2012 é ano bissexto. Não disseram que neste ano o mundo
acabará? Superstição? Essa e outras questões fazem refletir sobre o passar dos
dias e as criações humanas para marcá-lo. Foto: NASA
Por Roberto Filizola, professor do Departamento de
Teoria e Prática de Ensino do Setor de Educação da Universidade Federal do
Paraná, autor da obra Didática da Geografia (Base Editorial, 2010)
Quantos anos você tem? Quem não saberia responder a essa
pergunta? Por incrível que pareça, membros de algumas sociedades não sabem
afirmar, de maneira precisa, suas idades. Ao menos uma das razões para isso
está na inexistência do calendário em suas culturas. Basta olharmos à nossa
volta e prontamente reconhecer não só o valor que atribuímos, como a relevância
do calendário para a organização de nossas vidas. Temos, portanto, um
interessante ponto de partida para pensar a origem do calendário.
Primeiramente, é interessante observar que esse termo tem
origem latina, calendarium, e significava “livro de contas”. Na antiga Roma, o
primeiro dia do mês era dedicado ao pagamento das contas do mês anterior, e
também era denominado de calendae – calendas –, tendo dado origem à palavra
calendário. Assim, se hoje a pessoa que elabora calendários se denomina
calendarista, o verbo calendarizar diz respeito à organização do tempo por meio
do calendário. Não dependemos de um calendário escolar para planejar e
organizar nossas atividades?
Pois bem, o calendário, ou simplesmente a folhinha, tem por
finalidade nos auxiliar na marcação da passagem do tempo. Daí não termos
dificuldade de saber a nossa idade. O calendário possibilita organizar o tempo,
ou melhor, dividi-lo em dias, semanas e meses. Temos assim que o ano pode ter
um início e um fim, uma duração ou extensão e suas divisões. Decorrem disso
questões curiosas: por que atribuímos ao ano a duração de 12 meses? Como se
obtém a duração do mês?
Tais questionamentos só reforçam a ideia de que para
“montar” um calendário necessitamos de critérios. Mais do que isso, critérios
arbitrários. Não é à toa, portanto, que existem inúmeros calendários: o
egípcio, o juliano, o judaico, o gregoriano, o lunar, o solar, o maia, o
asteca, o romano, o muçulmano, o chinês… Sendo assim, no que e com base em que
civilizações, povos e religiões organizavam seus calendários?
Natureza versus medição do tempo
No mundo natural, animais e plantas adaptam-se a inúmeras situações. A espécie
humana também teve de adaptar-se ao meio para poder perpetuar-se. Por outro
lado, os seres humanos aprenderam a intervir no ambiente, a alterá-lo para
potencializar sua existência. Nesse processo, a observação, a tentativa de
entendimento do funcionamento das partes que compõem a natureza foi de
fundamental importância. Como os grupos humanos desenvolveram a agricultura?
Sem dúvida, a observação de que uma planta específica se desenvolvia a partir
da queda ao chão de certas sementes encontra-se por detrás da história da
agricultura. E quanto ao tempo, isto é, à sua medição?
Curiosamente, existe uma forte relação entre a invenção da
agricultura e a divisão do tempo. Isso porque, para as sociedades agrícolas,
era necessário saber a época apropriada para o plantio e a colheita, assim como
para comemorar suas festividades religiosas, aí incluída a festa da colheita.
Isso não significa dizer que sociedades coletoras e pescadoras também não
dependessem de uma base natural de divisão do tempo. Mas naquelas, esse fato
era mais expressivo.
Assim, as estações do ano tinham início e fim, ou melhor, se
sucediam umas às outras. Relacionando sua periodicidade ao aparecimento no céu
de uma determinada estrela, e mesmo pelo número de vezes que uma fase da Lua se
repetia, o tempo passou a ser contado, organizado. Em outras palavras, os
grupos humanos desenvolveram uma consciência crescente a seu respeito, a ponto
de criar o calendário e o relógio.
Quanto à organização do -calendário, -encontra-se associada
ao movimento aparente do Sol na esfera celeste ao longo de um período, o qual
se convencionou denominar ano. Assim como percebemos que, ao longo do ano, a
iluminação pelo Sol de determinados cômodos de nossas casas se altera, os povos
mais antigos percebiam que, a cada dia, o Astro-Rei nascia e se punha num ponto
diferente no horizonte. Esse tipo de observação, ao lado do reconhecimento de
que o “mapa do céu” sofria modificações ao longo do ano, revelou para esses
povos que o Sol se movimentava cumprindo um ciclo como se girasse em torno de
algo. A esse ciclo, portanto, correspondia o período de um ano.
Qual critério estabelecer para determinar o início desse
ciclo, ou do ano? Os primeiros calendários baseados no movimento aparente do
Sol assinalavam seu início quando começava a primavera no Hemisfério Norte. Por
outro lado, antigos calendários também foram estabelecidos a partir da Lua, ou
seja, com base em suas fases. Se o calendário solar possui 365 dias, o lunar
conta com 11 dias a menos: 354.
O ano bissexto
Quando nos referimos ao movimento aparente do Sol na abóbada celeste, na
realidade estamos tratando do movimento de translação da Terra. Trata-se,
portanto, do movimento que nosso planeta realiza ao redor do Sol e tem a
duração de 365 dias, 5 horas e 48 minutos. Essa é a referência para a construção
do nosso calendário. É desse movimento, ainda, que decorrem as estações do ano.
Os calendários solares, portanto, prestam-se melhor para marcar as datas das
estações do ano.
É necessário salientar que o tempo que a Terra leva para
completar uma volta em redor do Sol não pode ser tomado como um número exato de
rotações (movimento que a Terra executa em torno de si mesma). Em outras
palavras, o ano e o dia têm durações que não são múltiplos entre si. Assim
sendo, em todo ano “sobram” 5 horas e 48 minutos no nosso calendário, razão
pela qual a cada quatro anos se acrescenta um dia ao calendário, no mês de
fevereiro. Caso contrário, o ano-novo não teria início à zero hora do dia 1º de
janeiro, mas em instantes diferentes sempre que a Terra completasse uma órbita.
Como os calendários são criados para durar, permitindo que determinadas datas
possam ser marcadas e mantidas fixas, esse mecanismo é eficiente e evita
confusões.
Revista Carta Fundamental
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