segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Alimentação e ecossistema: cientistas tentam desvendar a relação intrincada


A partir de análises genéticas, pesquisadores da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, buscam compreender de que forma a alimentação e o ecossistema impactam no microbioma de humanos e de animais.

Paloma Oliveto




(foto: Valdo Virgo/CB/D.A. Press)

Nos últimos anos, o campo da pesquisa de microbiomas cresceu rapidamente, o que trouxe novos conhecimentos — e questões adicionais — sobre os micro-organismos que habitam os corpos de humanos e outros animais. Agora, um estudo da Universidade de Princeton usou a análise genética para examinar a relação entre dieta, meio ambiente e a microflora. De acordo com os pesquisadores, a abordagem pode apontar novos caminhos para se estudar e compreender esse elemento tão importante ao funcionamento do corpo e que, quando em desequilíbrio, está por trás de uma ampla gama de doenças.

“A mudança ambiental pode influenciar o que os animais comem e, como consequência, ter um efeito em seu microbioma e na saúde de várias maneiras que só podem ser entendidas em ambientes naturais”, diz o principal autor do estudo, Tyler Kartzinel, professor assistente de ecologia e biologia evolutiva na Universidade de Brown e ex-pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Princeton. Para isso, a equipe de cientistas foi a campo e estudou a relação de dieta/meio ambiente/microbiota em animais. Foram coletadas e analisadas mais de 1 mil amostras de material fecal de 33 espécies de herbívoros — que variaram de antílopes diminutos a gigantescas girafas e elefantes — em uma savana africana.

Grande parte do trabalho de campo foi realizada no Centro de Pesquisa Mpala, no Quênia, administrado pela Universidade de Princeton. “Uma amostra fecal abre uma incrível janela para a biologia de um animal selvagem, revelando desde o que ele come até as bactérias que vivem em seu intestino e os tipos de parasitas que possui”, explica Robert Pringle, professor-associado de ecologia e biologia evolutiva em Princeton e autor sênior do estudo. “Estamos apenas começando a explorar o potencial das abordagens forenses baseadas em DNA para estudar a ecologia da vida selvagem. Isso pode nos ensinar muito sobre questões que, historicamente, têm sido muito difíceis, se não impossíveis, de investigar.”


Diferenças Depois de analisar o DNA nas amostras para inferir as dietas e os microbiomas dos animais, os pesquisadores chegaram a três conclusões principais. Consistente com o que esperavam, eles descobriram que espécies estreitamente relacionadas tinham microbiomas semelhantes e, em menor grau, dietas semelhantes. A segunda descoberta foi que as espécies (e animais individuais de uma espécie) que consumiam dietas diversas tendiam a ter microbiomas diferentes.

Por fim, o estudo constatou que os animais cujas dietas sofrem mudanças sazonais significativas também tendem a experimentar grandes alterações em seus microbiomas. Mas a equipe ficou surpresa ao verificar que a flora de espécies domesticadas, como gado, ovelhas, cabras, burros e camelos, tende a mudar mais com as estações do que a dos animais selvagens.

Kartzinel observa que os métodos utilizados no estudo permitiram um nível mais profundo de análise da microbiota. No passado, os pesquisadores estudavam microbiomas de duas maneiras: alguns realizavam pesquisas entre espécies, comparando, por exemplo, a microbiota de uma ovelha à de uma vaca. Outros conduziam pesquisas intraespécies, fazendo comparações entre indivíduos da mesma espécie em situações (como a estação do ano) diferentes. No entanto, como os pesquisadores de Princeton e Brown usaram a abordagem genética para avaliar amostras individuais de muitas espécies diferentes habitantes do mesmo ambiente, eles conseguiram fazer comparações entre e intraespécies.

Segundo Kartzinel, uma variedade de perguntas adicionais surge da pesquisa. “Por exemplo, a sensibilidade sazonal no microbioma é um sinal de saúde ou um problema? Você pode imaginar animais mudando suas dietas e microbiomas porque são bons em se adaptar às mudanças no ambiente. Mas também pode imaginá-los fazendo isso porque estão estressados e apenas tentando sobreviver à medida que o ambiente muda”, diz.

Os pesquisadores também esperam determinar qual fator — dieta ou microbioma — tende a ser mais sensível ao ambiente do animal. “A mesma planta pode fornecer frutas suculentas para os animais comerem em uma estação e oferecer apenas galhos mastigáveis na próxima. Se ele comê-la nas duas estações, nossos métodos não registrariam uma mudança na dieta dele, mas o microbioma intestinal seria afetado”, explica Kartzinel. O cientista conta que pretende fazer mais pesquisas para determinar a importância da mudança de dieta e da microbioma na saúde dos animais selvagens.
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“A sensibilidade do microbioma de um herbívoro ajudará a manter uma dieta saudável em um mundo em mudança?”, questiona. “Ou outros ajustes têm precedentes quando o animal toma decisões sobre como sobreviver? Talvez seja um pouco de ambos. Estamos falando de várias espécies ameaçadas de extinção, e as pessoas dependem do gado, por isso é importante considerar as possibilidades.” Se o microbioma influenciar significativamente a saúde e o comportamento dos animais, diz Kartzinel, isso poderá “afetar teias alimentares, comunidades e ecossistemas inteiros, porque determinaria quem sobrevive e quem é extinto”. “É incrível pensar nisso”, enfatiza.

A equipe também começou a explorar como os resultados da pesquisa podem ser aplicados para seres humanos. “O mundo biomédico está realmente interessado em descobrir se — e como — podemos gerenciar o microbioma intestinal humano para melhorar a saúde, o estresse e a nutrição. Junto a diversas outras abordagens de pesquisa, acreditamos a nossa abordagem genética pode fornecer uma camada adicional de informações”, diz Kartzinel.

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