo do consumo.

No caso dos clubes, há um número limitado de sócios (entre 15 e 45), e existe, inclusive, uma lista de espera para entrar.

"Pulla", apelido do tesoureiro e encarregado técnico de um clube canábico de Montevidéu, explica que a lista de espera "é um indício de que a demanda não está atendida. Há muito mais gente querendo acessar o mercado legal que ainda não consegue".

A norma também estabelece que a coleta de cada membro não pode passar das 40 gramas mensais e, em muitos casos, também há um mínimo.

Autocultivo clandestino

Da mesma forma que o consumo foi sendo normalizado, a percepção do mercado ilegal também mudou. Os especialistas indicam que os principais abastecedores do mercado sejam os cultivadores locais.

Agus, nome fictício de uma consumidora de 28 anos, explica que se registrou para comprar cannabis em farmácias, mas agora adquire o entorpecente no mercado clandestino ao mesmo tempo em que cultiva suas próprias plantas, sem estar registrada.


"Eu não vejo como mercado clandestino. Entendo que é próximo, tem preços bons para o que vende e não parece que a gente esteja recorrendo ao narcotráfico", diz. Tem "um amigo ou conhecido que te passa o contato de alguém que tem flores e as vende".

Segundo Marcos Baudean, professor da Universidade ORT do Uruguai e pesquisador do projeto Monitor Cannabis, "há muito mais cultivadores domésticos que não constam dos registros", e por isso não é possível fazer uma estimativa concreta da abrangência do mercado clandestino.

Apesar disso, o professor assegura que os cultivadores não registrados "já ultrapassaram" as redes de tráfico na venda de cannabis. Apesar disso, os traficantes continuam presentes no Uruguai, principalmente vendendo o que chamam de 'paraguayos', prensados de maconha mais baratos.
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Fundo Global espera arrecadar US$ 18 bilhões para luta contra HIV, tuberculose e malária


Esta é a maior meta de arrecadação que a organização em evento organizado pelo presidente americano, Joe Biden
Por AFP





O Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária convocará doadores, nesta quarta-feira (21), em Nova York, com a expectativa de arrecadar ao menos US$ 18 milhões em um evento organizado pelo presidente americano, Joe Biden.

É a maior meta de "reabastecimento" que a organização já estabeleceu e ocorre em meio a crescentes pressões econômicas, tanto nos países doadores como naqueles beneficiados por esses recursos, após a pandemia da Covid-19 e em meio às crises alimentares e energéticas decorrentes do conflito da Ucrânia.

A porta-voz Françoise Vanni disse à AFP estar animada com as promessas recentes: 1,3 bilhão de euros da Alemanha, US$ 6 bilhões dos Estados Unidos e US$ 1,08 bilhão do Japão. Somadas, estas quantias levariam o órgão a "mais ou menos metade" de sua meta.


Há muito em jogo, e o objetivo de US$ 18 bilhões se baseia, em grande parte, em retomar o caminho para o fim da aids, da tuberculose e da malária até 2030, recuperando o terreno perdido durante a pandemia da Covid e salvando ao menos 20 milhões de vidas nos próximos três anos, afirmou Vanni.

O Fundo Global foi criado em 2002 e reúne governos, agências multilaterais, grupos da sociedade civil e do setor privado para combater essas três doenças mortais, em geral com novos ciclos de financiamento a cada três anos.

No ano passado, o Fundo Global alertou que a pandemia estava tendo um impacto "devastador" em seu trabalho, provocando um retrocesso nos resultados pela primeira vez em sua história.

Em 2020, por exemplo, o número de mortes por tuberculose chegou a 1,5 milhão, um aumento pela primeira vez em uma década, o que fez desta doença infecciosa a mais mortal do mundo depois do coronavírus.

Ainda assim, o Fundo Global, que proporciona 76% de todo financiamento internacional para combater a tuberculose, disse que os programas mostraram sinais de recuperação no ano passado.

O número de pessoas que receberam serviços de prevenção do HIV aumentou novamente, depois de registrar uma queda em 2020, atingindo 12,5 milhões de beneficiados no mundo todo, detalhou Vanni.



Ela espera que os doadores observem o histórico de sucesso do organismo, que anunciou, na semana passada, ter ajudado a salvar 50 milhões de vidas nas últimas duas décadas.

Segundo uma lei do Congresso americano, os Estados Unidos não podem fornecer mais de um terço dos fundos para o Fundo Global, um limite que serve como desafio para outras nações duplicarem esse compromisso.

O fundo proporciona quase um terço de todo financiamento internacional para combater o vírus da aids.
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OMS: doenças não transmissíveis causam 17 milhões de mortes prematuras


Pandemia agravou quadro, ao atrasar e interromper cuidados de saúde
Por Agência Brasil




A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou nesta quarta-feira (21) que as doenças não transmissíveis são responsáveis por 17 milhões de mortes prematuras todos os anos. O grupo inclui doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas. A entidade cobrou de líderes mundiais ações urgentes de combate ao que se refere como a principal causa de morte no mundo.


Dados da OMS mostram que as doenças não transmissíveis respondem por quase três quartos das mortes registradas no planeta. Todos os anos, 17 milhões de pessoas com menos de 70 anos morrem em decorrência desse tipo de enfermidade, sendo que 86% delas vivem em países de baixa e média renda.



A pandemia de covid agravou ainda mais o fardo das doenças não transmissíveis, ao atrasar e interromper o cuidado à saúde. Nos primeiros meses da pandemia, 75% dos países reportaram ter interrompido serviços essenciais de combate às doenças não transmissíveis por conta das restrições de lockdown [confinamento].

A OMS lembrou que, embora todos os países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) tenham se comprometido a reduzir as mortes prematuras por doenças não transmissíveis em um terço até 2030, poucos se encontram atualmente no caminho certo par alcançar a meta.


Esforços globais urgentes são necessários para voltar aos trilhos, alcançar as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e reduzir as mortes prematuras por doenças não transmissíveis, finalizou a OMS.
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Situação em usina nuclear de Zaporizhzhia 'segue se deteriorando', diz AIEA


Alerta foi feito pelo diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi
Por AFP




A situação na usina nuclear de Zaporizhzhia, no sul da Ucrânia, “segue se deteriorando”, alertou nesta quarta-feira (21) o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, enquanto os ucranianos acusavam a Rússia de voltar a realizar bombardeios.

A situação segue se deteriorando e não podemos nos dar ao luxo de esperar que aconteça uma catástrofe, disse Grossi, após uma reunião sobre a representação da França nas Nações Unidas.

O diretor da AIEA afirmou que discutiu o assunto com o ministro de Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, com quem se reuniu mais cedo à margem da Assembleia Geral da ONU em sua sede em Nova York.

“Enquanto continuarem os bombardeios, os riscos são enormes”, acrescentou.

As autoridades ucranianas acusaram nesta quarta a Rússia de ter voltado a bombardear as instalações da maior usina nuclear da Europa, mas garantiram que o índice de radiação no local não estava acima do normal.

“Mesmo nas piores condições, a diplomacia nunca pode parar (...) É nossa responsabilidade fazê-lo com propostas pragmáticas e realistas, e isso é o que estamos tentando fazer”, comentou Grossi.

Ao seu lado, a ministra francesa de Relações Exteriores, Catherine Colonna, explicou que o objetivo é “uma desmilitarização da planta no marco da soberania da Ucrânia”.

Ao saber sobre os novos bombardeios, o operador público das usinas nucleares ucranianas, Energoatom, pediu nesta quarta-feira que a AIEA “atue com maior determinação” contra Moscou.

A usina de Zaporizhzhia, ocupada pelas tropas russas desde as primeiras semanas de sua invasão da Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro, tem sido alvo de constantes bombardeios nos últimos meses.

Kiev e Moscou negam a responsabilidade e acusam um ao outro de chantagem nuclear.
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Mulheres nunca estiveram tão estressadas e tristes na última década como agora, mostra estudo


Pesquisa avaliou a saúde delas em 122 países e Brasil ficou em 104; acesso, exames preventivos, segurança, bem-estar emocional, necessidades básicas e dores foram questionados
Por Agência O Globo


A saúde das mulheres em todo o planeta piorou em 2021 em relação a 2020, apesar da pandemia ter perdido a força. Elas tiveram mais dificuldade no acesso à comida, apenas 12% fizeram algum exame para diagnóstico de câncer e estão mais estressadas, preocupadas, irritadas e tristes do que em qualquer momento da última década.

A pesquisa Hologic Global Women's Health Index, feita pela empresa americana voltada para saúde feminina Hologic em parceria com a Gallup, avaliou 127 mil mulheres e homens em 122 países.

Se a situação global é ruim, com a pontuação máxima de apenas 70 pontos (de 0 a 100) obtida por Taiwan, seguida por Letônia, Áustria e Dinamarca, ela é especialmente preocupante no Brasil, segundo a pesquisa. Estamos na 104º colocação, com apenas 44 pontos, e atrás de países como Uganda, Bolívia e Paquistão. Os três últimos são Venezuela (120º lugar, com 39 pontos), República do Congo (121º, 38) e, como pior lugar para a saúde da mulher, Afeganistão, com apenas 22 pontos.


Os participantes responderam questões sobre cinco áreas: cuidado preventivo (como medição da pressão, do diabetes, testes para câncer e infecções sexualmente transmissíveis), saúde emocional (sentiu preocupação, estresse, triteza ou raiva nos últimos dias?), saúde e segurança (acesso aos serviços de saúde ou a segurança para andar à noite sozinha), necessidades básicas (falta de dinheiro para alimentação ou moradia), e saúde individual (tem problemas de saúde ou sente dor).

O estudo identificou que o bem-estar das mulheres piorou de forma mundial nesse segundo ano da pandemia. O estresse, a preocupação e a raiva aumentaram três pontos percentuais cada um no período de um ano (de 2020 para 2021), enquanto a tristeza aumentou notavelmente seis pontos. Mais de quatro em cada 10 mulheres em 2021 disseram que sentiram preocupação (43%) e estresse (41%) durante grande parte do dia anterior à pesquisa, quase uma em cada três experimentou tristeza (32%) e mais de uma em cada quatro experimentou raiva (26%) — todos em níveis recordes.


As mulheres também disseram mais que os homens que houve momentos no ano passado em que não tinham dinheiro suficiente para comprar alimento (37% das mulheres contra 33% dos homens). Essa diferença foi maior em 2021 do que em 2020 – porque houve piora para elas, enquanto eles se mantiveram estáveis.

A percepção de violência delas também piorou de 2020 para 2021. Mais de uma em cada três não se sente segura andando sozinha em seu bairro, o que significa que quase 1 bilhão de mulheres no mundo se sentem inseguras.

Em 2021, 60% das mulheres disseram não ter feito nenhum exame para os quatro problemas de saúde apresentados (pressão arterial, câncer, diabetes e ISTs). No caso de câncer, por exemplo, apenas 12% fizeram algum exame, ou seja, mais de 2 bilhões de mulheres do mundo não sabem se estão com a doença ou não.


Para os pesquisadores, o estudo soa um alarme: “Apesar da esperança de que a pandemia de Covid-19 teria chegado ao fim em 2021, assim como as interrupções nos serviços essenciais de saúde terminariam e a situação da saúde das mulheres começaria a melhorar, os resultados do Índice 2021 sugerem que a situação pode ser ainda mais urgente agora do que era durante o primeiro ano da pandemia”.

Globalmente, a pesquisa mostra que a saúde da maioria das mulheres não melhorou em 2021 e das que já estavam vulneráveis, piorou. A diferença de pontuação no índice geral entre mulheres que vivem em países de alta e baixa renda quase duplicou em um ano, enquanto o fosso entre as mulheres nas áreas urbanas e rurais ficou duas vezes maior.

“Em todo o mundo, as mulheres também perderam terreno em quatro das cinco dimensões de sua saúde enquanto lutavam mais pelo básico, se sentiram menos seguras, suas emoções mais sofridas e experimentaram mais dor do que no ano anterior. Os cuidados preventivos são o pilar mais fraco de todos.”
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quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Custo para a Ucrânia da invasão russa calculado em US$ 1 trilhão


Custo para a Ucrânia da invasão russa calculado em US$ 1 trilhão
Para o atual ano, as autoridades ucranianas esperam uma redução considerável do PIB
Por AFP






O custo para a Ucrânia da invasão russa, iniciada em 24 de fevereiro, é calculado em quase um trilhão de dólares, afirmou em Berlim um conselheiro do presidente Volodymyr Zelensky.

"Nos primeiros dias da agressão, os russos destruíram 100 bilhões de dólares de nossos ativos", afirmou o conselheiro econômico do presidente ucraniano, Oleg Ustenko, em uma conferência organizada pelo Conselho Alemão de Assuntos Internacionais.

"Este valor agora é muito maior. Estamos falando de custos diretos e indiretos que se aproximam atualmente de um trilhão de dólares", completou, ou seja, o equivalente a "cinco PIB anuais".

Para o atual ano, as autoridades ucranianas "esperam uma redução considerável do PIB, calculada entre -35 e -40%, a queda mais expressiva de nosso PIB desde 1991", lamentou Ustenko.

O déficit orçamentário aumentaria em quase 5 bilhões de dólares por mês, segundo o conselheiro de Zelensky.

"Em vez de ter 7 bilhões de dólares (déficit) no conjunto do ano, administramos 5 bilhões por mês", lamentou.

Em 2023, o déficit pode alcançar 40 bilhões de dólares, ressaltou o conselheiro.

Além dos danos e do custo da resistência militar à invasão russa, Kiev não pode contar mais com receitas fiscais.

"Obviamente, quando você está neste tipo de circunstância, é um grande problema para as finanças públicas saber como você poderá arrecadar e receber as receitas para o orçamento estatal", explicou.

Algumas empresas foram "destruídas pelos russos. Outras não trabalham todos os dias ou não operam com plena capacidade", disse Ustenko. "Isto significa que o orçamento vai receber, sem dúvida, muito menos na comparação com o que estava previsto inicialmente".

Em agosto, a Ucrânia pediu ao FMI um novo programa de ajuda, que deve se parte de um esforço internacional mais amplo liderado pelos Estados Unidos e a União Europeia.

O Banco Mundial calculou em 9 de setembro o custo da reconstrução do país em 350 bilhões de dólares, mas destacou que o valor deve "aumentar nos próximos meses enquanto a guerra prossegue".
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Derretimento de geleiras gera aparecimento de 3.000 novas lagoas no Peru


Derretimento de geleiras gera aparecimento de 3.000 novas lagoas no Peru
O Peru tem um total de 2.679 geleiras que cobrem cerca de 2.000 km²
Por AFP





O Peru registrou a formação de mais de 3.000 novas lagoas em seu território como resultado do derretimento de suas geleiras pelo aquecimento global, informou nesta quinta-feira (22) o Ministério do Meio Ambiente (Minam).


"Até atualmente, foram identificadas mais de 3.000 novas lagoas no país como resultado do derretimento das geleiras", revelou um comunicado do Minam.

A vice-ministra dessa pasta, Yamina Silva, alertou que as geleiras do país andino estão em processo de derretimento, "o que pode gerar risco para as populações que vivem nas partes mais baixas, porque estão sendo criadas novas lagoas que representam um risco em potencial".


Silva explicou que entre as novas lagoas formadas "cerca de 500 representam um possível perigo de transbordamento por causa das mudanças climáticas".

O Peru tem um total de 2.679 geleiras que cobrem cerca de 2.000 km².


Em julho de 2021, a Autoridade Nacional da Água (ANA) informou que o aquecimento global provocou o derretimento de 51% da superfície das geleiras do Peru nos últimos 50 anos, o que originou a formação de novas lagoas.

A montanha nevada Pastoruri, com 5.200 metros de altura e localizada na região de Ancash (norte), uma das joias do turismo no Parque Nacional Huascarán, é a mais afetada, com mais de 50% de sua superfície derretida pelas mudanças climáticas, de acordo com o relatório da ANA.

O Peru tem mais de 8.000 lagoas em suas 18 cadeias de montanhas nevadas no país, conforme relatado pela ANA.

O país andino tem a cadeia montanhosa tropical de maior superfície, 71% das geleiras tropicais do mundo e 27 dos 32 climas do mundo, segundo a ANA.
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Hidrelétricas e a geopolítica das energias renováveis na Amazônia





Hidrelétricas e a geopolítica das energias renováveis na Amazônia

Carlos Potiara Castro

Abstract

This article aims to reflect on the strategic importance of hydroelectric energy generated in the Amazon region for the interconnected Brazilian system. Its quantification shows a regional potential for higher energy generation compared to the current production of pre-salt oil. We consider this issue from the perspective of the geopolitics of renewable energy that brings new and relevant elements. In this article, the analytical framework focuses on path-dependence, smart-grids and energy-intensive societies and their energy security policies. As a result, we observe that in the current configuration, the advent of renewable energies can be an additional element of a long-term economic specialization of the Amazon, with worrying consequences from a socio-environmental perspective.

Keywords:
Path dependence; Energy security policies; Energy-intensive societies; Amazonia

Resumen

Este artículo tiene como objetivo reflexionar sobre la importancia estratégica de la energía hidroeléctrica generada en la región amazónica para el sistema nacional interconectado. Su cuantificación muestra que existe un potencial regional de generación de energía superior a la producción actual de petróleo pre-sal. En este estudio, el tema es considerado desde la perspectiva de la geopolítica de las energías renovables, lo que aporta un conjunto de elementos nuevos y relevantes al tema. El marco analítico de este artículo se centra en la dependencia de la trayectoria, las redes inteligentes y las sociedades intensivas en energía y sus políticas de seguridad energética. Se concluye que, en la configuración actual, el advenimiento de las energías renovables puede constituir un elemento adicional de especialización económica a largo plazo en la Amazonía, con preocupantes consecuencias en la perspectiva socioambiental.

Palabras-clave:
Dependencia de la trayectoria; Políticas de seguridad energética; Sociedades intensivas en energía; Región amazónica

Resumo

Este artigo objetiva realizar uma reflexão em torno importância estratégica da energia hidrelétrica gerada na região amazônica para o sistema nacional interligado. Sua quantificação mostra que há um potencial regional de geração de energia superior em importância à produção atual de petróleo do pré-sal. Neste estudo, considera-se a questão sob a ótica da geopolítica das energias renováveis, que traz um conjunto de elementos novos e relevantes para o tema. O quadro analítico deste artigo centra na dependência de trajetória, nas redes inteligentes e nas sociedades energo-intensivas e suas políticas de segurança energética. Conclui-se que, na configuração atual, o advento das energias renováveis pode constituir elemento adicional de uma especialização econômica de longo prazo da Amazônia, com consequências preocupantes na perspectiva socioambiental.

Palavras-chave:
Dependência de trajetória; Políticas de segurança energética; Sociedades energo-intensivas; Região amazônica

1 - Introdução

Há uma ampla gama de motivos pelos quais a discussão sobre a energia se coloca historicamente para a geopolítica. O mais recente deles se relaciona ao processo de transição para as novas energias renováveis1. São as consequências dessa transição que são relevantes para as relações de poder entre estados e para a economia, pois ela levará a uma redução da dependência de energia de origem fóssil e dos conflitos potenciais que a acompanham (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4252). Área de interesse crescente, a geopolítica das energias renováveis se estabelece na academia sobretudo a partir da década de 2010, com um aumento expressivo de publicações científicas sobre o tema. Parte de seus autores afirmam que a necessidade de independência energética foi um dos motivos principais para o financiamento das pesquisas tecnológicas que tornaram as novas fontes renováveis viáveis. Por outro lado, é lembrado que a dependência não desaparece por completo, mas ela é reduzida em intensidade e transicionada para a oferta de outras commodities, como as terras raras.

A transformação acelerada da matriz elétrica do país, em que a produção eólica se torna a segunda maior fonte de fornecimento, ultrapassando em posição as termelétricas, e que vê a fonte solar crescer a taxas de três dígitos ao ano, é um exemplo de um fenômeno extenso e global. Com as novas fontes de energia renováveis, geralmente estabelecidas mais próximas das regiões consumidoras, a gestão do sistema integrado de transmissão de eletricidade cresce em importância. Nessa configuração, a geração hidrelétrica, assim como a própria termelétrica, se torna estratégica pois atua como fonte de energia firme e bateria do sistema, complementando o fornecimento das renováveis que mostram diferenças horárias de geração, assim como sazonalidade anual específica.

O Amazonas é o maior dos rios existentes e sua bacia de drenagem é uma das mais importantes, situando-se em termos territoriais logo abaixo da do Golfo de México e Caribe (WRI, 2005). Ela possui a característica única de ter o seu desenvolvimento econômico configurado sem coerência com seu curso principal. As ações coordenadas e as estratégias de desenvolvimento são oriundas de uma sociedade sudestina, de ethos essencialmente platino. Guardando traços exógenos, essas ações são marcadas pelo estranhamento, que levou a um pensamento geopolítico que se traduz, também, em uma política de segurança energética e em uma especialização econômica.

Este artigo objetiva discutir criticamente o papel exportador de energia hidrelétrica da região Amazônica. Para tanto, são desenvolvidas reflexões sustentadas em três campos do conhecimento: a geopolítica da energia; a transição para fontes renováveis e a política ambiental.

Ele está subdividido em quatro seções. Na primeira é abordado o advento das energias renováveis, o conceito de dependência de trajetória e as consequências econômicas e sociais do aprisionamento em uma determinada tecnologia, nos médio e longo prazos. Nela será discutido também a instabilidade de sistemas encerrados e as políticas de segurança energética.

Na segunda e terceira seções, será abordado o aporte teórico da geopolítica das renováveis, enquanto expressão de relações de interesse inter-territorial, que embora traga novas variáveis, não impede a formação de sociedades energo-intensivas, assim como um populismo energético, que justifica amplamente a projeção de força no exterior, através de instrumentos de comando e controle. Na última parte, será realizado um dimensionamento da energia planejada, atualmente produzida e exportada por usinas hidrelétricas localizadas na região amazônica, expresso em barril de petróleo equivalente, com vista a discutir seu papel estratégico. Resultados esses que se baseiam em um estudo extenso sobre 76 usinas individuais.

Na conclusão será realizada uma reflexão sobre cenários possíveis para uma região que se tornará crescentemente exportadora de recursos energéticos, articulando uma perspectiva geopolítica e socioambiental.
2 - Dependência de trajetória e a economia política da energia

O conceito de dependência de trajetória, que afirma que uma determinada característica institucional, como a forma de organização, o padrão técnico ou de desenvolvimento econômico não se baseia nas condições atuais, mas sim é formada por uma sequência de decisões anteriores, cada qual levando a um resultado distinto (DAVID, 1985, p. 338; BERNARDI, 2012, p. 143; BALAZ; WILLIAMS, 2007, p. 39), ressurge com vigor na literatura científica a partir das discussões sobre a transição da matriz energética para as novas fontes renováveis e a descarbonização das sociedades contemporâneas (FOUQUET, 2016, p. 2; FOXON et. al., 2013, p. 146). Ele traz a perspectiva de um encerramento dos sistemas energéticos (lock-in) e realça a importância do histórico de decisões e escolhas cumulativas tomadas no passado para a compreensão das dificuldades a serem superadas na transição para as renováveis. Trata-se de uma visão que compreende que os elementos constitutivos de um sistema coevoluem e que ajuda a explicar porque a transição se torna tão complexa e não é função apenas do advento de novas tecnologias (MOORE, 2003, p. 315). Por esse motivo Fouquet (2016, p. 2) argumenta que “encerramentos e dependência de trajetória precisam urgentemente ser melhor compreendidos, suas implicações identificadas, e estratégias para lidar com eles formulados”.

É que os sistemas de energia estão sujeitos a uma proeminente dependência de trajetória de longa duração, muitas vezes acima de 50 anos, devido a suas próprias características de infraestrutura, tecnologia e mercado. As decisões que levam à adoção de uma determinada fonte de energia têm uma origem complexa, cujo histórico se perde muitas vezes ao longo do tempo, legando, entretanto, formas concretas de organização da economia e da sociedade (RUTTAN, 1997, p. 1523; FOXON et. al., 2013, p. 147). Existem vários exemplos ilustrativos das dificuldades de escapar a um encerramento tecnológico. Pode-se lembrar do processo de superação do padrão de veículo automotor propulsionado por gasolina que se consolidou entre 1905 e 1920, pelo elétrico que surge como seu real competidor a partir dos anos 2000. A história da tecnologia mostra que entre 1885 e 1905 havia três padrões disputando o público. Em 1899 foram vendidos nos Estados Unidos 1.575 veículos elétricos, 1.681 carros a vapor e 936 a gasolina. Esse caso sugere uma situação complexa, em que “a interação de vários fatores econômicos e técnicos deu ao carro a gasolina uma vantagem decisiva” (COWAN; HULTEN, 1996, p. 66). São fatores, portanto, que não foram plenamente controlados pelos próprios agentes presentes nessa arena, mas se configurou de tal forma que apenas um século depois começa a se modificar. Outro caso complexo ocorreu quando da adoção de um padrão de tecnologia para a geração elétrica a partir de usinas nucleares. Os reatores que usam água leve para aproveitamento do urânio são considerados inferiores aos que adotam outras tecnologias, entretanto eles chegaram a dominar 80% do mercado de usinas construídas ao redor mundo, por motivos históricos anteriores (COWAN, 1990, p. 545; DAVID, 1985, p. 336; CAVALHO, 2014, p. 29).

Diante do desafio aportado pela transição energética e pela descarbonização das sociedades em resposta às mudanças climáticas, compreende-se melhor que as decisões tomadas no passado, relativas a tecnologias e fontes de energia, possuem uma considerável força de inércia, que impede que sejam transformadas rapidamente e sem complexidade (RAMAN, 2013, p. 173; RUOTSALAINEN, 2017, p. 232). Por esse motivo, a combinação de opções de geração de energia, na era da transição para as renováveis, precisa ser definida ao mesmo tempo que o modelo de desenvolvimento desejado na longa duração, ainda mais que há implicações humanas tangíveis, como a necessária conexão à rede de 850 milhões de pessoas que ainda vivem sem acesso a ela (IRENA, 2019; CASTRO, 2017, p. 5, 2019a).

A produção e oferta de energia, ao longo do século XX, foi devedora da construção de um conjunto de obras de grande vulto com as quais coevoluíram a tecnologia do setor, a formação de capacidades humanas, a estruturação de burocracias de gestão e com um mercado de transação (FOXON et al., 2013, p. 148; ANSAR et al., 2014, p. 43). Nesse contexto, a construção de infraestruturas de geração de energia, como as hidrelétricas, promove um repentino aumento de oferta e por isso ela é acompanhada geralmente de planos de indução à demanda (ANSAR et al., 2014, p. 47), como a concessão de subsídios a setores produtivos que garantam o consumo do excedente de geração (NICOLINI; TAVONI, 2017, p. 413). O crescimento da renda das famílias, além das políticas de indução ao consumo leva, ao longo do tempo, a um aprisionamento do sistema, deixando poucas opções de mudança de trajetória (ver Gráfico 1). O Gráfico 1 abaixo ilustra isso ao realçar o papel de políticas de subsídios no consumo total de energia.




Gráfico 1
Relação entre consumo per capita (eixo y), expresso em toneladas de petróleo equivalente, por subsídio per capita (eixo x) em 50 países, em dólares




Cria-se desse modo uma vulnerabilidade sistêmica, que vai levar à institucionalização de políticas de segurança energética2. Essas políticas podem focar na oferta, na demanda ou em uma combinação das duas. A diminuição da demanda de energia pode ser atingida através da adoção de novas tecnologias, da atualização das unidades consumidoras existentes e da transformação dos modos de vida de uma sociedade (CAPELLÁN-PÉREZ et al., 2017, p. 761). Entretanto, a história do desenvolvimento econômico mostra que as sociedades humanas lidaram mais frequentemente com a escassez de recursos energéticos pelo aumento da oferta, através da exploração de novas reservas (FOUQUET, 2016, p. 2). Nesse ponto, Högselius e Kaijser afirmam que :



Os países dependentes de importação de energia têm historicamente adotado duas estratégias amplas para lidar com a dependência de energia e as vulnerabilidades que ela gera. O primeiro e mais óbvio foi o desenvolvimento de fontes domésticas. O segundo foi encontrar maneiras de gerenciar - em vez de reduzir - as importações de energia (2019, p. 440).

É nessa configuração que se pode entender a atuação dos países que são os polos mais dinâmicos do capitalismo global, enquanto fiadores do fluxo internacional de commodities energéticas (MOHAPATRA, 2016, p. 684). Caso mais visível por sua extensão, as operações geopolíticas no Oriente Médio para assegurar a oferta contínua de petróleo para o mercado internacional são políticas oficiais muito concretas de segurança energética. E como tal, elas foram objeto de reflexão e receberam fundos orçamentários para sua execução (DELUCCHI; MURPHY, 2008, p. 22543).

A energia se tornou no século XIX, pela primeira vez na história, uma questão geoestratégica para os governos nacionais, para importantes atores econômicos como as grandes corporações, assim como para sociedades inteiras (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4251). É no engessamento das formas de uso dos recursos energéticos que surge o sentimento de escassez eminente, gerador de violência, em sociedades fordistas energo-intensivas (HUBER, 2013, p. 181). E é no imbricamento entre dependência de trajetória e vulnerabilidade sistêmica que aparecem políticas de comando e controle, que constituem um dos motivos pelos quais a transição para as renováveis se tornou tão desejável para vários atores na arena geopolítica, compreendida enquanto política de potência no “fenômeno do espaço” (CORREIA, 2018, p. 95; HÖGSELIUS; KAIJSER, 2019, p. 443).
3 - Geopolítica das renováveis, smart grids e armazenamento de energia cinética

Campo analítico em formação, a geopolítica das energias renováveis vai se definir rapidamente a partir da década de 2010, com o estabelecimento dos principais elementos de um corpo de saber e de suas principais dimensões estratégicas (OVERLAND, 2019, p. 37). É um campo que desde seu início é liderado por autores e autoras advindos de instituições de pesquisa de países desenvolvidos, porém de menor peso geopolítico. Em particular os escandinavos, os Países Baixos e a Espanha. Isso é o reflexo dos fortes investimentos em pesquisa que eles realizaram em áreas afetas à segurança energética, um tema de interesse vital para esses países que possuem pouca capacidade de influência em um multilateralismo marcado pelo poder nuclear (HÖGSELIUS; KAIJSER, 2019, p. 443).

Refletindo as transformações econômicas e sociais que ainda não estão sendo plenamente vividas, esse campo produz uma literatura prospectiva e comparativa, no sentido de que seu objeto é em realidade uma transição histórica de largas consequências humanas (RUOTSALAINEN et al., 2017, p. 231). A civilização do petróleo transformou a geografia do mundo (HUBER, 2008, p. 106), suas cidades, os modos de vida das pessoas e propiciou o surgimento de novos e amplos setores econômicos, como o de serviços e o de consumo de massa. Essas transformações informam o quadro inicial de atuação da geopolítica das renováveis (SCHOLTEN; BOSMAN, 2016, p. 273).

Em uma revisão bibliográfica abrangente da literatura científica do campo, realizada por Vakulchuk et al. (2020, p. 2), foram identificados a emergência de cinco temas principais. O primeiro, que é mais frequentemente abordado, apresenta uma discussão sobre o potencial de redução dos conflitos atuais advindos de pautas energéticas, com a transição para as renováveis. O segundo sublinha quais os países e as regiões do mundo que ganharão e perderão e os cenários, positivos ou negativos, que deverão ser enfrentados. O terceiro discute as consequências da propagação das renováveis para as relações internacionais como um todo, sabendo-se da centralidade da pauta energética. E os dois últimos temas apontados por esses autores, se referem a novas áreas estratégicas: os materiais críticos para a construção de equipamentos necessários à geração de energia limpa, assim como a possível cartelização de setores de mineração desses elementos (HACHE, 2016, p. 42) e a segurança cibernética do sistema elétrico, que deverá ser cada vez mais automatizado e, portanto, passível de ataques advindos do exterior (SULLIVAN et al., 2017, p. 23).

A maioria dos autores concorda que os conflitos tendem a ser reduzidos com a transição para as renováveis, mas existem vários fatores em jogo que precisam ser levados em consideração. O primeiro é que o petróleo não deixará de ser a fonte primária de energia no médio prazo. Hoje as renováveis representam apenas 4,05% do total de energia consumida e não deverão ultrapassar a casa do 28% em 2050 (BP, 2019; IRENA, 2019). Logo, as questões territoriais relacionadas ao petróleo permanecem (MOHAPATRA, 2016, p. 690; AUGÉ, 2014, p. 24). Além disso, a segurança territorial para o trânsito de energia se aplica igualmente às energias renováveis. Nessa perspectiva, Sullivan et al. afirmam que “ na situação de produção e transporte de energia renovável em larga escala sob a forma de eletricidade, o princípio do controle territorial será semelhante ao dos oleodutos e dos gasodutos” (2017, p. 41). No mesmo sentido, Paltsev afirma que:



assim como no caso dos combustíveis fósseis, os países de trânsito no comércio de eletricidade são cruciais (…). Pois a maioria das questões geopolíticas que envolvem gás natural (na Europa) não ocorre entre comprador e vendedor, mas entre um vendedor e um país de trânsito. (2016, p. 392).

Por outro lado, Raman chega a falar de “fossilização das renováveis”, questionando o otimismo dos que afirmam que as renováveis são intrinsecamente democráticas e igualitárias e dizendo que elas “ não oferecem almoço grátis, mas sim um conjunto de opções que são muito superiores ao combustível fóssil ou às alternativas nucleares” (RAMAN, 2013, p. 178). Já Capellán-Perez et al. (2017, p. 774) afirmam que existe o perigo, caso mantidas as mesmas características sociais de uso de energia, de se “intensificar uma geopolítica imperialista para conquistar terras e apreender recursos de outros países”. Há, portanto um consenso de que o território continuará a ser um importante fator de poder, mesmo com o crescimento da oferta de energias de fontes renováveis.

Do ponto de vista tecnológico, a introdução em larga escala das renováveis vai acarretar transformações profundas no mercado de energia e nas relações entre produtor e consumidor (PHUANGPORMPITAK; TIA, 2013, p. 286). Elas vão exigir a implementação de uma rede elétrica distribuída, com novos mecanismos de equilíbrio sistêmico, uma transformação que vai ser chamada de “infraestrutura energética com sistemas sociotécnicos complexos e adaptativos” (SCHOLTEN; BOSMAN, 2016, p. 275). Além das grandes geradoras, os próprios consumidores se tornam também produtores e os preços da energia flutuam em tempo real, para refletir os picos de oferta e demanda (PALTSEV, 2016, p. 392). Nessa perspectiva será o gerenciamento da rede que determinará por um lado, o preço final da energia e por outro, o próprio sucesso da adoção das renováveis em maior escala (HACHE, p. 39, 2016). Para responder às necessidades de gerenciamento da rede, será necessário a adoção de redes inteligentes (smart grids), em substituição de um sistema inflexível, usando a tecnologia digital para a automação do controle, monitoramento contínuo e otimização do sistema de distribuição (ARCIA-GARIBALDI et al., 2018, p. 298; PHUANGPORMPITAK; TIA, 2013, p. 284).

A questão que justifica a implementação de smart grids é a intermitência da produção de energia renovável, a cada momento do dia (FOXON, 2013, p. 155). A geração eólica, solar ou de maré possuem essa característica inerente, de não conseguir prover energia firme consistentemente, e a gerada a partir de biomassa, em sua maior parte, conhece uma sazonalidade anual (OVERLAND, 2019, p. 38). Por isso, para acomodar uma porcentagem mais alta de energia renovável, a rede elétrica precisará de grandes quantidades de energia convencional de reserva e de uma enorme capacidade de armazenamento de energia (BARBOSA et al., 2016, p.100). Serão na maior parte das vezes as próprias usinas convencionais termelétricas ou nucleares, além das baterias de lítio de grande porte, que ajudarão a responder à intermitência no fornecimento de energia pelas renováveis.

A opção de backup limpo, que viabilize o uso das renováveis, é a energia gerada por usinas hidrelétricas (PÉREZ-ARRIAGA et al., 2016, p. 766; ANSAR et al., 2014, p. 48). Seus reservatórios funcionam como armazenamento de energia cinética em larga escala (HUNT, 2020, p. 2; IMMENDOERFER et al., 2017, p. 231), que pode ser transformada em eletricidade rapidamente, alimentando o sistema integrado com energia firme. É nesse quadro que surge o projeto norueguês de prover serviço de armazenamento, se tornando a “bateria verde” da Europa, com a previsão de transporte por cabos submarinos de parte de sua produção nacional de hidreletricidade, uma das maiores do mundo (GULLBERG, 2013, p. 616). Caso implementado, esse projeto modificará o status geopolítico desse país, em nível regional, aumentando o seu poder de barganha na agenda energética (SCHOLTEN et al., 2014, p. 279).

As hidrelétricas amazônicas em operação, assim como o seu imenso potencial a ser aproveitado, passarão a desempenhar um papel ainda mais central na geopolítica energética brasileira (TAVARES et al., 2006, p. 109). As barragens localizadas na Amazônia possuem um forte passivo ambiental (FEARNSIDE, 2015b, p. 16; CORRÊA, 2016, p. 234; FLEURY; ALMEIDA, 2013, p.142), que resulta em grande parte de uma relação petrificada com as regiões platinas do país, que direcionam as políticas regionais (BERMANN, 2012, p. 6). Sobre esses aspectos, Nascimento e Castro, abordando a construção da hidrelétrica de Belo Monte, chegam a falar da “criação de territórios de exceção” onde a norma jurídica não se aplica (2017, p. 141). Por paradoxal que seja, uma das principais fontes que viabilizará a implementação de projetos em larga escala de geração de renováveis será um conjunto de barramentos que submergirão florestas em pé, terras de povos originários e de populações tradicionais (FEARNSIDE, 2015a, p.42; CASTRO, 2004, 2008a, 2011).

Por detrás dos planos de implantação em larga escala de projetos de geração de energia renovável estão projetos de desenvolvimento desenhados para incrementar a demanda de um tipo de sociedade que usa de forma intensiva bens energéticos. Uma reflexão sobre essas sociedades se faz, portanto, necessária, assim como sobre suas instituições e políticas de segurança energética.
4 - Sociedades energo-intensivas e políticas nacionais de segurança energética

Historicamente, o crescimento da intensidade de emprego de energia ocorre em sistemas socio tecnológicos em que se observa uma coevolução dos conhecimentos sobre o aproveitamento das fontes disponíveis e da adaptação da sociedade ao seu uso (CARVALHO, 2014, p. 26; RUOTSALAINEN et al., 2017, p. 237). A era do petróleo se confunde com o século XX e com um processo de transformação acelerado das sociedades humanas em escala planetária. A adaptação social a uma nova realidade tecnológica ocorre junto à estruturação de pactuações sociopolíticas entre os diversos atores sociais, em um ambiente transformado.

A América do Norte foi vista em seu apogeu como um modelo para outras sociedades. O fordismo, que surge nesse país, tornou em bens de consumo os meios de transporte, mas foi pela coalizão pelo New Deal, que dominou o espaço político desse país até o final dos anos 1960, que foi dado ao trabalhador meios de bem-estar, baseado em grande parte no consumo de massa e de energia abundante. Sobre esse aspecto, Matthew Huber afirma que:



Ironicamente, embora o fordismo tenha sido institucionalizado por meio da solidariedade pública do liberalismo do New Deal, ele ajudou a produzir uma geografia bastante privatizada da reprodução social (…). Essa aparência de autonomia foi alimentada pelo consumo volumoso de derivados de petróleo (...). O papel crucial do petróleo foi de impulsionar uma extensa espacialidade do consumo de massa, que foi chamada de “privatização móvel”: automobilidade; habitação unifamiliar particular; espaçosos jardins e quintais; e extensas distâncias entre casa, trabalho, áreas comerciais e espaços de lazer (2013, p. 179).

Podemos nos referir, portanto, a um populismo energético em que a oferta farta de derivados do petróleo ajuda a sustentar uma pactuação social, que tem em um de seus vértices uma política externa de segurança energética (MOHAPATRA, 2016, p. 694). Pois se as pessoas comuns de uma tal sociedade não conseguem perceber as consequências das políticas de projeção de força no exterior, elas são, entretanto, amplamente beneficiárias delas. É como se, apesar da perda de liberdade individual em uma sociedade alienada e massificada (HUBER, 2008, p. 108), houvesse um bem-estar promovido pela abundância de energia disponível.

É nesse contexto de incorporação de um modelo societal ao redor do mundo (CASTRO; FERREIRA, 2013, p. 260; CASTRO, 2008b, 2019b), que o Brasil se torna igualmente energo-intensivo. Ao crescimento econômico ocorrido na década de 2000 até meados da de 2010 se acompanhou o aumento interno de demanda de energia, tanto elétrica como fóssil. Uma tendência que é observada globalmente, como mostra o Gráfico 2, abaixo. As descobertas de novas jazidas de petróleo e a construção de termelétricas responderam pela maior parte do aumento da demanda de energia. Mas no planejamento de fornecimento para o país, a hidreletricidade constitui um componente fundamental. A maior parte do acréscimo da eletricidade foi oriunda de barramentos na bacia amazônica.




Gráfico 2
Variação do PIB e do consumo de energia no mundo 1998-2007




Cabe lembrar aqui que as políticas energéticas e de ocupação da Amazônia contemporâneas foram delineadas sobretudo nos governos autoritários militares. Enquanto a geopolítica interna dos militares (PROST, 2000, p. 4) se referia à Amazônia enquanto Brasil marginal (CASTRO, 2014, p. 131, 2006), o planejamento de sua ocupação, delineado no 2o Plano Nacional de Desenvolvimento de 1974, “estabeleceu como objetivo prioritário reduzir em ritmo acelerado a dependência do país em relação a fontes externas de energia” (TAVARES et al., 2006, p. 106). Dessa forma, acompanhando os principais vetores de desmatamento, colocou-se como objetivo aproveitar o potencial hidrelétrico amazônico. O que gerou políticas de indução ao consumo, através de subsídios, para indústrias eletrointensivas, destinadas à exportação (FEARNSIDE, 2015b, p. 113), criando uma clara dependência de trajetória de longo prazo.

A geopolítica para a Amazônia é um componente do legado militar, cujo estudo ajuda a compreender o que ocorre hoje na região. Ela criou um estranhamento com o espaço local, já que verbalizou perspectivas platinas sobre um outro território (RAVENA et al., 2019, p. 141) e lhe definiu um papel econômico e energético (PROST, 2000, p. 28). Observa-se que os principais barramentos na Amazônia acompanham a mesma direção dos vetores do desmatamento seja, aqueles que destruíram as florestas próximas a Marabá e Tucuruí, seja no Xingu, na região da Transamazônica onde está Belo Monte, seja ainda aqueles que avançam na área cortada pela estrada BR-163, onde está planejada a construção de São Luiz do Tapajós (FEARNSIDE, 2015a, p. 428). É um conjunto de políticas públicas que surge “sob o estigma da segurança energética” (BERMANN, 2012, p. 7) e que geraram o estabelecimento de burocracias para operar instrumentos de comando e controle, específicos para a região amazônica, que se estabeleceram desde o início da ditadura militar (PROST, 2000, p. 5).

Essas políticas traduzem parte da ação do estado para a região, em um continuum, mesmo no período democrático. O Quadro 1 lista um conjunto de políticas com essas características. Nos oito últimos anos, quatro delas foram editadas ou atualizadas através de decretos presidenciais. Sob o governo Dilma Rousseff, foi instituído em 2013, durante os protestos sociais contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte (RAVENA et al., 2019, p. 147), um Gabinete permanente que tinha por objeto atuar especificamente na Amazônia Legal, para, entre outros, “garantir a lei e da ordem” (BRASIL, 2013). Em 2019, o atual presidente lança o projeto Barão do Rio Branco (APIB, 2019; FERREIRA, 2010, p. 203) para a margem esquerda da bacia amazônica, retomando um plano da ditadura militar de replicar o padrão de ocupação da margem direita. Ato contínuo, o decreto de 2013 é substituído em 2019 por outro de teor impreciso e aberto a interpretações, mas que mantém os mesmos instrumentos de comando e controle. O governo atual modifica por fim o Conselho nacional para a Amazônia Legal (BRASIL, 2020b), que é atualmente coordenado por um general e que conta com nada menos que 23 oficiais militares como membros titulares e suplentes.


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Quadro 1
Instrumentos de comando e controle específicas para a região amazônica


Percebe-se que, tal como ocorre em outras regiões produtoras de fontes de energia, há um pressionamento, a partir de instituições nacionais que representam melhor os centros consumidores do país, sobre a sociedade e o espaço amazônico.

Os sete maiores produtores de hidreletricidade no mundo4 - o Brasil é o terceiro maior - somam 61% da capacidade instalada mundial de 1.245,8 GW (EPE, 2019a, p. 31). A maior parte do potencial hidrelétrico ainda a explorar está nos países da América Latina e da Ásia. Nesse quadro, no Brasil está previsto que cerca de 50% da expansão da produção elétrica será proveniente de fonte hidrelétrica (EPE, 2019b, p. 184). E do potencial hidrelétrico a ser aproveitado, mais de 70% estão na bacia do Amazonas (ANEEL, 2008, p. 57). Isso se dará em um contexto em que, tal como ocorre em outras regiões produtoras de fontes de energia, continuará a haver um pressionamento das regiões consumidoras sobre a sociedade e o espaço amazônico. É o que nos mostra a história da geopolítica da energia do século XX.
5 - Dimensionamento dos recursos hidrelétricos

A quantificação da geração hidrelétrica amazônica em barris de petróleo equivalente, que é universalmente utilizada na literatura geopolítica, permite visualizar a relevância estratégica que essa desempenha para o sistema produtivo e para a sociedade nacional. Para realizar o cálculo é necessário definir uma tecnologia geradora que seja alimentada por combustível fóssil e equalizar os outputs. Pela sua flexibilidade de geração de energia firme, as termelétricas alimentadas a gás natural são aptas a desempenhar esse papel, mesmo que tenham um nível de eficiência maior que a média do parque gerador a combustível fóssil brasileiro.

A literatura sobre as usinas hidrelétricas possui uma terminologia própria, adequada à sua tecnologia. O potencial hidrelétrico de uma bacia hidrográfica é estabelecido oficialmente através de ato do governo, baseado em estudos técnicos (EPE, 2019b, p. 124). Ele possui dois componentes: o potencial inventariado, que mede com precisão os aproveitamentos disponíveis para futuras obras e o potencial aproveitado pelas usinas concluídas e em operação.

O potencial hidrelétrico indica a capacidade de geração máxima, em um momento teórico de pico. A energia assegurada por outro lado, corresponde à média daquela que é efetivamente gerada. É a quantidade de energia contratada, que uma usina hidrelétrica entrega ao sistema nacional interligado de distribuição, em uma média anual. Corresponde, portanto, a um percentual do potencial hidrelétrico.

É a diferença entre a energia assegurada produzida pelas hidrelétricas e o consumo médio da região amazônica que nos dará uma dimensão da capacidade de exportação de energia e do papel geoestratégico que desempenha.

A conversão da energia gerada em megawatts para a unidade barril de petróleo equivalente adota como parâmetro a média de eficiência térmica das usinas a gás natural estadunidenses, do ano de 2014 (EIA, 2019: 168). Dada a rápida evolução no nível de eficiência das termelétricas a gás através da adoção de novas tecnologias e da maior intensidade de investimentos financeiros nos setores energéticos daquele país, a eficiência de seu parque gerador a gás é certamente maior que a nacional. Desse modo, para evitar desvios por excesso5, foi adotado como parâmetro em nossos cálculos uma eficiência média de 43,2%, ou seja, de 7.907 Btus6 para cada kilowatt-hora gerado.

A metodologia adotada na pesquisa eliminou as pequenas centrais hidrelétricas e incluiu as usinas da bacia do Araguaia-Tocantins e as do norte do Mato Grosso, localizadas em tributários da bacia amazônica.

O potencial hidrelétrico da bacia amazônica está longe de ser estabelecido, pois, estão ausentes os inventários de tributários como os rios Negro, Trombetas, Purus, Acre e Juruá além da própria calha do Solimões - Amazonas. Os cálculos oficiais do potencial hidrelétrico acompanham o avanço dos principais vetores do desmatamento.

A Tabela 1, abaixo, mostra as totalizações do potencial e da produção diária das usinas hidrelétricas na Amazônia, expressas em MWh e em barris de petróleo equivalente.


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Tabela 1
Dimensionamento da produção hidrelétrica da bacia amazônica e conversão para barris de petróleo equivalente


Para efeito de comparação, a garantia física das usinas em operação, expressa em barris de petróleo equivalente, se equipara à produção diária de petróleo de um país como o Egito. Caso a totalidade do potencial hidrelétrico for aproveitado, a energia assegurada gerada, de 2.399.832,90 barris de petróleo, se aproximaria à produção do próprio Brasil, incluindo aquela oriunda do pré-sal, conforme mostra a Tabela 2. Mais expressivo ainda é o resultado do cálculo da energia disponível para ser exportada atualmente em barris de petróleo equivalente, que posiciona a região como a 15o maior exportadora do mundo, entre o Azerbaijão e a Argélia.


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Tabela 2
Maiores produtores globais de petróleo, incluindo a Amazônia


A fonte hídrica correspondeu a 80% da geração de eletricidade nacional em 2017 (EPE, 2018, p. 5). A hidreletricidade é considerada uma fonte renovável e não sofre com as previsões de esgotamento evidenciadas na curva de Hubbert para os recursos fósseis (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4255). E como afirma a EPE, “na atual conjuntura de inserção de fontes de energia renováveis variáveis, como as fontes eólica e solar, de natureza intermitente, aumenta a importância das usinas hidrelétricas com reservatório, para a operação e segurança do sistema” (2018, p. 14).

Nesse contexto, é de se esperar que a hidreletricidade gerada na região amazônica venha a caracterizá-la como uma grande exportadora interna de energia, advindo daí sua posição geoestratégica para o sistema produtivo e para a sociedade nacional.
5 - Conclusão

Buscou-se com este artigo realizar uma reflexão sobre a transição para as energias renováveis, focando em três elementos principais. Primeiramente, sobre a dificuldade de realização de uma transição tranquila das fontes fósseis para um conjunto amplo de novas formas de geração de eletricidade. Existem relações íntimas dificilmente elimináveis, entre tecnologia, setor produtivo, sociedade e sistema regulatório, em uma dependência de trajetória, cujo significado original muitas vezes se perdeu na história. Essa relação impõe igualmente uma redução da margem de manobra para modificações aprofundadas em um sistema energético, constituindo, portanto, um trancamento de opções.

Em uma segunda perspectiva, apresentou-se o campo de estudo da geopolítica das renováveis. Trata-se, como vimos, de um pensamento prospectivo sobre processos que ainda estão se consolidando ou que vão surgir em um futuro próximo. Dentre os vários elementos em discussão, há a perspectiva de redução de conflitos armados tidos como originados pelo uso intensivo de derivados de petróleo. Mas é a questão tecnológica, que esse campo discute, que é mais relevante para esta pesquisa. A geração de energia com as renováveis é disseminada em uma rede distribuída, em que centenas de unidades geradoras se interconectam para atender ao consumo local em um dado momento. A administração de uma rede inteligente se torna estratégica desse modo, sobretudo se houver trocas transfronteiriças. A gestão dessa rede deve prever a variação natural da geração pelas renováveis, com o uso de baterias, de termelétricas ou de hidrelétricas para garantir o aprovisionamento de energia firme e evitar interrupções de fornecimento. O armazenamento de energia em barragens para sustentar os sistemas interligados de outros países e regiões se torna dessa forma uma questão geoestratégica, segundo a literatura do campo da geopolítica das renováveis.

O terceiro elemento abordado é o do advento de sociedades que se constituem enquanto grandes usuárias de energia. Refletir sobre elas constitui uma questão relevante pelo fato de se prever que, sem a transformação de sua natureza, dificilmente os problemas já conhecidos gerados pelo uso de fontes fósseis, do ponto de vista geopolítico, serão superados. O surgimento daquilo que podemos chamar de um populismo energético tendeu a realizar projeções de força externas para garantir a abundância de energia interna e um tipo de bem-estar social que constituiu uma pactuação entre setor produtivo, trabalho e governo. Ora, é a lógica que se encontra por trás desse modelo de sociedade que gera políticas de segurança energética, através de instrumentos de comando e controle. A análise que se realiza é então em torno da posição que ocupará a região amazônica enquanto fornecedora de energia firme. Ainda mais sabendo que desde o início de sua ocupação contemporânea pela margem direita, planejada a partir de uma “geopolítica interna” dos militares no poder, instrumentos de comando e controle foram instituídos especificamente para essa região. Assim como, desde o início, a geração hidrelétrica amazônica foi percebida como um elemento geoestratégico.

Junto com esses temas, foi realizado um dimensionamento da produção hidrelétrica amazônica convertida em barris de petróleo equivalente, que é a unidade natural de discussão no campo da geopolítica da energia. Com esses números foi possível ter uma medida de quão importante é a exportação de energia para o resto do país, equivalendo à de importantes países exportadores.

Desse modo, este artigo buscou levantar questões para a realização de um debate circunstanciado sobre os impactos da transição energética, interpretados pelo campo da geopolítica das renováveis, sobre regiões com alta capacidade de armazenamento de energia. No caso amazônico em particular, poderá se constituir em mais um problema socioambiental. Que incentivará os principais vetores de transformação da cobertura vegetal e de destruição da floresta em pé. Algo em princípio inesperado, visto as promessas trazidas pelas renováveis, de transformação das sociedades contemporâneas.

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1
- No quadro deste trabalho, as renováveis se referem às novas fontes: solar, eólica, de marés, geotérmica e parte da de biomassa, como do bagaço de cana. A fonte hidrelétrica será explicitamente referida.
2
- Sejam usinas termelétricas, nucleares ou hidrelétricas, elas são invariavelmente objeto de planos de segurança nacional para sua proteção, assim como as regiões petrolíferas e as jazidas de urânio (FONTAINE, 2003, p. 87).
3
- Esses últimos autores afirmam que foi usado um valor entre 0,2% a 0,6% do PIB estadunidense em ações militares no exterior para garantir o fluxo de oferta de petróleo.
4
- São respectivamente, China (332 GW), Estados Unidos (102,7 GW), Brasil (96,9 GW), Canadá (80,3 GW), Rússia (51,2 GW), Japão (50,1 GW) e Índia (47,5 GW).
5
- Não havendo litearatura atualizada informando com precisão a eficiência média do parque brasileiro, importa evitar quaisquer exageros indesejáveis nos números resultantes.
6
- Significa British Thermal Unit (Unidade Térmica Britânica)
7
- O consumo calculado corresponde à soma do consumo da região norte, do estado do Tocantins e de parte do estado de Mato Grosso, proporcional à média dos municípios banhados por afluentes da bacia amazônica.
8
- Energia assegurada teórica do potencial hidrelétrico regional em BPE.

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