segunda-feira, 19 de junho de 2017

O ITER


Reator termonuclear em desenvolvimento desde 2006 é promessa de solução para o problema energético global.




A previsão é de que as instalações do novo reator estejam prontas em 2025. (foto: © ITER Organization)

Talvez, o leitor nunca tenha ouvido falar sobre o ITER, acrônimo, em inglês, para ‘Reator Experimental Termonuclear Internacional’. Mas esse é um dos projetos mais ambiciosos em andamento, que poderá ser o primeiro passo para resolver o problema energético do mundo.

Usinas nucleares convencionais usam como combustível o urânio 235, isto é, o elemento químico cujo núcleo tem 92 prótons e 143 nêutrons. Ao ser bombardeado com nêutrons, o urânio 235 se parte em núcleos mais leves, que se movem rapidamente. Essa energia de movimento acaba sendo usada para aquecer a água de um reservatório, que, por sua vez, move turbinas, gerando energia elétrica.

Apesar de a energia nuclear já ser responsável por mais de 10% da matriz energética mundial, há o perigo de acidentes graves, e os resíduos radioativos deixados ao final do processo são um problema constante.

Ao contrário de usinas nucleares convencionais, o ITER espera extrair energia da fusão de núcleos leves – mais precisamente, de dois isótopos do hidrogênio: o dêuteron (próton mais nêutron) e o trítio (próton mais dois nêutrons). Ambos são relativamente abundantes na natureza. O dêuteron, por exemplo, pode ser extraído da água do mar.

Quando o dêuteron e o trítio se fundem, são gerados um núcleo de hélio (dois prótons e dois nêutrons) e um nêutron. Nesse processo, por volta de 0,4% das massas do dêuteron e trítio se converte em energia. Pode parecer pouco, mas isso é o triplo do que se obtém em usinas nucleares convencionais, que já são milhões de vezes mais eficientes que termoelétricas, as quais queimam combustíveis fósseis gerando gás carbônico (CO2). Por sua vez, as usinas de fusão liberarão hélio, que é um gás inofensivo.




As partes da máquina estão sendo construídas em diferentes países, incluindo Estados Unidos, Coreia do Sul, Japão, Rússia, Itália e Alemanha. (foto: © ITER Organization)

Em resumo, o ITER seria o primeiro passo rumo a uma fonte de energia limpa e abundante. O grande desafio é que, para que a fusão aconteça, o ITER terá que aquecer os isótopos do hidrogênio a temperaturas de 150 milhões de graus Celsius, ou seja, uns 10% da temperatura no centro do Sol. Esse plasma infernal, formando uma ‘sopa’ quentíssima de partículas, terá que ser mantido longe de tudo, por meio de campos magnéticos megapotentes. Não devemos subestimar os desafios tecnológicos envolvidos na fusão, mas eles podem ser superados.

O ITER é encabeçado pela União Europeia, China, Coreia do Sul, pelos EUA, pela Índia, pelo Japão e pela Rússia desde 2006. À época, o valor estimado para a construção foi de 5 bilhões de euros (hoje, cerca de R$ 18 bilhões), e o tempo para sua conclusão era de 10 anos.

Infelizmente, o projeto está atrasado em uma década. Contudo, as coisas começaram a melhorar desde o fim do ano passado, quando o gerenciamento do projeto passou para as mãos do francês Bernard Bigot. Mesmo assim, Bigot estima que a máquina não estará concluída antes de 2025, e que, depois disso, ainda serão necessários vários anos para que o objetivo original de gerar energia pela fusão de dêuterons e trítios seja alcançado.

A nova estimativa de custo quase que duplicou, passando a ser de 9,6 bilhões de euros (cerca de R$ 35 bilhões), o que levou o Departamento de Energia dos EUA a não garantir seu apoio ao projeto além de 2018 – mas esperemos que essa ajuda continue até o final. Dez bilhões de euros é o que custa um porta­aviões. Se podemos construir vários desses para nos matar, será que não podemos construir um ITER para (ajudar a) nos salvar?

George Matsas
Instituto de Física Teórica
Universidade Estadual Paulista
Revista Ciência Hoje

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Notícias Geografia Hoje


Rupturas nos canais da Transposição

 
“Mais uma vez o canal do Eixo Leste da Transposição do São Francisco se rompeu nesse fim de semana. (...) As orelhas estão em pé. Vamos acompanhando os desdobramentos”. Leia artigo completo de Roberto Malvezzi (Gogó).

(Por Roberto Malvezzi, Gogó* / Foto: Carmelo Fioraso).

Mais uma vez o canal do Eixo Leste da Transposição do São Francisco se rompeu nesse fim de semana. As imagens e vídeos da ruptura estão pela internet.

Diante desses fatos até mesmo o jornalismo paraibano começa questionar a qualidade técnica da obra realizada. Afinal, com os canais expostos há tantos anos ao sol do sertão, sendo remendados várias vezes, sempre restava uma interrogação sobre a funcionalidade desses canais e barragens.

Os responsáveis estão dizendo que a correção será feita rapidamente e que não há maiores problemas. Quem sabe seja verdade e o assunto morra aqui.

Mas, os sucessivos problemas apresentados desde seu curto funcionamento, comprometendo inclusive a chegada da água ao açude do Boqueirão, em Campina Grande, reforçam as dúvidas de quem já sabia das imensas dificuldades operacionais de uma obra desse porte, sobretudo a longo prazo.


Tempos atrás se elogiava muito a engenharia brasileira por realizar uma obra de tamanho porte. Agora há um silêncio e os problemas vão se acumulando. Segundo o hidrólogo João Abner, dos 9 m3/s bombeados do São Francisco, apenas 3 m3/s estão chegando ao açude do Boqueirão, em Campina Grande. Portanto, uma perda hídrica de 70%. Quem recebe essa pouca água fica contente, mas poderia chegar muito mais com uma obra infinitamente mais barata e eficiente.

Nosso receio sempre foi que essa obra fosse inviável também tecnicamente, além de tantos outros problemas de ordem econômica, ambiental, social e até éticos.

As orelhas estão em pé. Vamos acompanhando os desdobramentos. O pior será se essa obra mostrar-se mesmo inviável. Aí teremos que recomeçar tudo do zero, pensando novamente nas adutoras, sem falar na situação do rio São Francisco.

Mas, não há como sair do zero. Já houve muito tempo e muito recurso público perdidos. Pior, muita ilusão vendida para fins que nunca ficaram devidamente claros.

* Atua na Comissão Pastoral da Terra (CPT) e no Conselho Pastoral dos Pescadores na região do São Francisco. Articulista do Portal EcoDebate, e possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais.
 https://www.cptnacional.org.br

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Como o derretimento do gelo do Ártico está elevando os níveis dos oceanos em todo mundo?

Especialistas explicam como o descongelamento de gelo terrestre e a dinâmica de aquecimento da água impactam os mares


Shutterstock


Mudanças climáticas estão aquecendo o Ártico mais de duas vezes mais rápido do que qualquer outro lugar no planeta. Uma das consequências mais sérias é o aumento do nível oceânico, o que ameaça nações desde Bangladesh aos Estados Unidos (EUA). Porém, como exatamente o derretimento de gelo no Ártico contribui para a elevação do nível dos oceanos? A Scientific American perguntou a Eric Rignot, professor de ciência do sistema terrestre na Universidade da Califórnia em Irvine, e Andrea Dutton, professora assistente de geologia na Universidade da Flórida, como mudanças nesta região do norte em particular estão levando os oceanos a alturas perigosas.

Agora, os mares estão se elevando a uma média de 3,2 milímetros por ano globalmente, e prevê-se que eles subam um total entre 0,2 e 2 metros até 2100. Rignot e Dutton dizem que, no Ártico, o lençol de gelo da Groenlândia apresenta o maior risco para os níveis oceânicos porque o derretimento de gelo terrestre é a principal causa para a elevação dos mares - e “a maioria do gelo terrestre do Ártico está presa na Groenlândia”, explica Rignot. São 2,96 milhões de quilômetros cúbicos de gelo cobrindo áreas terrestres agora - e ele está derretendo nos oceanos. Se todo o lençol de gelo da Groenlândia descongelasse, segundo Dutton, ele elevaria em 7 metros, em média, os níveis marinhos. Isso inundaria significantemente megacidades, tais como Mumbai e Hong Kong.

O gelo terrestre da Groenlândia já está descongelando rápido o bastante para elevar os mares de todo mundo em 0,74 milímetros por ano. “O ritmo de derretimento tem aumentado”, em grande parte porque o descongelamento da superfície do lençol de gelo se recuperou à medida que as temperaturas globais ficaram mais quentes, diz Dutton. “Essa aceleração do derretimento da superfície dobrou a contribuição da Groenlândia no aumento do nível marinho” em comparação ao período de 1992 a 2011, acrescenta Dutton.

E o Ártico possui outras áreas terrestres congeladas - geleiras e calotas polares - em lugares como a Islândia, o Ártico canadense e o russo, o Alasca e as Ilhas Svalbard, da Noruega. Eles não chegam perto de guardar tanta água quanto o lençol de gelo da Groenlândia, mas ainda são uma parte significativa na equação do nível do mar. Juntamente com geleiras e calotas de gelo no Hemisfério Sul (excluindo o lençol de gelo da Antártida), sua fusão completa potencialmente poderia elevar os oceanos em quase meio metro, de acordo com o Serviço Geológico dos EUA. Contudo, as áreas do norte têm muito mais estruturas congeladas do que as do sul, observa Rignot. "O derretimento de geleiras e calotas de gelo na Patagônia e nos outros locais do sul não contribuiria tanto quanto o daqueles que estão no Ártico."

Além de simplesmente adicionar água ao oceano, o descongelamento de gelo terrestre do Ártico pode elevar os níveis marinhos ainda mais através de um mecanismo chamado expansão térmica. “Em um clima mais quente, o oceano absorve muito calor extra do sistema climático e, como resultado, ele se torna menos denso”, explica Rignot. À medida que o gelo terrestre do Ártico derrete no mar, há mais água oceânica, no geral - e, assim, mais água para aquecer e expandir enquanto o clima esquenta, o que eleva ainda mais os níveis marinhos. “A quantidade da expansão que ela causa é significativa o bastante para que possamos medi-la”, diz Dutton. De 1993 a 2010, a expansão térmica acrescentou uma média de 1,1 milímetros de elevação do nível do mar por ano, de acordo com o Quinto Relatório de Avaliação do Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas.

O Ártico também possui bastante gelo marinho - ao mesmo 6,5 milhões de quilômetros quadrados - e tem cerca de 2 metros de espessura, em média, de acordo com o Centro Nacional de Dados de Neve e Gelo. Dutton e Rignot dizem que embora o gelo marinho esteja diminuindo, ele não altera os níveis de água quando derrete pois já faz parte da massa oceânica. “Você pode congelar e derreter o gelo marinho o quanto quiser - ele não vai mudar o nível do mar”, diz Rignot. “Você está apenas mudando o estado na água”. Dutton fornece uma analogia: “Se você está sentado em um bar com uma bebida que tenha cubos de gelo, seu copo está cheio e os cubos derretem, ele não vai transbordar. O gelo já está boiando na água, então ele deslocou o volume de seu próprio espaço.”

Porém, o descongelamento de gelo marinho ainda desempenha um papel no aumento no nível do mar. “O gelo marinho se comporta como um cobertor em cima do oceano”, protegendo a água da energia solar e do calor atmosférico, segundo Rignot. Quando a cobertura congelada desaparece, sua superfície branca não está mais lá para refletir a luz do Sol de volta para a atmosfera - então o oceano absorve muito mais energia solar. “É como ir de não receber calor algum do Sol a receber todo o calor do Sol”, ele explica. “É uma tremenda diferença”. Esse efeito acelera o aquecimento no geral, o que, por sua vez, derrete mais gelo terrestre e eleva o nível do mar. Então mesmo que todo esse derretimento de gelo marinho não pareça grande coisa por não afetar diretamente os níveis marinhos, Rignot diz que “isso é muito importante - o desaparecimento desse cobertor perturba todo o sistema do Ártico”.
Annie Sneed
Revista Scientific American Brasil

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Demografia e Economia no Brasil e em Santa Catarina


Por: Prof.a Dra. Marianne Zwilling Stampe e Prof.a Dra. Thais Waideman Niquito

A mudança demográfica é um fenômeno que ocorre no mundo e também no Brasil. As quedas das taxas de fecundidade e de mortalidade infantil, junto ao aumento da expectativa de vida da população, tiveram como consequência a diminuição da taxa de crescimento populacional. Com isso, ocorre uma mudança na estrutura etária da população. As regiões que passam por esse fenômeno apresentam uma mudança na estrutura etária, observando, num primeiro momento, a existência de menos jovens e mais pessoas em idade ativa e, posteriormente, mais idosos.

Figura 1 – Pirâmide etária Brasil e SC – 2016



Figura 2 – Pirâmide etária Brasil e SC – 2030





Fonte: IBGE.

Em 2016, a população idosa corresponde a 8% da população brasileira, enquanto em 2030 espera-se que o percentual suba para 15% da população brasileira. Ou seja, em 14 anos a proporção de idosos praticamente será o dobro.

Estudamos na teoria do crescimento econômico clássico que o mesmo (em termos per capita) depende de capital, trabalho e tecnologia, e que este último fator seria exógeno (resíduo de Solow). Contudo, com a evolução da teoria, surgiram os chamados modelos endógenos de crescimento, que buscam explicar o desempenho econômico com base em fatores como educação e inovação. Outra motivação para explicar o crescimento da renda per capita é a mudança demográfica – ou razão de dependência (RD) –, isto é, a quantidade de pessoas dependentes (crianças e jovens – 0 a 14 anos – e idosos –65 anos ou mais) em relação às pessoas potencialmente ativas (15 a 64 anos)¹.

Essa taxa pode ainda ser desmembrada em mudança demográfica infantil e de idosos, o que é bastante útil para a análise econômica. Isso porque um aumento da razão de dependência advinda de grande aumento da população infantil causa impactos bastante diversos daqueles observados quando a causa é o aumento da proporção de idosos na sociedade.

Observamos para o Brasil (cujas estimativas populacionais vão até 2060) que o bônus demográfico – período em que a menor RD total é registrada – se dará em 2022 (43,4%). O desmembramento da RD também mostra que o aumento da mesma se dará exclusivamente por um crescimento da proporção de idosos na população. Em 2060, para cada 100 pessoas potencialmente ativas teremos 66 pessoas dependentes. Em Santa Catarina (cujas estimativas populacionais vão apenas até 2030) o quadro é ainda mais alarmante: já estamos no bônus demográfico. Os anos de 2016 e 2017 são os que registram as menores razões de dependência (39,9%).

Figura 3 – Razão de Dependência BR (%)



Figura 4 – Razão de Dependência SC (%)



Fonte: IBGE

E por que a demografia afeta o crescimento econômico? As razões encontram-se no fato de que os incentivos das pessoas mudam. Por exemplo, jovens e idosos possuem preferências distintas, gerando demandas de consumo distintas. Com isso, mudam os bens que serão produzidos, ou seja, afeta a produção de bens e serviços na economia. Além disso, os gastos do governo com idosos são mais elevados do que com crianças. Se as pessoas têm vida mais longínqua e continuam trabalhando por 30 ou 35 anos (se mulher ou homem, respectivamente) o impacto sobre a previdência deverá ser mais elevado, influenciando também nos gastos do governo. A previdência, já bastante deficitária, sofrerá ainda mais impactos negativos no médio prazo. Em 1991, os gastos do governo federal com INSS representavam 3,4% do PIB, atualmente já representam quase 8%². Teremos cada vez menos pessoas contribuindo e cada vez mais pessoas recebendo aposentadorias. A conta não fecha. Como solucionar essa equação? Mais impostos? Aumento do tempo de contribuição?

A oferta de trabalho também sofre alterações. No período em que a sociedade conta com maior proporção de pessoas potencialmente ativas a mesma deve aumentar, influenciando os salários e, com as políticas públicas certas, a produtividade. Posteriormente, à medida que as pessoas envelhecem, deverá diminuir a oferta de trabalho, pois temos um limite físico que podemos trabalhar. Assim, para que a renda per capita continue crescendo, precisaremos que a sociedade seja cada vez mais produtiva.

À medida que o bônus demográfico se aproxima, esse se torna um dos principais desafios para o Brasil e, como vimos, o mesmo é ainda maior em alguns estados, como Santa Catarina. Agravando este cenário, estamos entre os países mais improdutivos do mundo. Precisamos de 4,2 brasileiros para desenvolver o mesmo trabalho de um americano; 3,5 para um australiano; 3,2 para um alemão; 3,1 para um inglês. Ficamos atrás também de países em desenvolvimento: são necessários 1,7 para obter-se o mesmo produto de um argentino; 1,6 brasileiros para um mexicano ou uruguaio³. Fica claro que os desafios impostos pela demografia são inúmeros para a economia brasileira. Corremos o risco de ficarmos velhos antes de ficarmos ricos.

¹Idades definidas pelo IBGE.

²Dados contidos no texto “O Ajuste Inevitável”, de Mansueto Almeida Jr., Marcos de Barros Lisboa e Samuel Pessôa.

³Fonte: Conference Board.
 http://observatorioeconomicodaesag.esy.es

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