segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Rede de conceitos do Século XXI




Verbete do Dicionário do século XXI
Jacques Attali

ÁGUA - Um dos recursos vitais mais raros, cobiçado a ponto de provocar guerras. Atualmente, a agricultura utiliza dois terços da água potável. Para atender à demanda alimentar sem alterar os modos de cultivo, a proporção das superfícies irrigadas deve aumentar em um terço até 2010, e 50% até 2025. Será necessário, inclusive, irrigar terras para obter produtos alimentares de valor menor que a água. Além disso, o uso industrial e doméstico da água aumentará duas vezes mais rapidamente que a população. No cômputo geral, a demanda de água duplicará de 20 em 20 anos.
A oferta, em compensação, não se alterará. Noventa e sete por cento da água da Terra são salgados. Dos 3% potáveis - provenientes basicamente de geleiras, dos rios, lagos e da chuva -, dois terços concentram-se na Groenlândia e na Antártica, ou estão à deriva como icebergs. Não obstante os esforços empreendidos para aumentar os recursos disponíveis (represas, bombeamento de águas subterrâneas), a quantidade de água doce renovável no planeta não superará 40.000 km3 por ano. Esta defasagem entre a quantidade de água disponível e a demanda foi multiplicada por cinco em um século. Ainda por cima, a repartição torna-se cada vez mais desigual. Menos de 10 países concentram 60% dos recursos mundiais (em ordem decrescente: Brasil, Rússia, China, Canadá, Indonésia e Estados Unidos). Um terço da humanidade, em 80 países, 14 dos quais no Oriente Médio, sofrem de escassez de água; 1,2 bilhão de pessoas não dispõem do mínimo universal anual de sobrevivência. Seis milhões de crianças morrem anualmente por terem bebido água contaminada.
No futuro, a poluição reduzirá ainda mais a quantidade de água disponível. Por exemplo: em alguns decênios, baixou 14 metros o nível do mar de Aral, que perdeu 40% de sua superfície e 60% de seu volume de água potável. A poluição da atmosfera, provocando elevação da temperatura, acarretará o derretimento das geleiras e a elevação do nível dos mares, que por sua vez poluirá as camadas subterrâneas de água doce.
Em 2010, 32 países carecerão de água na África, na Ásia e em certas regiões da Europa e da América. A disponibilidade média anual por habitante se reduzirá a 5.100 m3 em 2025 e 4.000 m3 em 2040. no ritmo atual, todas as águas de superfície terão sido consumidas até 2100.
Batalhas sangrentas e guerras ocorrerão pelo controle dos rios de que os países situados acima tentarão apropriar-se: a Turquia dominará o Tigre e o Eufrates, a Etiópia (que terá passado de 55 milhões de habitantes em 1993 a 94 milhões em 2010) pretenderá dominar o Nilo. Angola, África do Sul, Namíbia e Botsuana disputarão o controle das águas do Okavango, que despeja 10 bilhões de metros cúbicos de água por ano, dos quais 94% se evaporam em três meses. Conflitos explodirão entre os países ribeirinhos da bacia do Jordão, compartilhado por 15, e talvez até entre os sete estados americanos banhados pelo Colorado.
Para economizar água, seu preço será aumentado maciçamente, o que levará à generalização da irrigação gota a gota, à proibição de toda descarga de emanações industriais, ao tratamento e reciclagem das águas usadas. Nos países particularmente bem administrados, como a França, a quantidade de água disponível poderá até aumentar.
Mais tarde, quando o preço da água se tiver tornado muito alto, a água do mar será dessalinizada, um dique será construído para fechar o mar Báltico e nele estocar água potável e icebergs serão rebocados da Antártica até a Austrália, o Oriente Médio e a Ásia central.
Jacques Attali é economista.

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