Contato com o DDT na infância ou na puberdade deixa mulheres mais vulneráveis ao surgimento do tumor cerca de 40 anos depois. Uso da substância é proibido no Brasil há apenas 10 anos
Muito usado no século 20, o produto ainda é aplicado em países da África e da Ásia para combater a malária(foto: Reuters/Enny Nuraheni - 15/3/04)
Longe das prateleiras brasileiras há apenas 10 anos, quando foi proibida sua produção e comercialização, o pesticida DDT aumenta o risco de câncer de mama em mulheres que foram expostas à substância em algum momento da vida. Um estudo publicado, nesta semana, no Journal of the National Cancer Institute, dos Estados Unidos, mostrou que pessoas que tiveram contato com o inseticida antes dos 14 anos, particularmente quando bebês ou no início da infância, têm mais possibilidade de desenvolver esse tipo de tumor antes da menopausa. Já aquelas sujeitas à substância depois dessa fase estão em risco aumentado ao alcançarem os 50-54 anos.
“O que descobrimos é que o tempo realmente importa. Sabemos que se exposições perigosas acontecem quando o tecido das mamas está mudando rapidamente, como na puberdade, isso impacta o desenvolvimento do órgão de forma que pode resultar em câncer posteriormente”, diz Barbara A. Cohn, pesquisadora do Instituto de Saúde Pública dos EUA. “A pesquisa publicada sugere que o DDT afeta o câncer de mama como um disruptor endócrino, que o período de tempo entre a primeira exposição e o risco (da doença) parece ser de cerca de 40 anos, e que outros disruptores endócrinos químicos podem potencialmente simular esse padrão de risco.” Disruptores endócrinos são substâncias externas que, no organismo, agem como hormônios, causando sérias alterações, incluindo o desenvolvimento de tumores.
O DDT foi amplamente usado no mudo todo no século 20. Apesar de banido — em alguns países, desde a década de 1970 —, ele continua presente no meio ambiente e ainda é usado para enfrentar a malária na África e na Ásia. Segundo os pesquisadores do Instituto de Saúde Pública dos Estados Unidos, a cada duas vezes mais exposição ao produto, há um risco três vezes maior de câncer de mama pós-menopausa em mulheres que tiveram contato com o pesticida na puberdade. A substância aumenta a chance de desenvolvimento desse tipo de tumor em pessoas expostas a ela na fase uterina até os 14 anos.
Resultados consistentes
“Embora tenham sido feitos muitos estudos sobre meio ambiente e câncer de mama, apenas uma pequena fração deles, de fato, mediu as exposições ambientais durante janelas de suscetibilidade — nesse caso, início da infância e antes da menarca”, afirma Mary Beth Terry, professora da Universidade de Colúmbia e autora do trabalho. “Os estudos que mediram a exposição ambiental durante as janelas de suscetibilidade, como o nosso, são consistentes em apoiar uma associação positiva com o risco de câncer de mama”, completa a pesquisadora.
A pesquisa baseia-se em dados de 15.528 mulheres, que participaram de um estudo epidemiológico ao longo de seis décadas. Para determinar os níveis de exposição ao DDT, os cientistas analisaram amostras de sangue estocadas, que foram coletadas de 1959 a 1967, durante cada trimestre da gestação e logo depois o pós-parto. Eles usaram dados estaduais para identificar os casos de câncer de mama diagnosticados entre 1970 e 2010 em mulheres de 50 e 54 anos e cruzaram as informações.
Um estudo anterior, de 2007, usou os mesmos métodos, combinando 129 casos de câncer de mama diagnosticados, de 1962 a 1994, em mulheres com até 50 anos de idade. A nova pesquisa expandiu a janela de resultados, considerando casos diagnosticados entre a idade de 50 a 54 anos, quando a maioria das mulheres concluiu recentemente a menopausa. “Enquanto você viaja pela vida, os períodos de risco mudam”, enfatiza Cohn. “Considerando os padrões que observamos, trabalhar para trás para determinar quando uma mulher entrou em contato com a substância pode ajudar na detecção precoce e no tratamento do câncer de mama associado ao DDT.”
"Trabalhar para trás para determinar quando uma mulher entrou em contato com a substância pode ajudar na detecção precoce e no tratamento do câncer de mama associado ao DDT”
Barbara A. Cohn, pesquisadora do Instituto de Saúde Pública dos Estados Unidos
Olfato danificado
No caso dos homens, o contato regular com pesticidas, incluindo o DDT, e herbicidas pode comprometer a capacidade olfativa, segundo estudo da Universidade do Estado de Michigan (EUA). Os pesquisadores chegaram à conclusão após acompanhar 11.200 agricultores ao longo de 20 anos. Os resultados inéditos foram divulgados, neste mês, na revista Environmental Health Perspectives.
Segundo Honglei Chen, principal autor, estudar os agricultores forneceu dados mais confiáveis sobre exposições a pesticidas do que se fosse considerada a população em geral. “Como o uso desses produtos faz parte do trabalho deles, são mais propensos a lembrar quais substâncias usaram e, em casos de alta exposição, a fazer relatos específicos”, justifica.
No início do estudo, 16% dos participantes relataram ter experimentado um evento de alta exposição a pesticidas ou herbicidas, como ter grande quantidade de produto derramada no corpo. Duas décadas depois, eles foram questionados sobre a existência de algum tipo de comprometimento olfativo. Aqueles que tiveram o contato exagerado foram 50% mais propensos a relatar problemas como perda parcial ou total do olfato, segundo os autores.
Água e sabão
A pesquisa também mostrou que uma lavagem imediata, usando sabão e água, pode mitigar o risco de complicações. Comparado com agricultores que nunca experimentaram um evento de alta exposição, aqueles que se limparam em um intervalo de três horas apresentaram risco 40% maior de ter problemas olfativos. Já os que esperaram quatro ou mais horas viram o risco potencialmente duplicar.
A equipe identificou que dois inseticidas — DDT e lindano — e quatro herbicidas — alacloro, metolacloro, 2,4-D e pendimetalina — apresentaram maior associação com o mau olfato. Honglei Chen não descarta outras consequências do contato excessivo com as substâncias. “Mais pesquisas precisam ser feitas, mas alguns estudos ligaram esses produtos químicos ao Parkinson e possivelmente à demência”, diz.
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