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Nos Estados Unidos 40% dos alimentos são desperdiçados
Perrin IrelandNos Estados Unidos 40% dos alimentos são desperdiçados
Em minha segunda rodada de pesquisas sobre o relatório The Dating Game (O jogo de datação, em tradução livre), do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais (NRDC, na sigla em inglês), que explica como o sistema de determinação das datas de validade dos alimentos estimula a perda de alimentos nos Estados Unidos, conversei com dois autores do próprio relatório: Emily Broad Leib, diretora da Harvard Food Law and Policy Clinic, (uma divisão do Centro de Direito da Saúde e Política de Inovação) uma perita no sistema legal que contribui para essa situação, e Dana Gunders, cientista residente do NRDC para desperdício de alimentos.
Minha conversa com Emily Leib:
O que é a Harvard Food Law and Policy Clinic, e como a ‘clínica’ se envolveu nesse relatório?
A clínica é um programa experimental de aprendizagem em que os estudantes de direito se envolvem em um treinamento prático e ativo e trabalham com clientes do mundo real para influir em leis e políticas alimentares.
Nosso trabalho com datas de vencimento começou como um projeto para atender às necessidades de nosso cliente Doug Rauch que pretendia lançar um novo modelo de loja de alimentos para vender produtos que ainda estavam bons, mas que de outro modo seriam descartados.
Ao concluir algumas pesquisas para ele sobre todas as leis estaduais ligadas à rotulagem com a data de validade dos alimentos, percebemos que o sistema precisava urgentemente de uma revisão e julgamos que essa seria uma ótima maneira de empregar as energias da clínica. Essa é uma área em que o sistema legal, em vez de melhorar a questão social na realidade erra ao criar mais desperdício de comida e reduzir a segurança do consumidor.
A primeira coisa que chamou minha atenção ao ler o relatório é que o sistema de rotulação é descrito como “confuso”. A que se deve isso em sua opinião?
O sistema decididamente é confuso! É uma bagunça tão grande que até é difícil chamá-lo de “sistema”. Como inexiste uma regulamentação a nível federal, os estados ocuparam essa lacuna e regulamentam a rotulação de diversas maneiras diferentes.
Tivemos dificuldade em encontrar dois estados que tivessem as mesmas normas.
Nova York, por exemplo, não exige datas em nenhum alimento e não regula a venda de produtos após as datas colocadas nas embalagens voluntariamente, mas todos os seus seis estados vizinhos exigem que certos alimentos sejam rotulados e/ou regulamentam sua venda após o vencimento do prazo. O próprio fato de que os estados são tão inconsistentes entre si mostra que essas datas nada têm a ver com a segurança alimentar, porque seus resultados não variam de estado para estado com base nessas leis de rotulação.
Os consumidores, porém, estão alheio a toda essa confusão. Para eles, há um “sistema” e eles tratam os rótulos de datas como se fossem significativas. A maioria das pessoas abordadas fica chocada ao descobrir que os termos utilizados são indefinidos, que não existem regras para a definição das datas de validade, e que os rótulos são regulamentados de forma tão inconsistente.
Quando vejo um rótulo que diz “vender até tal data” em uma embalagem, o que isso realmente significa?
Essa informação em geral se destina a uma comunicação entre os fabricantes e os varejistas, para que eles saibam até quando algo precisa ser vendido para que o produto ainda tenha uma vida útil para os consumidores. Caso contrário, eles devem ser tirados das prateleiras. Mas como não existe uma definição legal fixa para o termo, isso nem sempre é o caso.
De fato, alguns estados tratam a informação “vender até” como se fosse o mesmo que “usar até” e “melhor consumir antes de”. Em termos gerais, porém, acredito que os consumidores podem olhar para a data “vender até” e saber que se trata de uma data de rotação dos estoques e que os alimentos ainda são seguros e frescos por alguns dias após esse prazo.
E quanto às datas “usar até” ou “melhor até”? Qual é a diferença entre as duas categorias?
Mais uma vez, como essas datas não são definidas, não existe um significado fixo para esses termos. Nos Estados Unidos não há uma diferença consistente entre os dois. Frequentemente eles são empregados como sinônimos. Em outros países, como na União Europeia, “usar até” está ligado à segurança e “melhor consumir antes de” à qualidade. Esse não é necessariamente o caso nos Estados Unidos.
O relatório se concentra em como o sistema de rotulação acaba inadvertidamente criando um desperdício de alimentos. No entanto, vocês também mencionam como a sub-regulamentação do sistema de rotulação alimentar cria questões de segurança. A senhora poderia explicar isso?
A questão principal é que os consumidores não só se baseiam nas datas como uma razão para jogar alimentos que ainda são perfeitamente comestíveis e seguros, mas também parecem acreditar que todos os produtos são seguros antes das datas de vencimento; portanto, eles continuarão consumindo alimentos que foram armazenados ou manipulados de forma insegura.
Desse modo, o excesso de confiança em datas e a interpretação equivocada das mesmas como indicadores de segurança causam problemas nas duas pontas.
Como os regulamentos federais da rotulação de alimentos podem ser aprimorados?
Depois de realizar toda essa pesquisa estadual e industrial e analisar os impactos sobre os consumidores estou convencida de que melhorar e padronizar o sistema inconsistente e ineficaz de rótulos datados ajudaria os consumidores a maximizar seus orçamentos alimentares, reduziria o desperdício de comida e de recursos, e melhoraria a segurança alimentar.
Em minha opinião, a maneira mais simples e direta de fazer isso é por meio da regulação federal. Isso não quer dizer que a indústria não poderia fazer muita coisa boa com mudanças voluntárias, mas como há uma gama tão ampla de leis estaduais para rótulos datados, que são tão diferentes entre si, existem algumas limitações para os tipos de mudanças que a indústria pode fazer.
Por essa razão, a menos que os estados realmente rigorosos mudem suas normas, ou até que o governo federal intervenha para criar regras uniformes, uma ação da indústria poderia ser um primeiro grande passo, mas pode não nos levar ao melhor sistema. Dito isso, como presumo que é muito caro para as empresas seguirem todas as leis estaduais (muitas delas ainda estão mudando e quatro estados aprovaram novas leis para as datas de validade em 2012), acredito que também haja benefícios para a indústria em termos de custos administrativos reduzidos se elas tiverem uma lei uniforme.
Como esse trabalho afetou a senhora pessoalmente?
Começar a trabalhar nessa área mudou completamente os hábitos de consumo na minha casa. Gastamos muito mais tempo analisando as melhores formas de armazenar a comida para que ela dure mais e nunca jogamos nada em qualquer data de “validade”, exceto se o aspecto ou o cheiro do produto estiver ruim ou se soubermos que o guardamos por mais tempo que deveríamos. Só tivemos boas experiências fazendo isso. Estamos economizando comida e dinheiro!
Minha conversa com Dana Gunders, cientista do projeto do NRDC sobre alimentos e agricultura:
O que despertou seu interessou nesse relatório?
Esse relatório se originou de outro maior que produzimos, o Wasted Report, no qual analisamos os motivos e a extensão do desperdício de alimentos no país. Identificamos as datas de validade como um dos fatores estimulantes do esbanjamento e um sistema que realmente não atende nem aos consumidores nem à indústria.
Estou interessado nessa ideia de que ele não atende nem consumidores nem a indústria. A senhora poderia elaborar?
Os consumidores interpretam essas datas como um sinal de que o alimento não é seguro para consumo, ou que há alguma implicação de segurança por trás delas.
Na realidade elas se aplicam à qualidade. Eles (os consumidores) acreditam que se trata de um sistema objetivo e racional quando de fato há muita subjetividade em toda essa coisa. Recentemente entrei em um mercado da cadeia americana Trader Joe’s e dei uma olhada na seção de leite. Todo o leite ali é da marca Trader Joe’s e no mesmo tipo de leite, entre embalagens de 3,78 litros e 1,89 litro, havia dois tipos de datas diferentes. No caso do leite desnatado, em embalagens de 1,89 litro e 0,94 litro, o mesmo produto tinha informações diferentes: um trazia a data “melhor consumir até” e o outro não tinha data nenhuma. Exatamente os mesmos produtos e um sistema de datação completamente diferente.
Na indústria também há confusão. A falta de padronização está causando prejuízos. Existe um relatório publicado pelo setor em 2003 em que se estima que produtos no valor de US$ 900 milhões não são vendidos por causa da data de validade. Uma parte disso eles atribuem à falta de padronização.
O ex-presidente de uma rede de mercearias me contou que eles compravam as mesmas carnes que o concorrente do outro lado da rua. A sua loja colocava uma data de validade de três dias, enquanto o concorrente dava um prazo de cinco. Eles pensavam que estavam fazendo o produto parecer mais fresco assim, mas quando começaram a entrevistar as pessoas, descobriram que elas atravessavam a rua para comprar carne porque presumiam que com uma validade de cinco dias ela tinha uma vida útil mais longa e, portanto, era mais fresca. Eles mudaram sua tática e tudo ficou bem. Mas isso mostra o quanto algumas dessas datas podem ser arbitrárias.
Quais são as implicações ambientais para esse tipo de desperdício de alimentos?
Cerca de 40% dos alimentos nunca são consumidos nesse país — e isso levando em conta que nos Estados Unidos 80% do consumo de água fresca, mais da metade das terras rurais, e 10% do orçamento de energia são gastos para colocar comida em nossas mesas.
Se não estamos comendo esses alimentos isso é uma utilização terrível desses recursos.
No Reino Unido, um estudo de domicílios britânicos mostrou que 20% do desperdício realmente evitável resultava da confusão por causa das datas de validade. Nosso cálculo é muito arredondado, mas se o aplicarmos aos Estados Unidos, os domicílios, como unidades familiares, podem estar gastando entre US$ 275 e US$ 455 por ano em alimentos que serão descartados prematuramente.
Quais são as recomendações do NRDC para melhorar essa situação?
O fundamental é que gostaríamos de ver um sistema menos confuso e mais padronizado de datas.91% das pessoas relataram jogar comida fora por preocupação com sua segurança na data de “venda até”, pelo menos ocasionalmente; e essa é a data que os fabricantes usam para garantir à loja que o produto terá uma vida útil a mais depois de ser comprado. (Extraído de um relatório da indústria chamado US Grocery Shopper Trends 2011, divulgado pelo Food Marketing Institute, a principal associação comercial para varejistas de alimentos.)
Nossa primeira recomendação é substituir a informação “vender até” por uma data mais útil para os consumidores, para que eles não joguem a comida fora no dia em que pensam que ela já está ruim.
A segunda recomendação é ter um sistema de datação voltado ao consumidor que seja muito mais claro no que tenta transmitir. Deve haver uma distinção clara entre data de qualidade e data de segurança. Além disso, talvez deva haver mais transparência sobre como essa data foi determinada.
Se a mensagem é de segurança, então devemos usar essas palavras. Vamos dizer “Não é seguro consumir depois de”; se é sobre o pico de qualidade, então vamos empregar palavras que transmitam isso claramente. Talvez devêssemos usar algo como “frescura máxima antes de” ou “pico de qualidade antes de”.
Se eu quiser que o meu alimento seja o melhor possível, ainda devo prestar atenção à data de ‘vender até’?
Essa data é a sugestão do fabricante para quando o alimento está no pico máximo de qualidade. O que significa não estar no pico de qualidade? Isso depende do produto. Se você pensar em uma caixa de ‘Mac N Cheese’ (macarrão com queijo) com data de validade em março de 2015 e se perguntar o que acontecerá se você comer aquilo em maio de 2015 — você provavelmente nem notará a diferença.
Sobre o autor: Perrin Ireland rabiscou e escreveu enquanto pensava durante toda a sua vida; era uma aluna que visualiza conceitos para entendê-los. Atualmente ela é Especialista Sênior em Ciências da Comunicação do Natural Resources Defense Council, onde ajuda a contar a história de como a ciência desempenha um papel no trabalho do NRDC. Siga-a no Twitter @experrinment.
As opiniões expressas são as da autora e não necessariamente as da Scientific American.
Minha conversa com Emily Leib:
O que é a Harvard Food Law and Policy Clinic, e como a ‘clínica’ se envolveu nesse relatório?
A clínica é um programa experimental de aprendizagem em que os estudantes de direito se envolvem em um treinamento prático e ativo e trabalham com clientes do mundo real para influir em leis e políticas alimentares.
Nosso trabalho com datas de vencimento começou como um projeto para atender às necessidades de nosso cliente Doug Rauch que pretendia lançar um novo modelo de loja de alimentos para vender produtos que ainda estavam bons, mas que de outro modo seriam descartados.
Ao concluir algumas pesquisas para ele sobre todas as leis estaduais ligadas à rotulagem com a data de validade dos alimentos, percebemos que o sistema precisava urgentemente de uma revisão e julgamos que essa seria uma ótima maneira de empregar as energias da clínica. Essa é uma área em que o sistema legal, em vez de melhorar a questão social na realidade erra ao criar mais desperdício de comida e reduzir a segurança do consumidor.
A primeira coisa que chamou minha atenção ao ler o relatório é que o sistema de rotulação é descrito como “confuso”. A que se deve isso em sua opinião?
O sistema decididamente é confuso! É uma bagunça tão grande que até é difícil chamá-lo de “sistema”. Como inexiste uma regulamentação a nível federal, os estados ocuparam essa lacuna e regulamentam a rotulação de diversas maneiras diferentes.
Tivemos dificuldade em encontrar dois estados que tivessem as mesmas normas.
Nova York, por exemplo, não exige datas em nenhum alimento e não regula a venda de produtos após as datas colocadas nas embalagens voluntariamente, mas todos os seus seis estados vizinhos exigem que certos alimentos sejam rotulados e/ou regulamentam sua venda após o vencimento do prazo. O próprio fato de que os estados são tão inconsistentes entre si mostra que essas datas nada têm a ver com a segurança alimentar, porque seus resultados não variam de estado para estado com base nessas leis de rotulação.
Os consumidores, porém, estão alheio a toda essa confusão. Para eles, há um “sistema” e eles tratam os rótulos de datas como se fossem significativas. A maioria das pessoas abordadas fica chocada ao descobrir que os termos utilizados são indefinidos, que não existem regras para a definição das datas de validade, e que os rótulos são regulamentados de forma tão inconsistente.
Quando vejo um rótulo que diz “vender até tal data” em uma embalagem, o que isso realmente significa?
Essa informação em geral se destina a uma comunicação entre os fabricantes e os varejistas, para que eles saibam até quando algo precisa ser vendido para que o produto ainda tenha uma vida útil para os consumidores. Caso contrário, eles devem ser tirados das prateleiras. Mas como não existe uma definição legal fixa para o termo, isso nem sempre é o caso.
De fato, alguns estados tratam a informação “vender até” como se fosse o mesmo que “usar até” e “melhor consumir antes de”. Em termos gerais, porém, acredito que os consumidores podem olhar para a data “vender até” e saber que se trata de uma data de rotação dos estoques e que os alimentos ainda são seguros e frescos por alguns dias após esse prazo.
E quanto às datas “usar até” ou “melhor até”? Qual é a diferença entre as duas categorias?
Mais uma vez, como essas datas não são definidas, não existe um significado fixo para esses termos. Nos Estados Unidos não há uma diferença consistente entre os dois. Frequentemente eles são empregados como sinônimos. Em outros países, como na União Europeia, “usar até” está ligado à segurança e “melhor consumir antes de” à qualidade. Esse não é necessariamente o caso nos Estados Unidos.
O relatório se concentra em como o sistema de rotulação acaba inadvertidamente criando um desperdício de alimentos. No entanto, vocês também mencionam como a sub-regulamentação do sistema de rotulação alimentar cria questões de segurança. A senhora poderia explicar isso?
A questão principal é que os consumidores não só se baseiam nas datas como uma razão para jogar alimentos que ainda são perfeitamente comestíveis e seguros, mas também parecem acreditar que todos os produtos são seguros antes das datas de vencimento; portanto, eles continuarão consumindo alimentos que foram armazenados ou manipulados de forma insegura.
Desse modo, o excesso de confiança em datas e a interpretação equivocada das mesmas como indicadores de segurança causam problemas nas duas pontas.
Como os regulamentos federais da rotulação de alimentos podem ser aprimorados?
Depois de realizar toda essa pesquisa estadual e industrial e analisar os impactos sobre os consumidores estou convencida de que melhorar e padronizar o sistema inconsistente e ineficaz de rótulos datados ajudaria os consumidores a maximizar seus orçamentos alimentares, reduziria o desperdício de comida e de recursos, e melhoraria a segurança alimentar.
Em minha opinião, a maneira mais simples e direta de fazer isso é por meio da regulação federal. Isso não quer dizer que a indústria não poderia fazer muita coisa boa com mudanças voluntárias, mas como há uma gama tão ampla de leis estaduais para rótulos datados, que são tão diferentes entre si, existem algumas limitações para os tipos de mudanças que a indústria pode fazer.
Por essa razão, a menos que os estados realmente rigorosos mudem suas normas, ou até que o governo federal intervenha para criar regras uniformes, uma ação da indústria poderia ser um primeiro grande passo, mas pode não nos levar ao melhor sistema. Dito isso, como presumo que é muito caro para as empresas seguirem todas as leis estaduais (muitas delas ainda estão mudando e quatro estados aprovaram novas leis para as datas de validade em 2012), acredito que também haja benefícios para a indústria em termos de custos administrativos reduzidos se elas tiverem uma lei uniforme.
Como esse trabalho afetou a senhora pessoalmente?
Começar a trabalhar nessa área mudou completamente os hábitos de consumo na minha casa. Gastamos muito mais tempo analisando as melhores formas de armazenar a comida para que ela dure mais e nunca jogamos nada em qualquer data de “validade”, exceto se o aspecto ou o cheiro do produto estiver ruim ou se soubermos que o guardamos por mais tempo que deveríamos. Só tivemos boas experiências fazendo isso. Estamos economizando comida e dinheiro!
Minha conversa com Dana Gunders, cientista do projeto do NRDC sobre alimentos e agricultura:
O que despertou seu interessou nesse relatório?
Esse relatório se originou de outro maior que produzimos, o Wasted Report, no qual analisamos os motivos e a extensão do desperdício de alimentos no país. Identificamos as datas de validade como um dos fatores estimulantes do esbanjamento e um sistema que realmente não atende nem aos consumidores nem à indústria.
Estou interessado nessa ideia de que ele não atende nem consumidores nem a indústria. A senhora poderia elaborar?
Os consumidores interpretam essas datas como um sinal de que o alimento não é seguro para consumo, ou que há alguma implicação de segurança por trás delas.
Na realidade elas se aplicam à qualidade. Eles (os consumidores) acreditam que se trata de um sistema objetivo e racional quando de fato há muita subjetividade em toda essa coisa. Recentemente entrei em um mercado da cadeia americana Trader Joe’s e dei uma olhada na seção de leite. Todo o leite ali é da marca Trader Joe’s e no mesmo tipo de leite, entre embalagens de 3,78 litros e 1,89 litro, havia dois tipos de datas diferentes. No caso do leite desnatado, em embalagens de 1,89 litro e 0,94 litro, o mesmo produto tinha informações diferentes: um trazia a data “melhor consumir até” e o outro não tinha data nenhuma. Exatamente os mesmos produtos e um sistema de datação completamente diferente.
Na indústria também há confusão. A falta de padronização está causando prejuízos. Existe um relatório publicado pelo setor em 2003 em que se estima que produtos no valor de US$ 900 milhões não são vendidos por causa da data de validade. Uma parte disso eles atribuem à falta de padronização.
O ex-presidente de uma rede de mercearias me contou que eles compravam as mesmas carnes que o concorrente do outro lado da rua. A sua loja colocava uma data de validade de três dias, enquanto o concorrente dava um prazo de cinco. Eles pensavam que estavam fazendo o produto parecer mais fresco assim, mas quando começaram a entrevistar as pessoas, descobriram que elas atravessavam a rua para comprar carne porque presumiam que com uma validade de cinco dias ela tinha uma vida útil mais longa e, portanto, era mais fresca. Eles mudaram sua tática e tudo ficou bem. Mas isso mostra o quanto algumas dessas datas podem ser arbitrárias.
Quais são as implicações ambientais para esse tipo de desperdício de alimentos?
Cerca de 40% dos alimentos nunca são consumidos nesse país — e isso levando em conta que nos Estados Unidos 80% do consumo de água fresca, mais da metade das terras rurais, e 10% do orçamento de energia são gastos para colocar comida em nossas mesas.
Se não estamos comendo esses alimentos isso é uma utilização terrível desses recursos.
No Reino Unido, um estudo de domicílios britânicos mostrou que 20% do desperdício realmente evitável resultava da confusão por causa das datas de validade. Nosso cálculo é muito arredondado, mas se o aplicarmos aos Estados Unidos, os domicílios, como unidades familiares, podem estar gastando entre US$ 275 e US$ 455 por ano em alimentos que serão descartados prematuramente.
Quais são as recomendações do NRDC para melhorar essa situação?
O fundamental é que gostaríamos de ver um sistema menos confuso e mais padronizado de datas.91% das pessoas relataram jogar comida fora por preocupação com sua segurança na data de “venda até”, pelo menos ocasionalmente; e essa é a data que os fabricantes usam para garantir à loja que o produto terá uma vida útil a mais depois de ser comprado. (Extraído de um relatório da indústria chamado US Grocery Shopper Trends 2011, divulgado pelo Food Marketing Institute, a principal associação comercial para varejistas de alimentos.)
Nossa primeira recomendação é substituir a informação “vender até” por uma data mais útil para os consumidores, para que eles não joguem a comida fora no dia em que pensam que ela já está ruim.
A segunda recomendação é ter um sistema de datação voltado ao consumidor que seja muito mais claro no que tenta transmitir. Deve haver uma distinção clara entre data de qualidade e data de segurança. Além disso, talvez deva haver mais transparência sobre como essa data foi determinada.
Se a mensagem é de segurança, então devemos usar essas palavras. Vamos dizer “Não é seguro consumir depois de”; se é sobre o pico de qualidade, então vamos empregar palavras que transmitam isso claramente. Talvez devêssemos usar algo como “frescura máxima antes de” ou “pico de qualidade antes de”.
Se eu quiser que o meu alimento seja o melhor possível, ainda devo prestar atenção à data de ‘vender até’?
Essa data é a sugestão do fabricante para quando o alimento está no pico máximo de qualidade. O que significa não estar no pico de qualidade? Isso depende do produto. Se você pensar em uma caixa de ‘Mac N Cheese’ (macarrão com queijo) com data de validade em março de 2015 e se perguntar o que acontecerá se você comer aquilo em maio de 2015 — você provavelmente nem notará a diferença.
Sobre o autor: Perrin Ireland rabiscou e escreveu enquanto pensava durante toda a sua vida; era uma aluna que visualiza conceitos para entendê-los. Atualmente ela é Especialista Sênior em Ciências da Comunicação do Natural Resources Defense Council, onde ajuda a contar a história de como a ciência desempenha um papel no trabalho do NRDC. Siga-a no Twitter @experrinment.
As opiniões expressas são as da autora e não necessariamente as da Scientific American.
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