JOÃO MAURO ARAUJO
Tabatinga e Leticia: Rua da Amizade
Foto: João Mauro Araujo
Não é de hoje que o Brasil figura como local de refúgio para estrangeiros que, por correrem risco de vida, são obrigados a deixar seu local de origem. Durante as duas Grandes Guerras, por exemplo, foi expressivo o número de famílias que para cá vieram, provenientes de diversas partes do mundo. Na última década, intensificou-se o fluxo de refugiados colombianos, pressionados a abandonar seu país por causa da guerra civil travada entre os cerca de 30 mil soldados irregulares – distribuídos entre grupos guerrilheiros e paramilitares – e as forças de segurança do Estado.
No período entre 1995 e junho de 2007, segundo dados da Agência Presidencial para a Ação Social e a Cooperação Internacional, da Colômbia, foram registrados mais de 2 milhões de deslocamentos internos motivados pela violência. Entre as causas estão ameaças à população civil por suposta colaboração com grupos rivais, massacres, intensificação da atividade armada, controle sobre terras onde há cultivos ilícitos, disputa de territórios em zonas estratégicas, recrutamento forçado e exigência de contribuição financeira (chamada de "vacina"). Por se tratar de um conflito disseminado por quase todo o território colombiano, muitas vezes às pessoas resta apenas a saída pelas fronteiras e posterior tentativa de conseguir refúgio em países vizinhos, como Equador, Venezuela, Costa Rica e Brasil.
A lei brasileira 9.474/97, que define a implementação do Estatuto dos Refugiados, é considerada uma das mais avançadas da América Latina. "É interessante porque, na maioria dos países, em todo o mundo, esse tema está incorporado nas leis migratórias. No Brasil, porém, há uma legislação específica, que se baseia no diploma internacional – a Convenção de 1951, reformada pelo protocolo de 1967 da Organização das Nações Unidas [ONU], que traz os padrões mínimos de proteção", comenta Liliana Lyra Jubilut, advogada do Centro de Acolhida para Refugiados da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo. Para ser reconhecida como refugiada, a pessoa tem de comprovar seu temor de perseguição por um dos motivos previstos na lei: raça, religião, nacionalidade, opinião política ou grupo social, ou grave e generalizada violação dos direitos humanos.
A grande maioria dos colombianos que chegam ao Brasil não tem nenhum envolvimento direto com as partes em luta, mas mesmo assim precisou abandonar casa, emprego, familiares, em questão de horas ou dias. O número de refugiados provenientes da Colômbia reconhecido pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) gira em torno de 350, ou seja, 10% do total (3,5 mil), que inclui pessoas de outras 68 nacionalidades atendidas no Brasil. Esse dado, contudo, não reflete a realidade, uma vez que muitos "preferem" entrar e permanecer sem registros legais, pois temem ser deportados ao se apresentar à Polícia Federal. Há estimativa de até 17 mil colombianos em situação irregular no país. Outro motivo para não ter a documentação em ordem seria a falta de confiança em policiais, uma vez que em seu local de origem a imagem dos serviços de segurança está diretamente associada a grupos paramilitares.
Assim, essa população permanece invisível, calada e, quando questionada, tende a dizer que é de outro país, para não correr o risco de ser localizada por seus perseguidores. Por motivo de segurança, alguns dos entrevistados pediram para não ser identificados nesta reportagem, e seus nomes foram substituídos.
Violência
"Quando nasci, já havia guerra. Tenho 58 anos, e ela continua. Penso que vou morrer sem ver seu fim. Em meu país várias gerações não sabem o que é paz", afirma Carlos Ramírez Pérez, refugiado colombiano que está no Brasil desde junho de 2006. Natural do departamento de Boyacá, seus pais tiveram de se mudar quando ele ainda era criança para a capital, fugindo das lutas generalizadas entre grupos conservadores e liberais. Era o período conhecido como "A Violência", que teve início em 9 de abril de 1948, após o assassinato em Bogotá do carismático político Jorge Eliecer Gaitán. Um golpe de Estado do general populista Rojas Pinilla, em 13 de junho de 1953, amenizou parcialmente a guerra, que àquela altura já causara a morte de 300 mil pessoas. Contudo, cinco anos depois ele foi substituído pela Frente Nacional, resultado de um acordo firmado entre os partidos Liberal e Conservador, que decidiram alternar-se no poder.
Apesar do irônico entendimento entre as duas correntes políticas rivais, alguns grupos camponeses que tinham lutado ao lado dos liberais consideraram-se desfavorecidos com tal desfecho e permaneceram em armas. Foram surgindo assim as primeiras guerrilhas rurais, em comunidades autônomas, logo influenciadas pela Revolução Cubana, o que fez com que os ideais, até então de caráter liberal, assumissem um radical teor marxista. Já em 1964 as forças militares organizaram uma operação nas montanhas de Marquetalia (departamento de Tolima) para sufocar um foco rebelde, mas tiveram de enfrentar a resistência de 48 homens liderados por Manuel Marulanda Vélez, o "Tirofijo".
Foi a partir desse núcleo de combatentes que se formaram as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), o maior e mais atuante grupamento guerrilheiro do país, que há 43 anos luta para tomar o poder. A partir de meados da década de 1960, foram surgindo outras facções guerrilheiras de esquerda, mas só as Farc e o Exército de Libertação Nacional (ELN) – que constituíram a Coordenadoria Guerrilheira Simon Bolívar – permanecem em atividade.
O nome das Farc não traz boas lembranças a Carlos Pérez. Os grupos guerrilheiros cobram tributos nas áreas em que atuam e, se uma pessoa não paga, pode sofrer represálias. A família de Pérez, porém, não queria colaborar financeiramente com as Farc, o que levou todos os homens a se reunir e fazer um acordo, que só valeria para eles: "Nenhum de nós que for pego vai ser resgatado. Se tiver de morrer, morre", combinaram.
O seqüestro é bastante utilizado pela guerrilha na Colômbia como "capital de negociação" – serve tanto para exigir dinheiro dos familiares das vítimas como para pressionar o Estado a libertar prisioneiros e fazer concessões políticas. Em 2001, houve mais de 3,7 mil casos naquele país, com o recorde mundial de 50 em apenas 72 horas.
Em janeiro de 2006, Pérez seguia pela estrada que liga os departamentos colombianos de Santander e Norte de Santander, quando um "bloqueio que parecia do exército" interrompeu o trânsito. Era um grupo das Farc que abordava as pessoas, pedindo documentos. Por ter irmãos abastados, o nome de Pérez constava da lista que traziam. "Uma mulher se aproximou e bateu em mim com a ponta do fuzil. Fizeram-me caminhar um quilômetro, até onde um homem fazia uma palestra sobre a causa do seqüestro." Com a intervenção do exército colombiano, nove das pessoas que estavam presas – entre elas Pérez – conseguiram escapar, mas onze morreram. Pérez precisou, então, sair do país. Ele veio para São Paulo, onde buscou o auxílio da Cáritas Arquidiocesana, organização que integra a rede de proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).
Em sua opinião, o maior problema do refugiado é a solidão: "A gente se sente só, porque não encontra pessoas com os mesmos costumes. A língua e a comida são diferentes. É muito triste não poder abraçar as filhas, falar com a mãe, além da angústia de não saber o que pode acontecer com a família", lamenta. Depois de atender à reportagem, ele mostra, sobre uma mesa da Cáritas, algumas caixas com imagens coloridas, feitas de madeira reciclada, que confecciona e vende. "Pego uma caixinha nua e a visto", diz. Essa técnica, aprendida no Brasil, é hoje o principal ganha-pão de Pérez.
Paramilitares
As Farc não são, entretanto, o único exército ilegal a provocar deslocamentos. O Brasil também recebe pessoas que fogem dos paramilitares – ou "paras", como também são conhecidos –, cujo maior representante são as Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC), grupo surgido no início dos anos 1980, como extensão das milícias privadas das indústrias ilegais do narcotráfico e do comércio de esmeraldas. As AUC são o segundo maior grupo armado do país, bastante conhecido pela atrocidade de suas ações.
Claudia Castillari, que trabalhava no auxílio aos deslocados que fugiam para a região norte da Colômbia, onde vivia, foi expulsa do país devido às ameaças de um ex-líder das AUC, conhecido como Mancuso. Os conflitos não a atingiam diretamente, até o dia em que denunciou o envolvimento de paramilitares com pessoas do alto escalão do governo: "Eles têm deputados, conseguem eleger congressistas, uma vez que pressionam as pessoas nos povoados para que votem em seus candidatos", conta Claudia, que passou a ser vigiada em casa, no trabalho, e a receber telefonemas de desconhecidos. "Não foi brincadeira, sofri ameaças muito fortes. Eles sabiam de cada movimento meu, por isso não tive mais possibilidade de ficar na Colômbia."
Claudia tinha opções de refúgio em outros países, mas escolheu o Brasil pela proximidade e por já ter passado férias no Rio de Janeiro e em São Paulo. Ela achava que seria por um curto período, mas hoje sabe que seu retorno à Colômbia é algo quase inviável. Por isso, busca uma melhor adaptação. "É assim que se fala?", pergunta, após repetir determinadas palavras para corrigir a pronúncia em português. Claudia também vê certa semelhança entre os brasileiros e as pessoas de sua região: "São muito hospitaleiros e acolhedores".
Já a teóloga María de Jesús López foi duplamente ameaçada, primeiro pelos paramilitares e, depois, pelas Farc. A história de sua fuga começou no povoado onde morava, numa área de cultura cafeeira da Colômbia. Ela era proprietária de uma loja de roupas na cidade e, certo dia, quando retornava à sua casa, tomou conhecimento do assassinato de um rapaz que já havia sido interrogado por um comandante dos "paras", sob suspeita de colaborar com as Farc nos serviços de transporte que fazia. "Fiquei indignada. Tinha raiva porque sabíamos quem o havia matado e não podíamos fazer nada", conta María. Depois, foi seu sobrinho quem entrou na lista negra deles, por não concordar em fazer um frete "solicitado".
María, então, decidiu ocultá-lo e, por isso, passou a ser perseguida. Não lhe restou alternativa senão pegar o filho e o sobrinho e partir imediatamente para o Equador, deixando para trás tudo o que tinham. Por dois anos e nove meses eles permaneceram naquele país, onde tiveram a companhia de outros familiares que seguiram seu exemplo. Lá, María participou de uma associação que tinha entre seus objetivos expor a situação dos refugiados colombianos por toda a América do Sul. "Se uma mãe sai às pressas da Colômbia com três filhos, não é a passeio, mas porque tem problemas. Os rapazes de 13, 14 anos são muito perseguidos tanto pela guerrilha quanto pelos paramilitares, para que integrem suas fileiras", afirma. A associação organizou uma marcha que deveria percorrer todas as capitais do continente levando um apelo, mas teve de ser interrompida no Brasil, a terceira nação visitada, pois o irmão de María, que permanecera no Equador, foi agredido, como forma de "aviso prévio", por membros das Farc, os quais exigiam o fim imediato da manifestação.
María queria ter ido para algum lugar onde o idioma fosse o espanhol, porém, como diz, "o refugiado não escolhe para onde vai, tem de ficar no primeiro país que lhe dê abrigo". A língua costuma ser um grande desafio para os colombianos, seja nas relações sociais do dia-a-dia, seja para o ingresso no mercado de trabalho: "É um obstáculo", diz María, que faz cursos de computação e de português. No albergue em que reside atualmente, ela tenta reorganizar sua vida pela segunda vez, junto dos irmãos que também solicitaram refúgio no Brasil.
Fronteira
Ao redor do Parque Santander, em Leticia, estão as duas instituições mais procuradas pelos deslocados por motivo de violência que se dirigem à capital do departamento colombiano do Amazonas: a Pastoral Social e a Agência Presidencial para a Ação Social e a Cooperação Internacional. Ambas desenvolvem um trabalho de assistência e orientação. A Ação Social é fruto de uma lei federal de julho de 1997 e foi criada para atender a população vítima dos grupos armados. Nos últimos sete anos, o escritório de Leticia já assistiu a mais de 170 famílias, cerca de 600 pessoas.
Por ser de difícil acesso – uma vez que a cidade é separada do restante do país pela floresta Amazônica – e fazer fronteira com o Brasil e o Peru, em Leticia não há registro da presença ativa dos exércitos ilegais. A cidade pode ser alcançada de duas maneiras, a partir de outras regiões da Colômbia: por avião, saindo de Bogotá, e através do rio Putumayo – um trajeto longo e nada aconselhável, que passa por áreas de ação armada. Geralmente, os deslocados solicitam auxílio para custeio das passagens aéreas em vôos de carga – mais baratos – e assim conseguem chegar com maior segurança, conforme explica Carolina Fonseca, assessora de comunicação da Ação Social.
Se, por um lado, devido a sua localização, a capital do departamento do Amazonas constitui uma boa opção para quem deseja fugir dos conflitos sem deixar o país, por outro ela também serve de passagem para um possível refúgio no lado brasileiro, pois apenas alguns passos a separam de Tabatinga, cidade brasileira localizada no alto Solimões. Nesse ponto fronteiriço, a circulação entre os dois países é livre, sem a necessidade de apresentação de qualquer documento. Na Rua da Amizade, basta transpor o ponto demarcado por duas bandeiras nacionais, uma placa de "boas-vindas" e um posto militar.
Por essa facilidade de locomoção, não se sabe ao certo quantas pessoas atravessam a fronteira, e quantos desses transeuntes estão em busca de abrigo no Brasil. Uma promotora comunitária da Cáritas-Leticia se mostra preocupada porque, segundo ela, muitos pedidos são negados pelo governo brasileiro, o que aumenta a quantidade de colombianos em situação de clandestinidade. Juan Carlos Oviedo veio para o Brasil sozinho em dezembro de 2006, fugindo dos paramilitares que o ameaçavam por não querer pagar a "vacina" no departamento de Quindío. Seu primeiro pedido de asilo foi negado, mas ele ainda aguarda o resultado de um recurso. Enquanto isso, segue trabalhando como barqueiro em Tabatinga, onde já está há nove meses sem ver a esposa. Ela aguarda o resultado do pedido para poder vir morar com o marido. "Todos os dias nos comunicamos por telefone. É dura a solidão", conta Oviedo.
A Igreja é sempre procurada antes de qualquer entidade estatal. Há um acordo entre as arquidioceses dos países da tríplice fronteira para colaborar no auxílio aos migrantes e, em 2005, foi constituída a Pastoral da Mobilidade Humana, cujo escritório funciona na Igreja dos Santos Anjos de Tabatinga, com o apoio do Acnur. Segundo o vigário dessa paróquia, Gonzalo Franco, a pastoral trabalha principalmente com "colombianos que fogem da violência e peruanos que tentam escapar da pobreza". O Peru começa do outro lado do rio Solimões, no município de Santa Rosa. Por isso, há também em Tabatinga um grande número de pessoas daquele país.
Mesmo com certo ar de tranqüilidade, porém, a cidade brasileira "não é cem por cento segura para os refugiados", comenta Franco, lembrando o caso de uma família que fugiu para Manaus por sofrer ameaças em Tabatinga. Ele diz ter muita satisfação em poder ajudar com seu trabalho: "Para a gente não importa a religião, mas sim a pessoa, a dignidade humana antes de tudo".
Estigma
Em novembro de 2006, quando substituiu um colega na editoria de Mundo do jornal "A Crítica", de Manaus, Neuton Corrêa de Souza tomou conhecimento da presença de refugiados colombianos no Brasil. Seu primeiro impulso foi tentar localizá-los para fazer uma reportagem, na expectativa de descobrir pessoas que estivessem em melhores condições do que em seu país de origem. "Foi justamente o que não encontrei", afirma. Neuton conta ter visto gente que ainda enfrentava o trauma da guerra e que mesmo assim tinha vontade de voltar. Seu maior espanto, contudo, foi o relato de uma colombiana de 27 anos, que disse sofrer preconceito no Brasil por conta de sua nacionalidade, que estaria associada ao tráfico de drogas. "Quando a gente vai em busca de um emprego e diz de onde é, a primeira pergunta que fazem é: ‘Pablo Escobar?’ "
Refletindo sobre as origens desse estigma, Neuton teve a atenção chamada para o poder da mídia: "Suponho que os jornais estão colaborando para erguer o muro que divide brasileiros e colombianos. Aqui a gente vê muitas notícias do tipo: ‘Quadrilha colombiana presa com tanto de droga’, ‘Colombianos guerrilheiros atravessam a fronteira com droga’. Se não estiver associada ao tráfico da Colômbia, não é uma grande matéria." Ele questiona também a "mão única" dessa comunicação, pois os supostos criminosos não são ouvidos: "Eles são realmente da Colômbia? São mesmo traficantes?" Desde o início de 2007 Neuton participa de um programa de pós-graduação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), em que pretende estudar a questão do preconceito por meio da análise do discurso, e assim colaborar na elaboração de políticas públicas.
Márcia Maria de Oliveira, professora da Ufam e membro do Serviço de Ação, Reflexão e Educação Social (Sares), considera necessário o governo federal criar uma instituição específica para lidar com a imigração e os refugiados: "Uma das dificuldades que as pessoas em situação de refúgio encontram, quando chegam ao Brasil, é ter de se apresentar à Polícia Federal, que tem toda uma preparação para enfrentar o narcotráfico e fazer a guarda da fronteira, mas não para lidar com o refugiado".
Desde 1998, quando trabalhava na Pastoral dos Migrantes, em Manaus, Márcia acompanha o fluxo de estrangeiros. A partir de 2002, passou a perceber a chegada não de colombianos isolados, mas de grupos familiares. "Hoje é possível encontrar refugiados no mercado de trabalho, nas matrículas das escolas, no atendimento médico, na universidade e assim por diante." Para a professora da Ufam, as políticas migratórias carecem de mudanças profundas: "É preciso que a sociedade esteja informada sobre os processos e as causas das migrações compulsórias, e entenda a situação dos refugiados para poder exercitar a reciprocidade e evitar a sutileza da xenofobia velada".
Há comumente um mal-entendido com a palavra "refugiado", que por vezes é confundida com "foragido", talvez pela semelhança fonética. Yessica Torres, que vive no Brasil há seis anos, conta que as pessoas estranhavam ver em sua carteira de identidade a palavra "refugiada". "Diziam: ‘Nossa, quem você matou? Você foi expulsa?’, e eu explicava: ‘Não é bem assim, o refugiado sai de seu país por causa da violência, não porque é delinqüente ou assassino’ ". Yessica estava com 12 anos quando veio para São Paulo com a irmã mais velha e a mãe, para morar com o pai, Jorge Torres, que havia chegado pouco tempo antes. Apesar de se dizer "praticamente brasileira", Yessica, estudante de gestão empresarial, afirma ter saudade da Colômbia: "Vamos supor que você entre num lugar e sinta o cheiro da casa de seu tio. Então começa a lembrar..." Para ela, ser refugiado é "como ter começado a viver uma vida sem ter morrido na anterior".
Jorge Torres também parece tranqüilo. Faz planos de regressar à Colômbia, mas só a passeio, para a esposa poder reencontrar a família. Ele trabalha como pedreiro, participa de um grupo religioso e gosta de ouvir forró. Da mesma forma que Torres e outros refugiados vêm assimilando traços da cultura local, esta por certo não ficará imune aos inúmeros elementos trazidos por eles ao Brasil, já enriquecido pela contribuição de tantos outros estrangeiros aqui instalados.
Adaptação difícil
Preocupado com a situação dos refugiados, que muitas vezes, mesmo após anos de permanência no país, ainda enfrentam problemas para se integrar, o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) está fazendo um estudo sociológico com o propósito de entender os motivos que dificultam essa adaptação. Segundo Luiz Paulo Teles Barreto, presidente do órgão, aceitar refugiados no país apenas para honrar um acordo internacional não basta.
"Todo trabalho relativo a essa questão deve ser estruturado na solidariedade", afirmou Teles Barreto durante a solenidade em comemoração aos dez anos da lei 9.474/97, que, em dezembro último, premiou com o "Reconhecimento Solidário 2007" indivíduos e instituições que apóiam os refugiados no Brasil. Foram agraciados, entre outros, o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Social do Comércio (Sesc), pela contribuição à integração dos refugiados que vivem em São Paulo, por meio da oferta de cursos técnicos gratuitos, aulas de português e espaços de cultura e lazer, além de alimentação a preços mais acessíveis. A unidade do Sesc Carmo, por exemplo, é um dos locais procurados pelos colombianos que vivem na capital paulista.
Jan.fev de 2008
Revista Problemas Brasileiros
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